Resumo: O presente ensaio realiza breve análise acerca do papel do Supremo Tribunal Federal como árbitro federativo e a importância da atuação da Corte na definição dos contornos da federação brasileira. Examina-se a alteração jurisprudencial, no contexto da pandemia da Covid-19, da orientação da Corte na direção a uma maior descentralização federativa e pontua-se a necessidade de se proceder, ao longo dos próximos anos, ao acompanhamento dos julgados da Corte em conflitos federativos a fim de se aferir, se após a pandemia, a Corte tenderá a uma maior descentralização federativa.
Palavras-chave: Supremo Tribunal Federal. COVID-19. Federalismo. Conflitos Federativos. Descentralização.
I - INTRODUÇÃO
“Lembro à Nação que, por decisão do STF, as ações de combate à pandemia (fechamento de comércio e quarentena p. ex.) ficaram sob total responsabilidade dos governadores e dos prefeitos”. Estas são palavras do Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, publicadas em 8 de junho de 2020, em sua conta oficial do Twitter[1], que demonstram a compreensão do chefe do Poder Executivo acerca das decisões da Suprema Corte brasileira que reconheceram a autonomia dos entes subnacionais para a implementação de ações relacionadas ao enfrentamento da pandemia.
Segundo avaliação da Organização das Nações Unidas - ONU (2020), a pandemia da Corona Virus Disease 2019 (COVID-19), declarada em 11 de março de 2020 pela Organização Mundial de Saúde - OMS, trata-se da crise mais desafiadora que o mundo enfrenta desde a Segunda Guerra Mundial. Embora a ciência ainda não tenha logrado definir a origem real do vírus causador da síndrome respiratória (Sars-COV-2), a cidade chinesa de Wuhan foi apontada como o primeiro local de reporte do surto, em dezembro de 2019. A partir de então, a disseminação mundial se deu em escalada desenfreada[2].
Lilia Schwarcz (2020, p. 13) aduz que o século XXI começa, de fato, nesta pandemia[3]. O ano de 2020 precipitou uma ruptura na dinâmica de funcionamento das sociedades contemporâneas, de forma que mudanças que as sociedades levariam décadas para implementar tiveram que ser praticadas em meses. Ao se observar a tendência de mudanças decorrentes da pandemia - o que se convencionou a nominar de ‘novo normal’ -, percebe-se que tais alterações também podem ser constatadas na própria dinâmica das instituições públicas brasileiras.
Neste período de pandemia, o Supremo Tribunal Federal (STF) foi instado a julgar diversas demandas relativas ao enfrentamento da crise sanitária, assumindo papel central de mediador de conflitos políticos e jurídicos. Conforme dados da Corte (2021) constantes do Painel de Ações da COVID-19, até 14 de maio de 2021, o Tribunal recebeu 8.476 ações relacionadas ao tema e proferiu 10.583 decisões referentes à pandemia. Dentre as causas julgadas, destacam-se as Ações Diretas de Inconstitucionalidade - ADI’s 6341, 6343 e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental - ADPF 672 (BRASIL, 2020a, 2020b, 2020c), nas quais, o STF[4], em oposição à sua predominante jurisprudência de centralização federativa, assegurou a autonomia dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios para a execução de medidas relacionadas ao combate do novo coronavírus.
A federação brasileira[5], formada a partir da desagregação de um Estado unitário (movimento centrífugo), em sua arquitetura constitucional vigente, atribui à União significativo número de competências exclusivas e privativas, evidenciando o caráter centralizador do federalismo nacional (SOUZA, 2008, p. 815). A Constituição Federal (CF) de 1988, embora tenha tentado promover maior descentralização, conservou nas mãos da União a maior parte das competências e dos recursos necessários à concretização da autonomia (MORBIDELLI, 1999, p. 177).
O desenho federativo - se mais ou menos centralizado -, para além da divisão constitucional de competências, depende da linha e dos padrões seguidos pela Suprema Corte no exercício de sua função de “guarda da Constituição” (DALLARI, 2019, p. 43). Para Kenneth Clinton Wheare (1953, p. 62), de tempos em tempos, as Cortes ou instituições que decidem os conflitos federativos são apontadas como fomentadoras do poder central. No caso brasileiro, o STF, de acordo com o que indicam a quase totalidade[6] dos estudos realizados acerca do tema, tende a adotar postura centralizadora quando do julgamento de conflitos federativos[7]. Os próprios ministros da Corte, por várias vezes, em votos ou manifestações públicas, reconhecem a inclinação jurisprudencial centralizadora e apregoam a necessidade de uma alteração do posicionamento do Tribunal, de modo a revalorizar a autonomia dos entes subnacionais[8].
II - O STF COMO ÁRBITRO FEDERATIVO E SUA ATUAÇÃO NO CONTEXTO DA PANDEMIA
O STF ocupa um papel primordial no federalismo brasileiro ao julgar conflitos constitucionais entre entes federados, nos quais está em jogo a adjudicação de limites aos poderes da União, dos Estados e dos Municípios (OLIVEIRA, 2009, p. 225). O estudo e o acompanhamento da atuação da Suprema Corte na mediação de conflitos federativos, bem como a comparação com outras realidades constitucionais, mostram-se relevantes para a compreensão do funcionamento do sistema federativo brasileiro. Alterações no comportamento da Corte no julgamento de conflitos federativos impactam diretamente o arranjo federativo estatal (HORTA, 1990, p. 88-89).
Desde The federalist papers e as respectivas ponderações de Alexander Hamilton (arts. 78 a 83), já se vislumbrava a essencialidade da existência de uma Suprema Corte independente e imparcial para a preservação do texto constitucional e, consequentemente, para o resguardo e a conformação do arranjo federativo. Hamilton (1787) mencionava a importância do sistema de freios e contrapesos ao destacar que “[...] os Tribunais foram concebidos para ser um intermediário entre o povo e o legislativo, de modo a, entre outras coisas, manter este último dentro dos limites atribuídos a seu poder [...]”.
Nicholas Aroney e John Kincaid (2016), em “Courts in Federal Countries: Federalists or Unitarists?”, examinam a realidade de treze Tribunais de federações distintas[9], observando se as respectivas Cortes possuem inclinação à centralização ou à descentralização federativa e os fatores que induzem tais posicionamentos relativamente a cada um dos treze países estudados. Bernard Schwartz (1984), em “O Federalismo Norte-americano Atual”, enfatiza que as Cortes, como árbitros das disputas constitucionais, possuem papel potencialmente relevante a fim de fiscalizar a distribuição e partilha de poderes. Sustenta que, na medida em que os Tribunais são independentes e investidos do dever de preservar e aplicar a Constituição, são instados a manter a distribuição constitucional de poderes contra forças políticas empenhadas, alterando essa distribuição em uma direção mais centralista ou descentralista.
Nas palavras de Vanessa Elias Oliveira “[...] importante questão vem escapando aos olhos dos estudiosos do federalismo, em que pese a sua relevância para a compreensão do funcionamento das federações: o papel do Judiciário nestes sistemas [...]” (OLIVEIRA, 2009, p. 225). Segundo a professora, observa-se da literatura jurídica nacional que o papel do Poder Judiciário na configuração do federalismo é tema pouco explorado academicamente.
Durante a condução da pandemia, houve no Brasil grande conflito de competências entre a União e os entes subnacionais com relação à escolha das medidas a serem adotadas para o enfrentamento da crise de saúde pública instalada. No âmbito das Américas, em especial, no México e nos Estados Unidos da América (EUA), de forma semelhante, vivenciou-se no período significativos conflitos entre o Poder Central e os entes federados relativamente às escolhas das políticas para a mitigação dos efeitos da pandemia[10].
O STF, ao assegurar nas ADI’s 6341, 6343 e ADPF 672[11] a autonomia das unidades federativas para a condução de ações ao combate à COVID-19, alterou o rumo de sua jurisprudência centralizadora. A partir das mencionadas decisões, o Presidente da República, por diversas vezes, manifestou-se no sentido de que a Suprema Corte brasileira o teria impedido de adotar medidas no combate à COVID-19 (PARAGUASSU, 2020; SOARES, 2021). No âmbito do direito comparado, merecem destaque as crises federativas ocorridas no México (NÁJAR, 2020) e nos EUA (ALONSO, 2020), onde governadores formaram alianças para adoção de medidas dissonantes das propostas pelo Poder Executivo federal. Vivemos em um período histórico que será objeto de inúmeros estudos pelas gerações que nos sucederão (SAYURI, 2020).
Por certo, o posicionamento da Suprema Corte - tão enfático e contrário à sua tendência histórica -, ao assegurar autonomia dos entes federativos para adoção de medidas de combate à crise deve ser observado e acompanhado em julgados futuros, a fim de se aferir se servirão como divisores de águas na jurisprudência, até então, centralizadora da Corte.
III - CONCLUSÕES
Diante alteração no entendimento centralizador da federação da Suprema Corte, merece atenta observação, além do contexto político em que foram proferidas mencionadas decisões, se, a partir delas, há tendência de mudança da jurisprudência centralizadora do STF. Em outras palavras, importante é o questionamento se a alteração do entendimento de centralização federativa do STF, durante a pandemia, foi apenas circunstancial ou se está diante de uma virada jurisprudencial?
Como respostas ou hipóteses para a discussão de tais indagações pode-se cogitar: i) O STF tende a alterar sua jurisprudência em conflitos federativos no sentido de maior descentralização, a partir da crise sanitária vivenciada; ii) O STF adotou uma jurisprudência circunstancial: alterou seu entendimento com o objetivo principal de fazer valer as políticas públicas das unidades federativas subnacionais que a Corte reputava mais adequadas que as propostas pelo governo federal; e, iii) O STF adotou uma jurisprudência circunstancial: alterou seu entendimento para frear a inclinação arbitrária e negacionista do Presidente da República, fazendo valer o sistema de freios e contrapesos nacional.
Todavia, a pertinente análise acerca da alteração da jurisprudência centralizadora deverá ser feita nos próximos anos por meio de estudos empíricos, porquanto, neste momento de concomitância da crise, inviável se torna a observância segura de tendências de alteração jurisprudencial da Corte. Por certo, mostra-se necessário um recorte temporal razoável após o término da crise sanitária, a fim de se aferir com maior segurança ‘o que ficou’ após a Pandemia. A observação - em futuro próximo - dos julgados da Corte em conflitos federativos, ao longo do tempo, será muito importante para a constatação de uma possível tendência a maior descentralização federativa pelo STF, no momento posterior à pandemia.
Referências
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[1] BOLSONARO, Jair M. “Lembro à Nação que, por decisão do STF, as ações de combate à pandemia (fechamento de comércio e quarentena p. ex.) ficaram sob total responsabilidade dos governadores e dos prefeitos.”. Disponível em: https://twitter.com/jairbolsonaro/status/1269942255298777095?s=20.08 de junho de 2020. Acesso em: 14 maio 2021.
[2] Conforme dados de 14 de maio de 2021, o mundo conta com 156.077.747 infectados e 3.256.034 mortos; e o Brasil com 15.433.989 infectados e 430.417 mortos (GOOGLE NOTÍCIAS, 2021).
[3] Neste ponto, cabe rememorar o pensamento do historiador britânico, Eric John Ernest Hobsbawm, que, em sua obra Era dos extremos: o breve século XX: 1914-1991, semelhantemente, propôs como início do século XX a eclosão Primeira Guerra Mundial (HOBSBAWM, 1995, p. 14).
[4] Com relação à atuação do STF no cenário da pandemia, durante debate promovido pela TV Conjur, do sítio Consultor Jurídico, manifestou o Ministro Alexandre de Moraes que “[...] o Supremo Tribunal Federal se coloca como um obstáculo a mais contra eventual desrespeito ao federalismo brasileiro [...]”. (EMPRESA BRASIL DE COMUNICAÇÃO, 2020).
[5] Segundo Baracho (1986, p. 13), o federalismo, como conceito ou forma de organização, nasceu com a Constituição norte-americana de 1787. Sua teorização é atribuída a James Madison, Alexander Hamilton e John Jay, autores de The Federalism Papers. O Federalismo expressa-se na livre unificação de totalidades políticas diferenciadas, fundamentalmente, com os mesmos direitos, que são unidas para colaboração comum (HESSE, 1998, p. 180-181). Georg Jellinek define o Estado federal como um Estado soberano, composto por uma pluralidade de Estados cujo poder estatal é proveniente de seus Estados-membros unidos em uma unidade estatal (JELLINEK, 1949, p. 290). Bonavides, por sua vez, ensina-nos que a autonomia dos entes e a participação na formação da vontade federal são elementos indissociáveis a qualquer sistema federativo (BONAVIDES, 2000, p. 224). A multiplicidade de Federações existentes dificulta a tarefa de elencar as características essenciais do Estado Federal, porém é possível identificar, ao menos, quatro atributos basilares: i) repartição de competências; ii) autonomia política das unidades federadas; iii) participação dos membros nas decisões da União; e iv) atribuição de renda própria às esferas de competência (LEWANDOWSKI, 2018, p. 18). Barroso (2006) destaca que os entes federativos estabelecem entre si relações que não têm a marca da hierarquia, mas, sim, do desempenho por legitimação própria das funções constitucionalmente assinaladas. Ainda na caracterização da federação, cabe mencionar a necessidade da existência de um Tribunal que possa dirimir os conflitos federativos (TOCQUEVILLE, 2005, p. 169). Nas palavras de Kelsen: “[...] não é excessivo afirmar que a ideia política do Estado federativo só é plenamente realizada com a instituição de um tribunal constitucional [...]” (KELSEN, 2003, p. 182). No caso brasileiro, a Constituição Federal, no art. 102, I, f, outorgou ao Supremo Tribunal Federal a função de árbitro federativo.
[6] Letícia Antunes Tavares (2019, p. 235), em artigo “A tendência contemporknea do federalismo no Brasil de acordo com o Supremo Tribunal Federal”, com base no julgado da ADI 4060, aponta tendência do STF em abandonar sua jurisprudência predominantemente centralizadora.
[7] Dentre os estudos que apontam a postura centralizadora do STF, destacam-se: (HORBACH, 2003, p. 02-12); (MAUÉS, 2005, p. 65-85); (RANIERE, 2008, p. 183-202); (MARTINS, 2019); (BENVINDO; COSTA, 2016); (BERCOVICI, 2008, p. 1-18); (BZDERA, 1993, p. 03-29); (MACEDO, 2018); (CANELLO, 2016); (OLIVEIRA, 2009, p. 223-250).
[8] A título de exemplo, no julgamento da ADI 4060 (BRASIL, 2015), o Ministro Luiz Fux, em seu voto, asseverou que “[...] a federação brasileira ainda se revela altamente centralizada, muitas vezes, beirando o federalismo meramente nominal [...]”(p. 7-8), sendo, segundo o Ministro, um dos fatores para tanto, “[...] a contundente atuação do STF ao exercer o controle de constitucionalidade especialmente aquele inspirado no princípio da simetria e numa leitura excessivamente inflacionada das competências normativas da União [...]” (p. 8). Em outras oportunidades, manifestaram-se acerca da postura centralizadora do STF: O Min. Luís Roberto Barroso, na ADI 3165; o Min. Ricardo Lewandowski, na ADI 3359; e o Min. Edson Fachin, na ADI 825.
[9] Nicholas Aroney e John Kincaid (2016) analisam a atuação dos Tribunais dos seguintes países: Austrália, Bélgica, Brasil, Canadá, Etiópia, Alemanha, Índia, México, Nigéria, África do Sul, Espanha, Suíça e Estados Unidos. Na referida obra, com relação a cada país trabalhado, são delineadas as principais características constitucionais, estruturais e históricas de seu sistema federal; explicado o status constitucional e institucional de seus sistemas judiciais; e discutida a jurisprudência do federalismo do respectivo Tribunal Superior.
[10] No caso brasileiro, desde o início da crise sanitária, o Poder Executivo federal adotou postura negacionista quanto à gravidade da pandemia, apostou em tratamentos precoces sem comprovação científica, criticou medidas de quarentena e isolamento social, o que gerou conflitos com vários governadores e prefeitos (G1, 2021). No México, os governadores componentes da ‘Alianza Federalista’ opuseram-se ao governo federal sob a crítica de o ente central conduzir unilateralmente à crise e não estabelecer ações substanciais para enfrentamento da pandemia (EL UNIVERSAL, 2020).
Nos Estados Unidos, durante o ano de 2020, o presidente em exercício, de forma semelhante ao ocorrido no Brasil, negou a gravidade da doença, e governadores deixaram de observar diversas recomendações da Casa Branca por reputar que colocariam vidas em risco (BRAUN, 2020).
[11] Embora a Suprema Corte brasileira tenha julgado demandas posteriores relativas à pandemia, as primeiras decisões relevantes, proferidas no início da crise, que demonstraram a orientação do Tribunal, foram as proferidas nas ADI’s 6341, 6343 e ADPF 672, que resguardaram a competência concorrente
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios para adoção de medidas de enfrentamento ao novo coronavírus (BRASIL, 2020a, 2020b, 2020c).
Mestrando em Direito, Estado e Constituição pela Universidade de Brasília (UnB), na linha de pesquisa Constituição e Democracia. Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG (2007). Pós-graduado em Direito Notarial pela Universidade Gama Filho, Rio de Janeiro - UGF/RJ (2009). Membro do Grupo de Pesquisa em Política e Direito da Universidade de Brasília (UnB). Analista Judiciário, Área Judiciária, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ALVARENGA, Aislan Arley Pereira de. O Supremo Tribunal Federal e a ressignificação do federalismo brasileiro durante a pandemia da Covid-19 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 nov 2021, 04:23. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/57498/o-supremo-tribunal-federal-e-a-ressignificao-do-federalismo-brasileiro-durante-a-pandemia-da-covid-19. Acesso em: 21 nov 2024.
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