VANESSA BATISTA OLIVEIRA
(orientadora)
RESUMO: O presente estudo tem por escopo trazer uma breve narrativa da evolução histórica do desenvolvimento do trabalho, desde a Era Pré-Histórica até os dias atuais. Com base no método bibliográfico e documental, compila, de forma sucinta, as principais características do trabalho nas Revoluções Industriais e as implicações de ordem econômica e trabalhista dos sistemas e meios de produção, bem como seus impactos na vida dos trabalhadores e de toda a sociedade em cada período. Aborda, por fim, o mundo do trabalho no momento presente, o qual se consubstancia na Revolução 4.0 e, ainda, no que está por vir para a humanidade, a partir da Revolução 5.0, concluindo pela essencialidade do trabalho e do capital em toda a história do ser humano e a necessidade de compreender esses institutos, não como fontes de tensão, mas como elementos integrados.
Palavras-Chave: Trabalho; Revolução Industrial; Tecnologia; Digital.
ABSTRACT: This study highlights the historical evolution of labor development, from the Prehistoric Era to the modern-day. Based on the bibliographical and documental method, it succinctly compiles the main characteristics of labor in the Industrial Revolutions and the economic and labor implications of the systems and means of production, as well as their impact on the lives of workers and society in each period. Finally, it addresses the world of labor at the present-day, which is embodied in Revolution 4.0 and on what is coming for humanity, as of Revolution 5.0. In conclusion, labor and capital are seen as essential throughout the history of the human being, and it is necessary to understand these institutes, not as sources of tension, but as integrated elements.
Keywords: Labor; Revolution; Industrial; Technology; Digital.
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1 O TRABALHO DA PRÉ-HISTÓRIA A SEGUNDA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL.2 O TRABALHO NA TERCEIRA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL (REVOLUÇÃO DIGITAL). 3 O TRABALHO NO TEMPO ATUAL: REVOLUÇÃO. 4 PARA O FUTURO: SOCIEDADE. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.
INTRODUÇÃO
Uma pergunta que percorre a mente da humanidade é a seguinte: se Deus é o criador de tudo, o que Ele criou primeiro? Segundo Gênesis,1:1: “no princípio, Deus criou os céus e a terra”. Aprofundando a interpretação desta célebre afirmação, contida em um dos livros mais populares do mundo, Deus teria criado primeiro o tempo, pois, sem este, não haveria como saber o que veio primeiro ou depois, ou seja, não se saberia a ordem dos acontecimentos.
Toma-se por início esta passagem bíblica, sem qualquer pretensão de crença ou cunho religioso, mas tão somente para chamar atenção para um outro questionamento extremamente relevante. E o trabalho? Desde quando surgiu o trabalho? Qual a ordem dos acontecimentos relativos ao trabalho e qual sua importância na vida do ser humano?
Esta também é uma das indagações que nos permeia, visto que o trabalho acompanha a existência humana, conceituando-se e ressignificando-se ao longo dos tempos, seja como recurso de sobrevivência, seja como uma espécie de amarra ou como instrumento de satisfação.
1 O MUNDO DO TRABALHO: DA PRÉ-HISTÓRIA À SEGUNDA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL
De fato, o trabalho é um elemento intrínseco da trajetória do ser humano. Na Pré-História, quando o homem nômade começou a produzir e usar as primeiras ferramentas feitas de ossos, pedras e marfim, com o fim de caçar, confeccionar suas vestimentas e preparar seus alimentos, para, assim, sobreviver, aprimorando-as após a descoberta do fogo. Mais tarde, passando a desenvolver a agricultura, considerada como trabalho primitivo, o que foi possibilitando a sua sedentarização.
Note-se que, mesmo na era primitiva, quando o homem passou a desenvolver técnicas para facilitar suas atividades e melhor prover sua subsistência, na verdade, estava construindo o mundo ao seu redor, por meio dos objetos, modos de atuação e costumes. Ressalte-se a diferença do ser humano para os outros animais: enquanto os animais irracionais produzem apenas por instinto, o homem produz com intenção e significado específicos, organizando racionalmente o trabalho.
Nas palavras de Alice Monteiro de Barros (2016, p. 45 e 46):
O trabalho é uma atividade humana que pressupõe esforço físico e mental. Do ponto de vista filosófico, vem sendo conceituado como “uma atividade consciente e voluntária do homem, dependente de um esforço” ou como “a obra moral de um homem moral”; já sob o prisma econômico, o trabalho é considerado como “toda energia humana empregada, tendo em vista um escopo produtivo. Finalmente, sob o aspecto jurídico, ele é encarado como “objeto de uma prestação devida ou realizada por um sujeito em favor do outro” e, mais precisamente do ponto de vista jurídico trabalhista, o trabalho é uma prestação de serviço não eventual, subordinada e onerosa, devida pelo empregado em favor do empregador (grifos do autor).
Na Idade Antiga, o trabalho passou do caráter de sobrevivência rudimentar e unipessoal para assumir um cunho predominantemente escravagista. Em civilizações como Egito, Grécia e Roma, prisioneiros de guerra eram escravizados e submetidos à condição de trabalho compulsório, intenso e não remunerado, sem qualquer liberdade.
Na Idade Média, com o surgimento do feudalismo na Europa Ocidental, predominou a servidão. As terras eram divididas em feudos e a sociedade era composta de três camadas sociais rígidas ou estamentos: clero, nobreza e campesinato. Os donos de terras eram chamados de senhores feudais e faziam parte da nobreza, os camponeses, por outro lado, eram seus servos e exerciam um trabalho compulsório, em troca de permanecerem nas terras do seu senhor para cultivá-las, a fim de sobreviverem, sem qualquer chance de mobilidade e ascensão social por toda a vida, ou seja, quem nascia servo, morria servo.
Tanto nas sociedades escravagistas gregas e romanas da Idade Antiga, como na aristocracia feudal da Idade Média, o ócio — entendido não propriamente como o ato de não fazer nada, mas como o tempo livre na antiguidade, para não trabalhar e poder dedicar-se ao conhecimento e à contemplação ou o ócio cavalheiresco medieval, para diversão e exibicionismo — era considerado um verdadeiro status social das classes nobres e dominadoras (MARTINS, p. 35-37). Já o trabalho era tido como desonroso e, portanto, ficava destinado aos escravos e servos.
Como bem esclarece Marilena Chaui (1999, p. 11), “em grego, ócio se diz scholé, de onde vem nossa palavra 'escola'. Para os antigos, só era possível dedicar-se à atividade do conhecimento se não se estivesse escravizado pela obrigação de trabalhar.”.
Não é à toa que, diante desses modos históricos de relacionar o labor a esforço, castigo, penitência ou sacrifício, o termo “trabalho” se origina do latim tripalium, que consistia em um instrumento romano de tortura, feito de três paus, derivado de palus, tais como estacas, utilizadas para empalar, supliciando escravos e presos (TRABALHO, [20??]).
Corroborando essa noção, o referencial religioso, de tradição bíblica, relatado em Gênesis, 3:19, colocava o trabalho nessa posição de castigo, ao tratar da expulsão de Adão do paraíso e sua condenação ao trabalho para ganhar o pão de cada dia: “tu comerás o teu pão, com o suor do teu rosto, até que voltes à terra, visto que dela foste tirado; porque és pó e ao pó voltarás” (BÍBLIA, 2015, p. 27).
Com o movimento Renascentista, no Século XVI, de revalorização da racionalidade, da ciência e da natureza, destacados na antiguidade clássica, inaugurou-se a Idade Moderna e, assim, a vida medieval, que agonizava a sociedade, começou a entrar em franca decadência. Houve, então, a transição do feudalismo para o capitalismo, o homem como o centro da Criação e o consequente abrandamento do misticismo e do dogmatismo religioso.
A partir daí, a concepção do trabalho ganhou uma importante ressignificação; saiu da esfera de castigo divino para plena virtude, passando a ser exaltado e valorizado, como fonte de dignidade do ser humano (SOUSA, 2019).
Na esteira desta remodelação de pensamento, reformulou-se o conceito do ócio. Antes tido como virtude, tornou-se mal visto, entendido como vício, motivo de vergonha e desperdício de tempo, caso não fosse decorrente de recompensa pelo tempo de trabalho. Em contrapartida, o trabalho passou a ser sinônimo de meio de esforço digno e necessário para a realização pessoal, para o acúmulo de bens e para a melhoria da qualidade de vida, não só progresso individual, como geral, em colaboração com a coletividade (ABREU; ALMEIDA, 2016).
Todo esse cenário de exaltação do trabalho, somado ao processo de transição da produção manufatureira e artesanal, para a fabricação com o uso de máquinas e ferramentas a vapor, deu ensejo à ascensão do capitalismo e à Primeira Revolução Industrial (1760-1860)[1], que se originou na Inglaterra. Consistiu na primeira fase do processo de transformação das indústrias e impulsionou um forte crescimento econômico-capitalista.
Esse crescimento foi considerado o mais importante na história da humanidade, desde a domesticação de animais e a agricultura, notadamente por ter mudado o modo de produção das mercadorias, com o domínio do homem sobre novas formas de energia aplicadas à produção. Isso gerou um novo modo de organização da força de trabalho e da relação entre o capital e o trabalho, bem como um crescente progresso tecnológico e um inicial aumento no padrão econômico de vida das pessoas comuns, não antes experimentado.
Assim, com o avanço tecnológico intenso e o desenvolvimento de barcos a vapor, navios, ferrovias e fabricações em larga escala de mais indústrias de energia movidas a vapor, que se expandiu para outros países, a Primeira Revolução Industrial evoluiu para a Segunda Revolução Industrial (1860 a 1945). A utilização do petróleo e a invenção da eletricidade por Thomas Edison alavancaram sobremaneira o desenvolvimento industrial e tecnológico.
Foi nessa época, mais precisamente em 1914, que, com base no taylorismo[2], surgiu o fordismo: um sistema de produção, criado pelo empresário estadunidense Henry Ford para sua indústria automobilística. Posteriormente, a partir do século XX, este modelo passou a ser utilizado por indústrias no mundo todo.
Na criação de seu sistema de produção, Ford manteve os princípios de Taylor, com o serviço fragmentado em tarefas e a produção em série (produtos iguais), porém, o diferencial se deu quando Ford objetivou a produção em massa, ou seja, em quantidades maiores, com o mínimo de tempo gasto e a custo baixo, para fins de estimular a formação de uma sociedade de consumo em massa e, consequentemente, propiciar a obtenção de maior lucro empresarial. Para tanto, criou sua grande inovação: a esteira de produção. Assim, embora sedimentado nessas bases tayloristas, Ford conseguiu elaborar um sistema de produção próprio e bem mais produtivo (GODWIN, 2017).
Nesse cenário, a linha de montagem tornava-se muito mais eficiente, já que os produtos transitavam por toda a fábrica, permitindo que os trabalhadores executassem seu fragmento de tarefa sem saírem do lugar e, portanto, sem precisarem perder tempo de jornada com deslocamentos para ir buscar ou deixar o produto até o trabalhador seguinte. Com o produto rolando sobre a esteira, as máquinas iam imprimindo o ritmo de realização de tarefa a cada um dos trabalhadores.
Em mais uma inovação, Ford reduziu a jornada de trabalho dos trabalhadores de sua empresa para oito horas diárias e lhes aumentou o salário (GODWIN, 2017). Com isso, pode se concluir que Ford repassou, para a classe operária, parte do tempo e da economia de custos obtidos por meio da eficiência de seu método de produção. Assim, de modo incomum, os funcionários trabalhariam menos e sem redução salarial, com aumento de salário; ganhando mais em dinheiro e em tempo (GODWIN, 2017).
Ford percebeu que a produtividade em massa só geraria lucro se houvesse consumidores com renda suficiente para consumir. Essa renda decorria, eminentemente, do trabalho desempenhado pelos consumidores, ou seja, estava tudo interligado: os trabalhadores também eram consumidores. Sendo assim:
Ford era um defensor da seguinte ideia: com uma jornada menor e mais bem remunerado, o trabalhador será mais produtivo. Além disso, teria mais tempo livre para consumir – o que é fundamental para o funcionamento de uma economia capitalista. Portanto, Henry Ford enxergava seus operários como potenciais consumidores, e entendia que não havia lógica em pagar tão mal a eles. Não se tratava de caridade, mas sim de uma estratégia para lucrar mais (MODELOS..., [202?], online).
Outra especificidade fordista era a de gerar maior produção em menos tempo. Ford defendia que era preciso não diversificar os produtos, pois a variedade destes demandaria mais tempo de produção e mais gasto com insumos e matéria-prima, aumentando, assim, o custo final do produto e reduzindo o lucro, tanto que uma das frases mais célebres de Henry Ford é a seguinte: “O cliente pode ter o carro da cor que quiser, contanto que seja preto” (PAULO FILHO, 2015, online).
Como se vê, pode-se constatar o fordismo como um aprimoramento do taylorismo, com ideias próprias e inovadoras, mas sem o abandono das ideias tayloristas.
Embora se tenha cogitado que este crescente desenvolvimento industrial fosse propiciar um aumento de tempo livre para as classes sociais, o equívoco logo veio à tona. Infelizmente, as demais empresas copiaram somente as partes lucrativas do método fordista, mas não repassaram aos seus trabalhadores as vantagens compensatórias que o fordismo previa, quais sejam, redução de jornada combinada com aumento de salários.
Somado a isso, como a linha de montagem fordista era automatizada, com esteiras rolantes, cada operário realizava apenas uma pequena etapa da produção e, portanto, não precisava de quase nenhuma qualificação profissional para a execução do serviço. Dessa forma, mais enfraquecido intelectualmente, o trabalhador tornava-se mais suscetível à substituição e à exploração.
Esse problema estrutural acabou desencadeando uma desenfreada e desumana exploração da força de trabalho da classe operária, por parte da burguesia industrial, detentora dos meios de produção (MODELOS..., [202?]).
No auge da Segunda Revolução Industrial, o trabalhador foi se distanciando do resultado final do produto, pois ficava encarregado de operar somente em uma parte dele, dentro de uma linha de produção, o que lhe gerava uma sensação de alienação de seu propósito como profissional (LAZZARATO; NEGRI, 2001). Essa condição alienada se reforçava ainda mais pelo fato de o trabalhador também haver perdido o controle sobre seu próprio trabalho, já que as máquinas ditavam o ritmo e o modo com que ele, ser humano, passaria a atuar, como se peça de uma engrenagem fosse.
Com efeito, em que pesem certas vantagens do sistema fordista na esfera econômica, em termos de produtividade em escala e redução de custos; não há como negar que tal modelo de produção posicionou o trabalhador como um profissional desqualificado. Não era, assim, estimulado a pensar, mas apenas a executar um segmento da fabricação do produto, de forma extenuante e mecanizada, atuando como um simples apêndice no processo produtivo.
A nobre tarefa de usar o intelecto, inerente à essência de todo ser humano, na realidade, ficava intrinsecamente reservada a poucos profissionais de alto escalão, responsáveis pelo planejamento e pela gerência da linha de produção no chão de fábrica (LAZZARATO; NEGRI, 2001; RIFKIN, 1995).
Essa dissociação, típica dos modelos taylorista e fordista, entre o trabalho intelectual de concepção e o trabalho manual de execução dos produtos, antes organicamente integrados na era artesanal, acabou ocasionando uma acentuada divisão entre gerentes. Estes usavam a inteligência da massa de trabalhadores que executavam, de forma mecânica e repetitiva, uma faceta da produção, provocando desgastes de ordem existencial nesta classe operária (LAZZARATO; NEGRI, 2001). Como se não bastasse, a exploração do trabalho foi se mostrando sob várias condições adversas.
Como se não bastasse, a exploração do trabalho foi se mostrando sob várias condições adversas. Os salários foram sendo reduzidos desproporcionalmente ao tempo de trabalho despendido e as condições de trabalho ficando desumanas. Fábricas quentes, escuras e abafadas. Jornadas extenuantes, que chegavam a atingir até 16 (dezesseis) horas diárias, sem tempo livre para efetivo descanso, lazer e convívio familiar, senão para tentar recuperar as forças para a próxima jornada.
Relógios não eram permitidos aos trabalhadores, mas só aos supervisores, que controlavam todo o tempo de serviço e avisavam a hora de término do trabalho. Também havia dores articulares, doenças por movimentos repetitivos e problemas respiratórios da poluição do maquinário e até graves acidentes de trabalho que deixavam trabalhadores incapacitados para o resto da vida, sem qualquer reparação e tampouco medidas preventivas futuras (HARVEY, 2008).
Ademais, havia a exploração do trabalho infantil, de crianças de 6 (seis) anos de idade em diante, que além de submissas, eram submetidas a salários mais baixos (SILVA, 2021). Mulheres recebiam um terço do salário de um homem pelo mesmo serviço prestado (SILVA, 2021). Os operários também eram tratados com violência e punidos com castigos físicos por chefes ou capatazes (SILVA, 2021).
Toda essa exploração capitalista ensejou, do final do século XIX ao início do século XX, um estado geral de insuportabilidade da classe trabalhadora, que a partir daí se viu na necessidade de imprimir lutas sociais, por meio de greves e outros movimentos operários, na busca de legislações regulamentadoras de novas condições de trabalho, em prol da construção de uma nova sociedade. Estas lutas árduas galgaram conquistas de diversos direitos trabalhistas, que formaram a teia de proteção social de que hoje dispomos, indispensável ao desenvolvimento econômico em harmonia à dignidade da pessoa humana.
A título de exemplo, uma das lutas mais marcantes dessa época consistiu na primeira greve geral da história do Brasil, ocorrida em São Paulo, durante a Primeira Guerra Mundial, em julho de 1917. Foi promovida por organizações de operários, aliados a parte da imprensa, paralisando a indústria e o comércio brasileiros por trinta dias, em prol da reivindicação por redução de jornada e melhoria de salários e condições de trabalho.
Enquanto as lutas de classes seguiam na busca de equilíbrio entre capital e trabalho, os avanços tecnológicos também aceleravam, sem solução de continuidade, impulsionados não só pela busca natural do ser humano por evolução científica, mas também pela corrida armamentista desde o pós-Primeira Guerra Mundial.
Em meio a esse cenário, os baixos salários dos trabalhadores iam retirando-lhes cada vez mais o poder de compra, o que ocasionou um preocupante subconsumo na economia. Mesmo observando a redução das vendas e os estoques encalhando, os empresários mantiveram a produção em alta, porque, movidos pelo pensamento liberal da mão invisível do mercado[3], acreditavam que o próprio mercado teria a capacidade de se autorregular, sem qualquer intervenção do Estado. Entretanto, isso não ocorreu.
A bolsa de Nova York quebrou, bancos e empresas entraram em falência e um longo período de recessão, que se originou nos Estados Unidos, tomou conta de quase todo o mundo ocidental: era a Crise de 1929, no sistema capitalista, também conhecida como “A Grande Depressão”. Com a economia desorganizada, a produção industrial entrou em queda e, consequentemente, o preço dos produtos agrícolas caiu. Países como Brasil, México e Argentina destruíram estoques para tentarem sustentar os preços no mercado mundial.
A onda de desemprego se espalhou e se aprofundou em taxas astronômicas. Foram estimados 10 (dez) milhões em 1929 e, pelo menos, 30 (trinta) milhões de desempregados em 1932 (MODELOS..., [202?]). Sem empregos, não havia renda. Sem renda na mão daqueles que poderiam funcionar como consumidores, quais sejam, os trabalhadores, não havia demanda e, muito menos, consumo. Sem demanda não havia produção, o que, por sua vez, não gerava empregos (MODELOS..., [202?]).
Assim, a economia e o trabalho entraram em um ciclo vicioso de profunda depressão mundial, com a crise alimentando-se do seu próprio mal. É interessante ressaltar que:
[...] no início da Grande Depressão, Ford chegou a aumentar os salários de seus trabalhadores, para que eles consumissem mais. Porém, sua estratégia não funcionou, e foi preciso demitir funcionários e cortar salários. Em parte, isso ocorreu porque a Ford era uma das poucas empresas que remunerava bem seus funcionários. As demais empresas copiaram rapidamente as ideias de Ford em relação à sua esteira de produção, à produção em massa e em série. Porém, poucas foram as fábricas que “copiaram” as ideias de Ford quanto a remunerar melhor seus funcionários para que eles pudessem se tornar consumidores. Logo, naquele momento, a estratégia isolada de Henry Ford não foi capaz de formar um mercado consumidor interno suficientemente grande nos Estados Unidos (MODELOS..., [202?], online).
Nesse contexto, os preceitos liberais e a teoria da mão invisível não foram suficientes para promoverem a autorregulação do mercado nos tempos de depressão econômica. Foi preciso haver, então, uma intervenção estatal na economia para acabar com a crise.
Destarte, para sair da crise, a partir de 1933, o presidente dos Estados Unidos, Franklin Delano Roosevelt, substituiu o modelo econômico liberal pelo Keynesianismo, mediante a atuação do Estado na economia, pondo fim à crise. Criou-se o New Deal, que estabeleceu uma série de programas de controle das indústrias nos Estados Unidos, entre os anos de 1933 e 1937, para que não houvesse novas depressões entre o capital e o trabalho. Exigiu-se a valorização dos trabalhadores, com o pagamento de salários dignos para torná-los consumidores capazes de fazerem a economia girar e impedir que estes retornassem à exploração de suas forças de trabalho.
Conjuntamente a essas medidas, o Governo Estatal passou a assegurar garantias de educação, saúde e outros serviços públicos essenciais ao trabalhador. Estava nascendo, assim, o Estado Keynesiano, mais conhecido como Welfare Estate, o Estado do Bem-estar Social.
A crise de 1929 representou o abalo no liberalismo econômico e, juntamente ao advento da doutrina político-econômica Keynesiana, trouxe, para a história do capitalismo, uma lição concreta de que os princípios do liberalismo econômico nem sempre são capazes de equilibrar as relações de economia, capital e trabalho, pois a liberdade total e irrestrita de um setor da sociedade pode suplantar outro setor.
Pode-se concluir que, naquele cenário, a política Keynesiana funcionou como uma verdadeira revisão da teoria liberal, para que se passasse a adotar a compreensão de que o Estado deveria intervir na economia, sempre que fosse necessário, a fim de evitar a retração econômica e garantir o pleno emprego.
Por certo, o Keynesianismo e as ações do New Deal viabilizaram a própria continuidade do modelo fordista, desta vez em toda sua essência, além de terem recuperado a economia capitalista, que voltou a crescer, proporcionando melhoria na qualidade de vida de grande parte da população. Mais tarde, no período pós-Segunda Guerra Mundial (1950-1960), com a constituição de filiais de empresas multinacionais norte-americanas em vários países, surgiram os anos de grande prosperidade e crescimento capitalista, os chamados “Anos Dourados” do capitalismo, em que a economia foi impulsionada pelo capital estrangeiro, devido ao crescente processo de internacionalização industrial.
2 O TRABALHO NA TERCEIRA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL (REVOLUÇÃO DIGITAL)
A terceira etapa do processo de transformação econômica foi marcada, dentre outras mudanças, pela implementação da Internet. Substituiu-se, gradualmente, a tecnologia analógica pela digital.
Iniciou-se após a Segunda Guerra Mundial, na segunda metade do século XX, entre as décadas de 1950 e 1970. O desenvolvimento tecnológico começou a atingir um patamar mais sofisticado, com o avanço da alta tecnologia (high-tech), ou tecnologia de ponta, inaugurando, assim, o período histórico da Terceira Revolução Industrial, mais conhecido como Revolução Técnico-Científica-Informacional ou Revolução Digital.
No final da década de 1960 e com as Crises do Petróleo (1973 e 1979), o fordismo, que envolvia gasto de energia e matéria-prima com sua filosofia de superprodução, entrou em forte declínio no momento de alta do valor do combustível (PEDROSO, 2013). Foi necessário implementar-se o uso de soluções tecnológicas e de outro modelo de produção e gestão industriais.
Assim, o fordismo perdeu espaço para o toyotismo, um sistema flexível de produção, de origem nipônica, desenvolvido como contraponto à rigidez fordista (PEDROSO, 2013). Este modelo anterior não apresentava mais respostas à competitividade dos produtos japoneses concebidos pelo sistema toyotista. Com o desenvolvimento dos transportes e das telecomunicações, somado aos investimentos dos países desenvolvidos, o modelo produtivo toyotista, antes restrito ao Japão, logo se difundiu pelo mundo (PEDROSO, 2013).
O Toyotismo surgiu como um sistema de produção e gestão, desenvolvido pioneiramente pelo executivo Taiichi Ohno para a montadora Toyota, entre os anos de 1947 e 1975, que deu origem à filosofia lean, focada no aumento da produtividade e eficiência, bem como na redução de sete tipos de desperdícios (PEDROSO, 2013). São eles: produção em excesso, tempo de espera, estoque, gargalos de transporte, inventário e outros processamentos desnecessários, excesso de movimentação ou manobras no chão de fábricas, e erros para correção por retrabalho (PEDROSO, 2013).
Constituiu-se sob as seguintes filosofias basilares: trabalho em equipe e de cooperação, melhoramento contínuo, flexibilização da produção, acumulação flexível, lean manufacturing, produção just in time, kanban e heijunka.
A primeira filosofia toyotista baseia-se na ideia central de trabalho em equipe, responsável por si mesma, organizada de forma horizontalizada, composta de trabalhadores polivalentes e multifuncionais, capazes de se autocontrolarem e planejarem o trabalho, objetivando um melhor acabamento do produto (PEDROSO, 2013). O melhoramento contínuo visa ao constante aperfeiçoamento dos produtos, com a realização continuada de pequenas modificações, por vezes sugeridas pelo próprio trabalhador (PEDROSO, 2013).
A diversificação dos produtos fabricados, chamada de flexibilização da produção, trata se de uma medida voltada a tornar o consumidor mais atraído a adquirir as variedades do mercado, diferentemente da tendência fordista, que já estava deixando o mercado consumidor saturado da falta de variação dos produtos fabricados (PEDROSO, 2013).
Já o lean manufacturing, que significa “manufatura enxuta”, consistia em uma filosofia de gestão, com vistas a realizar uma produção enxuta, sem estoques desnecessários e com a menor quantidade de recursos possíveis (WOMACK; JONES; ROOS, 1992).
De forma oposta ao taylorismo, o just in time, característico do toyotismo, caracteriza-se por ser um sistema de produção que se fundamenta na seguinte ideia: para reduzir estoques e custos, tudo deve ser produzido, transportado, comprado e entregue na hora certa, devendo o produto ou matéria-prima chegar ao local necessário, para seu uso ou venda, somente sob demanda e no momento exato em que for necessário (HARVEY, 2008).
Kanban, de forma literal, significa “cartão” ou “sinalização”, tipo post-it, utilizado para indicar o andamento dos fluxos de produção em empresas de fabricação em série (CASTELLS, 1999). Por exemplo, as sinalizações “para executar”, “em andamento” ou “finalizado”, permitem, assim, um controle detalhado sobre quando, quanto e o que produzir, sem a necessidade de repetir checagem de tarefas a executar. Esta prática está intimamente ligada ao conceito just in time.
Heijunka, em uma tradução rápida, é uma palavra japonesa que significa “nivelamento” e está relacionada a uma programação nivelada da produção, mediante o sequenciamento dos pedidos, permitindo a combinação de itens diferentes, de forma a garantir um fluxo contínuo de produção, nivelando também a demanda dos recursos de produção (LIKER, 2005).
Como se percebe, ao invés de despender altos custos com matéria-prima para produção em massa, o sistema toyotista primava pela mínima produção, somente por demanda, sem estoques e, consequentemente, com menos gastos com mão de obra, grandes fábricas e encargos.
Com a desnecessidade de instalação de grandes áreas industriais, aliada à crescente velocidade de transmissão e compartilhamento de informação pelas infovias e ao avanço no transporte de matérias-primas, produtos e indivíduos, em uma lógica capitalista, as empresas começaram a descentralizar os locais das fábricas, trocando os grandes e concentrados distritos industriais do fordismo por novas localidades, com menor custo, menos congestionamento, mão de obra barata, descentralizada e menos sindicalizada. Este fenômeno de inversão geográfica foi conhecido como “deseconomia de aglomeração”.
A partir da desconcentração das fábricas, as diversas etapas da produção industrial e os setores de alta tecnologia das empresas puderam ser fragmentados por todo o mundo, conforme as vantagens apresentadas. Na busca por mão-de-obra de alta qualificação, as empresas passaram a instalar os setores de alta tecnologia em tecnopólos e locais com redes de telecomunicações de alta qualidade. Já os setores produtivos foram instalados nos locais com melhores incentivos fiscais, leis trabalhistas e ambientais flexíveis e menores custos de instalação e mão-de-obra treinada, mas de custo baixo[4].
Outro ponto que também chamou atenção foi o surgimento da terceirização, triangularizando — quaternalizando, ou até mais — as relações de trabalho. De fato, com a desconcentração da produção, as empresas focaram mais detidamente na atividade-fim, passando a contratar outras empresas para executarem as atividades-meio, as terceirizadas.
Com base nessa dinâmica, as empresas com produção industrial flexibilizada, descentralizada, fragmentada, transnacionalizada foram se tornando cada vez mais predominantes no mercado mundial e globalizado. Por via de consequência, começaram a conduzir os governos keynesianos, do Bem-Estar Social, a se transformarem em neoliberais, reduzindo a intervenção Estatal na economia e nas relações de trabalho, para não correrem o risco de perderem fábricas para outros países.
A partir desse cenário, portanto, inaugurou-se o neoliberalismo econômico no contexto global. Cumpre destacar, entretanto, os dilemas decorrentes da dicotomia entre os interesses do capital e as necessidades do trabalho.
Sob esse enfoque, as transformações toyotistas, alavancadas pelo avanço tecnológico da Terceira Revolução Industrial transmutaram a economia capitalista de superprodução versus subconsumo para uma economia de produtividade proporcional à demanda de mercado. Evitou se, assim, que nova crise econômica de grandes proporções se desencadeasse e atingisse o mundo empresarial.
Por outro lado, se as empresas se beneficiaram das inovações toyotistas, o mesmo não se podia dizer em relação à massa de trabalhadores, haja vista que a automação da produção acabou funcionando como um dos principais fatores para o desemprego estrutural, à medida que a mão de obra humana era substituída pela robotizada, reduzindo drasticamente a necessidade de contratação de trabalhadores, que se viram, portanto, desempregados.
Assim, junto à flexibilização da produção e globalização industrial, adveio a flexibilização das relações de trabalho. É que, na lógica capitalista, só havia um jeito de conter o risco de colapso industrial da era fordista, decorrente do encalhe da produção pela baixa no consumo: reduzir os custos com os trabalhadores, para manter os lucros, inclusive diminuindo o patamar de seus salários, conquistados com o fordismo.
Além disso, os trabalhadores não muito qualificados, especializados em uma única tarefa ou que, por diversos obstáculos econômicos, sociais e políticos, não conseguiram se qualificar para as novas necessidades tecnológicas do mercado, acabaram sendo descartados e substituídos por outros mais qualificados e multifuncionais. Caíram, desse modo, na vala do desemprego ou, quando muito, foram realocados em subempregos, submetidos a precárias condições de trabalho, com exploração de mão-de-obra e supressão de garantias trabalhistas.
Importante notar que a exigência do mercado por mão-de-obra qualificada e multifuncional também era mais uma medida utilizada para flexibilizar as relações de trabalho. Com o processo de automação da produção, as empresas, que já não mais precisavam contratar uma grande quantidade de empregados, passaram a escolher os mais qualificados, exigindo lhes requisitos para executarem uma multiplicidade de tarefas e oferecendo-lhes menores salários. Desse modo, até mesmo os trabalhadores mais qualificados, inseridos nesse novo mercado, também sofreram perdas de conquistas trabalhistas adquiridas na era fordista.
Com efeito, na era fordista, a grande necessidade de força de trabalho humano ensejou a chamada sociedade do pleno emprego, cujos trabalhadores detinham elevado padrão salarial e maior poder de negociação e organização em sindicatos; na era pós-fordista, a redução do consumo em massa desencadeou a redução da produção e dos custos com os trabalhadores, gerando precarização do emprego, com baixos salários, classe trabalhadora dispersa e sem força sindical.
Nesse cenário neoliberal e de crescimento tecnológico, também se desenvolveu um outro modelo de produção industrial de origem sueca: o volvismo. Este modelo caracteriza-se pelo uso de tecnologia de ponta, com alto grau de automação e experimentação, bem como pela primazia por segurança e perfeição do produto, pela forte participação dos sindicatos e por uma profunda cultura de valorização de seus trabalhadores (APOLINÁRIO, 2015). Ocupou uma posição diferente daquela relacionada aos operários do fordismo e mais importante do que a dos trabalhadores do toyotismo, já que integrados ao sistema e detentores do conhecimento de todas as etapas da produção e de auxílios sociais subsidiados pela empresa (APOLINÁRIO, 2015).
Certamente, na Primeira e Segunda Revoluções Industriais, as indústrias buscavam profissionais desqualificados e alienados da totalidade do processo produtivo, executores de pequenos segmentos da confecção do produto[5], mediante movimentos mecanizados e repetitivos. Eram meros apêndices dos maquinários, com jornadas e sistema de trabalho rígidos, justamente para viabilizarem produções de grande quantidade de um único modelo de produto, em larga escala, com baixo custo e, na maior parte das empresas, com baixos salários; na Terceira Revolução Industrial, ao contrário, despertou-se para a necessidade crescente de busca
O contexto histórico dessa supervalorização do crescimento técnico, científico e tecnológico é bem elucidado por Souza (p. 10-11):
[...] após a 2ª Guerra Mundial e o advento da Guerra Fria, conflito 'não bélico' entre Estados Unidos e União Soviética, os países sentiram a necessidade de desenvolver suas indústrias e sua tecnologia, como uma forma a proteger-se contra ataques de inimigos e um acontecimento do final da 2ª Guerra Mundial, que particularmente consolidou a exigência de passar por uma nova fase de industrialização foi o bombardeio de Hiroshima e Nagasaki, por parte dos Estados Unidos.
Com isso, essa fase é marcada por uma busca incessante de novas tecnologias nos diversos setores como garantia de proteção de ataques de terceiros.
É sempre bom deixar explícito para que vocês possam entender bem: as universidades e as indústrias, em especial nesse período, estavam envolvidas e decididas para industrializar os países e mesmo países agrários passaram por essa situação, um exemplo claro é o Brasil e o governo de Juscelino Kubitschek, com o projeto de desenvolver a economia, não em 50 anos, mas em cinco.
Ora, por que havia essa necessidade? Justamente porque o Brasil ainda era um país agrário e Juscelino sentia a necessidade de modificar essa situação.
Voltando à questão das universidades, por mais que elas sejam instituições originárias da Idade Média, as pesquisas tecnológicas ao menos da forma como conhecemos hoje, são próprias desse período de industrialização e uma característica bem interessante
desse processo é a de que há uma transmissão do saber-fazer entre universidades e indústria quase que de maneira simultânea, basta lembrar o que aconteceu na Europa durante a 2ª Guerra.
Outro ponto é que na terceira revolução industrial, há a produção de insumos de alto valor agregado e isso é fácil de entendermos: com o avanço das tecnologias, e até mesmo de nanotecnologias, conforme a pesquisa científica vai consolidando-se, mercadorias cada vez mais sofisticadas poderão ser produzidas e isso naturalmente aumentará o valor agregado do produto.
Tal é a importância da pesquisa nesse momento da Revolução que há outra denominação para a 3ª Revolução Industrial, que é Revolução Técnico-Científica.
Nesse contexto, a Revolução Digital fez surgir diversas inovações digitais e transformações tecnológicas no mundo inteiro, que romperam com paradigmas e opuseram modelos do período anterior, relativos à Era Industrial tradicional da Segunda e Terceira Revoluções.
Aproximadamente a partir de 1950, desencadeou-se uma profunda e gradual alteração, não só nos meios e sistemas de produção, mas também na própria organização da sociedade, haja vista um rápido desenvolvimento em telecomunicações, informática, tecnologia digital, informação, genética, automação e robótica (CASTELLS, 1999).
Enquanto a Era Industrial tradicional colhia frutos da invenção da prensa e privilegiava relações de trabalho rígidas, hierárquicas e verticais, a Era Tecnológica, em seu início, já começava a apregoar as vantagens, inclusive ambientais, da comunicação digital e apresentava novos modelos de negócios com características sensivelmente opostas aos anteriores, posto que flexíveis, colaborativos e horizontais.
Esse processo de digitalização tecnológica reestruturou o universo da eletrônica, fazendo com que a tecnologia, antes mecânica e analógica, fosse convertida para o formato digital, de tal modo que o computador e os circuitos lógicos digitais tornaram-se, então, as verdadeiras máquinas dentro do ramo empresarial.
A Internet — inicialmente criada na década de 1960, de forma restrita, por agência norte americana, com o intuito exclusivo de uso da indústria bélica, de investigações nucleares, de busca de tecnologia de espionagem e de interligação restrita de bases militares a universidades, para fins de pesquisa direcionadas ao governo – passou a ser disponibilizada e popularizada para outros países, a partir de 1990, por meio da Rede de Alcance Mundial (WWW – World Wide Web) (CASTELLS, 1999).
O uso popularizado de computadores, arquivos digitais, celulares digitais, redes sociais e outras tecnologias derivadas começou a fazer parte do cotidiano das empresas e dos lares de várias famílias por todo o mundo, reforçando a globalização, à medida que viabilizaram: a interatividade, o amplo acesso à informação, a produção de conteúdo, o estreitamento entre pessoas a quaisquer distâncias geográficas e culturais, a facilidade de mobilização coletiva de quaisquer grupos sociais em quaisquer causas, a prática do e-commerce, por meio de marketplaces e lojas virtuais, além da instalação de empresas multinacionais e a consolidação do capitalismo financeiro6.
A informação passou a ocupar o centro de destaque no cenário atual, tornando-se o novo paradigma, tanto para a classe de profissionais, como para a classe de empresários e industriários, seja com vistas a galgarem lugar no mercado de trabalho, no primeiro caso, seja para exercerem o empreendedorismo com sucesso, no segundo. A difusão da Internet e do computador tiveram importante papel no acesso rápido e recíproco de comunicações integradas, por diversos fluxos, inclusive a nível internacional, oferecendo uma maior capacidade de armazenamento de dados, algo decisivo em um período em que a informação passa a ser considerada uma das mais relevantes moedas de troca.
6Assim como a industrialização, o capitalismo não é estático, alterando-se no tempo, dividindo-se basicamente em três fases: capitalismo mercantil ou comercial (até o final do século XVIII), capitalismo industrial (primeira e segunda revolução industrial) e capitalismo financeiro (terceira revolução industrial e revolução 4.0).
Como ilustração dos tempos atuais, rememore-se a célebre frase “Informação é poder!”, reproduzida pelo personagem “Steve Jobs”, no filme “Piratas do Vale do Silício”, lançado em 1999, que retrata o nascimento da era da informática doméstica, no início da década de 1970.
É de se reconhecer, pois, que esta terceira fase da industrialização modificou o mundo do trabalho e inaugurou o início da Era da Informação, também chamada de Era Tecnológica, não restando dúvidas de que os investimentos em pesquisa científica e tecnologia proporcionaram um salto de qualidade e avanço na vida da humanidade.
No entanto, a crítica que se põe é que, enquanto o mercado capitalista se voltou, cada vez mais, para os trabalhadores qualificados, outros profissionais especializados em uma só tarefa ou sem as mesmas oportunidades de qualificação foram sendo deixados para trás, ocasionando altas taxas de desemprego e migração para o mundo do trabalho informal, em que o trabalhador é posto, indevidamente, à margem de leis e direitos trabalhistas, como se tais relações de trabalho fossem desregulamentadas, embora não necessariamente o sejam.
A Revolução Digital, portanto, consolidou-se de forma extremamente antagônica, pois, por um lado, elevou diversos setores da sociedade para um patamar de crescimento tecnológico bastante avançado, e, por outro, desencadeou uma verdadeira tecnoprecarização do trabalho nas classes sociais com menores oportunidades de acompanharem esse crescimento (ANTUNES, 2009).
Até então, não se constitui como novidade o fato de que o desenvolvimento tecnológico tenderia a impor a substituição do homem pela máquina, até porque foi o que aconteceu com grande parte da massa trabalhadora na Segunda Revolução Industrial, em que o operário foi reduzido a mero apêndice dos maquinários no processo produtivo.
Na Era Digital, porém, essa preterição da força de trabalho humana se intensificou substancialmente, à medida que o homem foi perdendo seus postos de trabalho no setor secundário da economia, não só para máquinas, mas também para sistemas informatizados. Isso acarretou uma crescente terciarização da economia, com o direcionamento, para o setor terciário de comércio e serviços, dos trabalhadores que perderam seus empregos no setor industrial; um escape na busca por suas sobrevivências.
Destaque-se que, na Era da Informação, a migração de empregos para o setor terciário ocorreu não só no setor secundário, mas também adveio do setor primário (RIFKIN, 1995). A introdução de maquinários e novos conhecimentos agrícolas e tecnológicos no meio rural também acarretou alta de desemprego da massa trabalhadora que não conseguia se qualificar suficientemente para operá-los (RIFKIN, 1995). Com isso, o resultado foi o êxodo rural desses trabalhadores do campo para as cidades, a fim de recorrerem à empregabilidade no setor terciário.
Verifica-se que a Era da Informação inaugurou um cenário paradoxal no mundo do trabalho. Houve, simultaneamente, aumento no número de empregos e aumento do número de desempregados, porque os novos postos de trabalho requereram conhecimentos tecnológicos especializados. Diante disso, uma grande parte dos trabalhadores não conseguiu ocupá-los por falta de oportunidades e de tempo para alcançarem a qualificação profissional que o mercado digital exigia.
Outro fato impactante da Revolução Digital foi a flexibilização pós-fordista da produção. Não só implicou a fabricação de produtos com obsolescência programada (por meio de produções de itens com menor durabilidade e tempo de vida útil), como também a obsolescência perceptiva (por meio de lançamentos de produtos em novas cores, novos modelos e novas tecnologias, com o intuito de gerarem uma sensação de defasagem destes nos consumidores) (CASTELLS, 1999).
A qualidade dos produtos passou, então, a ser medida não pelo tempo de durabilidade, mas pela diversificação ou grau de tecnologia, de modo que parar de funcionar ou ter algum defeito não são mais fatores que os deixam inservíveis para uso. Impera, sobretudo, motivos como o modelo seguinte ter atingido um patamar de variação, sofisticação ou tecnologia maiores que o anterior. Vale notar o impacto ambiental, social, econômico e trabalhista que essa nova filosofia de produção passou a gerar. Citem-se, como exemplos, nos dias de hoje, os artigos de moda e os aparelhos de celular.
Nesse contexto, o homem converte toda sua capacidade de evoluir tecnologicamente, não em prol do cerne humanitário, mas sim em função da lógica da lucratividade. Até aqui, ainda não há uma condução das decisões e transformações econômicas para os fins sociais, ou seja, ainda não se vê o ser humano como o destinatário final de toda essa evolução que ele próprio adquiriu, porque todo o esforço, seja ele o do trabalho, seja o do empreendedorismo, vem sendo despendido em função do capital, ainda que essa destinação importe em sofrimento de classes sociais desprovidas de oportunidades de crescimento.
Enfim, a pulsão que vinha movendo a economia, qual seja, a da lógica de mercado, não necessariamente guardava observância com a lógica humanitária. Pode-se concluir que a Era da Informação proporcionou transformações tecnológicas que representaram incontáveis vantagens para a sociedade, mas também deixou muitos trabalhadores desempregados e sem acesso às capacitações tecnológicas, o que inviabilizou suas inserções no mundo do trabalho digital.
3 O TRABALHO NO TEMPO ATUAL: REVOLUÇÃO 4.0
Com respaldo em vários estudiosos no assunto, a exemplo de Klaus Schwab (2016), pode se afirmar que, atualmente, vivencia-se a Era da Revolução 4.0.
A transição da Terceira para a Quarta Revolução ocorreu de forma gradual, assim como em todas as demais. O seu maior impulso, entretanto, foi a ruptura com os modelos usuais de negócios e tecnologias; deu-se lugar a inovações disruptivas, em velocidade e amplitude cada vez mais crescentes, que seguem avançando no curso desta nova era.
Schwab (2016, p.11) elenca descobertas e inventos descontínuos que surgiram no início da Revolução 4.0. Destaca também o quanto está por vir, a nível de interação entre eles:
[...] ainda precisamos compreender de forma mais abrangente a velocidade e a amplitude dessa nova revolução. Imagine as possibilidades ilimitadas de bilhões de pessoas conectadas por dispositivos móveis, dando origem a um poder de processamento, recursos de armazenamento e acesso ao conhecimento sem precedentes. Ou imagine a assombrosa profusão de novidades tecnológicas, que abrangem numerosas áreas: inteligência artificial (IA), robótica, a internet das coisas (IoT, na sigla em inglês), veículos autônomos, impressão em 3D, nanotecnologia, biotecnologia, ciência dos materiais, armazenamento de energia e computação quântica, para citar apenas alguns. Muitas dessas inovações estão apenas no início, mas já estão chegando a um ponto de inflexão de seu desenvolvimento, pois elas constroem e amplificam umas às outras, fundindo as tecnologias dos mundos físico, digital e biológico.
Para demonstrar que adentramos a Quarta Revolução, Schwab (2016, p. 12-16) pondera no seguinte sentido:
Estou ciente de que alguns acadêmicos e profissionais consideram que essas inovações são somente mais um aspecto da terceira revolução industrial. Três razões, no entanto, sustentam minha convicção da ocorrência de uma quarta – e distinta – revolução:
- Velocidade: ao contrário das revoluções industriais anteriores, esta evolui em um ritmo exponencial e não linear. Esse é o resultado do mundo multifacetado e profundamente interconectado em que vivemos; além disso, as novas tecnologias geram outras mais novas e cada vez mais qualificadas.
- Amplitude e profundidade: ela tem a revolução digital como base e combina várias tecnologias, levando a mudanças de paradigma sem precedentes da economia, dos negócios, da sociedade e dos indivíduos. A revolução não está modificando apenas o “o que” e o “como” fazemos as coisas, mas também “quem” somos.
- Impacto sistêmico: ela envolve a transformação de sistemas inteiros entre países e dentro deles, em empresas, indústrias e em toda sociedade.
[…]
As tecnologias digitais, fundamentadas no computador, software e redes, não são novas, mas estão causando rupturas à terceira revolução industrial; estão se tornando mais sofisticadas e integradas e, consequentemente, transformando a sociedade e a economia global.
[…]
A quarta revolução industrial, no entanto, não diz respeito apenas a sistemas e máquinas inteligentes e conectadas. Seu escopo é muito mais amplo. Ondas de novas descobertas ocorrem simultaneamente em áreas que vão desde o sequenciamento genético até a nanotecnologia, das energias renováveis à computação quântica. O que torna a quarta revolução industrial fundamentalmente diferente das anteriores é a fusão dessas tecnologias e a interação entre os domínios físicos, digitais e biológicos.
Além da inteligência artificial (IA), robótica, internet das coisas (IoT), veículos autônomos, impressão em 3D, nanotecnologia, biotecnologia, ciência dos materiais, armazenamento de energia e computação quântica, Schwab (2016, p. 23-34) elencou outras principais megatendências tecnológicas (technological megatrends), com base em pesquisa[6] realizada no ano de 2015, pelo Fórum Econômico Mundial, e no trabalho de vários Conselhos da Agenda Global do Fórum.
Schwab (2016) citou a robótica avançada por biomimetismo[7]e o acesso a informações remotas por meio da nuvem, sem necessidade de programação por uma unidade autônoma. Estima-se que, quando a próxima geração de robôs for criada, provavelmente funcionará como aliada do ser humano, não mais como uma espécie de máquina substitutiva do homem.
Outros exemplos de megatrends também citados foram as casas conectadas, as cidades inteligentes, os materiais inteligentes, os nanomateriais, os plásticos termofixos, o blockchain, a bitcoin, a biologia sintética, o xenotransplante, a bioimpressão tridimensional de tecidos vivos e a neurotecnologia.
Além disso, vários pontos de inflexão esperados até 2025 foram elencados, a exemplo de roupas e óculos de leitura conectados à Internet, carros sem motoristas, transplante de fígado impresso em 3D, substituição do censo por fontes de big-data, dentre outros. Importante notar que todos esses avanços, quando implementados, abrirão espaço para o início da já esperada Sociedade 5.0, a qual será abordada adiante.
Destaca-se que a Quarta Revolução Industrial, embora esteja em curso em várias partes do mundo, em outras, não foi vivenciada ainda. Estipula-se que nem mesmo a Segunda Revolução Industrial chegou a ser usufruída, por falta de acesso a descobertas científicas basilares.
De fato, a Segunda Revolução precisa ser plenamente vivida por 17% (dezessete por cento) da população mundial, pois quase 1,3 (um vírgula três) bilhões de pessoas ainda não têm acesso à eletricidade. Isso também é válido para a Terceira Revolução Industrial, já que mais da metade da população mundial, 4 (quatro) bilhões de pessoas, vivem em países em desenvolvimento sem acesso à Internet (SCHWAB, 2016). O tear mecanizado (a marca da primeira revolução industrial) levou quase 120 (cento e vinte) anos para se espalhar fora da Europa. Em contraste, a Internet espalhou-se pelo globo em menos de uma década (SCHWAB, 2016, p. 17).
Não resta dúvida, portanto, de que as desigualdades sociais e econômicas representam desafios sistêmicos para a plena implementação da Quarta Revolução Industrial. Outro paradoxo será o fato de que somos, ao mesmo tempo, produtores e consumidores, de tal modo que as inovações disruptivas tenderão a afetar, tanto de forma positiva, como negativa, nossos padrões de vida.
Magaldi e Salibi Neto (2018, p. 15) ressaltam que a velocidade das transformações faz com que o valor gerado pela empresa seja julgado diariamente pela sociedade, na forma de consumidores atentos. Ao surgir uma nova opção que atenda suas demandas latentes ou não mapeadas, esses implacáveis “juízes” canalizarão sua atenção ao novo, deixando à míngua as empresas que não atenderem à evolução do mercado.
Nessa perspectiva, com a alta tecnologia da Revolução 4.0, profissões e atividades empresariais tradicionais vêm se extinguindo, ao passo que novas demandas e profissões surgem. Há muito tempo extintas ou, no máximo, ainda existentes, mas obsoletas em países cuja tecnologia seja mais desenvolvida, estão as profissões de: vendedor de enciclopédias, telefonista, datilógrafo, leiteiro, projetista de cinema, vendedor, arrumador de pinos de boliche, comerciante de aluguel de fitas de videocassete, entre outras.
Dando seguimento a uma futura extinção, senão já extintas, têm-se, por exemplo, as profissões de: comerciante de aluguel de DVD e Blu-rays, revelador de fotos, carteiro, bibliotecário, digitador, relojoeiro, recrutador de RH e profissional de telemarketing. Especula se que até mesmo pilotos de avião e taxistas caminham para a extinção, em função da futura tendência do desenvolvimento e do uso crescente de veículos autônomos.
Dentre as novas profissões, estima-se como promissor o mercado de trabalho para as profissões de gestor de resíduos ou lixólogo, especialista em agroecologia, gerontólogo, analista de SEO (Search Engine Optimization), consultor de sucessão, farmacoeconomista, aquicultor, especialista em bioinformática, especialista em mobile marketing, dentre outras (OLIVEIRA, 2013, p. 55).
Nesse rumo, novas profissões surgem, mas não necessariamente surgem os profissionais na mesma proporção, porque esta demanda requer investimento e políticas públicas de educação e qualificação acadêmica, além de treinamentos práticos, a fim de preparar a sociedade para desempenhar esses novos papéis no mercado de trabalho.
Com efeito, um fato inconteste da atualidade é a demanda de profissões emergentes. Já a formação de profissionais qualificados, na mesma quantidade e velocidade, para exercer tais profissões e, então, atender a essa demanda por completo, por enquanto, é apenas uma expectativa ainda não plenamente concretizada.
A velocidade das informações, do desenvolvimento de tecnologia fina e, consequentemente, a velocidade da dinâmica de necessidades que vão surgindo, são fatores que nos levam a indagar se os atuais sistemas de educação estão atentos a essas questões e conseguirão acompanhar esse ritmo, no sentido de capacitarem os estudantes de hoje para se tornarem os profissionais que o futuro tecnológico exigirá. O que se estuda no presente, ainda que seja o mais atualizado possível, poderá rapidamente se tornar obsoleto, no momento que o estudante concluir o ensino médio e superior e precisar ingressar no mercado de trabalho.
É de suma importância, portanto, que o sistema educacional vigente, que representa a base da construção do conhecimento, ajuste-se em conteúdo e em ritmo, às evoluções tecnológicas, para oferecer grades de ensino condizentes com os perfis de trabalhadores que o sistema produtivo tende a demandar no futuro, desenvolvendo competências úteis para a vida adulta dos estudantes.
Ademais, a tendência do mercado aponta para a preponderância de profissões tão qualificadas em relação à formação educacional da população em geral que, provavelmente, uma significativa parcela de profissionais não consiga ingressar ou manter-se no mercado, em virtude da falta de qualificação voltada ao trabalho 4.0, o que infelizmente engrossará a massa de trabalhadores desempregados e de excluídos digitais.
A partir dessa ótica, urge que as políticas públicas sejam voltadas não só aos profissionais do futuro, mas também aos trabalhadores de hoje, com vistas à capacitação destes, já para o momento presente, a fim de lhes desenvolver a necessária competência para acompanharem o ritmo dos upgrades tecnológicos. Essa postura governamental afigura-se indispensável para minorar o desemprego e a discriminação digital da classe trabalhadora que, no passado, não recebeu uma formação profissional hábil ao enfrentamento da multiplicidade e complexidade das inovações e mudanças tecnológicas do presente.
O mercado de trabalho não é estático, mas dinâmico, e vem passando por diversas transformações ao longo do tempo. Com a Pandemia do Coronavírus (COVID-19) e a necessidade de isolamento social, essas transformações digitais aceleraram-se mais ainda, compelindo a sociedade a reinventar-se para contemporizar a continuidade dos serviços com a própria sobrevivência da espécie humana, na tentativa de proteção contra o contágio e a disseminação do vírus.
Nesse cenário, grande parte dos trabalhadores de atividades compatíveis com a modalidade remota tiveram que se adaptar à realidade pandêmica e, então, migraram para o teletrabalho. Outros, porém, não conseguiram trabalhar remotamente, ou porque suas atividades são de execução essencialmente presencial, ou porque a empresa não conseguiu adaptar seu funcionamento ao modo tecnológico, ou, ainda, por falta de recursos financeiros e conhecimentos técnicos para adquirirem e operarem computador, celular, tablet, notebook e similares, para fins laborais.
Evidentemente que, do ponto de vista normativo, o teletrabalho não é uma novidade da pandemia, pois referida modalidade de labor já tinha previsão legal, desde o ano de 2011, com o acréscimo do parágrafo único ao art. 6º, da CLT, por intermédio da Lei n. 12.551/11 e, mais adiante, com a Lei n. 13.467/17. Esta última introduziu o Capítulo II-A, com os arts. 75-A a 75-E, especialmente dedicado ao tema.
Constata-se, porém, que o teletrabalho nunca esteve tão inserido no mundo do trabalho como agora, em tempos de pandemia, principalmente no caso de trabalhadores mais qualificados e de empresas cujas atividades passaram a ser operadas em home office. Em outra perspectiva, contudo, os trabalhadores menos qualificados, ou cujas atividades são essencialmente presenciais, ficaram de fora dessa modalidade.
Todo o cenário atual leva a crer que as mudanças na geografia do trabalho, proporcionadas pelos avanços tecnológicos da Revolução 4.0 e aceleradas pela Pandemia do Coronavírus (COVID-19), certamente representam um caminho sem volta, pelas inúmeras vantagens econômicas que trouxeram, dentre as quais, menor poluição de veículos em deslocamentos, maior conexão familiar, menores custos com aluguel de estabelecimentos. Cumpre mencionar também as agruras emocionais do home office, seja pelo isolamento social, pela simbiose do espaço casa e trabalho, seja pela intensificação de tarefas decorrentes da hiperconexão do trabalho em conjunto com os afazeres da terceira jornada, que atinge grande parte das mães nessa geração ainda patriarcal.
Sob esse panorama, embora grande parte da população já seja usuária de smartphone, ainda há um longo percurso para ser considerada como digitalmente incluída. Uma pesquisa realizada em 2018 pelo suplemento de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC), da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), e divulgada em 29.04.2020 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2020), indicou que 79,3% (setenta e nove vírgula três por cento), ou seja, 4 (quatro) em cada 5 (cinco) brasileiros com 10 (dez) anos ou mais de idade possuem celular.
A pesquisa em apreço também revelou que 25% (vinte e cinco por cento) da população brasileira ainda não tem acesso à Internet, o que em números totais representa cerca de 46 (quarenta e seis) milhões de pessoas (IBGE, 2020). No meio rural, todavia, a falta de acesso à Internet ainda é maior do que no meio urbano, chegando a 53,5% (cinquenta e três vírgula cinco por cento), e nas cidades esse percentual é de 20,6% (vinte vírgula seis por cento) (IBGE, 2020).
Em ato contínuo, apontou que 41,6% (quarenta e um vírgula seis por cento), quase metade das pessoas, não têm acesso à rede, pelo fato de não saberem usá-la, enquanto 34,7% (trinta e quatro vírgula sete por cento), ou seja, 1 (uma) a cada 3 (três) pessoas, não têm interesse em usá-la (IBGE, 2020). Ainda, 11,8% (onze vírgula oito por cento) delas alegam que o serviço à Internet é caro e 5,7% (cinco vírgula sete por cento) argumentam o alto custo do equipamento necessário para conectar (IBGE, 2020).
Além disso, observou-se que, em todas as regiões do país, o rendimento real médio per capita dos domicílios em que havia utilização da Internet (R$ 1.769) foi quase o dobro do rendimento dos que não utilizavam a rede (R$ 940) (IBGE, 2020). Desse modo, a Internet ainda não é acessível à população com renda média per capita abaixo de R$ 1.769,00 (mil setecentos e sessenta e nove reais) (IBGE, 2020). Isso é preocupante, principalmente se considerarmos que a renda domiciliar per capita média nacional do Brasil era de R$ 1.373,00 (mil trezentos e setenta e três reais) em 2018, R$ 1.438,67 (mil quatrocentos e trinta e oito reais e sessenta e sete centavos) em 2019 e R$ 1.380,00 (mil trezentos e oitenta reais) em 2020, segundo pesquisa da PNAD Contínua, do IBGE (SILVEIRA; ALVARENGA, 2021).
Notou-se que o acesso à Internet é mais alto entre jovens. A faixa etária de 20 (vinte) a 24 (vinte e quatro) anos foi a que mais utilizou a Internet em 2018, alcançando 91% (noventa e um por cento) do público dessa idade (SILVEIRA; ALVARENGA, 2021). Em contrapartida, somente 78,1% (setenta e oito vírgula um por cento) da população de 45 (quarenta e cinco) a 49 (quarenta e nove) anos e apenas 38,7% (trinta e oito vírgula sete por cento) da população de 60 (sessenta anos) anos ou mais tinham acesso à rede (SILVEIRA; ALVARENGA, 2021). Tais dados demonstraram que, quanto mais avançada a idade, menos acesso à Internet esse público menos jovem vem tendo, somando-se, por via de consequência, à camada de excluídos digitais.
Segundo a referida pesquisa, verificou-se o nível de instrução como outro fator que também influencia no acesso à Internet. Embora o uso da Internet esteja sendo impulsionado em segmentos de níveis de instrução mais baixos, em 2018, o percentual de pessoas que utilizaram a Internet foi de apenas 12,1% (doze vírgula um por cento) no nível sem instrução e de 55,5% (cinquenta e cinco vírgula cinco por cento) no fundamental incompleto (SILVEIRA; ALVARENGA, 2021). Já no nível superior incompleto, esse percentual atingiu 98,3% (noventa e oito vírgula três por cento). Assim, a maior parte dos excluídos digitais encontra-se nas classes com menor escolaridade (SILVEIRA; ALVARENGA, 2021).
A finalidade do acesso à Internet também foi investigada. O objetivo mais elevado do uso da Internet, com percentual de 95,7% (noventa e cinco vírgula sete por cento), era enviar ou receber mensagens de texto, de voz, ou imagens por aplicativos diferentes de e-mail; 88,1% (oitenta e oito vírgula um por cento) era direcionado a fazer chamadas de voz ou vídeo; e 86,1% (oitenta e seis vírgula um por cento), para assistir a vídeos (SILVEIRA; ALVARENGA, 2021). Portanto, de modo geral, até a população que tem acesso à Internet parece não estar tão familiarizada com o uso mais elaborado das ferramentas tecnológicas para outros fins, que não apenas trocar mensagens, fazer chamadas e assistir a vídeos.
Essa constatação tem impacto na exclusão digital da classe obreira, na medida em que os serviços prestados por teletrabalho tendem a exigir do trabalhador um manejo mais aprofundado da rede. Uma considerável parte da população não estava preparada para agir dessa forma, e isso continua mesmo diante da emergência pandêmica instaurada em 2020.
Como se vê, o mero fato de boa parte da população brasileira fazer uso de celular não implica dizer, por si só, que esta mesma população tenha acesso à Internet ou, ainda mais, que tenha condições de desempenhar seu trabalho com habilidade para operar os diversos recursos tecnológicos existentes.
Em suma, não basta ter um celular à mão; é preciso educação e inclusão digital, por várias frentes. Trabalhadores com menor proteção social, baixa escolaridade, de classes sociais com menor poder aquisitivo, que façam parte do meio rural, por exemplo, têm sido os mais afetados pelo progresso tecnológico. Por sua vez, empresários que não conseguiram se reinventar, com o uso de soluções tecnológicas irremediáveis, também adentraram o rol de exclusão.
Nesse quadro, percebe-se, portanto, que, apesar de estarmos vivendo na Era da Informação, ainda há muitos excluídos digitais, sejam eles empresários de certos ramos mais tradicionais de mercado, que não conseguiram acompanhar a velocidade do avanço tecnológico; sejam trabalhadores que dedicaram a vida profissional a tais ramos e se veem devorados pela veloz transformação eletrônica.
Analisando-se detidamente o rol de exclusão digital, os mais excluídos possivelmente são os não-alfabetizados digitais, isto é, os trabalhadores braçais, literalmente não-alfabetizados e sem quaisquer oportunidades de acesso, não só ao uso de tecnologia, como ao próprio conhecimento e treinamento de conceitos mais basilares da informática.
Há também os reféns tecnológicos, que são aqueles profissionais que até possuem certa qualificação intelectual, mas ainda cultivam um certo bloqueio para o mundo digital ou, mesmo fazendo uso deste, não detêm um conhecimento tecnológico aprofundado. Utilizam as redes sociais, mas não sabem criar minimamente um conteúdo digital ou desconhecem os riscos de invasão de privacidade, os perigos à sua segurança pessoal ou familiar. Podem, inclusive, tornarem-se reféns dos algoritmos, distanciando-se da vida real para se robotizarem no mundo virtual, sem a noção exata dos malefícios que existem, em que pesem os benefícios.
Relevam-se outra espécie de reféns tecnológicos, quais sejam, os profissionais que já entram no rol dos improdutivos, não pela ausência de uso das tecnologias digitais, mas pelo excesso deste, o que chega a acarretar distração e dispersão, a ponto de os dominarem. Tal fator gera desperdício de tempo com navegações inúteis ou desconexas com a sua necessidade de produtividade ou evolução pessoal e profissional.
Como se verifica, essa velocidade da tecnologia no mundo atual traz vantagens e desvantagens. É inegável o valor do aprendizado digital que boa parte de empresas e trabalhadores têm adquirido para criarem alternativas tecnológicas rápidas e criativas de continuidade dos serviços. Sem a pressão pandêmica, essas alternativas certamente levariam anos para serem implementadas.
Por outro lado, há uma gama de prejuízos psicológicos para a saúde mental do ser humano, que corre o risco de tornar-se um dependente digital, pela estratégia comercial perversa dos algoritmos; ou tornar-se um inseguro digital, diante da destruidora sensação de estar sempre atrasado na corrida pelo conhecimento tecnológico em virtude do volume de informações. Esses fatores, sem dúvida, são potenciais desencadeadores de doenças de ordem psíquica, tais como ansiedade, depressão e síndrome de burnout.
Outrossim, destacam-se as soluções tecnológicas recorrentes no ramo do comércio. A transformação de lojas físicas para e-commerces, embora tenha auxiliado as empresas na continuidade de seus negócios, por outro lado, têm implicado, muitas vezes, a dispensa de parte de seus empregados, acarretando mais desemprego.
De igual modo, é indubitável que o teletrabalho tem sido a válvula de escape mais utilizada para a continuidade de serviços de trabalhadores mais qualificados, entretanto, não socorre aqueles com menor qualificação, muitos dos quais acabaram perdendo seus empregos, por não terem como se encaixar nas novas realidades digitais.
É evidente, destarte, a dualidade entre pontos positivos e negativos dos crescentes impulsos tecnológicos da Revolução 4.0. Portanto, torna-se indispensável a atenção de políticas públicas e de toda a sociedade quanto à prática de ações que contribuam para que o desenvolvimento da tecnologia não acentue ainda mais as desigualdades sociais.
4 PARA O FUTURO: SOCIEDADE 5.0
Não obstante se vivenciar a Era da Revolução 4.0, desde 2016, com o lançamento, pelo governo japonês, do 5º (quinto) Plano Básico de Ciência e Tecnologia, que traça políticas públicas a serem implementadas até 2021, o Japão inaugurou o conceito de Sociedade 5.0, já aspirando, para um futuro bem próximo, uma evolução tecnológica de braços dados com avanços sociais.
De acordo com referido documento, a Sociedade 5.0 foi conceituada como “sociedade centrada no homem, no qual equilibra avanços econômicos e sociais em um sistema que integra ciberespaço e espaço físico, como smart homes, tecnologias vestíveis, mobilidade autônoma, assistentes digitais, energia inteligente, entre outros” (AMARAL, 2018, online).
Na Revolução Industrial, o desenvolvimento das máquinas sujeitava o homem a condições miseráveis para produzir mais; já na Revolução 5.0, o foco deverá ser o de utilizar a tecnologia de forma integrativa, para que a humanidade possa viver melhor, com mais tempo e mais qualidade de vida, com maior inclusão social e maior ganho em sustentabilidade.
Com efeito, estima-se que a Revolução 5.0 terá o objetivo primordial de facilitar a vida dos seres humanos; os sistemas inteligentes funcionarão não como inimigos ou competidores da força de trabalho do homem, mas como aliados, na busca de soluções de problemas essenciais da coletividade e do planeta, tais como, prevenção e redução de desastres naturais, criação de vias de consumo consciente, busca do retardo no envelhecimento da população, aumento da segurança pública e privada e redução das desigualdades sociais, reconstrução de cidades para smart cities (cidades inteligentes). Tudo de forma sustentável.
Se, hoje, lamentavelmente, o homem ainda é encarado como produto das redes sociais, com a Sociedade 5.0 almeja-se que, finalmente, o ser humano e a biodiversidade sejam colocados, de forma harmoniosa, no centro do desenvolvimento tecnológico, econômico e social. Todas essas conjecturas sobre o futuro nos remetem, contudo, ao que já dizia Mujica (HUMAN, [2016?], online)[8]:
A forma como vivemos e nossos valores são a expressão da sociedade na qual vivemos. E a gente se agarra a isso. Não digo isso agora por ser presidente. Pensei muito sobre isso. Passei mais de dez anos na solitária. Tive tempo... Em sete anos nem sequer li um livro. Tive muito tempo para pensar. E descobri o seguinte: Ou você é feliz com pouco, com pouca bagagem, porque a felicidade está dentro de você, ou não consegue nada. Isso não é uma apologia à pobreza, mas à sobriedade. Só que inventamos uma sociedade de consumo, e a economia tem que crescer, porque se não crescer, acontece uma tragédia. Inventamos uma montanha de consumos supérfluos. Compra-se e descarta-se, mas o que se gasta é tempo de vida. Quando compramos algo, não pagamos com dinheiro. Pagamos o com tempo de vida que tivemos que gastar para ter aquele dinheiro. Mas tem um detalhe: tudo se compra, menos a vida. A vida se gasta. E é lamentável desperdiçar a vida para perder a liberdade.
Ousa-se especular que essa filosofia provavelmente seja a principal conscientização a ser seguida pela humanidade rumo à Revolução 5.0, em prol de uma desconstrução da atual sociedade do consumo para uma sociedade inteligente. Esta, por sua vez, deverá conjugar tecnologia e sobriedade; os seres humanos não serão só consumidores, mas cidadãos, na melhor concepção e no mais alto grau evolutivo da palavra, para alcançar maior qualidade de vida e sustentabilidade para o planeta.
Até adentrar à Revolução 5.0, faz-se mister que o bem-estar individual do ser humano seja preservado. À medida que o homem adquire volumosos conhecimentos e informações, também deve preparar mente e saúde para enfrentar e saber lidar com o mundo virtual, sem adoecimento, não se deixando ser devorado pelas interatividades virtuais, a ponto de distanciar se das relações interpessoais presenciais.
O filme-documentário “O Dilema das Redes” retrata bem esses riscos. Há uma frase bastante marcante neste filme que diz: “Se você não paga pelo produto, o produto é você” (O DILEMA DAS REDES, 2020, online).
Com o surgimento da Pandemia do Coronavírus (COVID-19), houve uma rápida inserção no mundo digital, até mesmo como forma de interação social, uma vez que o contato pessoal foi restringido por questões sanitárias. Nesse sentido, constata-se que as gerações Y[9] e Z[10] têm mais facilidade de apreensão do conhecimento e mais intimidade com o universo da automação, em contrapartida, tendem a desenvolver uma postura de imediatismo, com ritmo acelerado de pensamento.
As consequências adversas podem ser inúmeras, entre elas, a dificuldade de passar por processos que requeiram o ato de esperar o tempo de cada etapa, a dificuldade de lidar com frustrações, a dificuldade de autoaceitação pela comparação com o mundo superficialmente perfeito das redes sociais ou a melancolia da solidão ocasionada pelo hiperfoco em uma tela. Contudo, tais fatores também podem ser encontrados nas gerações passadas.
Contudo, o homem inserido nas redes não é peculiaridade das gerações Y e Z. De modo geral, os das gerações passadas também estão assim. E nesse ponto me faz lembrar uma orientação muito interessante da psicopedagoga Isa Minatel (2020, online), sobre as crianças e “O Dilema das Redes”, para adultos hiperconectados, quando interpelados por seus filhos: “Se uma criança te chama, é ela quem está te salvando, e não o contrário.”.
A sociedade, embora precise de lazer, entretenimento, conhecimento e informação, deve levar isso de forma saudável, aprendendo a limitar o tempo de uso, a selecionar conteúdos que realmente possam trazer alguma sensação prazerosa. A organização das redes também precisa começar a se organizar de forma ética nesse sentido.
Isso não significa dizer, entretanto, que não se deva olhar a evolução tecnológica de forma maniqueísta. A atenção se direciona para que não nos transformemos em meros produtos, na mesma proporção do que ocorreu na Primeira e Segunda Revoluções Industriais, respectivamente, quanto ao ser humano como mero apêndice de máquina.
Torna-se premente a existência de regulações éticas das redes sociais, sejam no retorno claro quanto ao domínio de nossos dados pessoais, sejam para a valorização, e não para a exploração do ser humano no mundo virtual, tanto no âmbito do trabalho digital, como em geral. A LGPD, Lei 13.709/2018, promete ser um valioso instrumento de proteção social nesse ponto.
Diante de todo esse contexto, espera-se que, no caminho rumo à Sociedade 5.0, a visão sistêmica que começa a se difundir no seio da humanidade, venha a integrar economia, trabalho, lazer, família e saúde mental, em uma harmoniosa equação. Fórmula vital essa, que o homem segue, buscando encontrar, ao longo das eras.
CONCLUSÃO
A história do trabalho é uma história de múltiplos sentidos: luta, sobrevivência, propósito, ideal, esforço, prazer, realização, inserção social, honra, dignidade. Em uma boa observação, percebe-se que em tudo há trabalho. Um simples gesto de lavar as mãos, caminhar pelas ruas ou acender uma luz envolve alguém — muitas vezes invisibilizado — que trabalhou para fabricar o sabão e o calçamento, ou fazer a água e a energia elétrica chegarem até nós.
O trabalho sempre esteve presente e assim estará; não de forma estática, mas dinâmica, recriando-se e passando por transformações juntamente à humanidade. Nessa toada, cada Revolução Industrial, conforme relatado na história, revela uma etapa de transformação do trabalho e sua intrínseca relação com as descobertas de novos meios de produção.
Examinou-se que a Primeira Revolução Industrial representou os primórdios da automação mecânica, tendo como marco o surgimento das primeiras máquinas hidráulicas e a vapor; A Segunda Revolução Industrial inaugurou o início da era do petróleo, com o uso da energia elétrica, do motor de indução e da linha de montagem; A Terceira Revolução Industrial, por sua vez, destacou-se pela introdução dos processos computadorizados, pelo uso da eletrônica e pela automação a caminho da robótica.
Dando continuidade, a Quarta Revolução Industrial traz descobertas relativas a IA, big data, fábricas inteligentes, IOT, dentre outros. Para o futuro, anuncia-se a Sociedade 5.0, prenunciando uma mudança de paradigmas, em que se aprenderá a deslocar o foco dos interesses econômicos para o homem em si, fazendo uso da tecnologia em prol da evolução e da sustentabilidade.
O fato de as Revoluções Industriais estarem historicamente catalogadas no tempo não quer dizer que no mundo, atualmente, não convivam todos os sistemas de produção, pois ainda existem lugares com patamar equivalente ao da Segunda Revolução Industrial, em que o desenvolvimento tecnológico mais basilar sequer chegou. Infelizmente, situações de trabalho escravo ainda são detectadas, mesmo em países em desenvolvimento e com introdução de tecnologia, como é o caso do Brasil.
A Era da Informação, referente à Revolução 4.0, trouxe muitas inovações tecnológicas disruptivas que se tornam cada vez mais factíveis, entretanto, a reflexão gira em torno da adaptação a essa nova realidade. Esta não somente se refere a investimentos em prol do desenvolvimento científico, mas também passa por uma necessária evolução sistêmica do ser humano, tanto no aspecto coletivo, como no interpessoal.
Nesse sentido, coletivamente, é imprescindível que sejam desenvolvidas políticas públicas assecuratórias de capacitação do trabalhador para atuar no mercado digital, além de medidas de proteção da empregabilidade, contra o pseudo-empreendedorismo e a informalização do trabalho, a fim de evitar que o crescimento tecnológico célere e desordenado acarrete o aumento do desemprego. Esta circunstância pode atropelar classes sociais mais baixas e com menos acesso aos conhecimentos e recursos informatizados.
Quanto à prenunciada Revolução 5.0, tem-se que trabalho e capital só andarão de mãos dadas, quando se compreender que esses dois elementos essenciais da subsistência humana não devem ser inseridos em guerra de tensões, mas ser entendidos como institutos integrados e mutuamente cooperativos, para uma existência digna e harmoniosa da humanidade.
REFERÊNCIAS
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[1] Apesar de o termo “Revolução” passar uma ideia de movimento de transformação abrupta, vale esclarecer que em se tratando das Revoluções Industriais, deve-se compreender que, na verdade, tratam-se de processos graduais de mudança e, sob o ponto de vista histórico, que se processam em ritmo relativamente lento e, não necessariamente, uniformes em todos os países, ao longo de anos.
[2] Modo de organização do processo produtivo, também conhecido como gerenciamento científico, criado por Frederick Winslow Taylor (1856-1915), no final do século XIX, que visava a otimizar as tarefas desempenhadas nas empresas e aumentar a produtividade em menor tempo possível, basicamente por meio da padronização do trabalho, intensificação da divisão do trabalho e supervisão do trabalho pelos gerentes (HARVEY, 2008).
[3] Mão invisível é um conceito criado pelo filósofo e economista Adam Smith, em seu livro A Riqueza das Nações, publicado em 1776. Segundo o conceito da mão invisível, o mercado livre se autorregularia, sem a necessidade da intervenção do Estado.
[4] A propósito, essa dinâmica de distribuição das fábricas deu ensejo ao Global Sourcing, atual estratégia empresarial de terceirização de partes da produção, por meio da aquisição de bens e serviços de outros países, onde existam fatores economicamente mais vantajosos para a empresa contratante, tais como alta produtividade, com baixos custos de produção, decorrentes de salários muito baixos à classe trabalhadora desses outros países (PINTO, 2012). O dilema dessa prática globalizada é que, por um lado, esta tende a gerar ganhos à empresa que contrata, mas, por outro, acarreta perda de empregos no país de origem e, consequentemente, piora nos padrões de vida da população, além de redução da competitividade nacional, sem contar a possibilidade de indiferença e falta de compromisso da empresa multinacional ao respeito, por parte da empresa terceirizada, às garantias de proteção trabalhista, social e ambiental com que foi produzido ou prestado aquele bem ou serviço correspondente à parte da produção contratada, por meio de tal modalidade de terceirização.
[5] A alienação aqui referida é no sentido de que o trabalhador não tinha espaço para implementar sua criatividade e sofria o desânimo em não poder participar do resultado final da concepção do produto fabricado.por profissionais qualificados, multifuncionais e dotados de criatividade, que pudessem atender às novas expectativas do mercado capitalista
[6] Cf. Deep Shift – Technology Tipping Points and Societal Impact, Global Agenda Council on the Future of Software and Society, Fórum Econômico Mundial, set. 2015.
[7] Biomimetismo é uma engenharia inspirada biologicamente, mediante o estudo e a imitação das melhores ideias já existentes na natureza e adaptada à resolução dos desafios humanos (ARPINI, 2020).
[8] José Mujica, apelidado de Pepe Mujica, foi presidente do Uruguai de 2010 a 2015. Ex-guerrilheiro dos Tupamaros, entre os anos 60-70, foi preso como refém pela ditadura entre 1973 e 1985. Ele prega uma filosofia de vida em torno da sobriedade: aprender a viver com o que é necessário e o que é justo.
[9] A geração Y consiste em um conceito sociológico que abrange os jovens nascidos no começo da década de 1980 a meados da década de 1990, chamados millennials, sendo uma camada da sociedade movida à tecnologia e inovação, com tendência ao consumo e com perfil profissional criativo e inovador (TUDDA; PADULA, 2019).
[10]A geração Z refere-se aos jovens nascidos entre 1995 e 2015, em um contexto tecnológico mais avançado, chamados centennials e são tidos como nativos digitais, ainda mais que os Ys, bem como desprendidos, empreendedores e aptos a multitarefas (TUDDA; PADULA, 2019).
Juíza do Trabalho do Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região. Pós-graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho e em Mediação e Práticas Sistêmicas Restaurativas pela FACET. Pós-graduanda em Direito Previdenciário e em Psicanálise pela FACET. Mestranda em Direito e Gestão de Conflitos pela UNIFOR. Ex-Promotora de Justiça do MP/CE. Pós-graduada em Direito Processual Penal pela UNIFOR.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ALMEIDA, DAIANA GOMES. O Trabalho ao Longo das Eras Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 jun 2021, 04:54. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Monografias-TCC-Teses-E-Book/56873/o-trabalho-ao-longo-das-eras. Acesso em: 11 out 2024.
Por: Daniela Peixoto Nogueira
Por: Valdiléia Maria Alves Florêncio
Por: Vanessa de Assis Ferreira
Por: Vinicius Gama Toffoli de Oliveira
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