Direito civil. Modificação de plano de saúde coletivo empresarial com o fim de evitar a inexequibilidade do modelo antigo (EXCEÇÃO DE RUÍNA).
Os empregados demitidos sem justa causa e os aposentados que contribuíram para plano de saúde coletivo empresarial que tenha sido extinto não têm direito de serem mantidos nesse plano se o estipulante (ex-empregador) e a operadora redesenharam o sistema estabelecendo um novo plano de saúde coletivo a fim de evitar o seu colapso (exceção da ruína) ante prejuízos crescentes, desde que tenham sido asseguradas aos inativos as mesmas condições de cobertura assistencial proporcionadas aos empregados ativos. Inicialmente, cabe asseverar que um plano de saúde pode ser: (a) individual ou familiar: em que a pessoa física contrata diretamente com a operadora ou por intermédio de um corretor autorizado; ou (b) coletivo: contratado por uma sociedade empresária, conselho, sindicato ou associação junto à operadora de planos de saúde para oferecer assistência médica e/ou odontológica às pessoas vinculadas às mencionadas entidades, bem como a seus dependentes. Um plano de saúde coletivo, por sua vez, pode ser: (b.1) por adesão: contratado por pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial, como conselhos, sindicatos e associações profissionais; ou (b.2) empresarial: contratado por sociedade empresária, para garantir assistência à saúde dos seus funcionários e de seus respectivos dependentes em razão do vínculo empregatício ou estatutário. No que diz respeito a plano de saúde coletivo empresarial (b.2) - ou seja, à hipótese em análise -, realmente, é garantido ao inativo (o empregado demitido sem justa causa ou o aposentado) que contribuiu para o plano de saúde em decorrência do vínculo empregatício o direito de manutenção da sua condição de beneficiário "nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral" (arts. 30 e 31 da Lei 9.656/1998). Nesse contexto, de acordo com o art. 2º, II, da RN 279/2011 da ANS, deve-se entender por "mesmas condições de cobertura assistencial" a "mesma segmentação e cobertura, rede assistencial, padrão de acomodação em internação, área geográfica de abrangência e fator moderador, se houver, do plano privado de assistência à saúde contratado para os empregados ativos", de modo a inexistir, na hipótese em análise, direito adquirido a modelo de plano de saúde ou de custeio. Nesse sentido, aliás, a Quarta Turma do STJ (REsp 531.370-SP, DJe 6/9/2012) decidiu que, embora seja garantida aos empregados demitidos sem justa causa e aos aposentados "a manutenção no plano de saúde coletivo nas mesmas condições de assistência médica e de valores de contribuição, desde que assuma o pagamento integral desta", os valores de contribuição poderão "variar conforme as alterações promovidas no plano paradigma, sempre em paridade com os que a ex-empregadora tiver que custear". De fato, pela exceção da ruína - instituto que, conforme definição doutrinária, representa a circunstância liberatória decorrente da "situação de ruína em que o devedor poderia incorrer, caso a execução do contrato, atingida por alterações fácticas, não fosse sustida" -, o vínculo contratual original pode sofrer ação liberatória e adaptadora às novas circunstâncias da realidade, com a finalidade de manter a relação jurídica sem a quebra do sistema, sendo imprescindível a cooperação mútua para modificar o contrato do modo menos danoso às partes. É por isso que, nos contratos cativos de longa duração, também chamados de relacionais, baseados na confiança, o rigorismo e a perenidade do vínculo existente entre as partes podem sofrer, excepcionalmente, algumas flexibilizações, a fim de evitar a ruína do sistema e da empresa, devendo ser respeitados, em qualquer caso, a boa-fé, que é bilateral, e os deveres de lealdade, de solidariedade (interna e externa) e de cooperação recíprocos. Além do mais, ressalte-se que a onerosidade excessiva é vedada tanto para o consumidor quanto para o fornecedor, nos termos do art. 51, § 2º, da Lei 8.078/1990. Cumpre destacar, também, que a função social e a solidariedade nos planos de saúde coletivos assumem grande relevo, tendo em vista o mutualismo existente, caracterizador de um pacto tácito entre as diversas gerações de empregados passados, atuais e futuros (solidariedade intergeracional), trazendo o dever de todos para a viabilização do próprio contrato de assistência médica. Desse modo, na hipótese em apreço, não há como preservar indefinidamente a sistemática contratual original se verificada a exceção de ruína. REsp 1.479.420-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 1º/9/2015, DJe 11/9/2015.
Decisão publicada no Informativo 569 do STJ - 2015
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