A primeira estruturação do Estado, do Direito e da Justiça aconteceu (desde que nos seja permitido fazer um discricionário corte histórico) no século XVII, que foi o século (tanto na Europa continental como no Brasil) do Estado absoluto (Estado sob o regime da força – Machtstaat). No século XVIII reinou (de forma pura, de forma bruta) o Estado de Polícia (Polizeistaat, ou seja: o regime do despotismo ilustrado).
Contra esses tirânicos modelos de Estado nasceu (no século XIX) o Estado de Direito legal ou legalista (que constitui a primeira onda evolutiva do Estado, do Direito e da Justiça). Durou cerca de cento e cinqüenta anos (na Europa continental) e passou por várias mutações (Estado liberal de Direito, Estado social de Direito e Estado democrático de Direito).
Em meados do século XX surgiu a segunda onda evolutiva do Estado, ou seja, o chamado Estado de Direito constitucional (depois da Segunda Guerra Mundial).[1] Os modelos anteriores (liberal, social e democrático) não se desvencilharam do legalismo. A partir da Segunda Guerra mundial houve uma mudança de paradigma: assim surgiu o constitucionalismo (ou neoconstitucionalismo).
Paralelamente, a partir dessa mesma época, foi se desenvolvendo (e se fortificando) a terceira onda, isto é, o Estado de Direito internacional (três foram as formas de atuação desse Direito internacional: regional, comunitária e global). No final do século XX e princípio do século XXI apareceram os sinais mais contundentes da quarta onda, é dizer, do Estado de Direito global (que tem no Tribunal Penal Internacional um dos seus marcos cardeais).
Vivemos (não é difícil notar) um momento de turbulenta transição (e mutação). O mais chocante: na quase totalidade dos meios acadêmicos ainda se ensina o antigo Direito do Estado de Direito legalista (ou seja: o Direito da primeira onda, que é conhecida como a era ou a onda das codificações). Mas o Estado, o Direito e a Justiça (desde essa época) experimentaram profundas evoluções. Nem bem captamos a era da constitucionalização (segunda onda, também chamada de neoconstitucionalismo) e já estamos não só ingressando no Estado de Direito internacional (terceira onda) senão também já vislumbrando as primeiras movimentações da quarta onda, constituída pelo Estado de Direito global.
Na terceira onda o Brasil ingressou no dia 03.12.08, ocasião em que o Pleno do STF, por nove votos a zero, admitiu que os tratados internacionais de direitos humanos possuem valor superior à lei ordinária. Havia duas correntes: (a) a do Min. Gilmar Mendes, que sustenta a supralegalidade dos tratados; (b) a do Min. Celso de Mello que admitia a constitucionalidade desses tratados. Por cinco votos a quatro venceu, por ora, a primeira corrente (cf. RE 466.343-SP e HC 87.585-TO).
O Estado de Direito global, por seu turno, vem ganhando força e reconhecimento a cada dia. Muitos são os Tribunais internacionais que fazem parte da chamada Justiça global. Dentre eles destacam-se: o Tribunal Internacional de Justiça da ONU, o TPI (Tribunal Penal Internacional) e os tribunais (ad hoc) da ONU para julgamento de crimes específicos. O TPI, de todos, hoje é o mais famoso (em razão da sua independência).
Eis a metáfora: são muitas e variadas as causas do calamitoso insucesso que os estudantes de direito estão protagonizando nos exames da ordem dos advogados do Brasil (só 19% de aprovação nacional). Dentre elas destaca-se a seguinte: durante a faculdade muitas vezes ensina-se a jogar basquete, mas na hora da partida decisiva o juiz informa que o jogo é de futebol. Quem aprendeu usar as mãos não sabe jogar com os pés. Aprende-se o direito legalista (dos códigos). Na hora agá do aluno o que se exige é um raciocínio mais complexo, que envolve o Estado de Direito constitucional, internacional e global. Essa é uma das razões dos resultados calamitosos no exame de ordem, concursos, vida prática etc.
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