RESUMO: O presente artigo científico tem como objetivo discutir a inserção de uma família homoafetiva na entidade familiar, fazendo um breve aparato histórico da evolução da família, enfatizando os seus principais princípios e as discussões sociais a respeito do tema. Observar-se-á, ao longo do trabalho que há uma significativa diferença quanto ao tratamento que a sociedade concede a uma união estável e a uma família homoafetiva, inclusive no que tange aos aspectos morais, sociais e culturais de cada entidade. Neste prisma, este paper visa defender e inserir uma nova denominação de entidade familiar regido pela Constituição Federal de 88 e ratificada pelo Codigo Civil de 2002.
Sumário: Introdução; 1 Considerações Pertinentes a Respeito da Evolução Histórica do Direito de Família, 1.1 A família no direito romano, 1.2 A família no direito canônico, 1.3 A visão do direito de família no Código Civil de 2002 2 Os Princípios Constitucionais e a Pluralidade de Modelos Familiares; 3 A União Homoafetiva Concebida como Entidade Familiar; Conclusão; Referências. Bibliográficas.
PALAVRAS-CHAVE: Evolução Histórica; Princípios; União Homoafetiva, Entidade Familiar.
INTRODUÇÃO
Na esfera das relações interindividuais reguladas pelo Direito, a sexualidade suscita grandes polêmicas. Especialmente nas últimas décadas, a necessidade de adaptação das soluções para as rupturas enfrentadas nas relações familiares e afetivas exige uma constante adaptação do Direito, na tentativa de compor os conflitos surgidos no cotidiano da vida social e familiar. A reivindicação de efeitos jurídicos e do reconhecimento das relações afetivas entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar vem estimulando reflexões e revisões conceituais, sobretudo no âmbito jurídico. No entanto, no direito brasileiro o tema carece de maior aprofundamento e elaboração teórica.
Neste trabalho científico, iremos tomar como objeto de estudo a união homoafetiva em um contexto contemporâneo, buscando em um primeiro momento estabelecer um reconhecimento de efeitos jurídicos e do reconhecimento das relações afetivas entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar deve ser analisada a partir da previsão constitucional dos objetivos fundamentais da República em construir uma sociedade pluralista, justa e solidária (artigo 3o, inciso I), dos direitos e garantias fundamentais, bem como dos novos contornos atribuídos ao Direito de Família pela concepção constitucional.
Por fim em um segundo momento, tratar-se-á da interpretação do novo Código Civil de 2002 pautando-se na visão plural de entidades familiares, inscrita na ordem constitucional e na doutrina e jurisprudência, recentemente produzidas.
1. Considerações Pertinentes a Respeito da Evolução Histórica no Direito de Família.
Não existe nos antepassados dos povos antigos, assim como na Antiguidade Oriental ou na Antiguidade Clássica, o florescimento de uma sociedade organizada, sem levar em consideração as bases ou fundamentos de uma família ou de sua organização. As organizações familiares brasileiras possuem como base o modelo na origem romana, canônica e da família germânica.
1.1 A Família no Direito Romano
O sistema severo, que fizeram as famílias se tornarem uma sociedade patriarcal
teve sua origem na Antiga Roma. A família romana era organizada no poder e na posição do pai, chefe da comunidade. O pátrio poder tinha caráter unitário exercido pelo pai, designado como sui júris.
Pelo relato de ArnoldoWald:
A família era definida como o conjunto de pessoas que estavam sob a patria potestas do ascendente comum vivo mais velho. O conceito de família independia assim da consanguinidade. O pater familias exercia a sua autoridade sobre todos os seus descendentes não emancipados, sobre a sua esposa e sobre as mulheres casadas com manus com os seus descendentes. (WALD, 2005, p. 09)
Destarte, a família funcionava simultaneamente como uma unidade econômica,
religiosa, política ou jurisdicional, pois, primeiramente o patrimônio pertencente à organização familiar era administrado pelo pater; era religiosa pelo o fato de ter uma própria religião doméstica dos entes falecidos; possuía um caráter político, uma vez que constituía uma espécie de Senado, formado pela reunião dos chefes familiares, os chamados (patres conscripti).
Com a morte do “pater famílias” o poder era transferido ao primogênito e/ou a
outros homens pertencentes ao grupo familiar, ficando a mulher impossibilidade de assumir o comando da família em qualquer hipótese. Existiam duas possibilidades para a mulher naquele rigoroso sistema: continuar se submetendo aos poderes da autoridade paterna (casamento sem manus), ou entrar na família marital a partir deste momento conceder obediência ao seu marido (casamento com manus).
Existiam em Roma duas espécies de parentesco: a agnação e a cognação. A agnação vinculava as pessoas que estavam sujeitas ao mesmo pater, mesmo quando não fosse consanguíneas (filho natural e filho adotivo do mesmo pater, por exemplo). A cognação era o parentesco pelo sangue que existia entre pessoas que não deviam necessariamente ser agnadas uma da outra. Assim, por exemplo, a mulher casada com manus era cognada, mas não agnada do seu irmão, o mesmo ocorrendo com o filho emancipado em relação àquele que continuasse sob a patria potestas. (WALD, 2005, p. 10)
Os cognados passaram a ter direitos de sucessão e de alimentos no Império Romano, além de já possuir a figura do magistrado como agente competente para solucionar os conflitos e não mais a do pater. Neste período, a mulher começa a desfrutar de autonomia para exercer os seus direitos, além de fazer correspondência com o início do feminismo.
A doutrina jurídica reconhece que o direito romano forneceu ao Direito brasileiro
elementos básicos da estruturação da família como unidade jurídica, econômica e religiosa, fundada na autoridade de um chefe, tendo essa estrutura perdurada até os tempos atuais.
1.2 A Família no Direito Canônico
A partir do século V, com o decorrente desaparecimento de uma ordem estável
que se manteve durante séculos, houve um deslocamento do poder de Roma para as mãos do chefe da Igreja Católica Romana que desenvolveu o Direito Canônico estruturado num conjunto normativo dualista (laico e religioso) que irá se manter até o século XX.
Os canonistas eram totalmente contrários à dissolução do casamento por
entenderem que não podiam os homens dissolver a união realizada por Deus e, portanto um sacramento, o chamado “quod Deus conjunxit homo non separet”.
Por esta teoria, se reconhece a indissolubilidade do vínculo e só se discutindo o
problema do divórcio em relação aos infiéis, cujo casamento não se reveste de caráter sagrado.
Para Arnoldo Wald existia uma divergência entre a concepção católica do
casamento e a concepção medieval; vejamos:
Enquanto para a Igreja, em princípio, o matrimônio depende do simples consenso das partes, a sociedade medieval reconhecia no matrimônio um ato de repercussão econômica e política para o qual devia ser exigido não apenas o consenso dos nubentes, mas também o assentimento das famílias a que pertenciam. (WALD, 2005, p. 13)
Este direito elaborou um quadro de impedimentos para o casamento, abrangendo
causas baseadas na incapacidade, quais sejam: idade, casamento anterior, infertilidade, diferença de religião; causas relacionadas com a falta de consentimento, ou decorrente de uma relação anterior (parentesco ou afinidade).
A separação do direito canônico se distingue do divórcio romano ou judaico por não importar na dissolução do vínculo e por ser um ato judiciário da autoridade religiosa, enquanto em Roma e para os hebreus constituía um ato privado contra o qual a parte prejudicada podia recorrer à autoridade judiciária. (WALD, 2005, p. 15)
A evolução se deu com a elaboração das teorias das nulidades e de como ocorreria
a separação de corpos e de patrimônios perante o ordenamento jurídico. Não se pode negar, entretanto, a influência dos conceitos básicos elaborados pelo Direito Canônico, que ainda hoje são encontrados no Direito Brasileiro.
1.3 A visão do direito de família no Código Civil de 2002.
Entre os Códigos Civis de 1916 e 2002, além da natural evolução dos costumes
que determinaram o fim da indissolubilidade do casamento e a extensão do poder familiar à mulher, existe um marco histórico temporal que é a carta Magna de 1988 quando se estuda o Direito de Família no Brasil.
A união estável entre o homem e a mulher é reconhecida como entidade familiar, devendo a lei facilitar a sua conversão em casamento. É estabelecida a igualdade do homem e da mulher no exercício dos direitos e deveres referentes à sociedade conjugal. O prazo para o divórcio é reduzido. Em caso de separação judicial, será concedido após um ano ou após dois anos de comprovada separação de fato. Aos filhos havidos do casamento, ou por adoção, são concedidos os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação. (WALD, 2005, p. 24/25).
O legislador constituinte visivelmente pretendeu contornar as distinções,
preconceitos e desigualdades existentes no Direito familiar brasileiro, assim como, consolidar as conquistas de forma que introduziu o conceito de união estável, reduziu de cinco para dois anos o tempo exigido para o divórcio direto e impediu qualquer discriminação a respeito da origem dos filhos entre outros temas reservados à legislação ordinária agora, tratados pela Constituição Federal.
A família regulada pelo Código Civil de 2002 passa a representar limitada forma
de convivência, reconhece-se a existência das famílias monoparentais, identificadas constitucionalmente, o que reflete efetiva conquista nos rumos do reconhecimento de novos núcleos de relações de afeto e proteção, gerando, inclusive, direitos patrimoniais.
O direito de família no Brasil atravessa um período de efervescência. Deixa a
família de ser percebida como mera instituição jurídica para assumir feição de instrumento para a promoção da personalidade humana, mais contemporânea e afinada com o tom constitucional da dignidade da pessoa humana. Não mais encerrando a família um fim em si mesma, finalmente, averba-se que ninguém nasce para constituí-la (a velha família cimentada no casamento, não raro, arranjado pelo pai que prometia a mão de sua filha, como se fosse uma simples negociação patrimonial).
Ao revés, trata-se do lugar privilegiado, o ninho afetivo, onde a pessoa nasce
inserta e no qual modelará e desenvolverá a sua personalidade, na busca da felicidade, verdadeiro desiderato da pessoa humana. Está é a família da nova era.
2. Os Princípios Constitucionais e a Pluralidade de Modelos Familiares.
Embora estejamos em pleno século XXI, o conceito de família aqui no Brasil
ainda está estreitamente ligado à noção de casamento heterossexual. A enorme influência cristã em nossa formação cultural explica tal ligação. Refletindo tal perspectiva, o Código Civil de 1916 adotou um conceito de família estreito, considerando entidades familiares apenas aquelas constituídas pelo casamento. Assim, valorizavam-se muito mais os aspectos formais em detrimento às questões afetivas.
Com o advento da Constituição de 1988, houve uma mudança de paradigma no
que toca ao conceito de família, sendo agora também considerada como tal a união estável e a família monoparental, não sendo mais necessário o casamento. Foi suprimida a locução “constituída pelo casamento” do art. 175 da CF de 1969, ficando o artigo correspondente com a seguinte redação: art. 226. “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”.
A partir de então, os aspectos meramente formais perderam espaço, passando o
nosso ordenamento jurídico a dar maior importância ao afeto nas relações familiares. Aqui é possível enxergar o Princípio Jurídico da Afetividade.
Como exemplo, podemos citar os seguintes dispositivos constitucionais: a) todos
os filhos são iguais, independentemente de sua origem (art. 227, § 6º); b) a adoção, como escolha afetiva, alçou-se integralmente ao plano da igualdade de direitos (art. 227, §§ 5º e 6º); c) a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, incluindo-se os adotivos, e a união estável têm a mesma dignidade de família constitucionalmente protegida (art. 226, §§ 3º e 4º); d) o casal é livre para extinguir o casamento ou a união estável, sempre que a afetividade desapareça (art. 226, §§ 3º e 6º).
Dessa forma, o principio da afetividade passa a figurar como o pilar das relações
familiares, tornado-se fácil perceber que nosso ordenamento jurídico comporta e protege uma pluralidade de modelos familiares. Em outras palavras, todas as relações afetivas que tenha as características da família devem ser consideradas legalmente como tal, incluindo-se aqui a união homoafetiva. A esse respeito Paulo Lôbo (LÔBO, 1989, p. 77) nos ensina:
Constituindo o afeto a base das relações familiares, é necessário reconhecer efeitos jurídicos a outras uniões, quando se constituem de relações duradouras, estabelecem patrimônio comum por esforço mútuo e criam laços de responsabilidade e assistência, devendo, portanto, ser tuteladas pelo Direito. Os interesses a serem protegidos são aqueles que permitem a pessoa realizar-se íntima e afetivamente no pequeno grupo social familiar.
Neste sentido, podemos apontar três características comuns a todas as entidades
familiares: afetividade, estabilidade e ostensibilidade. Tais requisitos podem caracterizar não apenas a relação entre indivíduos do mesmo sexo, como também a relação entre pais e filhos adotivos (sejam estes últimos adotados por casais hetero ou homossexuais). A esse tema, fazse pertinente mais uma vez as palavras de Lôbo (LOBO, p. 9):
Se todos os filhos são iguais, independentemente de sua origem, é porque a Constituição afastou qualquer interesse ou valor que não seja o da comunhão de amor ou do interesse afetivo como fundamento da relação entre pai e filho. A fortiori, se não há qualquer espécie de distinção entre filhos biológicos e filhos adotivos, é porque a Constituição os concebe como filhos do amor, do afeto construído no dia a dia, seja os que a natureza deu seja os que foram livremente escolhidos. Se a Constituição abandonou o casamento como único tipo de família juridicamente tutelada, é porque abdicou dos valores que justificavam a norma de exclusão, passando a privilegiar o fundamento comum a todas a entidades, ou seja, a afetividade, necessário para realização pessoal de seus integrantes. O advento do divórcio direto (ou a livre dissolução na união estável) demonstrou que apenas a afetividade, e não a lei, mantém unidas essas entidades familiares.
Afora o principio da afetividade, ainda podemos citar alguns princípios
norteadores do direito de família que legitimam a união homoafetiva como entidade familiar, quais sejam: igualdade; estado democrático de direito; liberdade. Façamos a seguir uma breve exposição acerca de cada um deles.
O princípio da igualdade está expresso no caput do art. 5 de nossa Carta Magna e
reza que todas as pessoas são iguais perante a lei, “sem distinção de qualquer natureza”. A partir da leitura de tal dispositivo constitucional, não há que se distinguir um ou outro apenas pela opção sexual, ou ainda restringir os direitos da personalidade dos homossexuais. Pelo contrário, estes devem ser tratados de maneira igual e isonômica.
Segundo Joaquim José Gomes Canotilho: (CANOTILHO, 2002, p. 424/426)
A igualdade é um dos princípios estruturantes do regime geral dos direitos fundamentais. É um pressuposto para a uniformização do regime das liberdades individuais a favor de todos os sujeitos de um ordenamento jurídico. Esse princípio traz duas implicações básicas: igualdade na aplicação do direito e igualdade na criação de direitos. E nesse ponto o autor destaca que, diferentemente da estrutura lógica de identidades, a igualdade pressupõe diferenciações e designa uma relação entre pessoas e coisas, caracterizando-se, portanto, numa igualdade relacional.
Desse modo, impõe-se ao Estado uma atuação política e social de promoção de
direitos àqueles que estão desamparados juridicamente, ainda que isso importe um tratamento diferenciado.
Sendo assim, sob a ótica que o casal homossexual é um casal como outro
qualquer, não se pode admitir que haja um tratamento diferenciado no que tange aos direitos de família, incluindo-se aqui os direitos à adoção. Qualquer interpretação normativa diversa desta ultima, deve ser rechaçada, porquanto que infringe o principio da igualdade.
Na esteira deste pensamento, é sabido por todos que vivemos sob o manto do Estado Democrático de Direito, que nos assegura uma convivência harmônica ainda que tenhamos culturas e costumes totalmente diversos. Sendo assim, somente teremos verdadeira democracia se for respeitada a pluralidade de idéias, culturas e etnias, bem como se for possível o diálogo e a convivência entre pessoas que tenham opiniões e pensamentos distintos.
Neste prisma, pode-se afirmar que qualquer tipo de discriminação que o indivíduo
sofra por conta de suas opiniões ou preferências diverge totalmente de um Estado livre e democrático. A liberdade é também um princípio constitucional, tendo todos os cidadãos livre escolha de religião, credo, “opção sexual”, etc.
3. A União Homoafetiva Concebida como Entidade Familiar.
Ainda nos dias atuais sobrevive a discussão de cunho hermenêutico a respeito da
evolução das sociedades e do direito. Há quem diga que o ordenamento jurídico é imutável e inflexível, sendo necessário que a sociedade se amolde a ele. Tal entendimento é por certo totalmente equivocado. Ao passo que surgem novas tecnologias, surgem novas relações sociais e, por conseguinte, a necessidade de o Estado mediá-las. O direito exerce exatamente esta função de mediação de conflitos sociais, devendo, por isso, acompanhar a evolução da sociedade, sob pena de perder sua própria razão de existir.
Sob esta ótica, o direito de família se aperfeiçoou, buscando se adequar ao novo
contexto social. A Constituição atual trouxe mudanças significativas no que toca ao conceito de família, expandindo a abrangência normativa as relações afetivas. No entanto, o legislador constitucional não se lembrou de regulamentar as uniões homoafetivas, como fez com a família monoparental e a união estável.
Contudo, embora não esteja expressa na Constituição Federal a possibilidade da
união entre pessoas do mesmo sexo, tal dispositivo deve ser interpretado de forma inclusiva, haja vista não haver qualquer norma que exclua a possibilidade da existência da entidade familiar homossexual.
A própria família monoparental, explícita na CF, §4º, art. 226, dispensa a
necessidade de par andrógino (homem e mulher). Ainda nos remetendo a tal parágrafo legal, pode-se concluir que também não merece guarida o argumento levantado por alguns, de que a impossibilidade de filiação seria um empecilho para a caracterização da entidade familiar homoafetiva, tendo em vista que a família sem filhos é tutela por nosso ordenamento jurídico.
Por outro lado, não há que se falar em equiparação da união estável como a união
homoafetiva, vez que o §3º do supracitado art. 226 somente admite tal modalidade de entidade familiar quando constituída por homem e mulher. Neste sentido, Maria Berenice (DIAS, 2002, p. 5) nos traz a seguinte redação:
Ainda que tenha vindo a Constituição, com ares de modernidade, outorgar a proteção do Estado à família, independentemente da celebração do casamento, continuou a ignorar a existência de entidades familiares formadas por pessoas do mesmo sexo. Ora, não se diferencia mais a família pela ocorrência do casamento. A existência de prole não é essencial para que a convivência mereça reconhecimento, sendo que a proteção constitucional é outorgada também às famílias monoparentais. Se prole ou capacidade procriativa não são essenciais para que a convivência de duas pessoas mereça a proteção legal, descabe deixar fora do conceito de família as relações homoafetivas.
Por conseguinte, se estiverem “presentes os requisitos de vida em comum,
coabitação, laços afetivos, divisão de despesas, é de se concederem os mesmos direitos deferidos às relações heterossexuais que tenham idênticas características”. (DIAS, 2002, p.5) Neste sentido, não há motivos para haver tratamento diferenciado às relações hetero e homossexuais, devendo ambas serem tratadas como sociedades familiares e, por conseguinte, serem tutelas pelo Direito de Família.
Tal tutela se revela de enorme importância na medida em que a consideração da
união homoafetiva como entidade familiar ou não, interferirá na aplicação dos direitos inerentes às relações familiares, tais como: meação, herança, usufruto, alimentos, habitação, entre outros. Mas uma vez, Maria Berenice (DIAS, 2002, P. 5) nos esclarece a esse tema:
De forma cômoda, o Judiciário busca subterfúgios no campo do Direito das Obrigações, identificando como uma sociedade de fato o que nada mais é do que uma sociedade de afeto. A exclusão de tais relacionamentos da órbita do Direito de Família acaba impedindo a concessão dos direitos que defluem das relações familiares, tais como direitos à meação, à herança, ao usufruto, à habitação, a alimentos, a benefícios previdenciários, entre tantos outros.
Portanto, considerar a união homoafetiva como entidade familiar é garantir que os
princípios constitucionais da igualdade, liberdade, dignidade não sejam feridos, bem como é também, assegurar aos casais homossexuais que constituam família, todos os direitos que lhes são devidos. Nesse passo, vale frisar a importância da jurisprudência no sentido de causar uma mudança a respeito desse tema, haja vista ser o judiciário um agente transformador dos estagnados conceitos da sociedade.
CONCLUSÃO
Por tudo que foi exposto, vale à pena destacar que a discussão acerca do reconhecimento jurídico das uniões estáveis homoafetivas está aberta e exigirá um maior aprofundamento dos debates e amadurecimento nos posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais.
As uniões estáveis homoafetivas lograram receber guarida em nossa jurisprudência
e doutrina mais recentes, fato que nos conduz a sustentar que a edição do novo Código Civil em 2002, embora não comporte previsões que reconheçam tais relações como relações familiares, não deverá constituir impedimento para que a interpretação constitucional, aqui referida permita a possibilidade de concretização dos direitos de todas as entidades familiares, independentemente da diferença de sexos. A analogia coma união estável heterossexual parece ser o caminho a ser adotado para reconhecer e tutelar os direitos dos companheiros de mesmo sexo.
Nesse diapasão a contribuição deste artigo científico consiste, em relembrar que
constitui direito humano inalienável a vida, a liberdade, à busca do livre desenvolvimento da personalidade que compreende o direito à felicidade afetiva e familiar, livre de preconceitos e discriminações.
CANOTILHO, Joaquim José Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 5a edição.2002
DIAS, Maria Berenice. Uniões homoafetivas: uma realidade que o Brasil insiste em não ver. 2002. Disponível em: < www.ibdfam.com.br >. Acesso em 20 de maio de 2010.
LÔBO, Paulo Luiz Neto. A repersonalização das relações de família. In: BITTAR, Carlos Alberto (coord.) O direito de família e a Constituição de 1988. São Paulo: Saraiva, 1989.
LÔBO,______________. Entidades familiares constitucionalizadas: para além do numerus clausus. Disponível em: < http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2552 >. Acesso em: 21 de maio de 2013.
NOGUEIRA, Mariana Brasil. A Família: Conceito E Evolução Histórica E Sua
Importância.Disponível em: < http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/index.php/buscalegis/article/viewFile/9544/9110 > Acesso em: 28 maio. 2013.
WALD, Arnoldo. O novo direito de família. 16ª. Ed, São Paulo: Saraiva, 2004
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FERREIRA, ANDRE ROMERO CALVET PINTO. A união homoafetiva como entidade familiar: uma nova concepção com o advento do Código Civil de 2002 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 ago 2016, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/47232/a-uniao-homoafetiva-como-entidade-familiar-uma-nova-concepcao-com-o-advento-do-codigo-civil-de-2002. Acesso em: 02 maio 2025.
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