É comum a negativa de pagamento da cobertura securitária por parte das empresas seguradoras, em razão da embriaguez do condutor do veículo, seja ele o contratante do seguro ou um terceiro.
Como veremos adiante, algumas situações autorizam a negativa de cobertura, porém, na prática, na maioria dos casos, é devido o pagamento da cobertura securitária, mesmo estando o condutor em estado de embriaguez.
O Superior Tribunal de Justiça entende não ser abusiva a cláusula contratual que prevê a limitação de cobertura em caso de embriaguez do segurado, por ser situação de agravamento do risco. A cláusula, no entanto, deve constar de forma clara, em destaque, e informada ao segurado no ato da contratação.
Para validade da cláusula, não se admite que conste apenas em documento a ser entregue posteriormente à assinatura do contrato, como por exemplo, em “manual do segurado”, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que passamos a transcrever:
RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO DECORRENTE DE SEGURO DE VIDA. ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO. EMBRIAGUEZ. CLÁUSULA LIMITATIVA DE COBERTURA DA QUAL NÃO FOI DADO O PERFEITO CONHECIMENTO AO SEGURADO. ABUSIVIDADE. INFRINGÊNCIA AO ARTIGO 54, § 4º DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Por se tratar de relação de consumo, a eventual limitação de direito do segurado deve constar, de forma clara e com destaque, nos moldes do art. 54, § 4º do CODECON e, obviamente, ser entregue ao consumidor no ato da contratação, não sendo admitida a entrega posterior. 2. No caso concreto, surge incontroverso que o documento que integra o contrato de seguro de vida não foi apresentado por ocasião da contratação, além do que a cláusula restritiva constou tão somente do "manual do segurado", enviado após a assinatura da proposta. Portanto, configurada a violação ao artigo 54, § 4º do CDC. 3. Nos termos do artigo 46 do Código de Defesa do Consumidor: "Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance". 4. Deve ser afastada a multa aplicada com apoio no artigo 538, parágrafo único do CPC, pois não são protelatórios os embargos de declaração opostos com fins de prequestionamento. 5. Recurso especial provido.
(STJ - REsp: 1219406 MG 2010/0188000-0, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 15/02/2011, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 18/02/2011).
Além da obrigatoriedade em constar a cláusula no contrato em destaque, nos moldes do art. 54, §4º do Código de Defesa do Consumidor, entende o Superior Tribunal de Justiça que para a negativa de pagamento da cobertura securitária, deve a seguradora comprovar que a embriaguez foi causa determinante para a ocorrência do acidente. Além disso, para exclusão da cobertura deve ser comprovado que o segurado de forma dolosa quis causar o sinistro, ou seja, desejava aquele resultado.
Nesse sentido, as jurisprudências colacionadas:
AGRAVO REGIMENTAL - RECURSO ESPECIAL - DIVERGÊNCIA NOTÓRIA - MITIGAÇÃO DAS EXIGÊNCIAS DE DEMONSTRAÇÃO DO DISSÍDIO - AÇÃO DE COBRANÇA - SEGURO DE VEÍCULO - EMBRIAGUEZ DO SEGURADO - EXCLUDENTE DE COBERTURA - NÃO-CONFIGURAÇÃO - AGRAVO IMPROVIDO. 1. In casu, houve demonstração do dissídio jurisprudencial, já que este, por ser notório, admite a mitigação de diversas exigências regimentais. 2. A embriaguez, por si só, não constitui causa de exclusão da cobertura securitária, sendo necessária a prova de que o agravamento de risco dela decorrente influiu decisivamente na ocorrência do sinistro. 3. Agravo regimental improvido
(STJ - AgRg no REsp: 959472 PR 2007/0133293-4, Relator: Ministro MASSAMI UYEDA, Data de Julgamento: 18/12/2007, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJ 17.03.2008 p. 1).
APELAÇÃO CÍVEL. SEGUROS. SINISTRO. ALEGAÇÃO DE AGRAVAMENTO DO RISCO. EMBRIAGUEZ. NEGATIVA DE COBERTURA. CASO CONCRETO. Conforme entendimento pacificado na doutrina e jurisprudência, os contratos de seguro, ora objeto dos autos, devem ser analisados sob a ótica dos preceitos do Código de Defesa do Consumidor, consoante disposição do artigo 3º, § 2º, devendo suas cláusulas obedecer às regras dispostas na legislação mencionada. No caso concreto, não foram preenchidos os requisitos dos artigos 776 e 768, ambos do CC/2002 No caso vertente a seguradora não produziu provas suficientes para demonstrar que o motorista, de forma dolosa, causou o acidente. Os salvados pertencem a seguradora, porém deve esta se responsabilizar pelos gastos daqueles. Os honorários merecem majoração, no percentual que desde já fixo 18% sobre o valor da condenação. APELAÇÃO DA PARTE RÉ DESPROVIDA E DADO PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA. (Apelação Cível Nº 70065398471, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Léo Romi Pilau Júnior, Julgado em 29/07/2015).
(TJ-RS - AC: 70065398471 RS , Relator: Léo Romi Pilau Júnior, Data de Julgamento: 29/07/2015, Quinta Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 03/08/2015).
Situação diversa ocorre quando um terceiro guia o veículo e dá causa ao sinistro. A exclusão da cobertura por agravamento do risco só se configura quando imputada à conduta do próprio segurado. A título de exemplo, caso o sinistro seja causado por filho de segurado que no momento do acidente estava embriagado, a seguradora só poderá negar a cobertura caso comprove que o segurado permitiu que o veículo fosse conduzido por pessoa em estado de embriaguez, o que, na prática dificilmente será comprovado.
Isso porque o agravamento do risco deve ser imputado à conduta direta do próprio segurado. A presunção de que o segurado tem por obrigação não permitir que o veículo seja conduzido por pessoa em estado de embriaguez é válida até a efetiva entrega do veículo a terceiro.
Por esse motivo, após a entrega do veículo pelo segurado a terceiro que esteja em condições de dirigir, caso esse condutor venha a ficar embriagado e der causa ao sinistro, ainda assim a seguradora é obrigada a prestar a cobertura.
Nessa mesma esteira de raciocínio as seguintes jurisprudências:
RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE COBRANÇA - SEGURO DE AUTOMÓVEL - SUJEIÇÃO À LEI CONSUMERISTA - EMBRIAGUEZ DE TERCEIRO CONDUTOR (FILHO DO SEGURADO) COMO CAUSA DETERMINANTE DO SINISTRO - FATO NÃO IMPUTÁVEL À CONDUTA DO SEGURADO - EXCLUSÃO DA COBERTURA - IMPOSSIBILIDADE - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. I - A perda do direito à indenização deve ter como causa a conduta direta do segurado que importe num agravamento, por culpa ou dolo, do risco objeto do contrato; II - A presunção de que o contratante-segurado tem por obrigação não permitir que o veículo-segurado seja conduzido por pessoa em estado de embriaguez é válida e esgota-se, efetivamente, até a entrega do veículo a terceiro; III - Inexiste nos autos qualquer menção de que, na oportunidade em que o segurado entregou o veículo ao seu filho, este já se encontraria em estado de embriaguez, caso em que se poderia, com razão, cogitar em agravamento direto do risco por parte do segurado. Aliás, considerando que o contrato de seguro sujeita-se ao Código de Defesa do Consumidor, o ônus da prova acerca de tal demonstração incumbiria a Seguradora, que, como visto, nada produziu nesse sentido; IV - Recurso Especial conhecido e provido.
(STJ - REsp: 1097758 MG 2008/0236409-4, Relator: Ministro MASSAMI UYEDA, Data de Julgamento: 10/02/2009, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/02/2009 RSTJ vol. 214 p. 217).
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA DE INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA. SEGURO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. EMBRIAGUEZ DE TERCEIRO CONDUTOR. FATO NÃO IMPUTÁVEL À CONDUTA DO SEGURADO. EXCLUSÃO DA COBERTURA. IMPOSSIBILIDADE. 1. Para a recusa de pagamento de indenização securitária, o agravamento do risco deve ser imputado à conduta direta do próprio segurado. A presunção de que o segurado tem por obrigação não permitir que o veículo seja conduzido por pessoa em estado de embriaguez é válida até a efetiva entrega do veículo a terceiro. 2. Condições e valores de pagamento estipulados no contrato de seguro deverão ser analisados pelo magistrado de primeira instância. 3. Agravo regimental desprovido. (STJ - AgRg nos EDcl no REsp: 1341392 SP 2012/0180313-0, Relator: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 20/06/2013, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/07/2013
Advogado. Associado do escritório Duarte & Siqueira Advogados. Pós-graduando em Direito Civil e Processo Civil pela UCAM - RJ. Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás(PUC/GO).<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PEREIRA, Jessé Leal. Pode a seguradora negar cobertura por motivo de embriaguez do condutor do veículo? Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 set 2015, 04:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/45216/pode-a-seguradora-negar-cobertura-por-motivo-de-embriaguez-do-condutor-do-veiculo. Acesso em: 12 nov 2024.
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