GUSTAVO ANTONIO NELSON BALDAN[1]
(orientador)
RESUMO: Este artigo explora as graves violações de direitos humanos dentro do sistema carcerário brasileiro, focando nas realidades vividas pelas pessoas encarceradas. Em meio à superlotação, à falta de cuidados médicos adequados, à violência constante e à ausência de programas que possam dar esperança de uma vida melhor, esses indivíduos enfrentam diariamente situações que ferem sua dignidade. Ainda, ao abordar essas questões, o estudo busca dar voz àqueles que muitas vezes são esquecidos pela sociedade, destacando como essas violações impactam não apenas os presos, mas também o tecido social mais amplo, perpetuando a exclusão e o ciclo de violência que afeta a todos. Para investigar essas questões, o estudo se baseia em uma metodologia bibliográfica, analisando uma ampla gama de fontes, como artigos científicos, livros, relatórios de organizações de direitos humanos e documentos institucionais. Essa abordagem permitiu entender profundamente as dificuldades enfrentadas no sistema prisional e as perspectivas de quem estuda o tema, proporcionando uma visão mais humana e crítica sobre a realidade nas prisões brasileiras. Ao final, o artigo busca refletir sobre possíveis caminhos para que essas violações sejam reduzidas, trazendo uma perspectiva de mudança que seja fundamentada, mas também sensível às necessidades humanas de justiça e dignidade.
PALAVRAS-CHAVE: Direito humanos. Violações. Sistema prisional. Dignidade. Violência.
ABSTRACT: This article explores serious human rights violations within the Brazilian prison system, focusing on the realities experienced by incarcerated people. Amid overcrowding, lack of adequate medical care, constant violence and the absence of programs that can give hope for a better life, these individuals face situations every day that harm their dignity. Furthermore, by addressing these issues, the study seeks to give voice to those who are often forgotten by society, highlighting how these violations impact not only prisoners, but also the broader social fabric, perpetuating exclusion and the cycle of violence that affects society. all. To investigate these questions, the study is based on a bibliographic methodology, analyzing a wide range of sources, such as scientific articles, books, reports from human rights organizations and institutional documents. This approach allowed us to deeply understand the difficulties faced in the prison system and the perspectives of those who study the topic, providing a more human and critical view of the reality in Brazilian prisons. In the end, the article seeks to reflect on possible ways for these violations to be reduced, bringing a perspective for change that is grounded, but also sensitive to human needs for justice and dignity.
KEYWORDS: Human rights. Violations. Prison system. Dignity. Violence.
1 INTRODUÇÃO
O sistema carcerário brasileiro é reconhecido como um dos mais problemáticos do mundo, não só pela falta de eficiência em ressocializar os detentos, mas principalmente pelas graves violações de direitos humanos que acontecem lá dentro. As prisões no Brasil são sinônimos de superlotação, condições insalubres, violência por parte das instituições e falta de cuidados básicos. Nesse cenário, a dignidade humana, que deveria ser respeitada, muitas vezes, ou até mesmo na maioria das vezes, é completamente ignorada.
Em vez de ajudar na reabilitação social, as prisões acabam sendo locais de exclusão, piorando ainda mais as condições de vida das pessoas encarceradas e criando ciclos de violência e marginalização. Esses problemas não afetam apenas os presos, mas têm um impacto negativo em toda a sociedade, que vê de volta às ruas indivíduos ainda mais vulneráveis e desumanizados.
Esse cenário é resultado de um problema histórico e cultural maior, onde a resposta ao crime no Brasil tem sido, na maioria das vezes, o encarceramento em massa. No entanto, essa política de repressão tem se mostrado ineficaz, especialmente quando ignoramos as condições precárias nas quais os detentos são mantidos. A falta de investimentos em infraestrutura e a ausência de políticas públicas que ajudem na reintegração social dos presos criaram um ambiente onde as violações de direitos humanos são praticamente parte do sistema.
A violência física e psicológica, a falta de acesso à saúde e educação, e a ausência de programas de trabalho e ressocialização são fatores que apenas reforçam essa lógica de punição que vai muito além da simples privação de liberdade.
Este artigo tem o objetivo de investigar essas violações de direitos humanos no sistema carcerário brasileiro, analisando suas causas, consequências e possíveis soluções para uma reforma urgente. Com base em uma metodologia bibliográfica, o estudo busca entender melhor o que tem sido discutido na academia, nos relatórios de organizações de direitos humanos e em documentos oficiais sobre o tema. Além de identificar os problemas, o artigo pretende refletir sobre as possíveis soluções que poderiam reduzir essas violações e promover um sistema de justiça que respeite a dignidade humana.
Ao final, esperamos contribuir para o debate sobre a necessidade urgente de transformar o sistema carcerário brasileiro, indo além de uma lógica apenas punitiva e buscando uma ressocialização verdadeira, de acordo com os princípios de direitos humanos reconhecidos internacionalmente.
2 CONCEITO DE DIGNIDADE DE PESSOA HUMANA
A dignidade da pessoa humana é um princípio básico e importante no direito, tanto no Brasil quanto em outras partes do mundo. Esse conceito esclarece que todos os seres humanos possuem um valor que não pode ser ignorado, independentemente de quem são, do que possuem ou de onde vieram.
Isso significa que todos os seres humanos merecem ser respeitados e protegidos, sem exceções. Além disso, todos têm direitos que não podem ser retirados e que devem ser garantidos pelo Estado e pela sociedade. Em resumo, a dignidade da pessoa humana nos lembra que cada pessoa tem valor e merece ser tratada com respeito, não importa a sua situação.
Rabenhorst (2001, p. 14) esclarece o que significa o princípio da dignidade da pessoa humana:
[...] o termo 'dignidade' vem do latim dignitas, que designa tudo aquilo que merece respeito, consideração, mérito ou estima. A dignidade da pessoa humana é, acima de tudo, uma categoria moral; significa a qualidade ou valor particular que atribuímos aos seres humanos em função da posição que ocupam na escala dos seres. [...] A dignidade é atributo do que é insubstituível e incompatível, daquilo que, por possuir um valor absoluto, não tem preço.
Por esse princípio fundamental, a pessoa deve ser vista não como uma ferramenta para conseguir alguma coisa, mas como um fim em si mesma – ou seja, ela tem um valor absoluto, que não depende de nada. Esse valor é algo que faz parte de cada ser humano e não pode ser medido em dinheiro ou trocado por outra coisa. Além disso, como os seres humanos são racionais, não precisam seguir nenhuma regra que não tenha sido criada por eles próprios.
Para Ingo Sarlet (2012, p. 73):
[...] temos por dignidade da pessoa humana a qualidade própria e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da sociedade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos (o homem tem direito a ter direitos) e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de modo degradante e desumano, como venham a lhe garantir uma existência digna – de humanidade – das mínimas condições existenciais para uma vida saudável (saúde, previdência, assistência, moradia, educação, etc.), além de lhe propiciar e promover a sua participação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos (sócios sociais), mediante o devido respeito aos demais seres que integram a rede da vida.
Nesse sentido, o doutrinador Ingo Sarlet destaca que, dentro da Constituição, a dignidade da pessoa humana é a base do Estado Democrático de Direito, conforme o artigo 1º, inciso III, da Constituição de 1988. Esse princípio aparece em outros pontos da Constituição, como quando diz que a ordem econômica tem o objetivo de garantir a todos uma vida digna (art. 170, caput) e, na área social, quando fala sobre planejamento familiar, ligando-o à dignidade da pessoa humana e à paternidade responsável (art. 226, § 7º). Além disso, o direito à dignidade também é assegurado às crianças e adolescentes no artigo 227.
É importante destacar que a ideia de dignidade ganhou muita importância após a Segunda Guerra Mundial, especialmente depois dos horrores do Holocausto e da realização da Convenção de Genebra. Foi nesse período que a dignidade passou a ser reconhecida de forma expressa nas Constituições, como no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal. Além disso, a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 foi um marco crucial para essa mudança.
A Declaração dos Direitos Humanos é considerada uma das maiores conquistas da modernidade. Ela estabeleceu a liberdade, a igualdade, a fraternidade e a dignidade como princípios fundamentais para a vida em sociedade. Esses valores são vistos como essenciais para uma existência plena e testemunham a importância dos seres humanos como indivíduos sociais e políticos.
Nesse contexto, destaca-se a afirmação de Comparato (2015, p. 75):
Os direitos humanos não existem, no plano internacional, apenas e tão somente quando os Estados resolvem reconhecê-los por meio de tratados ou convenções. Pela sua própria natureza, nunca é demais repetir, trata-se de direitos inerentes à própria condição humana, e que, por isso mesmo, não dependem do assentimento estatal para ser exigidos. “Todos os homens”, proclama o art. I da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, “nascem livres e iguais em dignidade e direitos”. Não são os Estados que lhes conferem esses atributos.
Assim, a dignidade da pessoa humana, por ser um dos princípios fundamentais, é um princípio absoluto. Isso significa que, em qualquer situação, ela sempre deve prevalecer sobre outros princípios. A dignidade é a base da ordem jurídica e o ser humano é a fonte dos direitos humanos, porque a dignidade é a essência de todos esses direitos.
Por isso, todas as pessoas têm o direito a condições mínimas de vida, como saúde, previdência, assistência social, lazer, educação e moradia – em outras palavras, a um mínimo existencial.
Como está estabelecido no artigo 1º da Declaração Universal dos Direitos Humanos: “Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade.” A partir dessa declaração, é possível entender que o ser humano é, por sua natureza, um ser racional e existe como um fim em si mesmo, não apenas como um meio para os outros.
Essencialmente, o ser humano é uma pessoa – alguém que possui razão e consciência. Isso significa que cada pessoa deve ser vista como em si mesma e não apenas como um recurso que pode ser usado de acordo com a vontade de outros. A dignidade é o núcleo da condição humana, e por isso, deve ocupar um lugar central e destacado. Ela é a base dos direitos humanos e o fundamento que dá valor e significado a todos os direitos e liberdades.
Ainda neste sentido, o doutrinador Fábio Comparato (2012, p. 34):
A dignidade da pessoa não consiste apenas no fato de ser ela, diferente das coisas, um ser considerado e tratado, em si mesmo, com um fim em si e nunca como um meio para a consecução de determinado resultado. Ela resulta também do fato de que, pela sua vontade racional, se a pessoa vive em condições de autonomia, isto é, como ser capaz de guiar-se pelas leis que ele próprio edita. Pela sua vontade racional, a pessoa, ao mesmo tempo que se submete às leis da razão prática, é a fonte dessas mesmas leis, de âmbito universal, sendo o imperativo categórico – age unicamente segundo a máxima, pela qual tu possas querer, ao mesmo tempo, que ela se transforme em lei geral.
Portanto, a pessoa humana, como ser, é capaz de criar seu próprio mundo e valores, e a dignidade e a liberdade são direitos que devem ser garantidos a todos, sem exceção. Isso inclui as pessoas detentas em um presídio, que, apesar de sua situação, continuam a ter direito à dignidade.
Mesmo em um ambiente de privação de liberdade, a dignidade é um atributo inerente a cada ser humano e não deve ser negada. As condições de encarceramento não podem justificar a violação desses direitos fundamentais. Assim, reconhecer e respeitar a dignidade dos detentos é essencial para garantir que, mesmo em sua situação, eles sejam tratados com humanidade e respeito, refletindo a natureza intrínseca da dignidade humana.
3 CONDIÇÕES CARCERÁRIAS NO BRASIL
As condições nas prisões no Brasil são frequentemente vistas como muito ruins e preocupantes. A situação atual mostra vários problemas sérios que afetam a dignidade dos detentos e também a eficiência do sistema de justiça.
Uma destas condições degradantes que causam grande impacto, é a superlotação de pessoas em apenas uma cela, resultando em detentos dormindo em chão, usarem o mesmo banheiro, entre outros.
Referente à superlotação prisional expõe o autor e doutrinador Camargo que (2006, p. 574):
As prisões encontram-se abarrotadas, não fornecendo ao preso a sua devida dignidade. Devido à superlotação muitos dormem no chão de suas celas, às vezes no banheiro, próximo a buraco de esgoto. Nos estabelecimentos mais lotados, onde não existe nem lugar no chão, presos dormem amarrados às grades das celas ou pendurados em rede.
A revolta dos detentos geralmente acontece devido à superlotação, que leva às condições desumanas que eles enfrentam no sistema prisional. Essas rebeliões são uma forma que os presos encontraram para chamar a atenção do Estado para a questão da dignidade, que todos têm direito segundo a lei, e para exigir melhores condições dentro das prisões.
No entanto, a superlotação das prisões no Brasil vai contra o que está previsto no artigo 85 da Lei de Execução Penal, que diz: "O estabelecimento penal deverá ter lotação compatível com a sua estrutura e finalidade." Isso significa que as prisões deveriam estar dentro dos limites para os quais foram projetadas, mas a realidade atual mostra uma grande discrepância com essa norma, refletindo a situação precária do sistema carcerário.
A diferença entre o que a lei diz e o que realmente acontece nas prisões é enorme. A lei promete garantir a dignidade da pessoa humana, mas a realidade nas prisões é bem diferente. Enquanto a legislação estabelece direitos e condições para assegurar um tratamento digno, na prática, os detentos muitas vezes vivem em condições muito precárias e desumanas. Isso mostra o grande descompasso entre o que a lei prevê e o que os presos realmente enfrentam no dia a dia. Entende Assis (2007) que:
Dentro da prisão, dentre várias outras garantias que são desrespeitadas, o preso sofre principalmente com a prática de torturas e de agressões físicas. Essas agressões geralmente partem tanto dos outros presos como dos próprios agentes da administração prisional. O despreparo e a desqualificação desses agentes fazem com que eles consigam conter os motins e rebeliões carcerárias somente por meio da violência, cometendo vários abusos e impondo aos presos uma espécie de disciplina carcerária que não está prevista em lei, sendo que na maioria das vezes esses agentes acabam não sendo responsabilizados por seus atos e permanecem impunes.
Devido à superlotação nas prisões brasileiras, fica difícil separar os presos de alta periculosidade daqueles que cometeram crimes mais leves, fazendo com que eles acabem convivendo juntos. No entanto, essa situação vai contra o que diz o artigo 84 da Lei de Execução Penal, que estabelece que “o preso provisório ficará separado do condenado por sentença transitada em julgado. § 1º: O preso primário cumprirá pena em seção distinta daquela reservada para os reincidentes.” Isso mostra uma grande discrepância entre o que a lei prevê e a realidade dentro do sistema carcerário.
Ademais, de acordo com a Lei de Execução Penal, nos artigos 12 e 14, os presos devem receber assistência material, incluindo cuidados com a higiene, boas instalações sanitárias e acesso a atendimento médico, farmacêutico e odontológico. No entanto, a realidade é bem diferente. Muitos presos enfrentam condições de higiene muito ruins, e em vários estabelecimentos, as condições sanitárias são precárias e deficientes. Além disso, o acompanhamento médico muitas vezes é inexistente, o que agrava ainda mais a situação dos detentos.
Como resultado, surgem graves problemas, entre eles a proliferação de doenças, que é agravada pela falta de higienização e pela ausência de assistência médica. Muitas vezes, os presídios não têm sequer um ambulatório para atender os detentos. Em situações de emergência, os presos acabam sendo atendidos pelo SUS (Sistema Único de Saúde), o que evidencia a deficiência no atendimento médico dentro dos estabelecimentos prisionais.
Neste sentido, Teixeira (2008, p. 216) destaca:
Fundada na ideia de individualização da pena, as Regras Mínimas para Tratamento do Preso apontaram para a exigência de um estudo da personalidade e um programa para tratamento individual do encarcerado, referenciando ainda sobre a vedação a qualquer espécie de discriminação (cor, raça, língua, religião etc.) como critério de separação de presos no interior das prisões, além de orientar sobre higiene e serviços médicos no cárcere, espaço físico e forma de punição, vedação à punição desumana, cruel ou degradante, bem como o bis in idem, ou seja, a dupla punição pelo mesmo fato criminoso.
Portanto, além da desestruturação e da má higienização no sistema prisional, também existem problemas de preconceito e discriminação, seja por cor, raça ou religião, tratando os indivíduos de forma desigual.
A Constituição afirma que a dignidade da pessoa humana é um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito Brasileiro, e o Estado deve garantir esse princípio a todos os cidadãos. Assim, violar o princípio da dignidade da pessoa humana é uma violação inconstitucional, pois vai contra a base do sistema jurídico e os direitos garantidos a todos.
Miguel (2013) faz a seguinte observação:
Se fosse seguido o que a lei propõe, a lei penal teria duas funções: reparar o ato cometido pelo criminoso, e impedir que mesmas ações sejam repetidas. Contudo, a realidade é que o próprio sistema prisional é responsável pelo retorno dos ex-presidiários ao crime, já que os seus direitos são negados e o tratamento dado é diferente dos padrões legais e constitucionais – causando o sentimento de revolta robustecido pela falta de assistência e a falta de preparação para retornar ao convívio social. Isso leva ao fenômeno da reincidência criminal.
Ainda, a infraestrutura das prisões no Brasil é frequentemente inadequada e mal conservada. Muitos presídios enfrentam problemas sérios, como falta de ventilação, iluminação ruim, instalações sanitárias inadequadas e dificuldades com o fornecimento de água potável. Essas condições precárias contribuem para a propagação de doenças e pioram a saúde dos detentos.
A falta de manutenção e os investimentos insuficientes em infraestrutura agravam ainda mais a situação. Sem melhorias nas condições sanitárias e de saúde, a situação nas prisões continua a se deteriorar, afetando não só a saúde dos detentos, mas também a segurança e a ordem dentro das unidades prisionais.
Paci (2015) afirma que essas condições precárias são uma das razões para o alto número de rebeliões e fugas nas prisões. Quando os internos se encontram em situações tão desumanas e sem muitas opções para melhorar suas vidas, eles acabam recorrendo a esses meios extremos como forma de protesto e busca por mudança.
Como Paci (2015) afirma:
Em relação à arquitetura prisional, já se comprovou que o tamanho e forma de um presídio pode ter um impacto significativo no seu funcionamento. Presídios mal arquitetados contribuem para construções escuras e sombrias, com pouca ventilação, na qual faltam colchões, roupas de cama, vestimentas e produtos de higiene pessoal. O sistema hidráulico e elétrico está totalmente danificado. Em muitas celas coberturas de plásticos improvisadas pelos próprios presos não conseguem conter as goteiras, os canos nas paredes cobertos de musgo ficam expostos a longo de tetos e paredes. Nas galerias, tem-se o odor forte de esgoto e os vasos sanitários não possuem descargas. E mais, nota-se a falta de janelas a qual impede a ventilação. Portanto, a superlotação aliada à péssima infraestrutura prisional torna a questão mais preocupante e problemática.
É essencial que o sistema carcerário passe por reformas urgentes. Melhorar a infraestrutura, garantir acesso a serviços médicos adequados e manter as instalações são passos fundamentais para assegurar que as condições de vida dos presos estejam em conformidade com os padrões de dignidade e respeito aos direitos humanos.
Além das condições insalubres e da superlotação, o sistema carcerário brasileiro enfrenta várias outras violações graves dos direitos humanos, que afetam profundamente a dignidade dos detentos. Entre esses problemas estão a violência institucional, a falta de acesso a direitos básicos e o tratamento desigual.
A violência institucional é um problema sério nas prisões brasileiras. Há muitos relatos de abusos físicos e psicológicos por parte dos agentes penitenciários e outros funcionários. Os detentos frequentemente sofrem agressões, humilhações e até mesmo tortura, e muitas vezes não há mecanismos adequados para denunciar ou punir esses abusos. A falta de fiscalização e de medidas eficazes para lidar com a violência institucional permite que essas práticas continuem.
Além disso, a desigualdade e a discriminação são grandes problemas no sistema prisional. Os detentos podem ser tratados de forma desigual por causa de características como cor, raça, religião ou status socioeconômico. Isso se reflete em diferenças no acesso a recursos e serviços, e até mesmo nas condições de vida dentro das prisões. Essa discriminação dentro do sistema penal agrava as desigualdades sociais e exclui ainda mais os grupos mais vulneráveis.
As condições de trabalho para os detentos também são frequentemente exploratórias e injustas. Muitos presos são forçados a trabalhar em condições precárias, com remuneração muito baixa ou até sem pagamento. Isso cria uma sensação de exploração e injustiça, e as condições inadequadas de trabalho, além da falta de direitos trabalhistas básicos, só pioram a situação dos detentos e reforçam as desigualdades.
4 IMPACTO DAS CONDIÇÕES CARCERÁRIAS NAS FAMILÍAS DOS DETENTOS
O tratamento cruel que os presos recebem muitas vezes não afeta apenas os detentos, mas também seus familiares, como destacam Tannuss, Junior & Oliveira (2018, p. 208):
O tratamento dispensado aos familiares de presos é cruel, desapiedado e escancara as engrenagens de desumanização e coisificação características de uma sociedade violenta. Tamanho aviltamento institucional coloca em xeque a retórica que retórica que floreia o “Estado Democrático de Direito” e suas premissas de respeito às leis e subordinação à soberania popular. O princípio constitucional em tela, tantas vezes pronunciado por gestores públicos, mostra-se a cada dia mais distante da realidade da grande maioria do povo brasileiro, em especial das famílias do cárcere. Dentre as principais violências registradas contra familiares de presos estão os obstáculos para acesso à justiça, a revista íntima vexatória e as humilhações ligadas à visita íntima. Nestes processos, a violência de Estado produz marcas indeléveis nos corpos e subjetividades das mulheres que mantêm vínculos com os apenados privados de liberdade.
Durante as visitas ao sistema prisional, os familiares dos presos enfrentam uma série de dificuldades, como medos, humilhações, preconceitos e estereótipos. Além disso, eles sofrem com privações de direitos e outras adversidades.
Entre os visitantes, as mulheres, que são na maioria mães, irmãs ou companheiras, formam o grupo predominante e enfrentam essas dificuldades regularmente ao visitar os presídios.
As mulheres que têm vínculos com pessoas encarceradas enfrentam estigmas significativos, sendo frequentemente rotuladas como “mulher de preso” ou “mulher de bandido”. Esse estigma pode levar a que elas escondam sua identidade para evitar discriminação, serem vistas de forma negativa ou até mesmo perderem seus empregos. Essas mulheres muitas vezes carregam o peso do preconceito e da discriminação, enfrentando uma série de desafios adicionais devido à situação de seus familiares.
As visitas aos presos são uma importante oportunidade para manter os vínculos familiares. Conforme explica Santana (2021), essas visitas desempenham um papel crucial na preservação das relações entre os detentos e seus entes queridos, ajudando a fortalecer laços e fornece suporte emocional. Apesar das dificuldades enfrentadas pelos visitantes, essas interações são essenciais para o bem-estar dos presos e para sua reintegração futura.
Neste sentido, Santana (2021, p. 54) colaciona:
Muitos momentos do cotidiano são perdidos enquanto o indivíduo vive no estabelecimento carcerário. Os filhos, são os que mais sofrem e sentem a ausência do pai ou da mãe em sua vida, principalmente se ainda forem crianças ou adolescentes, faixa etária na qual ocorre a formação psicológica. O afastamento repentino do pai ou da mãe do seio familiar, reflete na perda do desenvolvimento dos filhos e da possibilidade de crescimento pessoal que é advinda desse acompanhamento.
Além disso, as visitas servem como uma forma de apoio que pode influenciar positivamente o comportamento dos presos. Quando os detentos sabem que têm visitas agendadas, muitas vezes se sentem mais motivados a se comportar bem e a participar de programas de reabilitação, na esperança de melhorar sua situação e facilitar a reintegração social no futuro. Esse apoio contínuo é fundamental para reduzir o estresse e a sensação de isolamento que muitos presos experimentam.
Por outro lado, os familiares dos presos enfrentam muitos desafios durante essas visitas. Eles frequentemente lidam com situações constrangedoras e com a sensação de estar sob constante julgamento por parte da sociedade. Isso pode incluir desde longas esperas até procedimentos de segurança invasivos e a necessidade de enfrentar o estigma associado ao fato de visitar um presídio.
Essas experiências podem ser emocionalmente desgastantes e impactar a saúde mental dos familiares, especialmente das mulheres, que são frequentemente as principais responsáveis pelas visitas.
Além dos desafios enfrentados durante as visitas, é importante reconhecer o papel que as famílias desempenham na reintegração dos presos após a liberação. A presença constante e o apoio das famílias podem ajudar a facilitar a adaptação dos detentos à vida fora do cárcere, contribuindo para uma reintegração mais bem-sucedida.
No entanto, a falta de apoio e a discriminação enfrentada pelos familiares podem tornar essa tarefa ainda mais difícil, o que reforça a necessidade de políticas que melhorem as condições das visitas e o suporte oferecido a esses familiares.
5 CONCLUSÃO
Em conclusão, as condições precárias no sistema carcerário brasileiro revelam uma séria violação dos direitos humanos e um grande desafio para a justiça social. A superlotação, a infraestrutura inadequada, a falta de atendimento médico e as condições de trabalho exploratórias são problemas que afetam a dignidade dos detentos e comprometem a eficácia do sistema prisional. Essas condições prejudicam não só os presos, mas também têm um impacto negativo na sociedade como um todo, perpetuando ciclos de marginalização e violência.
Para resolver esses problemas, é essencial adotar uma abordagem integrada que envolva reformas estruturais e investimentos significativos. Reduzir a superlotação pode ser feito promovendo alternativas ao encarceramento e construindo novas unidades prisionais. Melhorar a infraestrutura das prisões é fundamental, com investimentos em ventilação, iluminação e instalações sanitárias. Além disso, é crucial expandir o atendimento médico dentro das prisões para garantir cuidados adequados e prevenir a disseminação de doenças.
Também é importante regulamentar as condições de trabalho dos detentos e criar políticas públicas voltadas para a reintegração social. Reformas legislativas e mecanismos de monitoramento e fiscalização são necessários para garantir que os direitos dos detentos sejam respeitados e que o sistema carcerário funcione de maneira justa e eficiente.
Transformar o sistema prisional brasileiro é essencial para garantir que todos os cidadãos, independentemente de sua situação, sejam tratados com dignidade e respeito. Com um esforço sério e coordenado entre o governo, para a construção de mais unidades prisionais, o sistema de justiça e a sociedade civil, é possível criar um ambiente prisional que não apenas mantenha a ordem e a segurança, mas também promova a reabilitação e a reintegração dos detentos, alinhando-se aos princípios de justiça e direitos humanos.
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[1] Professor orientador. Mestre em Direito pela Universidade de Camilo Castelo Branco. Especialista em Direito Penal e Processo Penal com Capacitação para o Ensino no Magistério Superior pela Faculdade de Direito Professor Damásio de Jesus. Membro da Comissão de Dados - Estudos Jurídicos da 63ª Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional de São Paulo. Professor universitário. E-mail: [email protected]
Graduando em Direito pelo Centro Universitário de Jales – UNIJALES
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FARIAS, FELIPE GARDIN RECHE DE. Violação de direitos humanos no sistema carcerário brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 out 2024, 04:28. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/66687/violao-de-direitos-humanos-no-sistema-carcerrio-brasileiro. Acesso em: 06 dez 2024.
Por: Helena Vaz de Figueiredo
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