RESUMO [1]: O fenômeno da dupla incidência tributária, quando um só fato gerador produz a manifestação do poder de tributar mais de uma vez. A dupla incidência divide-se na bitributação, onde ocorre a existência de duas ou mais formas tributárias derivadas de dois entes diferentes e o bis in idem, que é o exercício da competência de uma norma, sob o mesmo fato gerador, sob o mesmo sujeito passivo e ativo. O artigo tem como objetivo geral abordar como o fenômeno da dupla incidência ser utilizado como instrumento constitucional previsto na carta maior. Quanto aos fins esta pesquisa foi descritiva e explicativa. Descritiva, o artigo buscou descrever os limites e sua previsão no texto constitucional. E explicativa, a pesquisa buscou tornou inteligível o objetivo da dupla incidência que é uma forma prevista na Constituição. Quanto aos meios, a pesquisa foi bibliográfica, baseada em revisão da literatura, recebendo uma redação textual das reflexões obtidas. Como conclusão destaca-se que os tributos, sendo um dever constitucional, gera direitos e obrigações tanto para o Contribuinte, como para o Estado. Conclui-se que este assunto é importante para sociedade pelo fato que poderia reduzir muitos impostos, estes instituídos de forma abusiva e contrário ao Texto Constitucional.
Palavras-chave: Fato Gerador; Dupla incidência; Texto Constitucional; Autorização Constitucional;
ABSTRACT: The phenomenon of double tax incidence, when a single taxable event produces the manifestation of tax power more than once. Double incidence is divided into double taxation, where there are two or more forms of taxation derived from two different entities, and bis in idem, which is the exercise of the competence of a rule, under the same taxable event, under the same subject passive and active. The article has its general objective to address how the phenomenon of double incidence can be used as a constitutional instrument provided for in the major charter. This research was descriptive and explanatory. Descriptive, the article sought to describe the limits and their prediction in the constitutional text. And explanatory, the research sought to make intelligible the objective of the double incidence that is a form foreseen in the Constitution. The research was bibliographical, based on a literature review, receiving a textual writing of the entries. In conclusion, it is highlighted that taxes, being a constitutional duty, generate rights and obligations for both the Taxpayer and the State. It is concluded that this subject is important for society because it could reduce many taxes, which were instituted in an abusive way and contrary to the Constitutional Text.
Keywords: Generating Event; Double incidence; Constitutional Text; Constitutional Authorization;
1 INTRODUÇÃO
O tema de estudo desse artigo sobre Direito Tributário, especificamente abordando o tema da bitributação, inclusive apresentando exemplos verídicos sobre as hipóteses presentes no ordenamento jurídico.
O Direito Tributário tem sua base, seus princípios e diretrizes fundamentais enraizados na Constituição Federal, especificamente no Título VI, mas não limitado apenas aos artigos deste. Da análise das regras de repartição de competências tributárias da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, depreende-se que cada um destes entes possui sua própria competência para tributar, não podendo a União, por exemplo, instituir tributo sobre um fato gerador cuja competência é dos Municípios. Este fenômeno é conhecido como bitributação.
O artigo buscou ainda verificar o que a doutrina e a legislação contribuem para as previsões constitucionais da dupla incidência, destacando suas características, limites constitucionais e principiológicos, benefícios e pontos positivos e negativos, demonstrando as hipóteses de bitributação permitidas no ordenamento jurídico pátrio.
Nesse contexto, o presente artigo busca responder ao seguinte questionamento: Na legislação tributária, de forma não excepcional, vê-se a dupla incidência, como no caso de um mesmo fato gerador ser tributado duas vezes, essa ocorrência seria constitucional?
A hipótese que norteou a pesquisa partiu da premissa básica de que a dupla incidência pode acontecer em duas situações previstas constitucionalmente, quais sejam, imposto extraordinário, na iminência ou no caso de guerra externa ou desde que seja autorizado constitucionalmente, no caso do bis in idem.
No que se refere à metodologia, Alves (2007, p.59) destaca que, a metodologia é um instrumento do pesquisador, “onde se define o como, onde, com quem, com quê, quanto e de que maneira se pretende captar a realidade e os fenômenos estudados”.
Por sua vez, Vergara (2004, p.41) esclarece que, a organização da metodologia é decorrente das particularidades de cada pesquisa, demandando algumas informações sobre alguns aspectos, tais como: “quanto ao método de abordagem, quanto à natureza da pesquisa, quanto aos fins e quanto aos meios", e que são brevemente expostos a seguir.
Quanto ao método de abordagem, este artigo adotou o método dedutivo, que conforme Gil (2007), nesse método parte-se dos argumentos gerais para os específicos, fazendo uso da dedução que tem seus fundamentos na relação lógica e entre as proposições apresentadas, com o objetivo de não comprometer a validade da conclusão.
Nesse estudo, primeiramente identificaram-se as questões relacionadas à previsão constitucional para em seguida, na passagem da perspectiva geral para a específica, discorrer sobre se há outras hipóteses de incidência e se estão conforme a constituição.
No que tange à natureza, configura-se como uma pesquisa qualitativa baseada na opinião das fontes como autores e doutrina, consultados. Conforme Mezzaroba e Monteiro (2008), a pesquisa qualitativa não mede dados, mas, procura identificar suas naturezas visando a compreensão das informações, sendo feita de uma forma mais global e interrelacionada com fatores variados, privilegiando contextos e o que prepondera sempre é o exame rigoroso da natureza, do alcance e das interpretações possíveis para o fenômeno estudado e (re)interpretado conforme as hipóteses estabelecidas pelo pesquisador.
Quanto aos fins esta pesquisa classifica-se como descritiva e explicativa. Descritiva, pois segundo Vergara (2004), expõe características de determinado fenômeno. Nesse artigo buscou-se descrever os limites do planejamento tributário e sua regulação no Brasil. E explicativa que conforme Vergara (2004), tem como principal objetivo tornar algo inteligível, justificar-lhe os motivos, esclarecendo ainda os fatores que contribuem, de alguma forma, para a ocorrência de determinado fenômeno. Essa pesquisa buscou tornou inteligível o objetivo do planejamento tributário que é uma forma lícita para reduzir os custos com os tributos nas empresas.
No que tange aos meios de investigação, a pesquisa pode ser enquadrada como uma pesquisa bibliográfica e doutrinária, que foi baseada em revisão da literatura, que recebeu posteriormente uma redação textual das informações obtidas. De acordo com Gil (2007), a pesquisa bibliográfica é desenvolvida a partir de material já elaborado, como livros, artigos e legislação. As informações foram obtidas na literatura publicada em livros, legislação, artigos e consultas em bibliotecas virtuais na internet.
Para a sistematização do artigo, foi utilizado o método descritivo sobre o tema. E para atender aos objetivos do trabalho, o artigo foi dividido em três seções principais. A primeira seção fala-se da possibilidade de um mesmo fato jurídico ser tributado por mais de uma pessoa. No segundo tópico, analisaremos algumas hipóteses sobre o instituto da dupla incidência, que não estão expressas no Texto Constitucional, tendo em vista a distribuição das competências, que apesar de detalhada, deixa lacunas para erros de interpretação e acabam por gerar disputas entre os entes sobre quem deve tributar determinado fato gerador. E por fim, analisa-se o Instituto da Dupla incidência, ressalvados os casos expressos na Constituição Federal, estão ou não em consonância com a Constituição Federal.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Essa seção tem como finalidade apresentar uma fundamentação teórica sobre o tema, procurando, a princípio, apresentar uma abordagem acerca das hipóteses de incidência e os aspectos conceituais do cabimento da dupla incidência. Afinal, a lei no nosso ordenamento jurídico, não se restringe a instituir tributos, precisando também determinar dentre outras hipóteses quem será, o sujeito ativo, sujeito passivo, bem como estabelecer sobre qual fato gerador determinado tributo incidirá. É preciso que haja o fato descrito na norma (fato gerador), sendo este elemento essencial para que faça surgir uma obrigação do sujeito ativo de cobrar e do sujeito passivo de pagar. Assim, o fato gerador e quem dá legitimidade ao ente público de realizar a cobrança do tributo, e cria também um vínculo de obrigação de pagar o tributo imposto.
Na fundamentação teórica, ainda foram contemplados os seguintes aspectos: princípios fundamentais, classificação e principais etapas do planejamento tributário, sendo essencial, portanto, caracterizá-los, isto porque a interpretação que irá se dar durante todo o artigo está apoiada nesses pressupostos básicos.
De acordo com Vergara (2004), denomina-se fundamentação ou referencial teórico, ou ainda revisão da literatura, a seção ou capítulo de um trabalho que tem por objetivo apresentar as principais pesquisas e estudos disponibilizados sobre a problemática, já realizados por outros pesquisadores. Nesse contexto, realiza-se, portanto, uma revisão da literatura existente e disponível, não somente no acervo de teorias e suas críticas, como também a trabalhos realizados que as tomam como referência, tomando-se conhecimento do que já existe sobre o assunto (estado da arte), oferecendo contextualização e consistência à investigação
2.1 Bitributação e dupla incidência de acordo com o texto constitucional
A Constituição Federal traz a competência, ou seja, discrimina, autoria a lei instituir e regulamentar o tributo. Temos como norma geral o Código Tributário Nacional, que embora tenha natureza infraconstitucional, foi recepcionada pelo legislador constituinte com status de lei complementar. A lei institui o tributo e da as perspectivas para a sua exigência. O fato gerador determina a obrigação tributária. Quando há dois entes ou mais tributando o mesmo fato temos o fenômeno da bitributação.
Impera no nosso ordenamento jurídico o princípio da legalidade, da qual decorre a bitributação, entende-se por princípio da legalidade com base no artigo 150 inciso primeiro da constituição federal de 1988 o seguinte: “Art. 150 – Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;”
A lei no nosso ordenamento jurídico, não fica restrita apenas a instituir os tributos, precisando também determinar dentre outras coisas quem será, o sujeito ativo, sujeito passivo, bem como estabelecer sobre qual fato gerador determinado tributo incidirá. É preciso que haja o fato descrito na norma (fato gerador), sendo este elemento essencial para que faça surgir uma obrigação do sujeito ativo de cobrar e do sujeito passivo de pagar.
Assim, o fato gerador e quem dá legitimidade ao ente público de realizar a cobrança do tributo, e cria também um vínculo de obrigação de pagar o tributo imposto. Deve-se ficar atento que o fato gerador gera a obrigação de pagar tributo, mas não é qualquer tributo, deve ser correspondente ao fato, isso se deve para evitar o enriquecimento ilícito do ente político, e proteger o interesse da coletividade. Ramon Henrique Santos diz que (2012, s.p.): [...] quando ocorrem várias incidências de tributos, cuja competência para instituição é de entes federados diferentes, sobre o mesmo fato gerador, pode-se dizer que ocorre um conflito de competência tributária. A Constituição Federal traz a competência, a lei complementar institui o tributo e regulamenta essa competência. Temos como norma geral o Código Tributário Nacional, que embora tenha natureza infraconstitucional, foi recepcionada pelo legislador constituinte com status de lei complementar. A lei institui o tributo e da as perspectivas para a sua exigência. O fato gerador determina a obrigação tributária. Quando há dois entes ou mais tributando o mesmo fato temos o fenômeno da bitributação.
Como ensina Regina Helena Costa (2012, p. 67): A possibilidade de um mesmo fato jurídico ser tributado por mais de uma pessoa:
“O nosso ordenamento jurídico não permite essa prática, pois cada fato gerador só pode ser tributado por somente uma pessoa jurídica de direito público (União, Estados, Distrito Federal e Municípios). Há também o “bis in idem” que é quando um único ente político tributa duas vezes o mesmo fato, ou ainda explicado pela mesma (2012, p. 67): [...] é o mesmo fato jurídico ser tributado mais de uma vez pela mesma pessoa política”.
Nesse caso, se houver expressa autorização prevista na Constituição Federal, a prática é permitida. Robinson Barreirinhas assim entende (2011, s.p.):
“Como foi dito, o nosso ordenamento jurídico veda a prática da bitributação, porém esta comporta algumas exceções, mas salientando que devem estar previstas expressamente na Constituição Federal.
O artigo 154 em seu inciso II determina que:
‘‘Art.154: A União poderá instituir: II- na iminência ou no caso de guerra externa, impostos extraordinários, compreendidos ou não em sua competência tributária, os quais serão suprimidos, gradativamente, cessadas as causas de sua criação.”.
No caso, impostos extraordinários, conceituados por Adriano Pinto (PINTO, 2008, s.p.): São aqueles passíveis de serem cobrados na iminência ou no caso de guerra declarada. Assim a Constituição Federal permite a cobrança desse tipo de imposto segundo Adriano Pinto para 2008, s.p.): [...] garantir a viabilidade de recursos para a batalha que se antevê ou já ocorre’’.
Mas e em relação ao princípio da anterioridade? José Francisco da Silva (2004, p. 129) diz que esse princípio: [...] estabelece uma imposição constitucional de se manter uma distância temporal mínima entre a publicação e a força vinculante da lei instituidora ou majoradora de tributos.
O artigo 150 em seu parágrafo primeiro da Constituição Federal determina que: ‘’Art.150: a vedação do inciso III, b, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, IV e V; e 154, II; e a vedação do inciso III, c, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, III e V; e 154, II, nem à fixação da base de cálculo dos impostos previstos nos arts. 155, III, e 156, I.’’
Esse artigo traz, nada mais do que a exclusão do princípio da anterioridade, pois não há como prever a vinda de uma guerra.
“Lauany Barbosa (BARBOSA, 2012, s.p.) dá uma breve explicação de como funciona o imposto extraordinário: A União Federal poderá até mesmo instituí-los fora de sua competência, ou seja, dela, dos estados e dos municípios. Poderão ter o mesmo fato gerador e base de cálculo de impostos já existentes, sejam federais, estaduais ou municipais. Não pode ser um imposto novado, não pode haver inovação tributária, ou seja, não pode criar um tributo que não existe, pois assim será residual. O que pode é criar um que já exista. Pode-se, em caso de guerra, por exemplo, cobrar IPTU federal (que é municipal), ou seja, o nome não importa, pode ter o mesmo nome ou diferente, mas seu cerne já existe. É criado em outro âmbito. Não se submete ao princípio da anterioridade fiscal, nem da anterioridade “integral”, mesmo sendo mitigado (90 dias). É restituído por meio de Medida Provisória. Cessada a situação que lhe deu causa, encerra-se a sua cobrança. É um imposto transitório, isso quer dizer só é criado para um determinado contexto. Assim, o imposto extraordinário é a criação tributaria de um imposto que já incide sob um fato gerador, sendo que frente a esta situação excepcional, dois entes tributarão o mesmo fato gerador. Pode-se assim haver cobrança fora de sua competência original, que incidirá sob o mesmo fato gerador.”.
Esse mesmo artigo 154, II da Constituição Federal originou o artigo 76 do Código Tributário Nacional: Art. 76: Na iminência ou no caso de guerra externa, a União pode instituir, temporariamente, impostos extraordinários compreendidos ou não entre os referidos nesta Lei, suprimidos, gradativamente, no prazo máximo de 5 (cinco) anos, contados da celebração de paz. Esse artigo descreve um imposto instituído de forma temporária, assim ao cessar as causas de sua criação (guerra externa) cessa também a sua incidência. Da celebração de paz tem-se cinco anos para ir gradativamente suprimindo a cobrança desses impostos. Lauany Barbosa (BARBOSA, 2012, s.p.) complementa:
“As hipóteses de incidência desses impostos extraordinários podem ser livremente estabelecidas pelo legislador, pois a Constituição não descreveu o âmbito de incidência desses impostos. O legislador pode definir várias hipóteses de incidência, pode instituir vários impostos, inteiramente distintos uns dos outros, cada qual com inteira autonomia, com regime jurídico próprio. As bases de cálculo e alíquotas desses impostos extraordinários podem ser estabelecidas também pelo legislador, com ampla liberdade.
Quanto a pessoa do contribuinte de impostos, Barbosa (BARBOSA, 2012, s.p.) encerra conceituando que: [...] é qualquer pessoa que tenha relação pessoal e direta com a situação descrita como hipótese de incidência do imposto, que pode ser definida livremente pelo legislador ordinário. Analisando que o fenômeno da bitributação é vedado pela Constituição Federal, salvo exceções que essa mesma traz de maneira expressa, percebemos que no caso de guerra externa a União impõe o imposto extraordinário, podendo o legislador estabelecer desde a sua incidência até a sua base de cálculos e alíquotas e tudo isso de forma livre.”.
2.2. Dupla incidência não prevista expressamente no texto constitucional
A Dupla Incidência ressalvadas as hipóteses previstas no artigo 154, II da Constituição Federal tornou a situação bastante complexa, vez que definiu as competências tributárias entre os entes estatais, mas não incluiu em seu texto nenhuma proibição expressa da bitributação ou qual imposto deve se sobressair no caso de sua ocorrência.
Como ocorre com quase todos os textos legais pátrios, a distribuição das competências apesar de detalhada, deixa lacunas para erros de interpretação e, obviamente, acabam por gerar disputas entre os entes sobre quem deve tributar determinado fato gerador. Invariavelmente, o perdedor nestes embates é o contribuinte. Como exemplo, desse embate complexo podemos citar o ISS e o ICMS.
As hipóteses de incidência de ICMS e ISS se confundem com enorme facilidade, tendo em vista que a Lei Complementar 116/2003 traz um rol enorme de serviços que são fatos geradores de ISS e que ao mesmo tempo são parte da cadeia de produção de determinados produtos já tributados através do ICMS pelos Estados.
Transporte de mercadorias, serviços de comunicação e internet, confecção de embalagens, tingimento de roupas. As hipóteses são muitas e as empresas são, obviamente, pegas no fogo cruzado entre os Estados e os Municípios.
Restam ao contribuinte apenas três opções: resignar-se com a situação e pagar dois tributos diferentes sobre o mesmo fato gerador; questionar a própria Administração Pública sobre quem é o ente competente; ou recorrer ao Poder Judiciário para que este decida, definitivamente, a qual ente deve-se recolher o tributo sobre determinada atividade.
A primeira opção não se apresenta, de forma alguma, como uma alternativa viável para os contribuintes no país, levando-se em conta a já extensa lista de tributos que lhes são cobrados.
Os questionamentos à Administração Pública, seja anterior às cobranças (através de processo administrativo de consulta) ou posterior às cobranças (através de processo administrativo para anulação de autos de infração), os resultados são imensamente desfavoráveis aos contribuintes, por falta de imparcialidade quanto à legitimidade das cobranças e ainda por obrigar o contribuinte a requerer a anulação de cada auto de infração que venha a ser lavrado contra si.
Nos tribunais superiores, há discordância, tendo o Superior Tribunal de Justiça entendido pela incidência do ISS (RESP 88852/ES, RS no AgRg 1362310/RS), entendimento obtido através de interpretação literal, afirmando que a industrialização por encomenda é hipótese de incidência pelo ISS já que consta do rol de fatos geradores da Lei Complementar 116/2003.
O Supremo Tribunal Federal, mais atualmente, vê a questão sob outro prisma: em julgamento de Medida Cautelar na ADI 4389, julgada em abril de 2011, entendeu-se pela incidência do ICMS tendo em vista que referidas industrializações por encomenda integram um processo maior e mais abrangente da produção de determinado produto.
O Ministro Relator Joaquim Barbosa entende:
“O que faz total sentido se pensarmos, por exemplo, na industrialização de um refrigerante que possui condições de conservação específicas, que variam dependendo da composição do refrigerante. Caso a embalagem não seja produzida com aquelas exatas características exigidas para que o refrigerante mantenha sua condição, o produto se perde ou, no mínimo, se altera. Logo, a embalagem não serve única e exclusivamente para diferenciar, através do logo, um refrigerante de outro, mas para manter a natureza do produto, integrando-se a ele.”.
Nesse Sentido, Para Fábio Fannuchi:
“A bitributação é um fenômeno já há muito presente e abominado em nossa legislação, mas com a velocidade em que as atividades e relações consideradas fatos geradores vem sendo alteradas pelas tecnologias, e também pela deficiente redação de nosso atual sistema tributário, vem se tornando cada vez mais presente na vida dos contribuintes.
Entende-se ser um fenômeno já há muito presente e abominado em nossa legislação, mas com a velocidade em que as atividades e relações consideradas fatos geradores vem sendo alteradas pelas tecnologias, e também pela deficiente redação de nosso atual sistema tributário, vem se tornando cada vez mais presente na vida dos contribuintes.”.
2.3. A constitucionalidade da dupla incidência
O fenômeno da Dupla Incidência é um instituto complexo, pelo fato de ter uma lacuna aberta na constituição.
Tendo em vista a incerteza da inconstitucionalidade ou inconstitucionalidade de tais tributos, há uma discussão não pacífica entre os defensores e opositores.
Recentemente, O Plenário do Supremo Tribunal Federal (SFT) ratificou, por maioria de votos, jurisprudência firmada em 1999, no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 212209, no sentido de que é constitucional a inclusão do valor do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual, Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) na sua própria base de cálculo. A decisão foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 582461, interposto pela empresa Jaguary Engenharia, Mineração e Comércio Ltda. contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP), que entendeu que a inclusão do valor do ICMS na própria base de cálculo do tributo – também denominado “cálculo por dentro” – não configura dupla tributação nem afronta o princípio constitucional da não cumulatividade. No caso específico, a empresa contestava a aplicação, pelo governo de São Paulo, do disposto no artigo 33 da Lei paulista nº 6.374/89, segundo o qual o montante do ICMS integra sua própria base de cálculo.
Com entendimento de forma contrária, portanto, inconstitucional, podemos tecer exemplo da inconstitucionalidade do imposto sobre produtos industrializados (IPI), sobre a importação. O Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) foi criado pela Emenda Constitucional n. 18 de 1965, tendo suas hipóteses de incidência discriminadas no art. 46 do Código Tributário Nacional (CTN - Lei 5.172/66), como repetição das hipóteses de incidência do antigo Imposto sobre Consumo, previsto na Lei 4.502/64. Desde que criado, muito já se discutiu sobre a incidência deste imposto na importação de bens (IPI-Importação), sempre se argumentando se esta hipótese de incidência seria ou não constitucional, devido ao bis in idem que seria causado nesta operação pela já incidência do Imposto de Importação (II). Essa argüição, todavia, sempre foi rechaçada pela melhor doutrina, pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o contra-argumento de que a Constituição nunca vedou o bis in idem (a dupla ou múltipla tributação de um mesmo fato gerador pela mesma Pessoa Jurídica de Direito Público), mas apenas a bitributação (cobrança de tributos pertencentes a diferentes pessoas jurídicas, sobre um mesmo fato gerador). Contudo, o IPI-Importação é inconstitucional por dois motivos diversos deste: Primeiro, porque o IPI não se qualifica como 'imposto sobre o comércio exterior', mas como imposto sobre a 'produção', sendo esta a “industrialização de mercadorias”, como autêntico fenômeno (operação) econômico onerado pelo IPI (o elemento material da hipótese de incidência deste imposto). A análise da base econômica (art. 153, inc. IV, §3º, CF) do IPI-Importação leva à conclusão de que é passível de tributação a “operação com produto industrializado”, no sentido de “industrialização do bem e sua saída do estabelecimento comercial”, e não no sentido de “qualquer operação jurídica realizada com um produto industrializado” (interpretação que albergaria a incidência do referido imposto na importação de um bem, porque “operação jurídica de compra e venda de bem”). “Note-se que, normalmente, a importação sequer é contratada diretamente com a indústria estrangeira, mas com distribuidores ou comerciantes estrangeiros. O mesmo se dá no caso de leasing internacional. Ou seja, sequer fora do território nacional se tem a ocorrência de fato gerador próprio do IPI. Tivesse tal operação ocorrido aqui em território brasileiro, não acarretaria a incidência de IPI, mas apenas de ICMS. Assim, ao menos nesta hipótese (de importação realizada não diretamente do industrial estrangeiro, mas do distribuidor ou comerciante importador), a inconstitucionalidade da cobrança do IPI se mostra clara”. O segundo argumento pela inconstitucionalidade do IPI-Importação é que, após longo debate, o STF assentou, através da Súmula 661 e precedentes, que “o fato gerador do ICMS é o desembaraço aduaneiro realizado pela empresa que promoveu a importação dos bens”. Sendo o ICMS um imposto cobrado pelo ente federado (Estado), possuindo como fato gerador o desembaraço aduaneiro, e sendo o IPI-Importação cobrado pelo Ente Federal (União), possuindo idêntico fato gerador (desembaraço aduaneiro), claro está que a incidência dos dois impostos sobre a importação preenche o requisito doutrinário e jurisprudencial da bitributação, devendo somente aquele (ICMS) prevalecer sobre a importação, porque incidência ordenada pela Constituição (art. 155, §2º, IX, a, CF), diferentemente do que ocorre com este, cuja incidência é estabelecida por lei federal (art. 46, inc. I, CTN – Lei.5.172/66).
3. CONCLUSÃO
A conclusão desse artigo no que tange às hipóteses constitucionais de bitributação dispostas no ordenamento jurídico brasileiro, que sempre serão impostas em situações extraordinárias, visando assim que a coletividade não seja onerada sem que ocorra nenhum motivo justo. Destaque para o artigo 154 da constituição, posto que através da disposição do mesmo, pode-se observar que só será admitida a bitributação no direito brasileiro em casos extraordinários, onde inclusive não haverá a necessidade de atender outros princípios norteadores do direito tributário nacional como a anterioridade. Conclui-se, portanto que o legislador constituinte se preocupou muito com as questões de tributação na atual constituição, posto que, já está enraizado em nosso ordenamento, problemas históricos com essa questão, atingindo estes problemas principalmente o polo mais fraco e submisso da relação, o Povo.
No tópico referente as hipóteses de bitributação não previstas constitucionalmente, é um tema complexo, pois é difícil precisar sobre a sua constitucionalidade. Temos como exemplo, o ICMS em compras virtuais que para parte da doutrina sua incidência é inconstitucional, no entanto esse entendimento embora controverso no próprio STF não é o que predomina.
Portanto, em face de tudo o que foi alvo do estudado aqui, chega-se à conclusão de que a bitributação que não autorizada pelo texto constitucional, não se sabe ao certo sobre sua constitucionalidade, eis que não é pacífico o entendimento jurisprudencial e doutrinário acerca das disposições legais que se encontram sob julgamento na Suprema Corte.
O presente artigo reuniu informações sobre a dupla incidência prevista na constituição e algumas hipóteses infraconstitucional, mas sem a pretensão de esgotar todas as discussões acerca do tema e nem tirar conclusões definitivas, pois, os aspectos que circundam esta questão são muitos e que um artigo não pode contemplar em todas as suas especificidades.
No entanto, respondendo ao problema inicial da pesquisa, pode-se destacar que a hipótese que norteou a pesquisa foi uma pesquisa para responder a respeito da constitucionalidade do fenômeno da dupla incidência, no entanto, como já explorado, não se dar uma resposta precisa, tendo em vista a controvérsia que há sobre o tema entre os tribunais superiores e a doutrina, apresentando apenas os argumentos, com a finalidade de interpretação, seja para o lado do fisco ou contribuinte.
Nesse contexto, o Direito Tributário demanda de seus aplicadores a adequada compreensão das normas, que contemple inclusive a esfera axiológica e da hermenêutica jurídica, a certeza das hipóteses legais de bitributação dispostas no ordenamento jurídico brasileiro, que sempre serão impostas em situações extraordinárias, visando assim que a coletividade não seja onerada sem que ocorra nenhum motivo justo e a incerteza das hipóteses infraconstitucionais do instituto.
A literatura jurídica local carece de mais pesquisas, tendo em vista a escassez de material para o objeto da pesquisa. Esse artigo contempla uma pesquisa inicial, portanto, os estudos devem prosseguir para um aprofundamento do tema.
No âmbito acadêmico, o tema demanda debates mais aprofundados por parte dos profissionais de Direito Tributário e legislação de impostos, uma corrente que entende ser patente a inconstitucionalidade da bitributação fora da previsão constitucional, e parte da doutrina e alguns julgados do STF, interpretando como cabível, portanto, constitucional.
Além disso, o tema precisa ainda ser desenvolvido sob uma perspectiva contemporânea e inovadora e que contemple, que leve em consideração a magnitude desse instituto, que vem aos poucos atingindo grandes proporções no contexto do Direito Tributário, bem como para o cotidiano dos contribuintes.
Pesquisas sobre esse assunto, encontram-se em processo de contínuas atualizações, devendo ser mais exploradas, constituindo e em um campo fértil para futuros trabalhos na área de Direito Tributário e legislação de impostos.
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[1] Artigo apresentado ao Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas (CIESA) como requisito parcial para a obtenção do título de Especialista em Direito Tributário e Legislação de Impostos.
Bacharel em Direito e Analista Jurídica na Defensoria Pública do Amazonas.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Taisa Emiliano da. O fenômeno da dupla incidência em consonância com a Constituição Federal de 1988 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 jun 2023, 04:18. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/61593/o-fenmeno-da-dupla-incidncia-em-consonncia-com-a-constituio-federal-de-1988. Acesso em: 22 nov 2024.
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