LUAN ARIEL FONSECA ROSA[1]
(coautor)
RESUMO: No presente trabalho será feita uma breve introdução aos meios de prova muito comuns no direito processual do trabalho. Discorrerá sobre a importância da prova emprestada na seara trabalhista, bem como as noções preliminares e os conceitos probatórios dentro do processo do trabalho. Buscar-se-á analisar a prova emprestada, prevista no Código de Processo Civil de 2015, sendo aplicada supletivamente e subsidiariamente ao processo do trabalho, nos termos dos artigos 15 do CPC e 769 da CLT, tendo como resultado a integração perfeita entre esses tipos processuais e, assim, conseguindo maior celeridade aos processos trabalhistas.
Palavras-Chave: Prova. Processo do trabalho. Código de Processo Civil. Aplicação supletiva e subsidiariamente. Instituto da prova empresta.
ABSTRACT: In the present work, a brief introduction will be made to the very common means of evidence in labor procedural law, borrowed evidence. Preliminary notions and evidentiary concepts will be demonstrated within the labor procedural law, thus demonstrating some peculiarities. This evidentiary means is provided for in the Civil Procedure Code of 2015, and is applied supplementarily and subsidiarily to the labor procedural law, under the terms of articles 15 of the CPC and 769 of the CLT, being the central theme of this work.
Palavras-Chave: Borrowed. Labor Procedural Law. Civil Procedure Code. Application supplementarily and subsidiarily. Civil Procedure Code. Borrowed evidence institute.
SUMÁRIO: 1) Introdução. 2) Provas no Processo do Trabalho: noções preliminares, conceitos e princípios probatórios. 2.1) Noções Preliminares da Teoria Geral do Processo. 2.2) Conceito de Prova. 2.3) Do Contraditório. 2.4) Dos Princípios Probatórios no Processo do Trabalho. 2.5) Princípio da Necessidade da Prova. 3) Da Importância da Prova Emprestada no âmbito do processo do trabalho. 3.1) Da Aplicação Supletiva e Subsidiária do Código de Processo Civil no Processo do Trabalho. 3.2) Da Previsão Legal da Prova Emprestada. 3.2.1) Do Contraditório no Instituto da Prova Emprestada. 3.2.2) Dos Parâmetros de Valoração da Prova Emprestada. 3.2.3) Da prova emprestada produzida por Juízo Incompetente e em processo anulado ou extinto sem resolução do mérito. 3.2.4) Prova emprestada produzida em processo que tramita no exterior. 3.3) Alguns casos de aplicação prática da prova emprestada – Exposição de Casos. 4) Conclusão. 5) Referências bibliográficas.
O sistema jurídico carece da segurança para que cumpra, desenvolva e mantenha sua finalidade. Dentre os meios procedimentais para a construção da segurança jurídica dentro do processo, é fundamental o instituto das provas, pois é ele quem garante a veracidade dos fatos e fundamentos, bem como a materialidade e autenticidade do que está sendo apresentado pelas partes nos autos, permitindo que o Julgador se embase no referido instituto para chegada da decisão, seja esta decisão preliminar, interlocutória ou definitiva.
A argumentação, evidentemente, é fundamental para a construção de toda decisão, mas não há argumento que se consiste sem provas.
Para dar início ao tema, serão expostos os principais elementos que compõem o direito processual de modo geral.
O processo do trabalho, assim como todas as áreas processuais (cível, penal, tributária, etc), possuem sua própria sistemática probatória, abarcando princípios, atribuições e meios de provas a serem utilizados nos termos da previsão legal. No presente caso, aqueles que estão previstos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, bem como aqueles que podem ser aplicados de maneira subsidiária e supletiva do Código de Processo Civil (CPC), Lei nº 13.105, de 16 de Março de 2015, por meio do seu art. 15, bem como do art. 769, da CLT.
Serão demonstrados noções preliminares e conceitos probatórios dentro do processo do trabalho.
No entanto, dentre todos os meios de prova apresentados, no presente trabalho, será abordada, de maneira mais detalhada e específica a aplicação da prova emprestada no âmbito do processo do trabalho, bem como sua receptividade e abordagem no referido sistema processual, tendo em vista que a prova emprestada possui sua previsão oriunda do Código de Processo Civil, mas é aplicada de maneira ampla e ativa no processo do trabalho. Desde já, vale dizer que a prova emprestada, embora, seja ainda uma novidade procedimental, trará uma ampla exposição acerca da sua aplicação.
2.PROVAS NO PROCESSO DO TRABALHO: NOÇÕES PRELIMINARES, CONCEITOS E PRINCÍPIOS PROBATÓRIOS
A prova tem estado presente na história desde os primórdios sendo o meio utilizado para se provar e comprovar algo ou alguma coisa.
Ao longo da história, foi-se construindo o direito probatório, marcado pela evolução em busca do ideal de justiça rápida e qualificada, principalmente no campo do direito processual, cuja prova tem diversas atribuições e maneiras de ser aplicada e desenvolvida.
2.1 Noções Preliminares da Teoria Geral do Processo
O direito processual, também chamado por alguns doutrinadores de direito adjetivo, por sua vez, é composto por uma série de atos e normas, com finalidades específicas, a fim de regulamentar todas as particularidades da função jurisdicional do Estado. (BRASIL. Código de Processo Civil, 2004).
De modo geral e sucinto, conforme Lopes (1999), os principais elementos que compõem o direito processual são: os princípios, a jurisdição, a ação, o procedimento e a lide.
O mesmo autor (Lopes, 1999), categoricamente, irá dizer que os princípios atuam como orientadores de um conjunto de fenômenos essenciais, originários e preliminares, que permitem a construção da norma e do direito, trazendo consigo o direito fundamental (como a constituição nacional), sendo considerados como alicerce da ciência do Direito.
Enquanto, a jurisdição é o poder de exprimir, proclamar, declarar o direito, sendo necessário, para além, a sua aplicação para que se torne um direito efetivo e reconhecido, tendo-se, então, a ação. (Lopes, 1999)
A ação, por sua vez, é o sistema processual prático para alcançar a concretude deste direito, sendo conduzida pelos requisitos previstos em lei. (Lopes, 1999)
E já os procedimentos, como o próprio nome sugere, é o instrumento técnico formado por atos coordenados numa sistemática lógica e legal para se chegar à uma finalidade, ou seja, à jurisdição, por meio da ação que lhe provocou. (Lopes, 1999)
Por último, a lide se trata do conflito provocado pelo autor, que apresenta sua pretensão, chamando-se o réu para discuti-lo nos exatos limites da lei e dos atos procedimentais. (Lopes, 1999)
A princípio, vale mencionar que o processo trabalhista não possui diversas classificações de fases procedimentais como acontece no processo civil, mas a sistemática procedimental, como um todo, acontece de maneira semelhante.
O autor, ao dar início ao processo, apresentando sua pretensão, por meio de petição inicial, e o réu ao responder contrapondo as alegações do autor, por meio de contestação, estes podem se embasar em fatos e em preceitos legais ou apenas em fatos ou, ainda, apenas em preceitos legais.
Neste sentido, dirá Lopes (1999), que as questões de direito suscitadas pelas partes, carecem apenas de uma análise sistemática por parte do Juízo, sendo resolvidas logo após a fase postulatória, sem maiores prorrogações.
Diferentemente, se as partes apresentarem questões de fato, tendo em vista, que os fatos precisam ser demonstrados e comprovados, o que será feito por meio do instituto probatório, ou seja, por meio de provas.
Dentro do processo, cada uma das partes apresentará sua versão sobre os fatos suscitados, bem como apresentarão todos os argumentos que estiverem ao seu alcance, mas o convencimento do Juízo dependerá das provas que estão sendo apresentadas no processo, e da administração das partes sobre elas.
Conforme os dicionaristas, prova significa: “o que demonstra a veracidade de uma proposição, de um fato; comprovação”.
Segundo Carnelutti apud Haulthausen (2008), “a prova em sentido jurídico é demonstrar a verdade formal dos fatos discutidos, mediante procedimentos determinados, ou seja, através de meios legais”.
Na lição de Caixeta:
Prova pode ser suscintamente definida como meio processual hábil para se obter, preferencialmente, a verdade dos fatos ou, ao menos, para se chegar o mais próximo possível dela, a fim de que o juiz possa construir seu convencimento motivado, tomando por base os fatos alegados pelas partes. (CAIXETA, 2016, p. 270).
Já Fredie Didier Junior (2017) irá dizer que “a prova, no sentido comum, é a demonstração da verdade de uma preposição”.
Desta forma, a prova é um meio processual utilizado pelas partes, autor e réu, para buscar comprovar e demonstrar nos autos, da melhor maneira possível, e que lhes for acessível, a realidade dos fatos apresentados, com a intenção de convencer o Juízo. Por meio destas provas, para que se tenha, assim, a procedência do seu pedido ou a improcedência do pedido para parte contrária.
Neste sentido, o atual Código de Processo Civil, em seu art. 368[2], dispõe que as partes têm o direito de produzir todos os meios de prova legalmente cabíveis para convencer o Juízo acerca dos fatos por estes alegados, mesmo que tais meios de prova não estejam previstos nesta normativa.
Em consonância com a importância e a essencialidade daquilo que está sendo produzido e atestado nos autos, o Julgador, nos termos do art. 371 do CPC/2015[3], deve se ater apenas aos elementos constantes nos autos.
O direito à prova é um direito fundamental, posto que se encontra como conteúdo do direito fundamental ao contraditório, que por conseguinte o garante, como contextualizado por Fredie Didier Junior (2017).
A garantia ao contraditório e a ampla defesa, bem como o acesso a todos os recursos inerentes a esta, se cumpre em atender todos aqueles que litigam no âmbito judicial ou administrativo, conforme está previsto no artigo 5º, LV da Constituição Federal de 1988[4].
A presente garantia, confere as partes a igualdade de oportunidades para apresentarem suas provas nos termos e tempo da lei.
Neste sentido, Ricardo Pires (2017) vai dizer que a doutrina, no âmbito geral, apresenta a cooperação entre as partes como um dos elementos de suma importância para estabelecer a garantia ao contraditório.
Assim como, o autor Cassio Scarpinella Bueno apud Ricardo Pires (2017) esclarece que:
O contraditório, no contexto dos ‘direitos fundamentais’, deve ser entendido como direito de influir, de influenciar na formação da convicção do magistrado ao longo de todo o processo”, e, mais adiante, arremata que “o contraditório deve ser entendido como diálogo, como cooperação. (BUENO apud PIRES, 2017).
Desta forma, nota-se que a cooperação entre as partes, é fundamental para se chegar a verdade dos fatos, e o meio principal de se garantir o contraditório e a ampla defesa, bem como de influir no convencimento do Julgador no decorrer da demanda. Vale ainda, destacar acerca da importância do papel do Julgador dentro do procedimento judicial, como pessoa determinante de atos, conforme prevê o artigo 765 da CLT.
Dentro de toda esta figura do contraditório entre as partes, tem-se a atuação de peso do Juízo, como a pessoa ao qual possui autonomia para determinar as provas e diligências necessárias para o julgamento do mérito da causa. Tem-se que esta autonomia está ligada tanto a uma determinação de fazer como de não fazer, ou seja, de deferir e de indeferir, de acordo com o seu convencimento ou não convencimento pelo que é posto nos autos pelas partes, estando tais apontamentos conjecturados nos artigos 765 da CLT e 370 do CPC.
A título ilustrativo, Bezerra Leite (2018), vai expor que:
Se o juiz indefere o retorno dos autos ao perito, para esclarecimentos adicionais solicitados pela parte, sob o fundamento de que tal providência nada acrescentaria ou esclareceria a respeito de aspectos relevantes à composição do litígio, uma vez que o laudo pericial minucioso já seria o suficiente para dar suporte ao deslinde da matéria, não há violação ao princípio do contraditório. (LEITE, 2018, pág. 775).
Neste sentido, corrobora-se o que foi dito acerca da autonomia e a atuação do Julgador, assim como, pode-se observar que o indeferimento deste, não necessariamente, será um ato de violação ao princípio do contraditório.
No entanto, caso as partes ou uma delas entenda que sua garantia ao contraditório está sendo violada, esta pode consignar protestos (protesto anti-preclusivos) para que tal matéria seja rediscutida em sede recursal, bem como, tal ato do Juízo pode ser caracterizado, sob a alegação da(s) parte(s), como cerceamento de defesa.
Para corroboração de tal exposição, segue abaixo decisão do Egrégio Tribunal do Trabalho da 3ª Região:
CERCEAMENTO DE DEFESA. CONFIGURAÇÃO. NULIDADE DA SENTENÇA. O devido processo legal (art. 5º, LIV, da CR), para que se torne efetivo, deve abranger o direito da parte de produzir as provas necessárias à plena elucidação da lide. Tal garantia, também derivada do princípio do contraditório e ampla defesa (art. 5º, LV, da CR), deve ser assegurada para que não se dê margem à alegação de cerceamento de defesa e à decretação de nulidade processual. Constitui ato privativo do Juiz, porém, a apreciação da admissibilidade ou da necessidade das provas requeridas, velando pela condução da instrução com foco no conhecimento da verdade (art. 370 do CPC e art. 765 da CLT). Uma vez frustrada, todavia, a faculdade da parte de produzir provas essenciais ao deslinde da controvérsia, impedindo a demonstração dos fatos objeto de debate, deve ser reconhecido o cerceamento de defesa, em função do manifesto prejuízo imposto ao litigante (art. 794 da CLT), implicando a nulidade da decisão e a renovação de atos processuais, nos termos dos arts. 797 e 798 da CLT. (TRT da 3.ª Região; PJe: 0010402-34.2016.5.03.0144 (RO); Disponibilização: 03/05/2019, DEJT/TRT3/Cad.Jud, Página 2821; Órgão Julgador: Setima Turma; Relator: Marcelo Lamego Pertence) (grifo nosso)
Tal ementa demonstra que o juízo “a quo” limitou a uma das partes de produzir provas para o deslindamento da lide, prejudicando-a e cerceando sua defesa, por meio da violação ao princípio do contraditório e da ampla defesa. Nestes termos, a Turma Julgadora decidiu por caracterizar o cerceamento de defesa a parte, e, consequentemente, a nulidade da r. sentença.
2.3 Dos Princípios Probatórios no Processo do Trabalho
Além dos princípios constitucionais, dentro do direito terão princípios que acompanharam cada uma das vertentes processuais (processo administrativo, processo civil, processo penal, processo tributário, processo do trabalho, dentre outros).
Neste sentido, serão abordados neste tópico os princípios basilares que norteiam a prova no âmbito do processo do trabalho. Sendo estes:
2.3.1 Princípio da Necessidade da Prova
A prova decorre da comprovação dos fatos alegados em Juízo, em especial, os fatos controvertidos, sendo necessária a apresentação de provas cabíveis para que estes sejam admitidos como verdadeiros.
O princípio da necessidade da prova atrai justamente esta necessidade de se comprovar tudo àquilo que está sendo apresentado nos autos de maneira fática pelas partes.
Assim como, o autor Bezerra Leite (2018) vai afirmar que “é necessário que a parte faça prova de suas alegações, pois os fatos não provados são inexistentes no processo”.
Por último, tem-se que a própria normativa ao incumbir às partes o ônus das provas, em conformidade com o que pretendem alegar (arts. 818 da CLT e 373 do CPC/2015), categoricamente, afirma acerca da necessidade da produção de provas.
3.DA IMPORTÂNCIA DA PROVA EMPRESTADA NO ÂMBITO DO PROCESSO DO TRABALHO
A Consolidação das Leis do Trabalho, por meio da integração jurídica, apresenta o “direito processual comum” como fonte subsidiária e supletiva do direito processual trabalhista, no qual, a prova emprestada terá sua aplicação e utilização do campo do processo do trabalho, por meio desta integração, conforme será visto, de maneira mais detalhada, a seguir.
3.1 Da Aplicação Supletiva e Subsidiária do Código de Processo Civil no Processo do Trabalho
O Direito Processual Comum regulamentado pela Lei nº 13.105/2015 (CPC), em seu artigo 15, prevê sua aplicação supletiva e subsidiária para regular outros direitos processuais (eleitoral, trabalhista, administrativo) em caso de ausência de normas.
Da mesma forma, o direito processual trabalhista, regulamentado pela CLT, permite formalmente a referida aplicação do direito processual comum em seus procedimentos, por meio do artigo 769 da CLT/2017.
Este procedimento de preenchimento de norma ausente se perfaz por meio do fenômeno da interação jurídica, no qual Delgado (2017) vai explicar do se trata este fenômeno:
A integração jurídica envolve um conjunto de mecanismos dirigidos a assegurar o suprimento das lacunas apresentadas pelas fontes principais do sistema jurídico perante determinado caso concreto, de maneira a garantir que o Direito sempre apresente uma resposta normativa em face de qualquer caso específico colocado a seu exame. (DELGADO, 2017, p. 106).
Ademais, vale fazer a distinção entre a supletividade e a subsidiariedade, no qual tal distinção será abordada por meio do entendimento do autor Shiavi (2017):
A supletividade se trata da aplicação do CPC para completar um instituto processual que já está sendo regulamentado pela CLT, com o intuito de aperfeiçoar e permitir mais efetividade e justiça acerca deste instituto no campo processual trabalhista, por exemplo, o ônus da prova previsto no CPC, pois o art. 818 da CLT é muito enxuto e não resolve questões cruciais como as hipóteses de ausência de prova e prova dividida; já a subsidiária consiste na aplicação do CPC quando a CLT e as leis processuais trabalhistas extravagantes não tiverem nenhuma normativa disciplinando determinado instituto processual, tendo como exemplo, a tutelas de urgência. (SHIAVI, 2017)
Para além, tem-se que, dentre as fontes do direito processual a serem aplicadas no processo do trabalho, seja de maneira supletiva, subsidiária ou análoga, a mais importante é a fonte do direito processual civil, tanto é que “participa da natureza das fontes legisladas, como pelo grau de elaboração que já alcançou e da proximidade de seus institutos com os do direito processual do trabalho” (GONÇALVES, 2014).
Destarte, o CPC terá sua aplicação supletiva e subsidiária sobre o processo do trabalho, por meio do fenômeno da integração jurídica, completando e suprindo as lacunas normativas da CLT, assim como do processo do trabalho.
Por último, segundo Gonçalves, é importante destacar que os dois direitos processuais aqui discutidos, no que se refere ao exercício de jurisdição processual, possuem práticas semelhantes, apesar das normativas do direito material civil e trabalhista serem distintas e, consequentemente, aplicadas de modo diferente no procedimento judicial.
3.2 Da Previsão Legal da Prova Emprestada
De plano, é importante comentar e observar que a prova emprestada não está inserida dentre os meios de provas comuns nas doutrinas e, sim, dentro do procedimento probatório, na “parte geral”, acredita-se que isto se deve as suas características probantes.
A prova emprestada trata-se, ainda, de uma novidade procedimental, tendo sua primeira previsão legal no Código de Processo Civil de 2015, por meio da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015, no art. 372. Senão veja-se: “Art. 372. O juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório” (grifo nosso).
Conforme disposto no referido artigo, a prova emprestada se trata de uma prova produzida em outro processo, seja este um documento, um depoimento pessoal ou testemunhal (ata de audiência), um laudo pericial, uma sentença, dentre diversos outros, transladada para outro processo (processo presente), por meio de certidão extraída daquele, ingressando, assim, como meio de prova documental.
Não obstante, consigna-se ainda ser possível transladar provas produzidas em processos de outra natureza, como penal, tributário, administrativo etc.
O autor Eduardo Talamini apud Didier Junior (2017[5]), afirma que a prova emprestada, além de ser um documento transladado, se trata do aproveitamento de uma prova que foi anteriormente desenvolvida.
Segundo Fredie Didier Junior (2017), a prova emprestada traz consigo a economia processual, bem como atrai a efetividade do princípio da eficiência processual, cuja força probatória será valorada pelo Juízo, que não está adstrito a dar-lhe idêntico valor ao que teve nos autos originários.
Ademais, vale ressaltar, que com a previsão do art. 372 do atual CPC, houve o afastamento da “prova atípica”, prevista do Código de Processo Civil de 1973, para a chegada da prova emprestada, permitindo sua admissão pelo Juízo, desde que observado o princípio do contraditório.
No Código de Processo Civil de 1973, como citado acima, apresentava a figura da “prova atípica” como um dos meios de prova, no entanto, as doutrinas e as jurisprudências já vinham denominando tal prova como “prova emprestada”, nos termos do artigo 332, do CPC/1973, assim como chegaram a criar alguns requisitos a serem preenchidos para utilização da referida prova.
Neste sentido, o autor Fredie Didier Junior (2014) esboça acerca destes principais requisitos que deveriam ser preenchidos, ao tempo do Código anterior, sendo estes: a) identidade de partes; b) identidade de objeto da lide; c) observância do contraditório na colheita da prova; d) licitude da prova produzida; e) guarda da eficácia e do convencimento do processo originário; f) observação das normas atinentes a prova documental, do processo para o qual será ela transportada. Caso não houvesse o preenchimento de todos estes requisitos, a prova emprestada não poderia ser utilizada, “visto que seria impossível corrigir o vício de origem em outro processo”, conforme Theodor Júnior (2017).
Contudo, com a reforma do CPC (2015), os doutrinadores entendem que o instituto da prova emprestada se tornou mais maleável, no qual, Theodoro Júnior manifesta o seguinte, a respeito disto:
O regime adotado pelo NCPC é bastante liberal no tratamento desse meio de prova, não tendo inserido no texto do art. 372 nenhuma das antigas exigências doutrinárias e pretorianas. Estas, contudo, serão levadas em conta para aferir-se o maior ou menor valor de convencimento da prova tomada de empréstimo diante da instrução do novo processo. Naturalmente, a força probante será máxima se se reunirem todas as condicionantes tradicionais. Na falta de alguma, entretanto, aplicar-se-á a regra nova, segundo a qual caberá ao juiz atribuir à prova emprestada “o valor que considerar adequado”. Com isso, é tratada a prova extraída de outro processo como documental, independentemente de terem as partes atuais participado da respectiva produção, de serem diversos os objetos dos dois processos e de inexistir conexão íntima entre os fatos básicos investigados num e noutro. O importante é que a prova transplantada documentalmente tenha sido colhida em processo regular, e que o fato nela revelado seja relevante para o julgamento da nova demanda. (THEODORO JÚNIOR, 2017, p. 941).
Ou seja, apesar de não ter mais a obrigatoriedade do preenchimento dos mencionados requisitos, ligados ao antigo Código (1973), sobre a prova emprestada, indiretamente, esta construção doutrinária e jurisprudência influenciará na análise do valor da prova pelo Juízo, mesmo com a singela previsão do atual Código.
Assim como, verifica-se, que mais ainda agora, a prova emprestada precisa seguir, inicialmente, todos os parâmetros da prova documental.
No entanto, Medina (2017) faz uma observação e uma leve distinção acerca da prova emprestada e a seu translado para o novo processo como prova documental. Veja-se:
Admitiu-se a prova emprestada, embora distintas as partes do processo em que foi originariamente produzida e do processo que a recebeu. Sendo assim realizada, a prova emprestada, produzida e documentada em outro processo (por exemplo, termo de audiência que consta depoimento de testemunhas, laudo pericial, etc.) ingressa nos autos como prova documental, e não como prova da mesma natureza. Para tanto, seria necessário haver coincidência das partes em ambos os processos, com contraditório realizado também em ambos os feitos. (MEDINA, 2017, p. 639).
Como se constata na citação acima, alguns doutrinadores ainda acreditam que a identidade das partes (mesmas partes em ambos os processos), ainda é importante para a utilização e caracterização da prova emprestada.
Neste sentido, segue abaixo, a título de demonstração, recente decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região:
PROVA EMPRESTADA. MEIO LÍCITO E FONTE DE VALORAÇÃO MOTIVADA PELO MAGISTRADO. A prova emprestada constitui um meio legítimo, por intermédio do qual se procura estabelecer a verdade a respeito dos fatos controvertidos, a fim de que o juiz forme a sua convicção motivadamente. A prova emprestada consiste na determinação do juízo para que seja realizado o traslado daquela produzida em outro processo, aproveitando tudo aquilo que guarda semelhança e pertinência com o caso em julgamento. O seu cabimento está vinculado à demonstração de identidade de partes, situação em que o objeto pode ser diferente, ou de objeto, quando então as partes não precisam ser as mesmas, observando-se, em ambas as espécies, o respeito ao contraditório e à ampla defesa, art. 5º, LV da CF, tanto no processo em que foi produzida, quanto naquele outro do qual será emprestada. (TRT da 3.ª Região; PJe: 0011463 26.2017.5.03.0036 (RO); Disponibilização: 10/04/2019; Órgão Julgador: Quinta Turma; Relator: Manoel Barbosa da Silva) (grifo nosso).
Observa-se que na referida ementa a turma Julgadora, além de abordar a licitude da prova emprestada, apresentou dois pontos importantes para o cabimento da prova: identidade das partes com possibilidade de objeto diferente, ou identidade de objeto com partes distintas. Ou seja, o aludido maleia da prova emprestada efetivamente será aplicado de acordo com o caso concreto.
Por último, como já dito inicialmente, frisa-se que a prova emprestada possui uma significativa aplicação no âmbito processo do trabalho, mas sua previsão legal, como visto, está prevista no atual CPC.
3.2.1 Do Contraditório no Instituto da Prova Emprestada
Uma das principais peculiaridades da prova emprestada, se não for a principal, é a observância ao princípio do contraditório, como visto anteriormente, pois esta tem que ter passado pelo contraditório no processo originário e no processo para o qual será transladado.
Em consonância com o entendimento do autor Medina (2017), Fredie Didier Junior (2017[6]) vai dizer que a importação da prova emprestada para outros autos será lícita, como prova emprestada, apenas quando a parte contrária tiver participado de sua produção, ou quando ambas as partes não tiverem participado se sua produção, mas se convencionam em fazer o seu uso, devendo, assim, tal prova ter o contraditório garantido no processo ao qual está sendo transladada.
Desta forma, verifica-se que, em suma, os doutrinadores compreendem que para o uso da presente prova é indispensável que: a) a parte contrária tenha participado da formação da prova, para que seja usada contra esta; b) ou que nenhuma das partes tenham participado da produção da prova, sendo levado em conta o que a parte pretende demonstrar em relação aos fatos expostos nos autos. Mas é fundamental que ambas as partes concordem com a utilização no processo da prova emprestada.
Destarte, têm que ser concedido as partes o direito de manifestar acerca das provas juntadas pela(s) parte(s) contrária, para que se tenha a consignação do contraditório, cabendo, posteriormente, ao Julgador decidir acerca da análise e utilização destas.
Para que tal exposição possa ser corroborada, veja-se o entendimento de um dos Julgadores do TRT 3ª:
SENTEÇA
[...]
Prova emprestada
O reclamante acostou com a inicial diversos documentos, especialmente laudos periciais, pleiteando o uso como prova emprestada.
Em relação a essa modalidade de prova documental, inicialmente, registro que somente é considerada válida mediante a prévia anuência dos litigantes.
No caso vertente, a terceira ré expressamente se opôs ao uso dos documentos, negando que sejam utilizados como prova emprestada.
Assim, inexistindo anuência dos litigantes, indefiro o uso como prova emprestada dos documentos de ID 7616979 a ID 6326e4c, ID dd52019 a ID 7f2c74f, ID 373200c e ID 296745c. (TRT 3 - RTOrd 0011861-45.2015.5.03.0164 - Mag.(a) Marcelo Alves Marcondes Pedrosa – Juiz Federal – 6ª VARA DO TRABALHO DE CONTAGEM – Disponibilizada em: 23/05/2018). (grifo nosso).
Tem-se que, neste caso, o Juízo “a quo” entendeu por indeferir o uso das provas emprestadas, sob o fundamento de que a discordância de uma das partes pelo uso das provas ocasionou na perda de validade destas, respeitando, assim, legalmente o contraditório.
3.2.2 Dos Parâmetros de Valoração da Prova Emprestada
Em conformidade com o artigo 372 do CPC/2015[7], Fredie Didier Junior (2017[8]) vai apontar que, conforme identificado pela doutrina, a prova emprestada apresentada aos atos para ter validação pelo Juízo, precisa guardar a eficácia do processo do qual se originou.
Conforme versado anteriormente, no atual CPC, nada é mais importante do que a validação do Juízo, principalmente em vista do seu livre convencimento, sendo essencial a observação de todos os parâmetros possíveis para a aceitação da presente prova.
Porém, vale ressaltar que o livre convencimento do Juízo, bem como sua análise acerca da necessidade e desnecessidade de novas provas a serem produzidas, não podem ensejar em cerceamento de defesa de uma ou de ambas as partes, senão tal decisão será anulada.
Segue abaixo a ementa de um v. acordão, no qual ficou caracterizado o cerceamento de defesa pelo fato do Magistrado (da 1ª instância) ter indeferido a produção de prova testemunhal de uma das partes, ante o seu convencimento com as comprovações trazidas pela prova emprestada:
CERCEAMENTO DE DEFESA. PROVA EMPRESTADA. PROVA TESTEMUNHAL. Embora a prova emprestada atinente a questões semelhantes à matéria controvertida possa contribuir para a elucidação, não se admite o cerceamento do direito à prova testemunhal para melhor contextualizar os fatos com as condições laborais específicas do autor, haja vista que a oportunidade para o aproveitamento de prova emprestada não representou encerramento da instrução e, portanto, não poderia traduzir fator inibitório à produção de outras provas. Assim, embora não desprezados os depoimentos da prova emprestada, que apresentam aptidão para contribuírem na elucidação dos fatos, deve ser franqueado às partes o exercício do direito da ampla defesa e de influírem na convicção do Juiz (artigos 369 e 372 do CPC). (TRT da 3.ª Região; PJe: 0011108-47.2017.5.03.0058 (RO); Disponibilização: 29/10/2018, DEJT/TRT3/Cad.Jud, Página 1494; Órgão Julgador: Setima Turma; Relator: Cristiana M. Valadares Fenelon).
No que tange à ementa do citado acórdão, as Rés, ora Reclamadas, manifestaram discordância quanto ao aproveitamento da prova emprestada apresentada pelo Reclamante na inicial, sendo tal prova genericamente impugnada, o que não inviabiliza o uso da referida prova, devendo ainda ser garantido o contraditório as partes. Assim como, no que se diz respeito às demais provas a serem produzidas nos autos (princípio da unicidade das provas) as partes têm direito ao contraditório. O que não foi possível, tendo em vista que o Nobre Magistrado indeferiu a produção de prova testemunhal por parte das Reclamadas, sobrevindo a caracterização de cerceamento de defesa, e consequentemente, a anulação da r. sentença.
Diante do exposto, entende-se que o caso concreto exigirá a avaliação de vários critérios a serem utilizados, sem incorrer em contrariedade a norma legal, bem como buscar a aplicação os princípios norteados do direito do processo do trabalho e de seu direito material, para que se alcance, assim, uma decisão justa.
3.2.3 Da prova emprestada produzida por Juízo Incompetente e em processo anulado ou extinto sem resolução do mérito
A prova emprestada produzida por Juízo incompetente não invalida os atos de sua produção, tal como, não impede a utilização desta em outro processo, cabendo ao Juízo dos autos que recebeu dar valoração a tal prova, segundo o autor Fredie Didier Junior (2017).
Já a prova emprestada produzida em autos que foram anulados ou extintos sem resolução do mérito, sua utilização terá algumas evidentes ressalvas. Estas provas devem ter intacto o objeto que pretendiam produzir ou que produziu no processo anterior, ou seja, não terem sido atingidas pelo vício ou causa que se levou a anulação ou extinção dos autos, assim expressa Fredie Didier Junior (2016). Assim como, este também faz a ressalta de que, em caso de processo extinto sem resolução do mérito por perempção, não há motivos, diversos dos que foram já expostos, para o impedimento do seu uso nos autos transladado.
3.2.4 Prova emprestada produzida em processo que tramita no exterior
A prova produzida no exterior pode ser utilizada como prova emprestada no direito processual brasileiro, ou seja, também, no processo do trabalho, desde que estas sejam lícitas. Devem estar de acordo com o ordenamento jurídico e cuide de abranger o sentido e a extensão do objeto (informações) que se pretende comprovar. Salienta-se ainda que tais documentos devem ser traduzidos para o idioma brasileiro, "tramitada por via diplomática ou pela autoridade central, ou firmada por tradutor juramentado" (CPC, art. 192, parágrafo único), assim exposto por Fredie Didier Junior (2016).
3.3 Alguns casos de aplicação prática da prova emprestada – Exposição de Casos
Primeiramente, convêm comentar que no processo do trabalho tem-se o entendimento prático de que as provas apresentadas, requeridas (documentos, prova emprestada, perícia técnica) devem ser impugnadas nos momentos oportunos.
Isto é, as provas apresentadas pelo reclamante na exordial, devem ser contestadas assim que oportuno pela parte contrária, neste caso, em sede de defesa; em seguida, as provas apresentadas pelo reclamado devem ser contestadas com a apresentação da réplica, ou seja, na impugnação, pelo reclamante, se não for caso de revelia.
Ademais, dependendo da maneira como o Juízo irá direcionar os procedimentos, as partes possuem até o momento final da fase de instrução (fim da audiência de julgamento), para manifestar acerca das provas que estão sendo produzidas nos autos, salvo determinação em contrário (como designação de prazo(s)).
a) Caso 1:
Às partes é concedido o momento oportuno para manifestarem acerca das provas que pretendem produzir, bem como a oportunidade de serem colocadas perante o contraditório. Veja-se a seguinte decisão:
PROVA EMPRESTADA. PEÇAS PROCESSUAIS EXIBIDAS NO RECURSO. IMPOSSIBILIDADE. A mera exibição, no recurso, de peças processuais de outros feitos não se constitui como prova emprestada, pois, no curso da instrução probatória, não foi acordada sua produção. (TRT da 3.ª Região; PJe: 0010383-97.2018.5.03.0066 (RO); Disponibilização: 22/11/2018, DEJT/TRT3/Cad.Jud, Página 3057; Órgão Julgador: Decima Turma; Relator: Taisa Maria M. de Lima).
Neste caso, o Recorrente não aproveitou da instrução probatória para expor o que se pretendia acerca dos documentos apresentados por ele nos autos. Do mesmo modo, o Douto Juízo entendeu, que os documentos acostados aos autos, não poderiam ser utilizados como prova emprestada, pois não foi acordada sua produção no decurso da instrução. Assim, entrando a parte com recurso, foi lhe negado provimento, ante a impossibilidade de tais documentos terem sua validade e apreciação discutida em sede recursal (Súmula 126, do TST), sendo mantida a r. sentença pela Colenda Turma.
b) Caso 2:
Os meios de provas devem ser requeridos e impugnados nas peças de apresentação e contestação (inicial, defesa, impugnação), e até o final da audiência de julgamento, como já exposto. No caso abaixo, o Réu perdeu a oportunidade de contestar e requerer a realização de prova pericial nos autos, decidindo o Juízo “a quo” pela caracterização de insalubridade e pagamento do referido adicional com base no laudo pericial juntado pela autora como prova empresta. Senão veja-se:
AUSÊNCIA DE PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL NOS AUTOS. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CONFIGURAÇÃO. Tendo a parte autora requerido a utilização de prova pericial emprestada (contra a qual o reclamado não se insurgiu expressamente) e uma vez constatado que, mesmo ciente de que se encerraria a instrução processual sem a realização de perícia específica no presente feito, o réu não se opôs, operou-se a preclusão quanto ao requerimento de realização da diligência em questão, motivo pelo qual não há falar na configuração do alegado cerceamento de defesa. (TRT da 3.ª Região; PJe: 0010663-11.2017.5.03.0064 (RO); Disponibilização: 13/05/2019, DEJT/TRT3/Cad.Jud, Página 817; Órgão Julgador: Quinta Turma; Relator: Convocado Alexandre Wagner de Morais Albuquerque)
Conforme a citação acima, se verifica que a prova emprestada (laudo pericial) juntada aos autos pela autora, teve valorização decisiva pelo Magistrado, não sendo necessário para este a realização de novo laudo. De acordo com as informações da ementa, o réu recorreu alegando o cerceamento de defesa, no qual tal alegação foi declarada infundada pela Colenda Turma, sobre o fundamento de que este teve até o final da fase de instrução para requerer a produção de prova pericial, e não o fez, não caracterizando, desta forma, em cerceamento de defesa.
c) Caso 3:
Como será verificado em seguida, em mais uma decisão foi determinado o pagamento de adicional de insalubridade com base no laudo pericial acostados aos autos como prova emprestada, no qual, segundo o Egrégio Tribunal, em consonância com a sentença, o Réu se desincumbiu do seu ônus para elidir a situação fática retratada nos autos. Assim como, a referida prova apresentou os parâmetros necessários de validação. Veja-se:
EMENTA: ADICIONAL DE INSALUBRIDADE - CARACTERIZAÇÃO - PROVA EMPRESTADA - IDENTIDADE DE FUNÇÕES RETRATADA PELA PROVA ORAL PRODUZIDA. Evidenciado por meio da prova oral produzida nos autos que o reclamante desempenhava função idêntica à apurada em laudo pericial utilizado como prova emprestada, cujo contato com agentes químicos sem a devida proteção caracterizaria insalubridade em grau máximo, impõe-se o pagamento do adicional e grau correspondentes, não alterando o rumo da lide o fato de a prova emprestada apurar as condições de trabalho de empregado da reclamada que teria exercido alguns cargos distintos daqueles exercidos pelo autor, prevalecendo no caso vertente o princípio da primazia da realidade, norteador do Direito do Trabalho, quanto à realidade fática vivenciada pelo autor em seu ambiente laboral. (TRT da 3.ª Região; PJe: 0010606-71.2018.5.03.0059 (RO); Disponibilização: 28/03/2019, DEJT/TRT3/Cad.Jud, Página 763; Órgão Julgador: Segunda Turma; Relator: Sebastiao Geraldo de Oliveira) (grifo nosso).
Aproveitando o teor da decisão acima, convêm abordar que o princípio da primazia da realidade norteado do direito trabalhista, segundo Godinho apud Bartolone (2019):
No Direito do Trabalho deve-se pesquisar, preferentemente, a prática concreta efetivada ao longo da prestação de serviço, independentemente da vontade eventualmente manifestada pelas partes na respectiva relação jurídica. A prática habitual – na qualidade de uso – altera o contrato pactuado, gerando direitos e obrigações novos às partes contratantes (respeitada a fronteira da inalterabilidade contratual lesiva). Desse modo, o conteúdo do contrato não se circunscreve ao transposto no correspondente instrumento escrito, incorporando amplamente a todos os matizes laçados pelo cotidiano da prestação de serviços, a descaracterização de uma pactuada relação civil de prestação de serviço, desde que no cumprimento do contrato despontem, concretamente, todos os elementos fático-jurídicos da relação de emprego (trabalho por pessoa física, com pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e sob subordinação) (GODRINHO apud BARTOLONE, 2019).
Segundo o doutrinador, atrai a realidade fática vivida pelo empregado no decorrer da sua prestação de serviço, no qual, consequentemente, será incumbido ao reclamante, demonstrar os fatos constitutivos de seu direito.
O direito probatório como visto, está em constante construção e readaptação as demandas da sociedade, que são apresentadas ao Poder Judiciário, em busca do acesso e cumprimento dos seus direitos, bem como na expectativa de ser abraçada pela segurança jurídica.
Este direito, dentre outros, possui características gerais aplicáveis a todos os direitos processuais, bem como possui peculiaridades que se alternam de acordo com o campo do direito processual (cível, trabalhista, penal, administrativo, dentre outros).
O direito probatório sempre foi um direito fundamental dentro da sociedade e dentro do processo, por ser ele a porta de entrada e saída para se comprovar e demostrar os fatos alegados e os reais fatos. Traz consigo princípios fundamentais a serem resguardados e aplicados, como o princípio do contraditório (art.5º, LV da CF/1988).
Os direitos processuais se relacionam entre si, de acordo com sua própria normativa, por meio do fenômeno da integração jurídica, no qual, o presente trabalho buscou demonstrar, de maneira mais específica, a interação e aplicação do Código de Processo Civil com a Consolidação das Leis do Trabalho, por meio da supletividade e subsidiariedade, objetivando complementar e preencher as lacunas normativas, apresentando esta troca de direitos e procedimentos probatórios.
Tal abordagem foi feita, principalmente, com o intuito de mostrar a “chegada” da prova emprestada no ordenamento jurídico, por meio do artigo 372 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (NCPC). Trata-se de prova produzida em outro processo, sendo essa um documento, um depoimento pessoal ou testemunhal (ata de audiência), um laudo pericial, uma sentença, entre outras. Tal prova emprestada é transladada para outro processo (processo presente), por meio de certidão extraída daquele, ingressando, assim, como meio de prova documental.
A referida prova, era antes abordada pelo processo comum como “prova atípica” e exigia rígidos requisitos para sua utilização e aplicação, no qual exigiu uma grande movimentação jurisprudencial e doutrinária durante a vigência do Código de Processo Civil de 1973.
A prova emprestada, ainda como uma novidade no direito probatório e no direito comum, já tem uma significativa aplicação no direito processual, principalmente no processo do trabalho, como pode ser observado, tendo a total influência do atributo provatório do ônus da prova e do princípio do contraditório.
Ademais, a prova emprestada, como abordado, trouxe consigo a economia processual, assim como atraiu a efetividade do princípio da eficiência processual, sendo esta valorada pelo Juízo, junto à análise de todo arcabouço probatório apresentado no processo.
No entanto, convêm salientar por que a prova emprestada, que tem tido uma significativa aplicação e eficiência no processo do trabalho, desde a alteração do Código de Processo Civil, não foi prevista formalmente na Consolidação das Leis do Trabalho ante a posterior reforma da legislação. Deixando-se, com isso, essa observação para as futuras alterações legislativas na área trabalhista.
Por último, vale comentar, que apesar da prova emprestada ter sido tomada como o tema principal, foi possível ver a nítida integração jurídica do CPC com o processo trabalhista em relação aos princípios constitucionais, princípios probatórios, atribuição do ônus probante e os meios de prova abordados.
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TALAMINI apud DIDIER JUNIOR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil Vol. 2. 12 Ed. Salvador, BA: JusPODIVM. 2017. p. 147
THEODOR JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processo Civil – Teoria geral do direito processual civil, processo de conhecimento comum. Vol. I. 58; Ed. Rio de Janeiro, RJ: Forense. 2017. p. 940, 941.
[1]Graduando do Curso de Direito pelo Centro Universitário UNA – Contagem / MG [email protected].
[2]Art. 368 - As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz. (BRASIL, 2016).
[3]Art. 371. O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento. (BRASIL, 2016).
[4] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; (BRASIL, 2017).
[5]A prova emprestada consiste no transporte de produção probatória de um processo para outro. É o aproveitamento da atividade probatória anteriormente desenvolvida, através do translado dos elementos que a documentaram. (TALAMINI apud DIDIER JUNIOR, 2017, p. 147).
[6]Se aquele que requerer a importação de prova e aquele contra quem se pretende seja aprova produzida forem terceiros em relação ao processo onde a prova se produziu, não há problema na sua importação: como nenhuma das partes participou da formação da prova, qualquer delas pode pedir a importação; o contraditório será garantido no processo para onde a prova for transladada (para essa última situação, STJ), Corte Especial, EREsp n. 428-SP, rel. Mina. Nancy Andrighi, j. em 4.6.2014). (DIDIER JUNIOR, 2017, p. 148, 149).
[7]Art. 372. O juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo- -lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório.
[8] Guardar a eficácia do processo do qual se originou, conservando o poder de convencimento inicialmente produzido; e ter eficácia e aproveitamento, não podendo ser facilmente reproduzida ou sendo sua reprodução financeiramente custosa. (Fredie Didier Junior, 2017)
Graduando do Curso de Direito pelo Centro Universitário UNA – Contagem / MG
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ALVES, Sara Fraga. Da importância da prova emprestada no processo do trabalho: a integração perfeita entre o CPC e a CLT Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 16 ago 2022, 04:05. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/59026/da-importncia-da-prova-emprestada-no-processo-do-trabalho-a-integrao-perfeita-entre-o-cpc-e-a-clt. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Maria D'Ajuda Pereira dos Santos
Por: Amanda Suellen de Oliveira
Por: HAROLDO JOSE CRUZ DE SOUZA JUNIOR
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