Sumário: 1.1) A marca da inovação legislativa, 1.2) Opcionalidade da via cartorária, 1.3) Requisição por advogado, 1.4) Prazo para a abertura do processo de inventário e partilha, 1.5) Conclusão, 1.6) Bibliografia.
Introdução.
Anos e anos se passam com processos insolúveis na Justiça, o que a aumenta a descrença da população de uma “ Justiça” efetiva. Com vista a desburocratizá-la e facilitar a vida do cidadão, o legislador criou a Lei 11.441 no ano de 2007, possibilitando que alguns deslindes possam ser solucionados, com maior presteza, pelos cartórios extrajudiciais. Mais uma opção a cargo do indivíduo.
1.1)A marca da inovação legislativa no cenário jurídico.
As relações familiares, hoje, podem e devem ser resolvidas em seara cartorária. A Lei 11.441/2007 trouxe significativas modificações aos artigos 982, 983 e 1.031, caput, todos do Código de Processo Civil (CPC). Optamos, ao invés de redigirmos um quadro comparativo sobre o tema, abordarmos, em tópicos, o que a mudança trouxe de diferente ao cenário jurídico. O mais importante a ser dito é o seguinte: A proposição legislativa visa deslocar, em parte, a atividade jurisdicional para a atividade notarial. Tivemos, pois, uma permissão legal para a realização de divórcio e separações consensuais, bem como inventário e partilha por escritura pública - quando todos os interessados forem capazes e concordes, o que até então só encontrava guarida em via judicial.
Exige, no entanto, que haja concordância entre todos os envolvidos, para que o inventário e a partilha sejam realizados por essa via. De toda sorte, não restou abolido o procedimento por via judicial - em havendo testamento ou interessado incapaz.
No que toca as separações consensuais, resta-nos a pergunta que não quer calar: as mesmas ainda subsistem, mesmo após o advento da Emenda Constitucional 66, do ano de 2010?
A resposta afirmativa se impõe. Até a respectiva emenda, o instituto da separação extrajudicial se dava após o lapso temporal de 1 ano da realização do matrimonio, via escritura pública. O mesmo lapso temporal exigido para a conversão da separação em divórcio, bem como para a separação de corpos.
Com o advento da Emenda Constitucional 66 de 2010 não há mais que se falar em prazo como requisito para o instituto do divórcio, não mais figurando como requisito a separação ( judicial ou extrajudicial pelo período de 1 ano).
Uma coisa é uma coisa. Outra coisa é outra coisa. Na atualidade, o divórcio independe de prazo, mas isso, por si só, não implica na extinção do instituto da separação judicial em face da magnitude social da mesma. Assim, a possibilidade de reconciliação do casal ainda é juridicamente possível. Não se mostra razoável a alegação de falta de interesse de agir ( condição da ação), tendo em vista que apenas o divórcio tem o condão de extinguir o vínculo matrimonial.
Parece despicienda tal afirmação, mas não o é. Os relacionamentos afetivos estão cada vez mais complexos e as pessoas têm cada vez menos certezas se amam ou não. Muitas vezes só o tempo é capaz de clarear os sentimentos.
Ressaltamos que a via extrajudicial não elimina a possibilidade de se recorrer ao Judiciário, conforme previsão legal atinente. Repise-se: A adoção desse procedimento cartorário é válida para os casos que não envolvam interesses de menores e incapazes (no inventário) e consensualidade ( nas separações e divórcios).
Importante se faz salientarmos que a mudança proposta representará um grande passo para descongestionar a atividade “ burocrática” do Estado, tanto no campo das sucessões, quanto no campo das relações de família. Faz-se salutar destacarmos um dado bastante precioso: Hoje, mesmo os processos de inventário feitos consensualmente são definidos num prazo médio de ( 1) um ano. Nesse período, herdeiros que não tinham problemas entre si passam a entrar em choque por causa da convivência forçada na administração do patrimônio comum antes da partilha.
Para abrilhantarmos a nossa obra citamos passagem do livro de Luiz Rodrigues Wambier, em obra conjunta, no seguinte sentido: “No caso parece ter havido equívoco do legislador, já que, exigindo-se que todos os interessados sejam capazes e que não haja litígio, estar-se-á diante de arrolamento e não inventário. Ocorre que, para nós, não houve atecnia do legislador, já que o arrolamento é um procedimento simplificado do inventário e partilha e a lei, em seu artigo 982, do CPC, faz menção tanto ao inventário quanto a partilha”. ( WAMBIER, Luiz Rodrigues, Editora RT, pág. 306. Ano 2007).
1.2) Opcionalidade da via cartorária.
Trazemos ao leitor a seguinte indagação:
Ticio faleceu no estado civil de viúvo, deixando dois filhos, Zimprônio e Abelardo. Ambos maiores e capazes. Deixou vasto patrimônio e, em razão do grande apego entre os irmãos, resolveram partilhar amigavelmente a herança e requereram a abertura do inventário por arrolamento. Tal seria possível ?
Entendemos perfeitamente possível. Isso porque o art. 2.016 do CC determina que a partilha deva ser judicial quando algum dos herdeiros for incapaz. Tal não se dá no caso em comento. Deve-se, pois, aplicar a lei 11.441/2007, ou seja, o envio das partes para a via extrajudicial.
Ressaltamos, todavia, que existe corrente contrária (dos autores acima supramencionados) defendendo que o verbo “poderá” denota faculdade, razão pela qual não haveria óbice a que se requeresse o arrolamento por via judicial. Luiz Rodrigues Wambier, em obra conjunta ( Editora RT, pág. 306. Ano 2007).
Todavia, se Tício, além dos dois filhos, deixasse um menor, Joaquim, como se procederia a situação? Haveria, pois, mudança na resposta por inteiro.
Entendemos que o procedimento não poderia ser bipartido, pois a lei é taxativa ao exigir, para a feitura da escritura pública em cartório, o requisito da capacidade e do consenso das partes (requisitos objetivos). O art. 2016 do CC determina que a partilha deva ser judicial, quando algum dos herdeiros for incapaz, visando ao melhor interesse do menor. E, aqui, o intérprete deve optar uma interpretação sistemática e teleológica da norma.
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em decisão exarada em abril de 2007, logo, três meses após a publicação da lei, deu ênfase a opcionalidade da via judicial ou extrajudicial por parte dos interessados. Colacionamos a seguinte ementa:
1. TIPO DE PROCESSO: Apelação Cível NÚMERO: 70019207190 Inteiro Teor Decisão: Acórdão RELATOR: Maria Berenice Dias EMENTA: SUCESSÕES. ANULAÇÃO DE PARTILHA EM INVENTÁRIO. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DE HERDEIRA ACERCA DO ESBOÇO. NULIDADE. Preliminar de prescrição rejeitada por ter sido a ação proposta dentro do prazo legal de um ano. Considera-se proposta a ação, ainda que se trate de comarca de vara única, no dia em que protocolada a petição no cartório. Inteligência do art. 263 do CPC. Afronta os princípios do contraditório e da ampla defesa decisão homologatória de esb... DATA DE JULGAMENTO: 25/04/2007
PUBLICAÇÃO: Diário de Justiça do dia 02/05/2007.
Mas as indagações não para por aí: E o caso daquela pessoa que já iniciou o processo na Justiça. A mesma poderá buscar a solução do caso extrajudicialmente? Entendemos que a resposta afirmativa se impõe. Aonde existe a mesma razão deverá existir o mesmo direito. Essa nada mais é que uma regra de hermenêutica.
Para tanto, poderá se valer das seguintes possibilidades: apresentar uma petição informando que está desistindo da ação interposta, ou simplesmente abandonar o processo em tramitação ou efetivar o divórcio no cartório extrajudicial e, conseqüentemente, levar à extinção do processo judicial, por perda do objeto.
1.3) Requisição por advogado.
Imprescindível a presença de advogado comum ou de advogados de cada um dos interessados, sob pena de o tabelião restar impedido de lavrar a escritura pública.
Os custos de todos os procedimentos dependem do valor patrimonial a ser partilhado e das peculiaridades de cada caso. Dessa forma, além da despesa dos honorários ao representante legal (advogado), o casal ou o inventariante terão que arcar com as despesas do cartório que variam, dependendo do valor do patrimonial que entrará na partilha de bens.
Assim, a nova modalidade de inventário exige a prestação de assessoria do advogado - que deverá seguir as bases do exercício da advocacia, ou seja, a ética, a responsabilidade e os deveres de aconselhar e informar precisamente os seus clientes. Encargo atribuído ao causídico é recolher do cliente o imposto de transmissão causa mortis ( ITCD). Já existe, inclusive, Lei Estadual prevendo tal fato. (Lei Estadual 10.705/00, com redação da Lei 10.992/01 e Portaria CAT-5 de 22 de janeiro de 2007). Através da Portaria CAT-5 de 22 de janeiro de 2007, a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo disciplinou que as primeiras declarações para a obtenção do documento imprescindível para lavrar a escritura de inventário e partilha (certidão de regularidade do ITCMD) deverá ser feita via Internet.
Como a Lei nº 11.441/ 2007 prevê que a escritura e demais atos notariais serão gratuitos àqueles que se declararem pobres sob as penas da lei, será criado um novo encargo oneroso para os cartórios com essa gratuidade. Entendemos, pois, que tal gratuidade para o cidadão não deve gerar custos para o cartório, que deve ser remunerado pelo Estado para a prestação desse serviço. A gratuidade é dever do Estado e não dos cartórios. O advogado, quando indicado para patrocinar a causa de juridicamente necessitado, no caso da impossibilidade da Defensoria Pública no local da prestação do serviço, tem direito aos honorários fixados pelo juiz, segundo tabela organizada pelo Conselho Seccional da OAB, e pagos pelos Estados.
Importante salientar que a seccional da OAB do Distrito Federal reduziu em 50% a tabela de honorários, cobrados em casos de separação, divórcios e inventários consensuais feitos diretamente nos cartórios. ( nota informada no próprio site da Ordem dos Advogados do Brasil do Distrito Federal: (www.oab.df.org.br)
1.4) Prazo para a abertura do processo de inventário e partilha:
Dispõe o artigo 983, do CPC que tal prazo deve ser aberto dentro de 60 ( sessenta) dias a contar da abertura da sucessão, ultimando-se nos 12 ( doze) dias subseqüentes, podendo o juiz prorrogar tais prazos de ofício ou a requerimento das partes. O artigo 983 do Código de Processo Civil, dispõe basicamente da penalidade de ordem fiscal que, caso não seja respeitado o respectivo prazo de 60 ( sessenta) dias —contados a partir da data do óbito do autor da herança— haverá a aplicação de multa sobre o valor do imposto, além de correção monetária e juros de mora, de acordo com o artigo 21 da Lei 10.705/00 (com as alterações da Lei 10.992 de 21 de dezembro de 2001). Confira o leitor o que preceitua a legislação em vigor:
“Art. 1.124-A. A separação consensual e o divórcio consensual, não havendo filhos menores ou incapazes do casal e observados os requisitos legais quanto aos prazos, poderão ser realizados por escritura pública, da qual constarão as disposições relativas à descrição e à partilha dos bens comuns e à pensão alimentícia e, ainda, ao acordo quanto à retomada pelo cônjuge de seu nome de solteiro ou à manutenção do nome adotado quando se deu o casamento.
§ 1o A escritura não depende de homologação judicial e constitui título hábil para o registro civil e o registro de imóveis.
§ 2o O tabelião somente lavrará a escritura se os contratantes estiverem assistidos por advogado comum ou advogados de cada um deles, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.
§ 3o A escritura e demais atos notariais serão gratuitos àqueles que se declararem pobres sob as penas da lei.”
Art. 4o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Art. 5o Revoga-se o parágrafo único do art. 983 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil.”
O artigo 1124, alínea A, do Código de Processo Civil é filho legítimo da lei 11441/2007; até então inexistente em nosso ordenamento jurídico. Com tal lei, no que toca a separação consensual e divórcio feitos via cartorária, filtramos três pressupostos indispensáveis para a sua concretização: deverá haver consensualidade tanto no divórcio quanto na separação, o ato é administrativo - o que equivale a dizer que a escritura pública substitui a homologação judicial e; por fim, inexistência de filhos menores e incapazes.
Já no que concerne ao inventário e partilha no bojo de tal relação, destacamos dois pressupostos relevantes: O inventário e a partilha poderão ser feitos administrativamente se não houver testamento e os interessados forem capazes e estiverem concordes. Desta feita, agora, inventários, partilhas, separações consensuais e divórcios consensuais, podem ser feitos administrativamente, desde que observadas às condições expressas na nova lei; condições estas que se revestem em condições específicas de procedibilidade para a prática do ato.
Registre-se que se houver testamento ou interessado incapaz, o inventário deve ser judicial. De acordo com o que preleciona Luiz Rodrigues Wambier, em obra conjunta ( Editora RT, pág. 306. Ano 2007), de acordo com o parágrafo segundo do artigo 1124, A, do CPC, é obrigatória a presença de advogados comuns ou de advogados de cada parte”; ou seja: Esse advogado pode ser o mesmo para todos os interessados ou cada um pode ter o seu advogado, ou advogados. A qualificação e a assinatura dos advogados constarão do ato notarial. Trata-se de um pressuposto específico para o ato.
E aqui surgem as seguintes indagações: Os separandos ou divorciandos, de comum acordo, poderão separar-se por mera procuração outorgada ao advogado? A presença das partes seria imprescindível ao ato? Caso fosse acatada a possibilidade do deslinde matrimonial ser obtido por meio de procuração esta seria uma procuração de natureza pública ou particular?
A questão é objeto de grandes controvérsias em artigos já publicados em sites jurídicos sobre o tema: Paulo Lôbo, que é conselheiro do CNJ, publicou sobre o tema um artigo intitulado “Divórcio e separação consensuais extrajudiciais“, no site do Conselho Nacional de Justiça ( Fonte: site do CNJ: www.cnj.jus.br). No respectivo artigo, ele defende a utilização de procuração para separação e divórcio consensuais extrajudiciais. Para sermos fiéis as suas palavras: “Qualquer dos cônjuges pode ser representado por procurador, com poderes específicos e bastantes, por instrumento público ou particular de procuração, porque não há vedação legal e é simétrico ao ato solene do casamento, que permite a representação convencional do nubente. Por outro lado, há a indispensável assistência e presença de seu advogado na lavratura da escritura, como garantia da defesa de seus interesses. Dessa forma, se para o ato mais solene que é o casamento o legislador admite a procuração, não faria sentido restringir num ato meramente administrativo”. (Paulo Lôbo, Divórcio e separação consensuais extrajudiciais, publicado no site do CNJ, em 27 de fevereiro de 2007).
O autor admite, inclusive, que tal procuração seja particular. Mas a matéria não é pacífica: No Rio Grande do Sul já há provimentos quantos ao tema: Resolução CNJ nº 35/2007. “Inventário – separação – divórcio – extrajudiciais. Atos notariais e registrais. Lei nº 11.441/2007. Em boa hora, o Provimento 04/07 da Corregedoria-Geral da Justiça do Rio Grande do Sul adotou essa cautela em mais de um dispositivo. Assim, o art. 619-C, § 4°, da CNNR, introduzido por aquele ato, dispõe que os cônjuges comparecerão pessoalmente para a lavratura do ato notarial, inadmitida a sua representação por procuração. Mais adiante, o § 5° determina que a falta de anuência de uma das partes quanto a qualquer das cláusulas apresentadas, ou a recusa de alguma pretensão que objetivava ver consignada, impedirá a realização do ato, devendo, então, ser informada pelo tabelião a possibilidade de ingresso na via judicial.” ( Nota extraída do site IBDFAN).
Havendo fundados indícios de prejuízo a um dos cônjuges ou existindo dúvida sobre a declaração de vontade, impõe-se a negativa à lavratura da escritura pública de separação ou divórcio. Ora, somente com a presença do casal é que o tabelião poderá conferir a anuência plena, esclarecida e consciente com todas as cláusulas do pacto (cujos termos e conseqüências deverão ser explicados em todos os seus detalhes, no ato) e verificada eventual dúvida quanto à declaração de vontade. Outro assunto importante é o relativo à possibilidade de escolha entre os procedimentos judicial e extrajudicial. A Resolução 35, do CNJ possibilita a escolha.
E, aqui, trazemos à colação importante julgado proferido pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul sobre o Tema: 6. TIPO DE PROCESSO: Apelação Cível NÚMERO: 70019033596 Inteiro Teor Decisão: Acórdão RELATOR: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves EMENTA: INVENTÁRIO E PARTILHA. LEI 11.441/2007. POSSIBILIDADE DE REALIZAÇÃO PELA VIA ADMINISTRATIVA. DIREITO DE ESCOLHA DAS PARTES. 1. Pela nova redação do art. 982 do CPC, primeira parte, a regra permanece sendo a realização do inventário pela via judicial, tendo a lei apenas facultado às partes a opção pela via administrativa. 2. Embora a realização do inventário pela via administrativa possa dar maior celeridade ao procedimento de partilha de bens, a... DATA DE JULGAMENTO: 25/04/2007.PUBLICAÇÃO: Diário de Justiça do dia 03/05/2007.
Vale ressaltar que sobre a negativa de comparecimento das partes ao ato cartorário, caso se torne possível verificar, de plano, que o autor é contra a possibilidade de realização da separação e do divórcio extrajudiciais através de procuração, deve o tabelião recusar o ato. É o mais sensato!
Entendemos que o casal deve comparecer pessoalmente ao ato de separação consensual ou divórcio devido a solenidade do mesmo.
O ato não deixou de ser solene por trazer a desburocratização ao Poder Judiciário. A família continua a ser a “célula mater” da sociedade. Colocar a família em primeiro lugar não é uma proposição ética tão óbvia, trivial, nem tão aceita por aí. Basta acessar a internet e o leitor encontrará, com facilidade, milhares de artigos que lhe dirão para colocar em primeiro lugar os outros - a sociedade, os amigos, o dever, o trabalho, o cliente - raramente a família! Valores familiares estão pouco na moda no contexto atual.
Não se pode confundir, aqui, economia processual com tutela inefetiva, sob pena de colocarmos a forma em prol do fundo. Um paradoxo! Ora, se no processo judicial, onde maiores são as cautelas, com a presença do magistrado e do Ministério Público, o comparecimento pessoal das partes é indispensável, não se ostenta prudente dispensá-lo justamente quando revestida de menor fiscalização a formalização do acordo ( via cartorária). Não haveria o menor sentido em assim proceder!
No mesmo pensar vem á baila decisão monocrática do STJ não totalmente fiel ao tema, mas proferida após a publicação da lei e, ao que tudo indica, pela complexidade doas fatos arrolados, se fez presente a opcionalidade como consta em ementa abaixo transcrita:
Processo SE 002487 Relator(a) Ministro BARROS MONTEIRO Data da Publicação DJ 24.04.2007 Decisão
SENTENÇA ESTRANGEIRA Nº 2.487 - IT (2007/0007896-3)
DECISÃO
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I. M. S. D., brasileira, e M. F., italiano, qualificados na inicial, formularam pedido conjunto de homologação de sentença estrangeira de separação consensual, proferida pelo Tribunal de Florença, Itália, em 09 de novembro de 2005. Foram apresentados os documentos indispensáveis à homologação: procurações (fls. 04/05), inteiro teor da sentença estrangeira de separação consensual, devidamente chancelada por autoridade consular brasileira (fls. 22/32), respectiva tradução por profissional juramentado no Brasil (fls. 11/20), bem como a certificação do trânsito em julgado da decisão, ocorrido em 08 de novembro de 2006(fls. 21 e 31-verso). O Ministério Público Federal, no parecer de fl. 35, opinou pelo deferimento do pedido.
Segundo alegam os requerentes, embora a esposa tenha adotado, no Brasil, o patronímico do marido, ao transcreverem o casamento na Itália, permaneceu a mulher com seu nome de solteira, conforme consta da sentença, razão pela qual pedem autorização para que volte a usar seu nome de solteira. Decido.
A sentença foi proferida por autoridade competente e as partes foram devidamente citadas na ação de divórcio. Por outro lado, a pretensão não ofende a soberania ou a ordem pública (Resolução/STJ nº 9/2005, arts. 5º e 6º), restando assim atendidos os pressupostos indispensáveis ao deferimento do pedido. No que se refere ao nome da requerente, ainda que nada conste da sentença de separação judicial, é forçoso reconhecer que a mulher, ao separar-se, não mais utilizava o patronímico do marido, razão pela qual se mostra necessário deferir-lhe autorização para retomar seu nome de solteira no Brasil, para fins de registro junto ao cartório competente. Posto isso, homologo a sentença estrangeira de separação judicial e autorizo a requerente a retomar seu nome de solteira. Expeça-se a carta de sentença.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília, 19 de abril de 2007.
MINISTRO BARROS MONTEIRO
Atente o leitor de quem irá homologar tal sentença estrangeira, ainda que a separação tenha sido consensual, não será o cartório e sim o Poder Judiciário. E aqui surge a seguinte dúvida: Poderá ser feita a separação consensual ou o divórcio consensual perante o consulado brasileiro em país estrangeiro, se o casal vive fora do Brasil? Veja: em decisão monocrática o Ministro Barros Monteiro fez menção à chancela da autoridade consular, mas não dispensou sua homologação pelo Poder Judiciário. È cediço que a lei foi publicada em 04 de janeiro de 2007 e sua decisão proferida em 19 de abril de 2007.
Entretanto, não nos pareça que deva ser assim. O Poder Judiciário pauta-se, ao prestar o serviço da jurisdição, pelos princípios da necessidade e da adequação. Princípios estes que estão revestidos no exercício regular do direito de ação; qual seja: o interesse de agir. Se uma questão, ainda que envolvendo interesses de ordem familiar, pode ser resolvida administrativamente, já não se faz necessária a prestação jurisdicional. E a nova lei veio adequar algumas situações nela previstas em outro âmbito, diverso do âmbito judicial.
1.5) Conclusão.
Acerca dos benefícios e malefícios de tal sistema, com essa nova implementação, o judiciário deve ser beneficiado com o “desafogamento” de infindáveis novas ações ( dando-se, sobretudo, uma maior efetividade ao princípio da economia processual e razoabilidade - em seu sentido substantivo, qual seja, o devido processo legal)) e as partes serão beneficiadas com uma agilidade na busca de seus interesses, interesses estes até então não divergentes. Outra vantagem de ordem prática a ser citada: O principal benefício que a lei 11.441/2007 trouxe foi quanto ao tempo de espera das partes em relação a esses tipos de ações, o prazo para entrega da certidão pelo cartório vai ser de, no máximo, uma semana – segundo estimativas jornalísticas. Isto é, havendo consenso entre as partes nos casos contemplados pela lei 11441/2007, a escritura da separação, do divórcio ou do inventário será conseguida de forma bem mais rápida que a tradicional (via Judiciário). Espera-se, também, que haja gradualmente uma desinflação processual da justiça comum, cuja demanda vem crescendo anualmente em todo o país.
Mas a nova lei apresenta aspectos negativos: No caso da separação e do divórcio, está sendo eliminada uma etapa que o direito processual brasileiro vê com importância, que é a tentativa de reconciliação de que trata o art. 1.122 do Código de Processo Civil, que dá o comando ao magistrado para ouvir os cônjuges sobre os motivos da separação consensual, esclarecendo-lhes as conseqüências da manifestação de vontade.
Assim sendo, entendemos que o termo “poderão” não denota o caráter de discricionariedade, como ressaltado pelos autores supra mencionados; mas cabe ressaltar que esta vinculação das partes ao sistema cartorário ( administrativo) deve ser vista com temperamentos. Sempre que houver uma omissão legal, o CPC, em seus dispositivos 1120 e seguintes, deve ser buscado (em caráter subsidiário) para resolver tais deslindes, sob pena de violarmos os princípios do acesso à justiça e do devido processo legal. Assim, a título de exemplo, João e Maria se separam administrativamente, via cartório. Um mês após o desenlace resolvem sair para um romântico jantar a luz de velas e, após uma tórrida noite de amor, concluem que não conseguem viver um sem o outro. Desesperados, o casal resolve colocar um fim a respectiva separação. Indaga-se: Isso seria possível administrativamente falando? A lei aqui é omissa: não determinou tal hipótese pela via administrativa, o que nos leva a entender que somente restaria ao “casal apaixonado” a via judicial para tal procedimento.
Não cabe ao interprete ou mesmo ao chefe da serventia resolver tal deslinde, pois não possuem competência de natureza legislativa para tal. Assim, nosso entendimento é no sentido de que no caso de reconciliação do casal na separação consensual em cartório, o processo de retomada se faz da seguinte forma: Através do procedimento judicial na separação, em casos de reconciliação, os interessados devem comunicar ao juiz da retomada do casamento através de uma simples petição. Ocorrerá pelo registro de um novo negócio jurídico bilateral em cartório de registro civil, perante o oficial de registros civis. E como ocorre nos divórcios de uma maneira geral, a reconciliação exige novas núpcias.
1.6) Bibliografia:
Lôbo, Paulo. A PEC do divórcio: conseqüências jurídicas imediatas. Revista Brasileira de Direito das Famílias e Sucessões, vol11, Porto Alegre: Magister; Belo Horizonte: IBDFAM, ago./set.2009.
VELLOSO DOS SANTOS, Reinaldo. Registro Civil das Pessoas Naturais. Porto Alegre: Fabris, 2006.
Ex Tabeliã pelo TJMG. Especialista em Compliance Contratual, pela Faculdade Pitágoras. Mestre em Direito das Relações Internacionais pela Universidad de La Empresa – Montevideo – UY. Escritora. Advogada.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PAULA NAVES BRIGAGãO, . Relações familiares em seara cartorária Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 16 maio 2012, 08:55. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/29027/relacoes-familiares-em-seara-cartoraria. Acesso em: 24 nov 2024.
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