RESUMO: O Direito Ambiental é um ramo do direito brasileiro relativamente jovem, sua criação e expansão ganharam força com a promulgação da Constituição Federal de 1988 e, desde então, os mecanismos e ferramentas protetivas vêm se especializando, a fim de atingir o nível exigido em âmbito internacional, para a proteção do bem ambiental. Tendo como objeto jurídico a proteção e a garantia do equilíbrio ambiental, um direito fundamental metaindividual, cuja repercussão não se limita às fronteiras geográficas do Brasil, o Direito Ambiental vem ganhando espaço entre os estudiosos e pesquisadores do tema, que cuidam de compreender e difundir suas ideias, a fim de garantir que o sistema nacional esteja de acordo com os padrões internacionais e exigências ratificadas pelo Brasil nas Convenções e Tratados Internacionais sobre a temática ambiental. Neste contexto, o presente artigo busca realizar uma abordagem sequenciada, que acompanha a evolução conceitual do tema, na tentativa de viabilizar a compreensão através de uma sequência lógica, ocorrida na gênese do próprio ramo do Direito, objeto de seu estudo. Seguindo essa lógica é feita a abordagem dos princípios que embasam o Direito Ambiental como um todo, sem os quais é impossível compreender as peculiaridades de suas ações específicas. Iniciando com um tópico sobre Meio Ambiente, onde é apresentado o seu conceito, fazendo a devida distinção de outros conceitos a ele relacionados, mas que não guardam relação com o objeto jurídico da matéria. Assim, é feita uma abordagem aos seus princípios norteadores, que embora sejam específicos, guardam estreita relação com os supra princípios que regem toda a legislação universal, à exemplo do princípio da Dignidade da Pessoa Humana.
PALAVRAS-CHAVE: Direito Ambiental; Princípios do Direito Ambiental; Meio Ambiente.
ABSTRACT: Environmental Law is a relatively young branch of Brazilian law, its creation and expansion gained strength with the promulgation of the 1988 Federal Constitution and, since then, protective mechanisms and tools have been specializing in order to reach the level required at the international level, for the protection of the environmental good. Having as its legal object the protection and guarantee of the environmental balance, a fundamental meta-individual right, whose repercussion is not limited to the geographical borders of Brazil, Environmental Law has been gaining space among scholars and researchers on the subject, who take care to understand and disseminate their ideas, in order to ensure that the national system is in accordance with international standards and requirements ratified by Brazil in the International Conventions and Treaties on the environmental theme. In this context, the present article seeks to carry out a sequenced approach, which follows the conceptual evolution of the theme, in an attempt to make understanding viable through a logical sequence, which occurred in the genesis of the branch of Law itself, object of its study. Following this logic, the principles that underlie Environmental Law as a whole are approached, without which it is impossible to understand the peculiarities of its specific actions. Starting with a topic on the Environment, where its concept is presented, making the due distinction from other concepts related to it, but which are not related to the legal object of the matter. In the following topic, an approach is made to its guiding principles, which, although specific, are closely related to the above principles that govern all universal legislation, such as the principle of the Dignity of the Human Person.
KEYWORDS: Environmental Law; Principles of Environmental Law; Environment.
SUMÁRIO: 1. Introdução; 2. Princípios do Direito Ambiental e Jurisprudência correlata. Conclusão; Referências Bibliográficas.
1 INTRODUÇÃO
A interação humana com o meio ambiente sempre ocorreu de forma instintiva: o homem buscava na natureza os recursos para sobrevivência, de forma indiscriminada, sem a consideração acerca das condições de renovação destes recursos. O crescimento associado à evolução tecnológica foram as molas propulsoras para que essa exploração de recursos passasse a níveis antes inimagináveis, e, portanto, desse início a um processo de degradação em larga escala que, ainda assim, era fato desconsiderado diante da enorme evolução que vivia a sociedade de forma geral.
Começa a nascer o conceito de sustentabilidade voltado ao uso de recursos naturais, a fim de garantir não apenas a sua exploração, para possibilitar a sequência do desenvolvimento, mas a sua manutenção ao longo do tempo. Essa sequência exploratória eivada de degradação, começou a dar sinais de afetação ao meio ambiente e, a partir da também evoluída ciência, percebeu-se a finitude de alguns recursos naturais antes desconsiderada. Essa constatação gerou a necessidade de atuação preventiva, em todas as ações humanas, como forma de redução de impactos. Necessário também que houvesse a união de vários setores da sociedade, assim como várias vertentes científicas conjugando esforços no sentido único de somar conhecimentos e repensar ações de desenvolvimento clássicas, que atendiam as finalidades imediatas, com um alto custo benefício a longo prazo.
Para que se concretizasse essa nova noção de desenvolvimento, houve a necessidade de congregar diversas áreas de conhecimento científico, jurídico e técnico, assim como foi necessário pensar o ajustamento do direito à efetivação dessa proteção na prática. Nesse contexto, nasce o Direito Ambiental, fruto de uma interação interdisciplinar que regula a atividade humana e sua relação com o meio ambiente, de forma a garantir que haja exploração sustentável, a fim de propiciar a manutenção de um meio ambiente sadio às próximas gerações.
Comparado aos outros ramos do direito, temos o direito ambiental como um segmento jovem do direito pátrio e, por essa razão, faz uso de vários conceitos e princípios de outras disciplinas jurídicas clássicas, a fim de tutelar o bem meio ambiente de forma satisfatória, não se limitando às fronteiras legais nacionais, ao incorporar posições e ferramentas legais supranacionais, a fim de preservar o bem ambiental. Essa sequência exploratória eivada de degradação, começou a dar sinais de afetação ao meio ambiente e, a partir da também evoluída ciência, percebeu-se a finitude de alguns recursos naturais antes desconsiderada. Essa constatação gerou a necessidade de atuação preventiva, em todas as ações humanas, como de reduzir os impactos.
A fim de possibilitar a tutela jurisdicional prevista no art. 225 da Constituição Federal de 1988, o Direito Ambiental apresenta-se como um ramo interdisciplinar do direito pátrio, trazendo em seu corpo: conceitos legais, tipificações de crimes ambientais, ferramentas de prevenção e contenção de violações ao meio ambiente sadio, atores legitimados para atuar em sua defesa e todos os instrumentos necessários ao atendimento das diretrizes internacionais acerca do tema.
Ao contrário do que possa parecer em um primeiro momento, o paradigma meio ambiente e desenvolvimento econômico não é uma oposição exata. O pensamento da sustentabilidade dentro do Direito Ambiental Brasileiro permite o desenvolvimento de atividades econômicas dentro da ótica da preservação e do reuso, que visam compatibilizar estas atividades com o desenvolvimento em ações sustentáveis ao longo do tempo.
Nesse contexto, há que se ressaltar o direito ao meio ambiente equilibrado, como direito fundamental sedimentado na Constituição Federal. Seguindo uma tendência constitucional da década de 70, a Constituição Federal de 1988 mantém a importância do equilíbrio do meio ambiente como ponto que serve de base para o Direito Ambiental Brasileiro: relaciona as competências legislativas e administrativas em matéria ambiental, aspectos culturais e sociais do meio ambiente que devem ser protegidos, e coliga o meio ambiente sadio como um requisito indispensável ao atendimento do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Essa importância concedida ao meio ambiente sadio, no contexto constitucional, já foi reconhecida pela Suprema Corte do Brasil, que entendeu:
“Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Trata- se de um típico direito de terceira geração (ou de novíssima dimensão), que assiste a todo o gênero humano (RTJ 158/205-206). Incumbe, ao Estado e à própria coletividade, a especial obrigação de defender e preservar, em benefício das presente e futuras gerações, esse direito de titularidade coletiva e de caráter transindividual (RTJ 164/158-161). O adimplemento desse encargo, que é irrenunciável, representa a garantia de que não se instaurarão, no seio da coletividade, os graves conflitos intergeracionais marcados pelo desrespeito ao dever de solidariedade, que a todos se impõe, na proteção desse bem essencial de uso comum das pessoas em geral. (ADI-MC n.º 3540-1 – STF)
Grande discussão pousa sobre a natureza jurídica do Direito Ambiental. Por tratar de tutelar um bem garantido nos direitos fundamentais de terceira geração, há que se considerar a existência de um híbrido entre direito público e privado, haja vista que se caracteriza pela titularidade coletiva do bem tutelado, a quem se destina uma regulação Estatal como forma interventiva, devido à complexidade desse bem.
Em outras palavras, temos um interesse que ao mesmo tempo pode ser considerado privado e público, bastando para essa configuração o ajuste de prisma, mas que tem no Poder Público seu maior defensor, através de suas instituições que, no entanto, não gozam de legitimidade privada para acionar o poder jurisdicional na tutela do bem meio ambiente, podendo um particular tomar a decisão de fazer valer sua cidadania e tomar providências no sentido de retirar o Estado-Juiz de sua inércia principiológica.
Portanto, temos um Direito cuja natureza jurídica foge da dicotomia clássica do Público-Privado e nasce o conceito para os direitos fundamentais de terceira geração, dos interesses metaindividuais. A análise da natureza jurídica do Direito Ambiental se faz necessária, para que seja possível a compreensão das duas dimensões de atuação estatal no que tange à tutela do bem ambiental.
Segundo a lógica de atuação do Estado, temos que a natureza jurídica privada de um Direito estabelece os limites de atuação estatal como atividade eminentemente secundária, chegando a considerar-se como regra a abstenção dessa atuação, principalmente ao se considerar o princípio de valorização da vontade das partes. Já o direito de natureza pública prescinde do particular e impõe ao Estado uma veemente atuação no sentido de fazer valer seus poderes institucionais para a manutenção da paz e harmonia sociais.
Neste diapasão, percebe-se que o Direito Ambiental traz de forma muito clara essas duas dimensões da atuação Estatal. Essa lição é bem abordada por BACAL (2012):
O reconhecimento do direito ao ambiente enquanto direito fundamental não obstrui o fato de que a proteção do meio ambiente também constitui uma finalidade do Estado e, de forma geral, dos poderes públicos, aos quais se impõe o papel ativo na promoção e na defesa dos bens e valores ambientais. Ou seja, o reconhecimento do direito ao ambiente enquanto categoria de direito fundamental, do qual emerge uma série de prerrogativas para os cidadãos, não subtrai ao Estado o dever de legislar e fiscalizar a aplicação das normas relativas ao ambiente. [...] o direito ao ambiente possui a natureza, para além de um dever fundamental do Estado, de um direito subjetivo fundamental atribuído à generalidade dos cidadãos, aos quais são conferidos os meios idôneos para preservá-lo e defendê-lo contra quaisquer ameaças e danos que sobre ele recaiam (v.g. as ações coletivas). (Eduardo Braga Bacal. Tutela Processual Ambiental e a Coisa Julgada nas Ações Coletivas, 2012, p.13).
Destarte, percebe-se claramente que o Direito Ambiental é de natureza jurídica híbrida, apresentando-se o bem ambiental como direito da coletividade e dever protetivo do Estado que, diferentemente do direito público puro, atua preventivamente tanto nas relações entre Estado-particular, como nas relações estritamente estabelecidas entre particulares, quando haja qualquer risco ao bem ambiental.
As ferramentas para a efetivação desta proteção Estatal também possuem titularidade compartilhada, no entanto, suas ações são capitaneadas de forma muito competente pelo Ministério Público. O uso de ações civis públicas, inquéritos civis e termos de ajustamento de conduta, assim como a tipificação penal dos crimes e contravenções ambientais, são instrumentos que a legislação pôs à disposição do Direito Ambiental para que seja possível uma atuação preventiva e corretiva à violação desses direitos que são tão caros a toda a sociedade.
A especificidade do Direito Ambiental também se estende aos seus princípios norteadores. Os princípios aplicados à tutela do bem ambiental são ajustados à realidade e aos detalhes necessários à prevenção e à correção de atos ou omissões que afetem a sua tutela. Grande parte dos princípios que regem o Direito Ambiental tiveram sua gênese na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, em 1972, realizada em Estocolmo, cuja declaração trouxe elencados, por primeira vez, a base do Direito Ambiental no mundo.
2 PRINCÍPIOS DO DIREITO AMBIENTAL E JURISPRUDÊNCIA CORRELATA
a) Princípio do Direito à Sadia Qualidade de Vida:
O direito à vida, preconizado como o direito mais fundamental de todos, base para a existência dos demais, por si só traz a condução da existência do maior de todos os princípios: o da Dignidade da Pessoa Humana. Com o passar dos anos, a mera garantia de vida não correspondia ao atendimento dos critérios de dignidade, uma vez que as condições sob as quais essa vida se desenvolveria eram determinantes para que o supra princípio fosse respeitado em sua plenitude. Os princípios aplicados à tutela do bem ambiental são ajustados à realidade e aos detalhes necessários à prevenção e à correção de atos ou omissões que afetem a sua tutela. Grande parte dos princípios que regem o Direito Ambiental tiveram sua gênese na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, em 1972, realizada em Estocolmo, cuja declaração trouxe elencados, por primeira vez, a base do Direito Ambiental no mundo.
Diante desta nova concepção, a qualidade de vida passou a ser a situação ideal dentro dos novos conceitos sociais conquistados pela luta dos direitos fundamentais de segunda e terceira geração. Sob o prisma ambiental, o meio ambiente é um dos fatores que proporciona condições mínimas de qualidade de vida à sociedade como um todo. Neste diapasão, a necessidade de manutenção de meio ambiente sadio foi elevada à condição de princípio e, portanto, rege todas as relações que, de alguma maneira, afetem o meio ambiente.
O princípio do direito à sadia qualidade de vida está previsto em inúmeros documentos e protocolos internacionais sobre a temática, dentre estes podendo ser destacada a sua presença na Declaração de Estocolmo, gerada na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente ocorrida em 1972, que prevê a necessidade de adequadas condições de vida e um meio ambiente de qualidade em seu princípio 1:
O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao desfrute de condições de vida adequadas em um meio ambiente de qualidade tal que lhe permita levar uma vida digna e gozar de bem-estar, tendo a solene obrigação de proteger e melhorar o meio ambiente para as gerações presentes e futuras. A este respeito, as políticas que promovem ou perpetuam o apartheid, a segregação racial, a discriminação, a opressão colonial e outras formas de opressão e de dominação estrangeira são condenadas e devem ser eliminadas. (Organização das Nações Unidas - Declaração de Estocolmo sobre o Meio Ambiente Humano. Estocolmo – 1972)
b) Princípio do Acesso Equitativo aos Recursos Naturais:
O equilíbrio no uso e exploração dos recursos naturais é uma constante preocupação quando se observa o respeito à sustentabilidade no processo de usufruto desses recursos. O termo equidade traz o sentido de justiça no acesso a quaisquer âmbitos de nossa sociedade, o tratamento diferenciado para os diferentes é uma forma de possibilitar o acesso justo a todos que possuam interesse comum.
No caso dos recursos naturais, a equidade na exploração de recursos naturais apresenta-se com um grau de complexidade maior: é necessário possibilitar acesso equânime à geração atual e as futuras, de forma que o uso desses recursos na atualidade não prejudique as sociedades que estão por vir, de forma que lhes sejam garantidos o mesmo meio ambiente sadio.
A Declaração de Estocolmo (1972) traz o princípio textualmente, elencado como o 5º:
Os recursos não renováveis da terra devem empregar-se de forma que se evite o perigo de seu futuro esgotamento e se assegure que toda a humanidade compartilhe dos benefícios de sua utilização. (Declaração de Estocolmo, art.5º)
A Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento traz esse princípio elencado no número 3:
O direito ao desenvolvimento deve ser exercido de modo a permitir que sejam atendidas equitativamente as necessidades de desenvolvimento e de meio ambiente das gerações presentes e futuras. (Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, princípio 3º)
O direito à vida, preconizado como o direito mais fundamental de todos, base para a existência dos demais, por si só traz a condução da existência do maior de todos os princípios: o da Dignidade da Pessoa Humana. Muitos outros documentos sobre a temática ambiental, resultado de reuniões entre nações, trazem o princípio ajustado a outros recursos, como o uso equitativo da água, presente no documento da Convenção para a Proteção e Utilização dos Cursos de Água Transfronteiriços e dos Lagos Internacionais, de Helsinque, 1992; ou a Convenção sobre a Diversidade Biológica, ratificou cada em âmbito nacional pelo Decreto 2.519/98, todos com a preocupação comum de que a justiça ambiental não se limita ao uso comedido atual, e sim uma racionalidade atual preocupada com a subsistência dos recursos para as gerações futuras.
c) Princípio do usuário-pagador:
Segundo esse princípio, as pessoas que se utilizam dos recursos naturais escassos devem pagar pela sua utilização, ainda que não haja poluição. Dessa forma, por esse princípio, a utilização dos recursos naturais mais escassos deve ser cobrada na tentativa de racionalizar sua utilização, funcionando como medida educativa para evitar o desperdício.
d) Princípio do Poluidor-Pagador:
Ao analisar a questão do consumo de recursos naturais, é necessário estabelecer dois segmentos de acesso a eles: o consumo propriamente dito, a exemplo do consumo de água potável disponibilizada pelo Estado para finalidade econômica; e o consumo retratado pelo dano ao recurso, tendo como maior exemplo a poluição ambiental, através do lançamento de substâncias poluidoras no meio ambiente. Nas palavras de BENJAMIN (1993), p. 33, o princípio do poluidor-pagador:
Impõe ao poluidor o dever de arcar com as despesas de prevenção, reparação e repressão da poluição. Ou seja, estabelece que o causador da poluição e da degradação dos recursos naturais deve ser o responsável principal pelas consequências de sua ação (ou omissão). BENJAMIN (1993), p. 33.
A ideia norteadora do princípio do poluidor/usuário pagador é a compensação financeira como meio de contenção aos abusos, tanto no que diz respeito a consumo, como no tocante à degradação propriamente dita. Analisando especificamente a sua vertente punitiva, relacionada aos atos ou omissões que resultem em poluição ambiental, há discussões no sentido de entender que o referido princípio se apresenta como uma licença para poluir.
Longe deste entendimento, o princípio do poluidor-pagador busca otimizar a obediência aos demais princípios no momento em que torna inviável para o poluidor a sua ação/omissão danosa ao bem ambiental, em razão da repercussão financeira que ocorrerá em caso de impactos ou efeitos negativos. No direito ambiental o princípio do poluidor-pagador encontra-se previsto na Lei 6.938/1981 - que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, art. 4º, VII que impõe ao poluidor e ao predador, obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos.
Essa amplitude do princípio poluidor-pagador não limita sua denominação como um princípio de compensação, uma vez que nos custos do valor cobrado estão inseridos gastos com prevenção, repressão e correção dos danos e consumo dos recursos naturais. A Declaração de Estocolmo (1972), traz o princípio textualmente, elencado como o 5º:
Os recursos não renováveis da terra devem empregar-se de forma que se evite o perigo de seu futuro esgotamento e se assegure que toda a humanidade compartilhe dos benefícios de sua utilização. (Declaração de Estocolmo, art. 5º).
Não obstante, necessário se faz verificar a relação entre poluidor-pagador e usuário-pagador: o primeiro visa, primordialmente, a responsabilizar o causador do dano, recompondo o meio ambiente. O segundo visa a evitar o enriquecimento sem causa do usuário de um bem comum da coletividade. O usuário é aquele que não causa poluição. Paga por um direito outorgado pelo poder público. O princípio do usuário-pagador representa uma evolução do princípio do poluidor-pagador. Embora apresentem traços distintos, são, na verdade, complementares. Por isso, muitas vezes, são tratados conjuntamente pela jurisprudência, para justificar do dever de reparação cumulado com o dever de pagamento:
ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DESMATAMENTO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE, SEM AUTORIZAÇÃO DA AUTORIDADE AMBIENTAL. DANOS CAUSADOS À BIOTA. INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 4º, VII, E 14, § 1º, DA LEI 6.938/1981 E DO ART. 3º DA LEI 7.347/85. PRINCÍPIOS DA REPARAÇÃO INTEGRAL, DO POLUIDOR-PAGADOR E DO USUÁRIO-PAGADOR. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER (REPARAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA) E DE PAGAR QUANTIA CERTA (INDENIZAÇÃO). REDUCTION AD PRISTINUM STATUM. DANO AMBIENTAL INTERMEDIÁRIO, RESIDUAL E MORAL COLETIVO. ART. 5º DA LEI DE INTRODUÇÃO AO CÓDIGO CIVIL. INTERPRETAÇÃO IN DUBIO PRO NATURA DA NORMA AMBIENTAL. 1. Cuidam os autos de Ação Civil Pública proposta com o fito de obter responsabilização por danos ambientais causados pela supressão de vegetação típica de brejo sem autorização do órgão ambiental competente. O juiz de primeiro grau e o Tribunal de Justiça de Minas Gerais consideraram provado o dano ambiental e condenaram o réu a repará-lo; porém, julgaram improcedente o pedido indenizatório pelo dano ecológico pretérito e residual. 2. A jurisprudência do STJ está firmada no sentido da viabilidade, no âmbito da Lei 7.347/85 e da Lei 6.938/81, de cumulação de obrigações de fazer, de não fazer e de indenizar (REsp 1.145.083/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 4.9.2012; REsp 1.178.294/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 10.9.2010; AgRg nos EDcl no Ag 1.156.486/PR, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 27.4.2011; REsp 1.120.117/AC, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 19.11.2009; REsp 1.090.968/SP, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 3.8.2010; REsp 605.323/MG, Rel. Ministro José Delgado, Rel. p/Acórdão Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJ 17.10.2005; REsp 625.249/PR, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJ 31.8.2006, entre outros). 3. Recurso Especial parcialmente provido para reconhecer a possibilidade de cumulação de indenização pecuniária com as obrigações de fazer e não fazer voltadas à recomposição in natura do bem lesado, devolvendo-se os autos ao Tribunal de origem para que fixe, in casu, o quantum debeatur reparatório do dano já reconhecido no acórdão recorrido. (REsp 1255127/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/08/2016, DJe 12/09/2016)
e) Princípio da Prevenção:
Observando que os princípios se complementam entre si, vamos analisar o princípio da prevenção, percebendo que ele é, como todos os demais, complementar na efetiva tutela do bem ambiental. Sua primeira previsão encontra-se no princípio 7 da Declaração de Estocolmo, que dispõe:
Os Estados deverão tomar todas as medidas possíveis para impedir a poluição dos mares por substâncias que possam pôr em perigo a saúde do homem, os recursos vivos e a vida marinha, menosprezar as possibilidades de derramamento ou impedir outras utilizações legítimas do mar. (Declaração de Estocolmo, princípio 7º)
Observe que o foco do princípio da prevenção é evitar a poluição, a ocorrência do dano atribuindo aos Estados a possibilidade de adoção de medidas preventivas. Inicialmente, o foco do princípio eram os mares, em virtude de sua sujeição ao derramamento de óleo e à poluição por deságue. No entanto, a prerrogativa atribuída aos Estados possibilitou, por exemplo, a previsão de ferramentas no Direito Ambiental Brasileiro de prevenção mais ampla, a exemplo do Estudo de Impacto Ambiental, constitucionalmente criado e aplicado a todas as obras que possuam potencial degradante para o entorno ambiental de sua instalação. O próprio artigo 225 da Constituição Federal traz em seu corpo o princípio da prevenção, ao impor ao Estado o dever de prevenção do meio ambiente.
f) Princípio da informação:
Este princípio é ligado ao princípio da participação comunitária e também ao princípio da publicidade, que norteia a Administração Pública. Isso porque o acesso às informações é imprescindível para que a população partícipe das decisões políticas ambientais. Com base nesse princípio, os órgãos ambientais possuem obrigação de permitir o acesso público aos documentos e aos processos administrativos que tratem de matéria ambiental, devendo fornecer todas as informações necessárias e que estejam sob a sua guarda. Tal direito é conferido a qualquer cidadão, independentemente, em regra, da demonstração de interesse específico.
g) Princípio da Precaução:
Diferentemente do princípio da prevenção, que objetiva prevenir ações e/ou omissões que, notadamente, afetarão o meio ambiente, o princípio da precaução tem como função prever situações que ainda não tenham efeitos negativos cientificamente comprovados, mas que possuam um potencial degradante a ser considerado, de forma que não haja danos ambientais pelo aparecimento de contextos não previstos, uma vez que o dano pode ser irreversível e, portanto, tenha um custo muito alto para a sociedade como um todo. O princípio teve sua gênese na Alemanha, por volta dos anos 70, e se consolidou no Direito Internacional após ser inserido na Declaração do Rio sobre o Meio Ambiente, em 1992, como o 15º princípio presente no documento:
Com o fim de proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deverá ser amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas capacidades. Quando houver ameaça de danos graves ou irreversíveis, a ausência de certeza científica absoluta não será utilizada como razão para o adiamento de medidas economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental. (Declaração do Rio sobre o Meio Ambiente, princípio 15º)
Estando também presente em outros dois tratados internacionais, ratificados e homologados pelo Brasil. Observe-se que à mera ameaça de dano basta para acionar o Estado no seu dever tutelar do bem ambiental, o que demonstra que o princípio da precaução possui natureza indubitavelmente preventiva.
De acordo com o STF:
De acordo com o princípio da precaução, se existe uma desconfiança, um risco de que determinada atividade pode gerar um dano ambiental sério ou irreversível ao meio ambiente e à saúde humana, neste caso, a referida atividade deverá ser proibida ou restringida mesmo que ainda não exista uma certeza científica de que ela é realmente perigosa. No caso analisado pelo STJ, uma associação de moradores de São Paulo ajuizou ação civil pública pedindo que a concessionária de energia elétrica "Eletropaulo Metropolitana – Eletricidade de São Paulo S.A" fosse obrigada a reduzir o campo eletromagnético na sua linha de transmissão localizada nas proximidades deste bairro. Segundo a parte autora os níveis do campo eletromagnético poderiam causar danos à saúde humana e ao meio ambiente e pediu que a concessionária adotasse os mesmos parâmetros que são previstos na legislação da Suíça. Entretanto, a Corte concluiu que, atualmente, não existem fundamentos fáticos ou jurídicos a obrigar as concessionárias de energia elétrica a reduzir o campo eletromagnético das linhas de transmissão de energia elétrica abaixo do patamar legal fixado pela ANEEL. STF. Plenário. RE 627189/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 8/6/2016 (repercussão geral) (Info 829).
É com base nesse princípio que a doutrina sustenta a possibilidade de inversão do ônus da prova nas demandas ambientais, carreando ao réu (suposto poluidor) a obrigação de provar que sua atividade não é perigosa nem poluidora:
PROCESSUAL CIVIL. AMBIENTAL. CUSTEIO DE PERÍCIA PARA AVALIAR SE HOUVE INVASÃO DE ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. POSSIBILIDADE. REEXAME DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. RECURSO QUE NÃO ABRANGE TODOS OS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO VERGASTADO. SÚMULA 538/STF. MULTA PROCESSUAL. INTERPOSIÇÃO DE AGRAVO INTERNO CONTRA DECISÃO MONOCRÁTICA. NECESSIDADE DE JULGAMENTO COLEGIADO PARA ESGOTAMENTO DA INSTÂNCIA. IMPOSIÇÃO DE MULTA INADEQUADA. SANÇÃO PROCESSUAL AFASTADA. PRECEDENTES DO STJ. 1. Na hipótese dos autos, o Juízo originário consignou que a inversão do ônus da prova decorreu da aplicação do princípio da precaução, como noticiado pelo próprio recorrente à fl. 579/STJ. Nesse sentido, a decisão está em consonância com a orientação desta Corte Superior de que o princípio da precaução pressupõe a inversão do ônus probatório. (AgRg no AREsp 183.202/SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 10/11/2015, DJe 13/11/2015). 2. O Tribunal de origem acrescentou que o ônus da prova recaiu sobre a parte recorrente, em razão de ter sido ela quem requerera a produção da prova pericial (fl. 563/e-STJ). 3. O acolhimento da pretensão recursal demanda o reexame do contexto fático-probatório, especialmente das circunstâncias fáticas que levaram o Juízo originário a adotar o princípio ambiental da precaução, o que faz incidir o óbice da Súmula 7/STJ. 4. A parte recorrente também não atacou, em Recurso Especial, o fundamento de que o ônus da perícia foi imputado a ela por ter sido a requerente da produção da prova, o que atrai o disposto na Súmula 283/STF. 5. Por outro lado, A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça já estabeleceu que agravo interposto contra decisão monocrática do Tribunal de origem com o objetivo de exaurir a instância recursal ordinária, a fim de permitir a interposição de recurso especial e do extraordinário, não é manifestamente inadmissível ou infundado, o que torna inaplicável a multa prevista no art. 557, § 2º, do Código de Processo Civil. 6. Agravo Interno parcialmente provido apenas para afastar a multa processual. (AgInt no AREsp 779.250/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/12/2016, DJe 19/12/2016).
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E DIREITO AMBIENTAL. USINA HIDRELÉTRICA. CONSTRUÇÃO. PRODUÇÃO PESQUEIRA. REDUÇÃO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO INCONTESTE. NEXO CAUSAL. PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. CABIMEN-TO. PRECEDENTES. INOVAÇÃO EM RECURSO ESPECIAL. NÃO OCORRÊNCIA. 1. A Lei nº 6.938/1981 adotou a sistemática da responsabilidade objetiva, que foi integralmente recepcionada pela ordem jurídica atual, de sorte que é irrelevante, na espécie, a discussão da conduta do agente (culpa ou dolo) para atribuição do dever de reparação do dano causado, que, no caso, é inconteste. 2. O princípio da precaução, aplicável à hipótese, pressupõe a inversão do ônus probatório, transferindo para a concessionária o encargo de provar que sua conduta não ensejou riscos para o meio ambiente e, por consequência, para os pescadores da região. 3. Não há inovação em recurso especial se, ainda que sucintamente, a matéria foi debatida no tribunal de origem. 4. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 183.202/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/11/2015, DJe 13/11/2015).
PROCESSUAL CIVIL – COMPETÊNCIA PARA JULGAMENTO DE EXECUÇÃO FISCAL DE MULTA POR DANO AMBIENTAL – INEXISTÊNCIA DE INTERESSE DA UNIÃO - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL - PRESTAÇÃO JURISDICIONAL - OMISSÃO - NÃO-OCORRÊNCIA - PERÍCIA - DANO AMBIENTAL - DIREITO DO SUPOSTO POLUI-DOR - PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. 1. A competência para o julgamento de execução fiscal por dano ambiental movida por entidade autárquica estadual é de competência da Justiça Estadual. 1. Não ocorre ofensa ao art. 535, II, do CPC, se o Tribunal de origem decide, fundamentadamente, as questões essenciais ao julgamento da lide. 3. O princípio da precaução pressupõe a inversão do ônus probatório, competindo a quem supostamente promoveu o dano ambiental comprovar que não o causou ou que a substância lançada ao meio ambiente não lhe é potencialmente lesiva. 4. Nesse sentido e coerente com esse posicionamento, é direito subjetivo do suposto infrator a realização de perícia para comprovar a ineficácia poluente de sua conduta, não sendo suficiente para torná-la prescindível informações obtidas de sítio da internet.5. A prova pericial é necessária sempre que a prova do fato depender de conhecimento técnico, o que se revela aplicável na seara ambiental ante a complexidade do bioma e da eficácia poluente dos produtos decorrentes do engenho humano. 6. Recurso especial provido para determinar a devolução dos autos à origem com a anula-ção de todos os atos decisórios a partir do indeferimento da prova pericial. (STJ, REsp 1060753/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/12/2009, DJe 14/12/2009).
Cumpre ressaltar que, nem sempre, a aplicação dos princípios da precaução e da prevenção devem levar à inviabilidade do procedimento, já que a aplicação de tais princípios é significativamente influenciada pelo caso concreto, ainda mais quando a desconstituição de determinado empreendimento leva a danos maiores que a sua manutenção pode proporcionar. Nesse sentido, veja-se julgado do STJ:
ADMINISTRATIVO E AMBIENTAL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. EMPREENDIMENTO HOTELEIRO. BAIXO IMPACTO AMBIENTAL. ÁREA DE PRESER-VAÇÃO PERMANENTE. NECESSIDADE DE AUTORIZAÇÃO DOS ÓRGÃOS AMBIEN-TAIS ESTADUAIS. MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL PELO DESPROVIMENTO DO APELO RARO. INCIDÊNCIA DO ART. 462 DO CPC/73 ANTE A SUPERVENIÊNCIA DO NOVO CÓDIGO FLORESTAL QUE ALTEROU AS DETERMINAÇÕES LEGAIS PARA AS ATIVIDADES DE BAIXO IMPACTO AMBIENTAL. OBJETIVO LEGAL DE MAXIMIZAR A PRESERVAÇÃO AMBIENTAL E COMPATIBILIZÁ-LA COM A SUA EXPLORAÇÃO SUSTENTÁVEL. O DESFAZIMENTO DAS OBRAS PODE SER ATÉ MAIS PREJUDICIAL DO QUE A SUA ADEQUAÇÃO À NOVA LEGISLAÇÃO. HIPÓTESE EM QUE DEVE SER DETERMINADO O PROSSEGUIMENTO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO, A FIM DE SE CONCLUIR O DEVIDO LICENCIAMENTO SOB A ÉGIDE DA NOVA LEGISLAÇÃO. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO PARA ESSE FIM. 1. A superveniência da Lei 12.651/2012 (Novo Código Florestal) repercutindo no presente caso, é considerado normativo afluente, nos termos do art. 462 do CPC, porquanto deve o procedimento administrativo de licenciamento, já requerido pelo interessado, ser analisado e decidido pela Autoridade Ambiental, sob as novas diretrizes hoje vigentes, não se exigindo a apresentação de outro ou novo pleito administrativo. 2. A aplicação tópica do princípio da precaução recomenda, no caso dos autos, que antes de se determinar o eventual desfazimento das obras, o que ensejará maiores prejuízos ambientais, seja dado prosseguimento ao procedimento administrativo de licenciamento, até a sua regular conclusão, decidindo-se o pedido na forma prevista no Novo Código Florestal. 3. O propósito de proporcionar a preservação ambiental a qualquer custo não é um fim em si mesmo, e não pode ser aplicado cegamente, causando até, um efeito contrário indesejado, razão pela qual, este caso, não comporta mero decreto de provimento ou improvimento recursal, mas sim a determinação de que o procedimento de licenciamento seja reanalisado, ante a superveniência de nova legislação ambiental, não sendo razoável impor-se a renovação do mesmo pleito na via administrativa, para decisão conforme as novas diretrizes ambientais. 4. Recurso Especial parcialmente provido para o fim de se determinar o prosseguimento do procedimento administrativo de licenciamento, agora sob a égide da nova legislação ambiental. (REsp 1201954/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 22/11/2016, DJe 17/08/2017)
Além disso, o princípio da precaução, como fator de legitimação democrática, está intimamente ligado ao princípio da educação ou informação ambiental, pois somente diante das informações claras e acessíveis a toda a comunidade é possível se debater, com maior rigor, os efeitos que determinado empreendimento gera ou, em tese, poderia gerar no meio ambiente. Sobre o tema, relevante o seguinte julgado do STJ:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. MEIO AMBIENTE. DIREITO DE INFORMAÇÃO. ART. 225, § 1º, VI, DA CONSTITUIÇÃO. ART. 4º, V, DA LEI 6.938/1981. PRINCÍPIO 10 DA DECLARAÇÃO DO RIO. DIREITO DE PARTICIPAÇÃO. ART. 2°, § 1°, DA LEI 10.650/2003. PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO. CULTURA DA TRANSPARÊNCIA AMBIENTAL. ART. 3°, IV, DA LEI 12.527/2011. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANO MORAL. IBAMA VERSUS PARTICULAR. IMPOSSIBILIDADE. DIREITOS FUNDAMENTAIS. PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO. RECONHECIMENTO LIMITADO. 1. Trata-se, na origem, de Ação Ordinária ajuizada em desfavor da União e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - Ibama, na qual a Associação Brasileira da Indústria de Pneus Remoldados - ABIP e a BS Colway Pneus Ltda. postulam: a) declaração da ilegalidade de publicação de "cartilha" pelo Ibama contendo informações alegadamente inverídicas e prejudiciais às autoras; b) imposição de obrigação de fazer consistente no recolhimento do material impresso já distribuído e sua retirada dos meios de comunicação, sob pena de multa diária; c) condenação em obrigação de não fazer qualquer anúncio ou divulgação do conteúdo questionado; e d) pagamento por danos morais sofridos. Por sua vez, o Ibama, em Reconvenção, buscou indenização por danos morais, aduzindo que fora denegrida sua honra objetiva. 2. Irretocável o acórdão recorrido. Alicerce do Direito Ambiental brasileiro e decorrência do dever-poder estatal de transparência e publicidade, o direito à informação se apresenta, a um só tempo, como pressuposto e garantia de eficácia do direito de participação das pessoas na formulação, implementação e fiscalização de políticas públicas de salvaguarda da biota e da saúde humana, sempre com o desiderato de promover "a conscientização pública para a preservação do meio ambiente" (Constituição, art. 225, § 1º, VI), de formar "uma consciência pública sobre a necessidade de preservação da qualidade ambiental e do equilíbrio ecológico" (Lei 6.938/1981, art. 4º, V) e de garantir o "acesso adequado às informações relativas ao meio ambiente de que disponham as autoridades", incumbindo aos Estados "facilitar e estimular a conscientização e a participação pública, colocando as informações à disposição de todos" (Princípio 10 da Declaração do Rio). 3. Nessa linha de raciocínio, mais do que poder ou faculdade, os órgãos ambientais portam universal e indisponível dever de informar clara, ativa, cabal e honestamente a população, "independentemente da comprovação de interesse específico" (Lei 10.650/2003, art. 2º, § 1º), para tanto utilizando-se de dados que gerem ou lhes aportem, mesmo quando ainda não detentores de certeza científica, pois uma das formas mais eloquentes de expressão do princípio da precaução ocorre precisamente no campo da transparência e da publicidade do Estado. A regra geral na Administração Pública do meio ambiente é não guardar nenhum segredo e tudo divulgar, exceto diante de ordem legal expressa em sentido contrário, que deve ser interpretada restritivamente pelo administrador e juiz. Além de objetivos estritamente ecológicos e sanitários, pretende-se também fomentar "o desenvolvimento da cultura de transparência na administração publica" (Lei 12.527/2011, art. 3º, IV). 4. O acórdão recorrido está em sintonia com o atual entendimento do STJ, consoante o qual é impossível à pessoa jurídica de Direito Público (Administração Pública direta, autarquias, fundações públicas), de índole não comercial ou lucrativa, ser vítima de dano moral por ofensa de particular, já que constituiria subversão da ordem natural dos direitos fundamentais. Precedentes. 5. Assente na iterativa jurisprudência do STJ ser inviável analisar a tese defendida no Recurso Especial, a qual busca afastar as premissas fáticas estabelecidas pelo acórdão recorrido, pois inarredável a revisão do conjunto probatório dos autos. Aplica-se o óbice da Súmula 7/STJ. Precedentes do STJ. 6. Quanto à interposição pela alínea "c", a jurisprudência pacífica do STJ é no sentido de que a incidência de sua Súmula 7 impede o exame de dissídio jurisprudencial, na medida em que falta identidade entre os paradigmas apresentados e os fundamentos do acórdão, tendo em vista a situação fática do caso concreto, com base na qual deu solução à causa a Corte de origem. 7. Recurso Especial não provido. (REsp 1505923/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/05/2015, DJe 19/04/2017).
A ratificação do princípio no ordenamento pátrio, foi efetivada pela inserção dos incisos V, no parágrafo primeiro do artigo 225 da Constituição Federal, que dispõe que é dever do Estado “controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente.”
h) Princípio da Reparação:
A complexa rede de conexões que forma o meio ambiente, requer que para a manutenção do seu equilíbrio, todas as suas variáveis sejam respeitadas, de tal forma que o aumento ou a diminuição de algum de seus elementos pode causar um desequilíbrio nesse sistema abstruso.
Considerada essa particularidade do sistema ambiental, há que se considerar o impacto negativo que um dano tem potencial de causar. Como vimos anteriormente, o princípio do poluidor-pagador tem um caráter punitivo e coator das práticas danosas. No entanto, nem sempre uma contraprestação pecuniária basta para sanar os transtornos causados pela ação degradante.
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DANO AMBIENTAL. REPARAÇÃO INTEGRAL DOS DANOS. NATUREZA PROPTER REM. CUMULAÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER, DE NÃO FAZER E DE INDENIZAR. POSSIBILIDADE. 1. A jurisprudência do STJ está firmada no sentido de que a necessidade de reparação integral da lesão causada ao meio ambiente permite a cumulação de obrigações de fazer, de não fazer e de indenizar, que têm natureza propter rem. Precedentes: REsp 1.178.294/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, j. 10/8/2010; REsp 1.115.555/MG, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, j.15/2/2011; AgRg no REsp 1170532/MG, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, j. 24/8/2010; REsp 605.323/MG, Rel. para acórdão Ministro Teori Albino Zavascki, j. 18/8/2005, entre outros. 2. Agravo regimental não provido. (STJ. AgRg no REsp 1254935 SC 2011/0113562-2. Relator: Ministro Benedito Gonçalves. T1 – Primeira Turma. Julga-mento: 20/03/2014. Publicação: DJe 28/03/2014).
No direito ambiental o princípio do poluidor-pagador encontra-se previsto na Lei 6.938/1981 – que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, art. 4º, VII que impõe ao poluidor e ao predador, obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos.
O Superior Tribunal de Justiça tem, a propósito do assunto, inúmeros precedentes enfatizando que o dever de reverter danos em áreas de vegetação nativa é exigível em face do atual ocupante (a título dominial ou possessório), não importando se o quadro ambientalmente danoso já existia em época anterior à ocorrência da transmissão da propriedade ou posse. Pontua-se inclusive que a inércia ante a degradação preexistente traduz em si uma concordância com sua ocorrência por parte do sucessor na ocupação, tendo o efeito de atrair para este a responsabilidade sob forma indireta por aquela degradação.
AMBIENTAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CONHECIDOS COMO AGRAVO REGI-MENTAL. PRINCÍPIOS DA FUNGIBILIDADE RECURSAL E DA ECONOMIA PROCES-SUAL. DANO AMBIENTAL EM RESERVA LEGAL. DEVER DE RECUPERAÇÃO. OBRI-GAÇÃO "PROPTER REM". ABRANGÊNCIA DO PROPRIETÁRIO ATUAL, INDEPEN-DENTE DE QUEM CAUSOU O DANO. [...] 1. O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que (i) a averbação da reserva legal, no âmbito do Direito Ambiental, tem caráter meramente declaratório e (ii) a obrigação de recuperar a degradação ambiental ocorrida na faixa da reserva legal abrange aquele que é titular da propriedade do imóvel, mesmo que não seja de sua autoria a deflagração do dano, tendo em conta sua natureza propter rem. [...] (STJ, EDcl no Ag 1224056/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/06/2010, DJe 06/08/2010).
Diante dessa realidade, considerando que o estado do meio ambiente não retornará nunca a sua situação prévia a ocorrência danosa, o direito pátrio previu a necessidade de responsabilidade do agente no sentido de reparar, dentro das possibilidades reais, o dano efetivamente causado pela sua ação ou omissão, conforme previsão do artigo 4º, da Lei 6.938/81 que em seu inciso VII, determina que o poluidor ou predador, tem obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados.
PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PRETENDIDA INDENIZAÇÃO POR DANOS AMBIENTAIS EM PROPRIEDADE PRIVADA NA AÇÃO PRINCIPAL. LEGITIMIDADE PASSIVA DO DNPM, IBAMA, ESTADO DE MINAS GERAIS (COPAM), FEAM, IGAM E BNDES. O ESTADO RESPONDE CIVILMENTE POR ATO OMISSIVO DO QUAL RESULTE LESÃO AMBIENTAL EM PROPRIEDADE DE TERCEIRO. 1. As entidades de direito público responsáveis pela vigilância, controle e fiscalização da atividade mineradora, juntamente com a empresa extrativista, possuem legitimidade para responder como sujeitos passivos em ação de reparação por danos ambientais que se alega sofridos por particular em sua fazenda, os quais causaram crateras (dolinas) e a morte de animais, por contaminação da água. 2. Legitimidade do DNPM - Departamento Nacional de Produção Mineral que se reconhece em face de sua competência para autorizar e fiscalizar a atividade mineradora (DL 227/67). 3. O IBAMA, na qualidade de órgão executor no contexto do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA e devido a sua competência fiscalizadora supletiva (Dec 99.274/90, at.18) possui legitimidade para integrar a lide, na medida em que lhe cabe exercer ingerência direta para conter a degradação ambiental, bem como o Estado de Minas Gerais possui, por seu órgão específico, o COPAM, a inegável atribuição de expedir licenças e de fiscalizar as atividades ambientais. 4. A FEAM - Fundação Estadual do Meio Ambiente, por ser a fundação estadual responsável pela fiscalização e determinação de medidas compensatórias do meio ambiente, também é parte legítima para integrar o pólo passivo da lide. 5. Igual sujeição passiva cabe reconhecer ao Instituto Mineiro de Gestão das Águas - IGAM , tendo em vista que existe, nos autos, laudo técnico atestando a poluição da água, em decorrência da atividade extrativista, de sorte que, até que o fato seja devidamente comprovado, na ação originária, estaria havendo falha na fiscalização por parte, também, do dito instituto. 6. Quanto ao BNDES, o simples fato de ser ele a instituição financeira incumbida de financiar a atividade mineradora da CMM, em princípio, por si só, não o legitima para figurar no pólo passivo da demanda. Todavia, se vier a ficar comprovado, no curso da ação ordinária, que a referida empresa pública, mesmo ciente da ocorrência dos danos ambientais que se mostram sérios e graves e que refletem significativa degradação do meio ambiente, ou ciente do início da ocorrência deles, houver liberado parcelas intermediárias ou finais dos recursos para o projeto de exploração minerária da dita empresa, aí, sim, caber-lhe-á responder solidariamente com as demais entidades-rés pelos danos ocasionados no imóvel de que se trata, por força da norma inscrita no art. 225, caput, § 1º, e respectivos incisos, notadamente os incisos IV, V e VII, da Lei Maior. 7. Agravo de instrumento provido. (TRF1, AG 200201000363291, DESEMBARGADOR FEDERAL FAGUNDES DE DEUS, TRF1 - QUINTA TURMA, DJ DATA:19/12/2003 PAGINA:185.)
PROCESSUAL CIVIL, CIVIL E ADMINISTRATIVO. DANOS MORAIS E MATERIAIS. RES-PONSABILIDADE CIVIL. ENCHENTES NO PARQUE DAS ORQUÍDEAS. AÇÃO INDIVIDUAL DE CUNHO PATRIMONIAL. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO ÓRGÃO AMBIENTAL ESTADUAL. IMÓVEL FINANCIADO PELO SFH. LEGITIMIDADE PASSIVA DA CEF. SENTENÇA ULTRA PETITA. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. CASO FORTUITO E FORÇA-MAIOR VERIFICADOS IN CONCRETO. EXCLUSÃO DO DEVER DE INDENIZAR. 1. Sentença que reconheceu, em prol de morador do Parque das Orquídeas, situado no Município de Parnamirim/RN, o direito à indenização por danos materiais e morais causados por alagamento que atingiu aquela localidade no inverno de 2000. 1. A proteção específica do meio ambiente, destinada a promover a recuperação ambiental no interesse da coletividade e, se for o caso, punir os responsáveis pelos danos, não é o aspecto preponderante da controvérsia. 3. O litisconsórcio passivo do órgão ambiental estadual (IDEMA) não se justifica em face da sua inadequação com a causa de pedir, o objeto da lide e o pedido em si de indenização, que têm índole individual e patrimonial. 4. A construção de imóvel financiado com recursos do FGTS, por meio de contrato firmado com a CEF, gera deveres do agente financiador, inclusive no tocante à fiscalização da obra financiada, conferindo legitimidade passiva àquela instituição financeira, ainda que in meritis se possa descartar a sua responsabilidade civil. Competência da Justiça Federal (art. 109, I, da CF). [...] (TRF5, AC 200384000046696, Desembargador Federal Marcelo Navarro, TRF5 - Quarta Turma, DJ - Data::12/09/2007 - Página::628 - Nº::176.)
Essa reparação não se trata de indenização pecuniária, e sim de ações de reversão e minimização dos impactos negativos causados. Apenas em caso de impossibilidade de restauração é arbitrado quantum indenizatório com a finalidade de reparação dos danos.
Concernente à corrente da corresponsabilidade do estado solidária, objetiva, ilimitada e subsidiária adotada pelo STJ:
ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RECURSOS HÍDRICOS. PRIORIDADE DO ABASTECIMENTO PÚBLICO. LEI 9.433/1997. RESPON-SABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR OMISSÃO DE FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL. LEI 6.938/1981. DANO IN RE IPSA AO MEIO AMBIENTE. CONSTRUÇÃO DE IMÓVEL EM ÁREA DE PROTEÇÃO DE MANANCIAIS. RESERVATÓRIO GUARAPIRANGA. ÁREA NON AEDIFICANDI. IMPUTAÇÃO OBJETIVA E EXECUÇÃO SUBSIDIÁRIA. MUDANÇAS CLIMÁTICAS. 1. Trata-se, na origem, de Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público paulista contra o Estado de São Paulo e a Imobiliária Caravelas Ltda. Nos termos da peça vestibular, a segunda ré construiu imóvel em área de manancial (represa de Guarapiranga), na faixa non aedificandi. O Tribunal de Justiça reconheceu a existência das edificações ilícitas e determinou sua demolição, entre outras providências
Caso prático, de grande repercussão nacional, onde ocorreu cumulação dos princípios do poluidor-pagador e da reparação foi o caso de Brumadinho com o rompimento das barragens da Vale do Rio Doce. A empresa, além da condenação pecuniária pelo dano ambiental causado, foi condenada a realizar ações de reparação com o recolhimento e destinação adequada de rejeitos, reparação e recuperação do trecho do rio Paraopeba, atingido pelo desastre, entre outras ações relativas à fauna e a flora locais.
i) Princípio do desenvolvimento sustentável:
A doutrina não é pacífica sobre a denominação de princípio para o desenvolvimento sustentável, muitos defendem tratar-se de um conceito. Autores e estudiosos da temática desenvolvimentista não concordam com a sua denominação de princípio, entendendo que se trata de um conceito, que subsidia o princípio do acesso equitativo dos recursos naturais.
O contexto sob o qual se insere esse princípio é bem mais complexo e, naturalmente, apresenta-se como a raiz de todos os problemas ambientais: a complexa relação entre o desenvolvimento econômico e a necessidade real de manutenção do meio ambiente, como garantia, inclusive da possibilidade de um futuro para o capital, por ser esse um absorvedor natural de recursos naturais. Neste cenário, temos o meio ambiente como uma importante variável do complexo sistema desenvolvimentista, principalmente no âmbito econômico, haja vista que o conceito de desenvolvimento abarca muitos outros prismas não analisados neste momento, a exemplo do social, do cultural, entre outros. Em outras palavras: decisões que objetivem o progresso e o desenvolvimento econômico, devem sem exceção, considerar os impactos ao meio ambiente, como meio de garantir não apenas a existência humana em tempos posteriores, mas também a possibilidade de manutenção do ciclo desenvolvimentista. Na jurisprudência do STF:
MEIO AMBIENTE - DIREITO À PRESERVAÇÃO DE SUA INTEGRIDADE (CF, ART. 225) - PRERROGATIVA QUALIFICADA POR SEU CARÁTER DE METAINDIVIDUALIDADE - DIREITO DE TERCEIRA GERAÇÃO (OU DE NOVÍSSIMA DIMENSÃO) QUE CONSAGRA O POSTULADO DA SOLIDARIEDADE - NECESSIDADE DE IMPEDIR QUE A TRANSGRESSÃO A ESSE DIREITO FAÇA IRROMPER, NO SEIO DA COLETIVIDADE, CONFLITOS INTERGENERACIONAIS - ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS (CF, ART. 225, § 1º, III) - ALTERAÇÃO E SUPRESSÃO DO REGIME JU-RÍDICO A ELES PERTINENTE - MEDIDAS SUJEITAS AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA RESERVA DE LEI - SUPRESSÃO DE VEGETAÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE - POSSIBILIDADE DE A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, CUMPRIDAS AS EXIGÊNCIAS LEGAIS, AUTORIZAR, LICENCIAR OU PERMITIR OBRAS E/OU ATIVIDADES NOS ESPAÇOS TERRITORIAIS PROTEGIDOS, DESDE QUE RESPEI-TADA, QUANTO A ESTES, A INTEGRIDADE DOS ATRIBUTOS JUSTIFICADORES DO REGIME DE PROTEÇÃO ESPECIAL - RELAÇÕES ENTRE ECONOMIA (CF, ART. 3º, II, C/C O ART. 170, VI) E ECOLOGIA (CF, ART. 225) - COLISÃO DE DIREITOS FUNDA-MENTAIS - CRITÉRIOS DE SUPERAÇÃO DESSE ESTADO DE TENSÃO ENTRE VALORES CONSTITUCIONAIS RELEVANTES - OS DIREITOS BÁSICOS DA PESSOA HUMANA E AS SUCESSIVAS GERAÇÕES (FASES OU DIMENSÕES) DE DIREITOS (RTJ 164/158, 160-161) - A QUESTÃO DA PRECEDÊNCIA DO DIREITO À PRESERVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE: UMA LIMITAÇÃO CONSTITUCIONAL EXPLÍCITA À ATIVIDADE ECONÔMICA (CF, ART. 170, VI) - DECISÃO NÃO REFERENDADA - CONSEQÜENTE INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE MEDIDA CAUTELAR. A PRESERVAÇÃO DA INTE-GRIDADE DO MEIO AMBIENTE: EXPRESSÃO CONSTITUCIONAL DE UM DIREITO FUNDAMENTAL QUE ASSISTE À GENERALIDADE DAS PESSOAS. (...) A QUESTÃO DO DESENVOLVIMENTO NACIONAL (CF, ART. 3º, II) E A NECESSIDADE DE PRESER-VAÇÃO DA INTEGRIDADE DO MEIO AMBIENTE (CF, ART. 225): O PRINCÍPIO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL COMO FATOR DE OBTENÇÃO DO JUSTO EQUI-LÍBRIO ENTRE AS EXIGÊNCIAS DA ECONOMIA E AS DA ECOLOGIA. - O princípio do desenvolvimento sustentável, além de impregnado de caráter eminentemente constitucional, encontra suporte legitimador em compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro e representa fator de obtenção do justo equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia, subordinada, no entanto, a invocação desse postulado, quando ocorrente situação de conflito entre valores constitucionais relevantes, a uma condição inafastável, cuja observância não comprometa nem esvazie o conteúdo essencial de um dos mais significativos direitos fundamentais: o direito à preservação do meio ambiente, que traduz bem de uso comum da generalidade das pessoas, a ser resguardado em favor das presentes e futuras gerações. (...) (STF, Pleno, ADI 3540 MC, Rel. Min. Celso de Mello, DJe de 03/02/2006).
Um exemplo claro de aplicação desse princípio é a adaptação da indústria automobilística às fontes de energia disponíveis no planeta. Se antes tínhamos uma indústria 100% baseada em combustíveis fósseis, de natureza não renovável, a iminência de escassez desse elemento fundamental para essa indústria e para a sociedade como um todo fez com que fossem pensadas alternativas energéticas, e hoje os automóveis movidos a eletricidade já são uma realidade em muitos países.
O STF (ADI 3.540-MC) já se manifestou no sendo de que “o princípio do desenvolvimento sustentável, além de impregnado de caráter eminentemente constitucional, encontra suporte legitimador em compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro e representa fator de obtenção do justo equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia, subordinada, no entanto, a invocação desse postulado, quando ocorrente situação de conflito entre valores constitucionais relevantes, a uma condição inafastável, cuja observância não comprometa nem esvazie o conteúdo essencial de um dos mais significativos direitos fundamentais: o direito à preservação do meio ambiente, que traduz bem de uso comum da generalidade das pessoas, a ser resguardado em favor das presentes e futuras gerações”
Percebe-se que essa adaptação da indústria tem dois objetivos claros: proteger as reservas de combustível fóssil e, mais objetivamente, garantir que seu mercado não esteja na dependência dessa única fonte finita de combustível, possibilitando a sustentabilidade do planeta e do seu nicho de mercado.
j) Princípio da participação democrática:
A participação democrática da população na defesa do meio ambiente é atribuição constitucional concorrente com a atuação estatal, conforme o caput do artigo 225 que dispõe sobre o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e impõe ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
A complexa rede de conexões que forma o meio ambiente, requer que para a manutenção do seu equilíbrio, todas as suas variáveis sejam respeitadas, de tal forma que o aumento ou a diminuição de algum de seus elementos pode causar um desequilíbrio nesse sistema abstruso.
Elemento vital para possibilitar a atuação popular no exercício da prerrogativa protetiva é, inicialmente, prover a sociedade de educação ambiental, para que seja possível entender os conceitos, compreender o bem ambiental protegido, suas formas de atuação e, em caso de impossibilidade, as formas de provocação ao Estado para que exerça seu mister.
O acesso à educação ambiental é tema da Lei 9795/99, que dispõe sobre a inclusão de estudos sobre o meio ambiente no âmbito educacional e institui a Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA) e, em seu corpo, traz como norte a necessidade dos indivíduos serem dotados de conceitos e processos que lhes permitam construir valores sociais, competências, atitudes, habilidades e conhecimentos que os permitam exercer sua função constitucional de proteção ao meio ambiente.
E a abordagem educacional prevista nesta legislação, atinge desde a educação de nível fundamental, passando por todas as etapas, até a educação ambiental não formal, que se dá fora das salas de aulas. Outro aspecto importante para viabilizar a obediência ao princípio da participação democrática é o livre acesso às informações ambientais.
Dentro das atividades de proteção ambiental, a fiscalização é uma das mais importantes e, em virtude do contingente populacional, seria uma das formas mais viáveis de exercer a vigilância ambiental em um território tão extenso quanto o nosso. A participação democrática da população na defesa do meio ambiente é atribuição constitucional concorrente com a atuação estatal, conforme o caput do artigo 225 que dispõe sobre o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e impõe ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
No Brasil, o acesso à informação ambiental é garantido por lei, através da Lei 10.650/03, que dispõe sobre o acesso à base de dados das entidades componentes do SISNAMA – Sistema Nacional de Meio Ambiente, e pela lei de acesso à informação, Lei 12.527/11, associadas às faculdades legais como o direito de petição, direito à informação e todos os demais instrumentos legais postos à disposição da sociedade.
Além dessas ferramentas, a sociedade ainda dispõe das Curadorias do Meio Ambiente, dentro da estrutura do Ministério Público, onde é possível denunciar e solicitar atuação do Parquet quando houver suspeita ou comprovada ameaça ou dano ao meio ambiente.
k) Princípio da função social e ambiental da propriedade:
O dever constitucional conjuntamente atribuído à sociedade e ao Estado, de exercer a proteção e a preservação da sociedade, traz consigo algumas repercussões fora do escopo da atuação efetiva, no que diz respeito ao exercício dessa atribuição. Uma destas é a repercussão no que tange à propriedade privada. O direito à propriedade, que já foi um direito absoluto, passou por inúmeras transformações ao longo do processo evolutivo social, e o que no início se via apenas como a proteção de patrimônio individual, passou a ter nuances e variáveis exigíveis, a fim de gozar da efetiva proteção estatal.
Com o passar do tempo, a propriedade, ainda que privada, passou a necessariamente ter que cumprir uma função social, estando em consonância com as necessidades da sociedade em que se insere. Isso não significa que na prática, o proprietário deva atender aos anseios de seus pares dentro de suas posses, entretanto, é necessário que a existência de uma propriedade privada não atinja a harmonia e a paz social, exercendo então sua função social dentro desse sistema.
O acesso à educação ambiental é tema da Lei 9795/99, que dispõe sobre a educação ambiental e institui a Política Nacional de Educação Ambiental e, em seu corpo, traz como norte a necessidade dos indivíduos serem dotados de conceitos e processos que lhes permitam construir valores sociais, competências, atitudes, habilidades e conhecimentos que os permitam exercer sua função constitucional de proteção ao meio ambiente.
Sob o prisma ambiental, a necessidade é de que a propriedade privada não se ajuste às exigências e princípios ambientais, de modo que, se o exercício do direito privado de propriedade atinge, de alguma maneira, o bem ambiental, direito difuso, o particular está sujeito a responder por seus atos e pelos efeitos desta propriedade. Logo, após a abordagem dos principais princípios, é possível perceber a complementariedade existente entre eles, e a necessidade de que sejam considerados, para que o meio ambiente possa ser privilegiado como direito da coletividade ante os interesses privados e estatais específicos.
l) Princípio da função socioambiental da propriedade:
Atualmente, fala-se em função socioambiental da propriedade. Isso porque um dos requisitos para que a propriedade rural cumpra sua função social é o respeito à legislação ambiental. No que tange à propriedade urbana, o requisito é respeitar o plano diretor, que, por sua vez, deverá necessariamente considerar a preservação ambiental (ex.: instituição de áreas verdes).
O art. 1228, § 1º, CC/02 denota o caráter transversal do direito ambiental, que permeia todos os ramos jurídicos – “o direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados (...), a flora, a fauna (...), bem como evitada a poluição do ar e das águas”.
A função social (socioambiental) não é apenas uma limitação ao exercício do direito de propriedade. Na verdade, é um atributo do direito de propriedade ao lado do uso, gozo, disposição e reivindicação. Compreende-se, assim, na “ecologização” da propriedade.
m) Princípio do limite:
Tal princípio consiste no dever do Estado de editar e de efetivar normas jurídicas que instituam padrões máximos de poluição, com a concepção de não afetar o equilíbrio ambiental e a saúde pública. O estabelecimento de padrões de qualidade, inclusive, é um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente.
n) Princípio da responsabilidade comum, mas diferenciada:
Tal princípio tem feição ambiental internacional e decorre do princípio da isonomia. Segundo esse princípio, todas as nações são responsáveis pelo controle da poluição e pela busca da sustentabilidade. Ressalta-se que os países poluidores devem adotar medidas mais drásticas, pois são os principais responsáveis pela poluição.
CONCLUSÕES:
Sob o prisma ambiental contemporâneo , a necessidade é de a sociedade e as instituições se ajustem às exigências legais e à principiologia ambiental, de modo que, se o exercício do direito privado de propriedade atinge, de alguma maneira, o bem ambiental, direito difuso, o particular está sujeito a responder por seus atos e pelos efeitos desta propriedade. Logo, após a abordagem dos principais princípios, é possível perceber a complementariedade existente entre eles, e a necessidade de que sejam considerados, para que o meio ambiente possa ser privilegiado como direito da coletividade ante os interesses privados e estatais específicos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
AMADO, Frederico Augusto Di Trindade Direito ambiental esquematizado. 5.ª ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2014.
ARAGÃO, Maria Alexandra de Sousa. O princípio do poluidor pagador: pedra angular da política comunitária do ambiente. Boletim da Faculdade de Direito – Universidade de Coimbra. Coimbra: Coimbra Editora,1997.
BACAL, Eduardo Braga. Tutela Processual Ambiental e a Coisa Julgada nas Ações Coletivas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2012.
BENJAMIN, Antonio Herman de Vasconcellos e. O princípio poluidor-pagador e a reparação do dano ambiental. BDJur, Brasília, DF. Disponível em: <http://bdjur.stj.gov.br/dspace/handle/2011/8692>.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília 1988.
____Lei nº 8.078/1990 – Código de Defesa do Consumidor
____Lei nº 9.605/1998 - Lei de Crimes Ambientais
___Lei nº 6.938/1981 - Institui a Política e o Sistema Nacional do Meio Ambiente
FILHO, Manoel Gonçalves Ferreira. Curso de Direito Constitucional, 40 ed.. São Paulo: Saraiva, 20.
FIORILLO, Celso Antônio Pacheco e CONTE Christiany Pegorari Crimes ambientais – São Paulo: Saraiva, 2012
MACHADO, Paulo Affonso. Direito Ambiental Brasileiro. 15ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2007.
MINISTÉRIO PÚBLICO DE SÃO PAULO. Direitos Coletivos e atuação do Ministério Público Disponível em http://www.cnmp.mp.br/direitoscoletivos/. Acesso em 28 de jul. de 2020.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS– Declaração sobre o Meio Ambiente Humano. Conferência das Nações Unidas sobre o meio ambiente humano em junho de 1972 – Suécia 1972. Disponível em http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Meio-Ambiente/declaracao-
de-estocolmo-sobre-o-ambiente-humano.html. Acesso em 28 de jul. de 2020.
RIBEIRO, Lúcio Ronaldo P. Da responsabilidade penal da pessoa jurídica. Disponível em: http://www.jus.com.br/doutrina/respppj.html, 1998. Acesso em 28 de jul. de 2020.
RICHARD, Domingues Dulley - Noção de Natureza, Ambiente, Meio Ambiente, Recursos Ambientais e Recursos Naturais - Agric. São Paulo, São Paulo, v. 51, n. 2, p. 15-26, jul./dez. 2004.
SIMÕES, Alexandre Gazetta. A transindividualidade do direito fundamental a um meio ambiente ecologicamente equilibrado. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24451/a-transindividualidade-do-direito-fundamental-a-um-meio ambiente-ecologicamente-equilibrado. Acesso em 28 de jul. de 2020.
TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
Pesquisador - UNIFOR
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: TELES, FILIPE EWERTON RIBEIRO. Abordagem Principiológica e Jurisprudencial do Direito Ambiental: As decisões do STF e do STJ consoante ao entendimento doutrinário dos princípios ambientais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 20 ago 2020, 04:26. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/55081/abordagem-principiolgica-e-jurisprudencial-do-direito-ambiental-as-decises-do-stf-e-do-stj-consoante-ao-entendimento-doutrinrio-dos-princpios-ambientais. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: gabriel de moraes sousa
Por: Thaina Santos de Jesus
Por: Magalice Cruz de Oliveira
Precisa estar logado para fazer comentários.