A SENTENÇA
A 2ª Vara Criminal da Justiça Federal do Rio de Janeiro, em decisão prolatada em 19 de fevereiro do corrente ano, condenou o ex-ativista italiano Cesare Battisti a dois (2) anos de prisão, “em regime aberto”, por ter entrado no Brasil com passaporte falso.
O juiz Rodolfo Kronemberg Hartmann, prolator da sentença, disse que foi aplicada a pena mínima por não conter "informações nos autos sobre antecedentes criminais do réu no Brasil". A pena, no entanto, foi substituída pela prestação de serviços comunitários e pelo pagamento de 10 salários mínimos a uma entidade de assistência social a ser apontada pela Justiça.
DA NULIDADE DO PROCESSO
O senhor Cesare Battisti é cidadão de nacionalidade italiana, foragido da justiça de seu país, que - por encomenda, a não ser que as evidências sejam traidoras - aqui se encontra de há muito homiziado (quando livre acobertado por autoridades; depois de preso não lhe faltaram nem faltam a solidariedade e os afagos dessas mesmas autoridades). É, pois, esse senhor estrangeiro e como tal sua situação no Brasil deve ser analisada à luz da lei especialmente criada para regular a presença de não nacionais no território brasileiro, qual seja, a Lei nº 6.815/80 – O Estatuto do Estrangeiro.
Nem de longe nos passa a idéia de que a sentença proferida pelo ilustrado juiz da 2ª Vara Criminal da Justiça Federal do Rio de Janeiro tenha sido encomendada. Mas não podemos deixar de dizer que nos intriga mais esse desacerto de nossa justiça frente ao caso do senhor Cesare Battisti. Primeiro foi o STF, se envolvendo num injustificado imbróglio, ao sinalizar que no acórdão a ser proferido no processo extraditório desse senhor ficará consignado que sua extradição ficará ao bel-prazer do Presidente da República; agora essa sentença maculada pela nulidade.
Diz o parágrafo único do art. 65 da Lei nº 6.815/80: “É passível, também, de expulsão o estrangeiro que: a) praticar fraude a fim de obter a sua entrada ou permanência no Brasil; ...” (grifo nosso).
A conduta infracional comprovada e atribuída ao senhor Cesare Battisti está, justamente, tipificada no parágrafo único, letra “a” do art. 65, qual seja, adentrar no território nacional fazendo uso de passaporte fraudulento. E a medida cominada, especialmente, para essa infração é a expulsão, para o que não carece de pronunciamento judicial a respeito. A apreciação de fraude cometida por estrangeiro a fim de obter sua entrada ou permanência no Brasil foge à competência do judiciário. O procedimento é exclusiva e marcantemente administrativo, resolvido na esfera do Governo Federal -Ministério da Justiça e Presidência da República. O Ministro da Justiça, “ex-officio” ou por provocação, determina à Polícia Federal a abertura de inquérito (Art. 70. “Compete ao Ministro da Justiça, de ofício ou acolhendo solicitação fundamentada, determinar a instauração de inquérito para a expulsão do estrangeiro”). Instruído, o inquérito será enviado com relatório conclusivo ao Diretor Geral da Polícia Federal que, por sua vez, exarando seu parecer, o encaminhará ao Ministro da Justiça para, no caso de ter sido verificado motivo autorizador da expulsão, submeter o processado à apreciação do Presidente da República para que decida sobre a conveniência e oportunidade, ou não, da retirada do paciente do território nacional. Isto é o que se depreende da leitura dos arts. 103, § 8º, (“Encerrada a instrução do inquérito, deverá ser este remetido ao Departamento Federal de Justiça, no prazo de doze dias, acompanhado de relatório conclusivo”) e 105 (“Recebido o inquérito, será este anexado ao processo respectivo, devendo o Departamento Federal de Justiça encaminhá-lo com parecer ao Ministro da Justiça, que o submeterá à decisão do Presidente da República, quando for o caso”) do Decreto nº 86.715/81 – Regulamento da Lei nº 6.815/80. E o art. 66 da Lei nº 6.815/80 diz:: “Caberá exclusivamente ao Presidente da República resolver sobre a conveniência e a oportunidade da expulsão ou de sua revogação” (grifo nosso).
Tratando-se, pois, de fraude praticada por estrangeiro a fim de obter a sua entrada ou permanência no Brasil falece competência ao Poder Judiciário para conhecer da matéria, uma vez que a lei atribui tão somente ao Presidente da República competência para desse delito conhecer e decidir – decisão que se limita à expulsão ou não do estrangeiro infrator -, razão por que o processado perante o juízo da 2ª Vara Criminal Federal do Rio de Janeiro é nulo de pleno direito.
INDUÇÃO A ERRO
Como antes dito, recusamos veementemente acreditar que o ilustrado magistrado prolator da decisão objeto da presente crítica conheceu o processo por encomenda, por entabulamento com pessoas interessadas na permanência do senhor Cesare Battisti no território nacional. Preferimos acreditar que o ilustre magistrado foi induzido a erro.
Infelizmente, não podemos sonegar que o ex-ministro da Justiça do Brasil, Tarso Genro, de há muito vem demonstrando público e notório interesse em manter esse senhor aqui homiziado. Chegou a tentar aqui mantê-lo sob abrigo de asilo político, que, por flagrantemente ilegal, foi tornado sem efeito.
Ora, o ex-ministro é bacharel em Direito e em sua biografia é retratado como jurista. Presume-se, pois, que sabia ele que o inquérito que apurou a falsidade do passaporte de que se valia o investigado não deveria ser remetido à Justiça Federal, mas, sim, ao Presidente da República. Não nos resta dúvida: “jogou o barro na parede e colou”.
As maquinações do ex-ministro Tarso Genro causaram confusões nas cabeças dos ministros do STF - um órgão colegiado, composto, presume-se, da elite da cultura jurídica nacional – quando do julgamento do processo extraditório do “condenado”. Portanto, não é de se admirar que o juiz da 2ª Vara Criminal Federal do Rio de Janeiro, tenha se deixado envolver por suas convenientes e descabidas interpretações da legislação brasileira, o que o levou a incorrer no erro de não se reconhecer incompetente para conhecer do processado. E esse erro acabou por lhe propiciar o cometimento de outro mais grave, qual seja, se valer do Código Penal para tipificar o delito cometido pelo “condenado”, quando, por ser ele estrangeiro, a tipificação de sua censurável conduta encontra-se agasalhada em dispositivo especial de legislação também especial, à qual, por si só, o Estado brasileiro não reage com pena privativa de liberdade, mas, sim, com a expulsão do território nacional – parágrafo único, letra “a”, do art. 65 da Lei nº 6.815/80 – Estatuto do Estrangeiro.
UMA SUBESTIMAÇÃO À INTELIGÊNCIA
Não nos causará admiração se algum leitor desta peça achar que as menções que fazemos ao ex-ministro Tarso Genro são impertinentes a um articulado que se propõe tratar do tema ora em apreço sob uma visão jurídica. Salientamos: não temos nada de pessoal contra o ex-ministro; somos apartidários; não votamos (nem mesmo pra síndico).
Sabe-se, o ministro Tarso Genro, seja lá por que motivo for, é um dos maiores interessados na permanência do “condenado” no território nacional. Divulgada a decisão nada mais nada menos do que o ex-ministro da Justiça foi o primeiro a se vangloriar do resultado do julgamento: “com a condenação, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode decidir por deixar que Battisti cumpra no Brasil a pena, que envolve serviços comunitários e o pagamento de multa de dez salários mínimos (R$ 5,1 mil), para só então ordenar a extradição do ex-ativista para a Itália. Como o mandato de Lula termina no dia 31 de dezembro, o impasse sobre extraditar ou não Battisti para a Itália seria do seu sucessor” (v. globo.com – 05/03/10 – 16h28).
Não se trata de conjetura leviana, irresponsável. As evidências não nos levam a outra conclusão. Tudo nos leva a crer que se tratou de uma indução a erro por má-fé. O inquérito, como manda lei, deve ter sido remetido pela Polícia Federal do Rio de Janeiro ao diretor geral da Instituição acompanhado de relatório que concluiu que o senhor Cesare Batista cometeu a infração tipificada no parágrafo único, letra “a”, do art. 65 da Lei nº 6.815/50. O processo só pode ter chegado até a 2ª Vara Criminal da Justiça Federal do Rio de Janeiro para julgamento do delito apurado no inquérito, qual seja, portar passaporte fraudulento para no Brasil permanecer.
Conclui-se, pois, que o ex-ministro da Justiça recebeu do diretor geral da Polícia Federal o processo, acompanhado do inquérito, com parecer reconhecendo o cometimento de fraude pelo senhor Cesare Battisti para aqui permanecer. Insistimos, o senhor ex-ministro Tarso Genro é bacharel em Direito; e mais, é um jurista. Outrossim, com toda certeza, não foi o primeiro processo de expulsão de estrangeiro por portar passaporte falso que ele se deparou durante o tempo em que esteve à frente da Pasta da Justiça. Pergunta-se: por que ele encaminhou o processo para Justiça Federal quando deveria submetê-lo à apreciação do Presidente da República?
“É querer fazer dos demais bestas”, idiotas. O senhor ex-ministro da Justiça, quando titular da Pasta, por diversas vezes subestimou a inteligência dos brasileiros, especialmente dos operadores do Direito, e mais flagrantemente nesse caso do senhor Cesare Battisti. Tentou a todos fazer crer que o asilo político por si concedido era legal, quando já havia um processo extraditório em andamento – o que, felizmente, não prosperou; depois, através de convenientes manifestações, incutindo na cabeça de alguns juízes-ministros a falsa idéia de que, concedida a extradição pelo o STF, a entrega do paciente-reclamado ficaria a critério do Presidente da República; e, agora, querendo convencer a todos de que a condenação em processo cristalinamente nulo inviabiliza a imediata extradição do senhor Cesare Battisti.
Até quando a comunidade jurídica nacional – nós não, somos um “zé ninguém” nesse universo, não temos autoridade intelectual para tanto -, os expoentes das letras jurídicas do Brasil, vai continuar ouvindo impropérios como os proferidos pelo ex-ministro Tarso Genro sem rechaçá-los com a rispidez merecida?
DELITO DIFERENCIADO
Sobejam evidências de que a fraude cometida por estrangeiros a fim de obter a sua entrada ou permanência no Brasil é delito a ser tratado de forma diferenciada dos demais por eles, estrangeiros, cometidos no território nacional. Senão vejamos:
o art. 65 da Lei 6.815/80 reza: “É passível de expulsão o estrangeiro que, de qualquer forma, atentar contra a segurança nacional, a ordem política ou social, a tranqüilidade ou moralidade pública e a economia popular, ou cujo procedimento o torne nocivo à conveniência e aos interesses nacionais”;
O art. 104 do Decreto nº 86.715/81 sentencia: “Nos casos de infração contra a segurança nacional, a ordem política ou social e a economia popular, assim como nos casos de comércio, posse ou facilitação de uso indevido de substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, ou de desrespeito a proibição especialmente prevista em lei para estrangeiro, o inquérito será sumário e não excederá o prazo de quinze dias, assegurado ao expulsando o procedimento previsto no artigo anterior, reduzidos os prazos à metade”;
Não se pode, pois, fugir à conclusão de que, cometendo o estrangeiro qualquer dos delitos discriminados nesses dispositivos, se sujeitará a inquérito para a apuração do fato bastante diferente daquele previsto para apuração de fraude para obter entrada ou permanência no Brasil. O inquérito para apurar o cometimento dessas infrações, embora observando o mesmo procedimento, é mais rigoroso, a começar pelos prazos a serem observados. São justamente nesses casos que, inevitavelmente, o inquérito tomará os rumos da Justiça Federal para que seja o indiciado submetido à legislação penal pátria, como acontece com qualquer nacional.
O art. 68 da Lei 6.815/80 e o art. 101 de seu regulamento reforçam esse entendimento: “Os órgãos do Ministério Público remeterão ao Ministério da Justiça, de ofício, até trinta dias após o trânsito em julgado, cópia da sentença condenatória de estrangeiro autor de crime doloso ou de qualquer crime contra a segurança nacional, a ordem política ou social, a economia popular, a moralidade ou a saúde pública, assim como da folha de antecedentes penais constantes dos autos” (grifos nossos). Do quanto neles contido, cristalino é que nesses delitos autorizadores da expulsão de estrangeiro e puníveis com pena privativa de liberdade, há, sim, a obrigatória intervenção do Judiciário. E é à vista de seu pronunciamento que o Presidente da República apreciará a conveniência e oportunidade de determinar a imediata retirada do expulsando do território nacional (Art. 66 da Lei nº 6.815/80: “Caberá exclusivamente ao Presidente da República resolver sobre a conveniência e a oportunidade da expulsão ou de sua revogação”) ou fazê-lo aqui cumprir a pena a si imposta, após o que, se conveniente e oportuno entender, decretar sua expulsão (Art. 67. idem: “Desde que conveniente ao interesse nacional, a expulsão do estrangeiro poderá efetivar-se, ainda que haja processo ou tenha ocorrido condenação”).
INEXEQUIBILIDADE DA SENTENÇA
À vista do quanto disposto no art. 89 da Lei nº 6.815/80 - “Quando o extraditando estiver sendo processado, ou tiver sido condenado, no Brasil, por crime punível com pena privativa de liberdade, a extradição será executada somente depois da conclusão do processo ou do cumprimento da pena, ressalvado, entretanto, o disposto no artigo 67” -, os simpatizantes do “condenado” vêem na decisão motivo para comemoração. Vêem-na como impeditivo para que, de imediato, seja o senhor Cesare Battisti extraditado. Nós, sinceramente, não vislumbramos na decisão motivação para os festejos. Pelo contrário; a decisão, que, voltamos a repetir, não acreditamos tenha sido prolatada com o propósito de agradar ou desagradar a quem quer que seja, não tem o condão almejado pelos aficionados do extraditando. Ela vai, justamente, de encontro ao desejo dessas pessoas que o querem aqui homiziado.
O “condenado” encontra-se preso desde março de 2007, por força de mandado do.STF, atendendo solicitação da justiça italiana, pela via de processo extradicional fundado em tratado de extradição que o Brasil mantém com aquela nação e que vigora desde o dia 1º de agosto de 1993.
Ledo engano dos simpatizantes do senhor Cesare Battisti. A sentença, nos estritos termos em que foi proferida, mesmo que tivesse sido prolatada por juiz competente, mesmo que o delito (cometer fraude para adentrar ou permanecer no território brasileiro) comportasse aplicação de pena privativa de liberdade, seria inexeqüível e, pois, inócua. A extradição concedida pelo Supremo Tribunal Federal é óbice ao cumprimento da pena “em regime aberto”. Senão vejamos. O art. 84 da Lei nº 6.815/80 está assim redigido: “Efetivada a prisão do extraditando (artigo 81), o pedido será encaminhado ao Supremo Tribunal Federal”. E o seu parágrafo único enfatiza: “A prisão perdurará até o julgamento final do Supremo Tribunal Federal, não sendo admitidas a liberdade vigiada, a prisão domiciliar, nem a prisão albergue” (grifo nosso). Ao estabelecer a inadmissão da liberdade vigiada, da prisão domiciliar e da prisão albergue outra não foi a intenção do legislador senão a de salvaguardar o processo extradicional; de evitar a fuga do extraditando, frustrando, assim, a pretensão da nação requerente. Ora, se o processo extradicional, na fase inicial, ainda pendente a apreciação dos pressupostos legais para a concessão da extradição, não admite a prisão em regime aberto, maiores razões existem para que, após concedida a extradição, não se admita a prisão “em regime aberto”.
INTERESSE NACIONAL
Quando do julgamento do processo de extradição, em face da infeliz decisão do STF de que extraditar ou não o senhor Cesare Battisti ficaria a critério do Presidente Lula, assim se manifestou o ministro Tarso Genro: “Ele tem que decidir em função dos interesses do país". Tendo em vista a euforia com que se exprimiu o ministro, só se pode concluir que estava ele atribuindo ao extraditando uma importância para o Brasil que até então a Nação brasileira desconhece. Seria hilariante se não estivessem envolvidos no processo a liberdade de um ser humano e a honradez da Nação brasileira. Não é nossa intenção zombar de quem quer que seja, especialmente do paciente-extraditando. Estamos verdadeiramente intrigados. Que importância seria essa? Sem o senhor Cesare Battisti aqui o “Pré-sal” não vai avante? O bolsa-família acabará? O PAC se transformará em frustração? A Petrobrás entrará em processo falimentar? A Copa do Mundo deixará de aqui se realizar? As Olimpíadas terão a mesma sorte da Copa? A doutora Dilma Rousseff não será eleita? O PT verá cair por terra sua pretensão de se perpetuar no poder?
Por maior esforço que façamos, não conseguimos vislumbrar a importância do senhor Cesare Battisti para os “interesses do País”. Pelo seu histórico, e principalmente pelos métodos por si usados para se contrapor a quem não comungava com sua ideologia, pode ser de grande importância sim, mas para os interesses do PT, especialmente como estrategista para a consecução dos claros objetivos do partido, que é a perpetuação no poder. Mas os interesses do Brasil não se confundem com os interesses do PT.
Em artigo anterior (Extradição – Lei nº 6.815/80 (A quem compete conceder a extradição?) acreditamos que deixamos claro que ao Senhor Presidente da República não cabe decidir nada no processo de extradição do senhor Cesare Battisti ou em qualquer outro processo extradicional. A decisão já foi proferida por quem de direito, ou seja, o Supremo Tribunal Federal, com a acuidade que ao caso merecia ser dispensada e, sobretudo, atendendo a interesse do Brasil, qual seja a salvaguarda da honradez da Nação brasileira, compromissada em Tratado-Lei de extradição firmado com a República Italiana. Certeza temos de que o STF se ateve tão-só à análise dos pressupostos que autorizaram a extradição requerida. Não foi a decisão prolatada em razão da pessoa e nem do ideário político do senhor Cesare Battisti. Como foi ele o reclamado poderia ser o senhor Silvio Berlusconi ou – perdoe-nos o sacrilégio - o Papa. Atendidos que fossem os pressupostos autorizadores da extradição, outra não poderia ser a decisão do STF que não a concessão da extradição. Cumprindo o Brasil o quanto obrigou-se, preservada estará sua honradez.
O senhor Cesare Battisti que siga sua sorte, que, espera-se, seja a melhor possível. Se entende que suas condenações foram injustas, que se valha da legislação de sua pátria para buscar as revisões dos julgados.
IMPERATIVIDADE DA EXTRADIÇÃO
Acreditamos que aqui deixamos sobejamente demonstrado que não há razão legal para o senhor Cesare Battisti no Brasil permanecer homiziado, devendo ser – recebido pelo Presidente da República o “acórdão” concedente da extradição, “o mandado de entrega”, prolatado pelo STF - incontinenti entregue à nação que o reclama.
Vale repetir a substância do art. 89 da Lei 6.815/80: “Quando o extraditando estiver sendo processado, ou tiver sido condenado, no Brasil, por crime punível com pena privativa de liberdade, a extradição será executada somente depois da conclusão do processo ou do cumprimento da pena, ressalvado, entretanto, o disposto no artigo 67”. Então vejamos:
- sua extradição foi concedida pelo STF, fundamentada em legal processo extradicional;
- não se encontra impediente para que não seja de imediato entregue à Itália, ou seja, “não está sendo processado” e tampouco foi condenado “por crime punível com pena privativa de liberdade” (art. 89 da Lei nº 6.815/80);
- o senhor Cesare Battisti, estrangeiro, quando preso portava passaporte fraudulento, infração legal prevista no Estatuto do Estrangeiro, cujo inquérito que a apurou deveria ser submetido à apreciação “exclusiva” (art. 66, idem) do Presidente da República que, conforme seu juízo, deveria decidir pela conveniência e oportunidade para “decretar sua expulsão” (art. 66, parágrafo único, idem), única medida prevista na lei específica para reprimir tal delito (art. 65, parágrafo único, letra “a”, idem);
- o inquérito que apurou a fraude, por “indução a erro” decorrente de “má-fé” (recusamos nos reconhecer hipócritas, imbecis), foi transformado em impróprio processo judicial que o condenou a pena privativa de liberdade, mas que, por estar flagrantemente maculado por nulidade absoluta, já que conhecido por quem não tem competência para tanto, não tem o condão de obstar sua entrega ao país que o reclama; nulo o processo, não é de se esperar que produza qualquer efeito;
- a sentença que o condenou, nos estritos termos em que foi proferida, mesmo que tivesse sido prolatada por juiz competente e mesmo que o delito (cometer fraude para adentrar ou permanecer no território brasileiro) comportasse aplicação de pena privativa de liberdade, seria inexeqüível e, pois, inócua;
- a extradição concedida pelo Supremo Tribunal Federal é óbice ao cumprimento da pena “em regime aberto” (art. 81, parágrafo único, idem); e,
- também, reclama essa providência o interesse nacional (art. 89, c/c art. 67, idem) uma vez que, mesmo admitindo-se a absurda hipótese do julgado condenatório a pena privativa de liberdade manter-se incólume, mas diante da impossibilidade de o réu cumpri-la em regime aberto, sua mantença no cárcere não se dará às expensas do ex-ministro Tarso Genro, nem do PT e muito menos do Presidente da República, mas sim do Tesouro Nacional, da Nação brasileira, por, no mínimo, dois anos, após o que, pouco provavelmente, será atendido o pleito da Itália.
ATÉ QUE A MORTE NOS SEPARE
“Mantendo-se incólume” o julgado proferido pelo ilustre juiz da 2ª Vara Criminal da Justiça Federal do Rio de Janeiro, consagrado estará o triunfo da malandragem sobre as letras da lei. Como linhas atrás dissemos, pouco provavelmente verá a Itália atendida sua pretensão. Prosperando esse julgado, ao senhor Cesare Battisti ficará facultada não só a fuga do Brasil, mas também a sua permanência no nosso convívio - “livre, leve e solto”. E a continuar a malandragem se sobrepondo à legislação pátria, não há como deixarmos de acreditar que as maquinações o levem a conosco conviver “até que a morte nos separe”. Não fugindo e, portanto, se determinando a aqui cumprir a pena, temos certeza de que, nas proximidades do seu termo final, cometerá pequeno delito punível com pena privativa de liberdade, passível de conversão em prestação de serviços comunitários, que, com o auxílio de manobras, certamente, servirá de fundamento à negação de sua entrega à Itália. E assim sucessivamente.
IRRESPONSABILIDADE DO STF
No nosso modesto trabalho retro mencionado manifestamos preocupação com a possibilidade de o Presidente da República vir a entender que a entrega do senhor Cesare Battisti à Itália dependeria de sua exclusiva vontade, principalmente em face da infeliz manifestação do Supremo Tribunal Federal quando, após o julgamento do processo extraditório que reconheceu a procedência do pleito da requerente, sinalizou que no acórdão constaria ressalva nesse sentido. Acreditamos que, nesse mesmo trabalho, desfizemos essa falsa idéia.
Mas nossa preocupação ultrapassou esse falso entendimento. Alcançou a possibilidade de o Presidente da República, vislumbrando a tempo que entrega do paciente não poderia ficar condicionada ao seu arbítrio, postergar ao máximo a entrega, para o que alertamos que assim procedendo poderia incidir em crime de responsabilidade.
O julgamento do processo extraditório do senhor Cesare Battisti ocorreu no dia 18 de novembro de 2009. Pois bem, se existe alguém a quem, até então, não se pode imputar culpa pelo fato de o senhor Cesare Battisti não ter sido entregue à Itália é o Presidente da República.
Ainda nesse nosso multicitado trabalho demonstramos a simplicidade do processo extradicional adotado pela legislação pátria. Registramos: ‘Resume-se no seguinte: a nação interessada requer a extradição; o STF, apreciando os pressupostos legais, concede ou não; e, o Governo, consubstanciado na decisão do Supremo, entrega o preso que está sob sua custódia ou o livra do constrangimento que lhe foi imposto (a prisão) em razão do pedido de extradição. Nada mais do que isto’.
Lá se vão mais de quatro (4) meses e, injustificadamente, o acórdão do julgamento não foi publicado. A inércia que esperávamos do Presidente da República é hoje de responsabilidade do Supremo Tribunal Federal e já beira a irresponsabilidade.
Enquanto isso o senhor Cesare Battisti é mantido às custas do Tesouro Nacional, da Nação brasileira.
Ubiratan Pires Ramos – OAB7.023BA.
Advogado/Auditor Fiscal do Trabalho, aposentado. Bel. em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RAMOS, Ubiratan Pires. Condenação de Cesare Battisti (Reflexo na sua extradição) Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 abr 2010, 08:56. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/19595/condenacao-de-cesare-battisti-reflexo-na-sua-extradicao. Acesso em: 30 nov 2024.
Por: RODRIGO PRESTES POLETTO
Por: LEONARDO RODRIGUES ARRUDA COELHO
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
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