MAÍRA BOGO BRUNO [1]
(orientadora)
RESUMO: Esta pesquisa aborda o princípio da dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais, tais como a liberdade e a igualdade, bem como do princípio da autonomia médico-paciente. Tendo como base o objetivo de verificar se a exigência do passaporte sanitário de vacinação contra a COVID-19, como condição para o exercício de direitos fundamentais, viola a dignidade da pessoa humana, princípio fundamental previsto na Constituição Federal de 1988. Utiliza-se a metodologia da pesquisa jurídica, com método de abordagem dedutivo e com técnica de coleta de dados exploratória bibliográfica e de análise de dados qualitativa. A partir dos dados coletados sobre os princípios e direitos fundamentais verificou-se que a exigência do passaporte sanitário de vacinação contra a COVID-19 pode acarretar diversos efeitos indesejados como a segregação desumana entre as pessoas; limitação abusiva de direitos fundamentais como a liberdade e a igualdade; restrições ilegais da autonomia na relação médico-paciente; segregação social entre vacinados e não vacinados; e, outros tipos de abusos tanto da sociedade como do Estado, o que viola o princípio da dignidade da pessoa humana.
Palavras-chave: Princípios Fundamentais; Circulação em Espaços Públicos; Segregação Social; Relação Médico-Paciente.
ABSTRACT: This research addresses the principle of human dignity and fundamental rights, such as freedom and equality, as well as the principle of doctor-patient autonomy. Based on the objective of verifying whether the requirement of a health passport for vaccination against COVID-19, as a condition for the exercise of fundamental rights, violates the dignity of the human person, a fundamental principle provided for in the Federal Constitution of 1988. methodology of legal research, with a deductive approach method and with an exploratory bibliographic data collection technique and qualitative data analysis. From the data collected on fundamental principles and rights, it was found that the requirement for a health passport for vaccination against COVID-19 can lead to several undesired effects such as inhumane segregation between people; abusive limitation of fundamental rights such as freedom and equality; illegal restrictions on autonomy in the doctor-patient relationship; social segregation between vaccinated and unvaccinated; and other types of abuse by both society and the State, which violates the principle of human dignity.
Keyword: Fundamental principles; Circulation in Public Spaces; Social Segregation; Doctor-Patient Relationship.
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho versa sobre a exigência do passaporte sanitário de vacinação contra a COVID-19 como fator de violação à dignidade da pessoa humana, ao passo que restringe o exercício de vários princípios e direitos fundamentais, enfocando os direitos de liberdade e igualdade e o princípio da autonomia.
É relevante referir que o reconhecimento da dignidade humana foi uma conquista árdua, consolidada após séculos de exploração da miséria e da fragilidade e de intermináveis conflitos bélicos, em especial as 2 grandes Guerras Mundiais (GM), buscando minar os abusos de um grupo que se acha superior sobre os demais, justificando, assim, as mais terríveis ações, com o fim da II GM, foi proclamada pelas Nações Unidas a Declaração Universal dos Direitos que reconheceu que todos os seres humanos, indistintamente, são membros da mesma família humana e detentores de direitos iguais e inalienáveis, sendo este reconhecimento “o fundamentando da liberdade, da justiça e da paz no mundo.” (ONU, 1948, não paginado).
No dia 11 de março de 2020 a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou a pior emergência sanitária dos últimos tempos. Uma variação genética fez com que um novo tipo de Coronavírus (Sars-Cov-2) surgisse e fosse capaz de se transmitir para e entre humanos, causando uma doença potencialmente fatal, conhecida como COVID-19 (UNA-SUS, 2020).
Para combater o alastramento do contágio pela COVID-19, foram tomadas diversas medidas sanitárias pelos governos estaduais e municipais como decretação de quarentena, suspensão de eventos sociais, restrição do transporte intermunicipal e interestadual, suspensão das aulas na educação básica e superior, funcionamento apenas de serviços essenciais, isolamento social etc. (AGÊNCIA BRASIL, 2020).
Além destas medidas governos estaduais e municipais, após o início da vacinação contra a COVID-19, passaram a exigir passaporte de imunização comprovando o esquema vacinal completo para a circulação em certos espaços coletivos, públicos e privados. (YAHOO!, 2021).
Diante disso, o principal questionamento que se pretende responder no decorrer da pesquisa é: a exigência do passaporte sanitário de vacinação contra a COVID-19 viola o princípio da dignidade da pessoa humana?
Esta pesquisa se justifica pelo fato de que tanto a sociedade internacional quanto a brasileira, vivenciaram momentos incertos e dramáticos no curso da pandemia da COVID-19, assim, diversas medidas de contenção foram adotadas, especialmente por governadores e prefeitos, condutas estas com verdadeiro caráter autoritário, afrontando diretamente vários direitos individuais indisponíveis, tais como o direito à liberdade, a igualdade e até mesmo ao próprio direito à saúde.
A imposição indiscriminada do passaporte de vacinação, por exemplo, levou pacientes com contraindicação médica a se vacinarem, sob risco de ter seu acesso e direito à cidadania ignorados, desrespeitando não só a sua vontade, como também a contraindicação formal de seu médico de confiança.
Esses foram alguns dos abusos cometidos em nome do bem maior, permitindo, à revelia de diversos dispositivos legais nacionais e de Tratados e Acordos Internacionais dos quais o Brasil é signatário, a limitação do exercício de direitos fundamentais e a inobservância de princípios constitucionais.
Destarte, diante da diversidade de limitações para conter o surto conduzido pela COVID-19, esta pesquisa se limitará ao passaporte sanitário ou passaporte de imunização, já que conduz à segregação de cidadãos, dentro de um mesmo território, o que é evidentemente incompatível com o ordenamento jurídico brasileiro.
O objetivo geral do trabalho é verificar se a exigência do passaporte sanitário de vacinação contra a COVID-19, como condição para o exercício de direitos fundamentais, viola a dignidade da pessoa humana.
Os objetivos específicos são: (i) averiguar a dignidade humana frente a exigência do passaporte sanitário de vacinação contra a COVID-19; (ii) verificar se houve limitação do direito à liberdade de locomoção prevista no (art. 5º XV e LXVIII, da CF) pela exigência do passaporte sanitário de vacinação contra a COVID-19; (iii) esclarecer se houve a violação do Direito à Igualdade previsto no (art. 5°, Caput, da Constituição Federal) pela segregação social entre vacinados e não vacinados; (iv) demonstrar a mitigação do princípio da Autonomia Médico-paciente pela desconsideração das decisões médicas decorrente da exigência do passaporte sanitário de vacinação contra a COVID-19.
O presente trabalho adota a metodologia da pesquisa jurídica, com método dedutivo e técnica de coleta de dados exploratória bibliográfica e documental, utilizando-se de doutrinas, documentos, leis e jurisprudências para, partindo do estudo sobre a proteção dos direitos humanos fundamentais e das controvérsias acerca da vacina, levantar subsídios quanto a violação destes direitos, pela exigência do passaporte sanitário de vacina contra a COVID-19.
Na primeira seção, discorre-se acerca da violação a um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito brasileiro, estabelecido no art. 1º, III, da CF, denominado princípio da dignidade da pessoa humana, e o condicionamento do seu exercício à vontade do Estado, em afronta direta às garantias e direitos fundamentais previstos no texto constitucional.
Na segunda seção, discute-se em relação ao direito constitucional à liberdade individual, onde foi possível verificar, no curso da pandemia da COVID-19, a imposição de medidas draconianas sem previsão legal, como a exigida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nas teses firmadas nas ADIs n. 6586 e 6587, para a compulsoriedade das vacinas.
Na terceira seção, aborda-se sobre a violação do direito à Igualdade pela segregação social entre vacinados e não vacinados, decorrente da exigência do passaporte sanitário de vacinação contra a COVID-19. Esta imposição segrega os indivíduos, passando a ideia de haver castas dentro da sociedade brasileira – a dos vacinados e a dos não vacinados -, o que indubitavelmente é incompatível com o Estado Democrático de Direito, colidindo com os artigos 3°, inciso IV e artigo 5°, inciso XLI, da Constituição Cidadã.
Na quarta seção, trata-se quanto à mitigação do princípio da Autonomia Médico-paciente pela desconsideração das decisões médicas. Onde não se pode olvidar que a preservação da vida e a autonomia da pessoa lúcida são soberanas. E que qualquer tentativa de eludir isso é “materialmente inconstitucional”.
O resultado a ser apresentado na presente pesquisa decorre do estudo dos dispositivos na legislação vigente, em especial, os artigos 1°, 3° e 5° da Constituição Federal de 1988, bem como, entendimentos e pensamentos de diversos autores consagrados pela doutrina nacional e internacional, resoluções do Conselho Federal de Medicina (CFM) e jurisprudências do STF.
2 DIREITOS FUNDAMENTAIS E O PRINCÍPIO FUNDAMENTAL DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
Esta seção aborda o princípio da dignidade da pessoa humana, que pode ser entendido como um valor moral, que faz do homem um ser que merece ser respeitado tanto pelo Estado, quanto pela sociedade; e que o protege de todo ato ou modo degradante, assim como, da discriminação, assegurando condições de sobrevivência.
A dignidade da pessoa humana é considerada o princípio balizador de todos os ordenamentos jurídicos atuais, o “princípio dos princípios” (ASSIS e KRACIESCKI, 2021). Neste sentido Daniel Sarmento explica que:
No que concerne à positivação jurídica, a dignidade da pessoa humana está consagrada com destaque na Constituição de 1988, no art. 1º, inciso III, que a invoca como “fundamento da República”, sendo também citada em outros preceitos mais específicos (arts. 170; 226, § 6º; 227; 230). O Brasil, ademais, ratificou e incorporou ao ordenamento jurídico quase todos os tratados internacionais de direitos humanos que contêm referências à dignidade. (SARMENTO, 2016, p. 56).
A dignidade da pessoa humana constitui então, fundamento do Estado Democrático de Direito (art. 1º, inciso III, da Constituição de 1988) e essa introdução no texto constitucional é importante para que haja uma legítima proteção.
De acordo com Nicola Abbagnano, filósofo italiano, por princípio da dignidade da pessoa humana, entende-se a exigência enunciada por Kant consoante a fórmula do imperativo categórico que as coisas têm preço, são substituíveis e relativas; já o homem como um ser racional, possui valor absoluto, intrínseco e inalienável, que é a dignidade. (ABBAGNANO, 2012).
No entanto, este princípio não é uma criação da esfera constitucional, pois ele é um dado anterior a toda experiência, tal como a própria pessoa humana. Mas, diante da sua magnitude, a Constituição transformou-o em um valor supremo da ordem jurídica, sendo anunciado como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil. (SILVA,1998, p.91).
Estando a dignidade da pessoa humana na qualidade de princípio fundamental, o legislador trouxe no Título II, art. 5° ao art. 17, da Constituição Federal de 1988 (CF/88), um vasto quadro de direitos e garantias fundamentais; tais como os direitos e deveres individuais e coletivos, os direitos sociais, os direitos de nacionalidade e os direitos políticos e dos partidos políticos. Sobre isso, Alexandre de Morais pondera:
Um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos e a busca ao Direito à Felicidade (MORAES, 2017, p. 52).
Neste ponto, para adentrar a dignidade da pessoa humana como princípio e fundamento do ordenamento jurídico, faz-se necessário trazer à colação o entendimento do jurista Ingo Wolfgang Sarlet, que a conceitua como:
Temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existentes mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos. (SARLET, 1988, p. 60).
Sobre a intrínseca relação entre o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais, Alexandre de Moraes pondera que:
os chamados direitos humanos fundamentais que consistem no conjunto institucionalizado de direitos e garantias do ser humano que tem por finalidade básica o respeito a sua dignidade, por meio de sua proteção contra o arbítrio do poder estatal, e o estabelecimento de condições mínimas de vida e desenvolvimento da personalidade humana (MORAES, 2021, p. 20).
Embora esteja claro que a dignidade humana se relaciona com todos os direitos fundamentais, para fins dessa pesquisa, será tratado apenas sobre o direito à liberdade e à igualdade, que estão previstos no art. 5°, caput e incisos, da CF/88.
Entende-se que a liberdade e a igualdade são alguns dos alicerces da dignidade da pessoa humana. O próprio texto Constitucional, estabeleceu no Título II, artigo 5°, alhures mencionado, que:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes. (BRASIL,1988, não paginado).
Ao passo que se não houver o respeito de todos os direitos previstos, não há de se falar em dignidade. Neste contexto, o juiz de Direito, Antônio Silveira R. dos Santos (2001), muito bem explica, que a dignidade só é possível com liberdade, porque somente o homem livre é digno, pois assim terá sua humanidade reconhecida. Mas, para que possa haver uma humanização total e abrangente, todos os homens, todos os povos e todas as organizações sociais humanas devem reconhecer a primazia da dignidade humana de seus membros pelos atributos espirituais (os seus valores), e não pelos atributos materiais externos, como riqueza material.
Entende-se como liberdade a determinação e/ou vontade (o livre-arbítrio), ante um ato não ordenado nem proibido por lei, de fazer ou não fazer algo. A autonomia privada está, portanto, diretamente e inseparavelmente ligada à liberdade individual, completando o sentido de dignidade. (SANTOS, 2001).
Para concluir esta seção, faz-se importante trazer a lição do renomado jurista Fernando Capez (2009), em seu sábio pensamento a respeito da dignidade humana, que declara que tudo e qualquer construção representativa que venha afrontar a dignidade da pessoa humana é inconstitucional, pois isto fere o fundamento da existência do Estado.
Considerando assim, que a liberdade, a igualdade e a autonomia privada estão intrinsecamente ligadas à dignidade humana, qualquer ameaça ou violação, acaba por ferir o princípio basilar do direito, à própria dignidade humana, como será demonstrado nas próximas seções.
3 LIMITAÇÃO DO DIREITO À LIBERDADE PELA RESTRIÇÃO DA CIRCULAÇÃO EM ESPAÇOS COLETIVOS
O Direito à liberdade está previsto genericamente no art. 5°, caput, da CF/88. Ao longo de seus, referido artigo, traz diversas formas de liberdade constitucionalmente protegidas, tais como: liberdade da pessoa física: art. 5º, XV, LXVII, LIV, LXI; liberdade de pensamento, opinião - art. 5º, IV, IX; de crença - art. 5º, VI, VII, VIII; e, de informação, art. 5º, XIV, XXXIII, LXXII; liberdade de ação profissional: art. 5º, XIII; e, liberdade de conteúdo econômico e social, reunião - art. 5º, XVI; E , associação - art. 5º, XVII, XVIII, XIX, XX. (SILVA, 2003). Aqui, será especialmente abordado sobre liberdade de locomoção, que se enquadra na liberdade de pessoa física, que está prevista no inciso XV, do art. 5, da CF/88.
A liberdade de locomoção não é só mais uma das liberdades civis dos indivíduos, mas sim um direito fundamental, e como tal, não pode ser limitado de forma arbitrária pelo Estado. Este direito encontra-se respaldado no art. 5°, XV, da seguinte forma: "É livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens". (BRASIL, 1988, não paginado)
No mais, os direitos e garantias individuais são considerados cláusula pétrea (CF/1988, art. 60, § 4º, IV), devendo-se, pois, respeitar o devido processo legal para que haja esta privação e não mera deliberação executiva e/ou judicial. (SANTOS, 2001).
Em consonância com a CF/88, pode-se entender que tal liberdade não pode vir a ser tolhida por atos do Estado tomados de ilegalidade ou de abuso de poder, como o caso da exigência do passaporte sanitário de vacinação contra a COVID-19 para circulação em espaços coletivos.
Ora, quanto aos limites da liberdade de locomoção só se pode estabelecer a obrigação de permanência em localidade determinada, sendo possível o estabelecimento de vedação de entrada em outros, somente por ordem do Presidente da República com prévia oitiva dos Conselhos da República, de Defesa e com autorização prévia do Congresso Nacional, conforme prevê o artigo 139, da Constituição Federal; outra forma de impedimento ao exercício deste direito é quando decretado Estado de Sítio, Art. 137, da Constituição Federal. (BRASIL,1988, não paginado)
Também é válido aclarar que o país, no atual cenário, não se encontra em situação de guerra declarada ou nenhuma outra ameaça à soberania, e mesmo diante da emergência de saúde pública, conforme declarado pela Portaria n° 188, de 3 de fevereiro de 2020, do Ministério da Saúde, não se está na presença de estado de sítio, única circunstância em que a Constituição da República permite a limitação ou suspensão de garantias fundamentais como a de liberdade de locomoção.
Ora, os Direitos Humanos são integrados pelos direitos básicos, sendo direitos civis e políticos, econômicos, sociais e culturais, difusos, coletivos e individuais homogêneos e que estão expressamente dispostos na Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948 DUDH). É relevante mencionar que tais direitos carecem ser protegidos pela lei, “para que o ser humano não seja compelido, como último recurso, à rebelião contra a tirania e a opressão”. (ONU, 1948, não paginado)
A DUDH dispõe que todo ser humano é capaz de ter direitos, sem que haja diferenciações de qualquer natureza, e garante a liberdade de locomoção, no Art 13, parágrafo 1, da seguinte forma: “Todo ser humano tem direito à liberdade de locomoção e residência dentro das fronteiras de cada Estado.” (ONU, 1948, não paginado).
Observando o atual cenário da exigência do passaporte sanitário contra à COVID-19, diante do direito à liberdade, diretamente ligado à dignidade humana, é importante trazer informações de que, a vacinação contra a COVID-19, foi questionada perante o Supremo Tribunal Federal, mediante as Ações Diretas de Constitucionalidade no 6.586/DF e 6.587/DF (BRASIL, 2021).
Naquela ocasião em que, em interpretação conforme à Constituição, a Suprema Corte esclareceu que somente poderiam ser utilizadas medidas indiretas para estímulo da vacinação quando presentes outras 5 (cinco) condições, o qual muito importa para fins deste artigo a condição número (iii); que diz respeito à dignidade humana e os direitos fundamentais das pessoas. (BRASIL, 2021).
Tendo em vista que, a exigência do passaporte vacinal contra a COVID-19, para o ingresso em determinados espaços de circulação púbica fere a diretriz do respeito à dignidade humana e aos direitos fundamentais das pessoas, desobedecendo a condição (iii) do documento acima citado.
A medida propicia a restrição do direito à liberdade de locomoção, art. 5°, XV, da CF, e cláusula pétrea art. 60, §4°, da CF/88, restringindo os direitos de crianças, adolescentes e maiores de idade à educação, aos cidadãos receberem atendimento de saúde e dos servidores públicos e privados de exercerem suas funções, uma vez que para seu exercício é imposto a exigência do documento, em ofensa aos limites dispostos pela Constituição.
Os passaportes de vacinação contra a COVID-19 deveriam lidar de maneira responsável com as incertezas em relação à duração da proteção oferecida pelas vacinas e até mesmo as diferentes infecções, e por este motivo nunca deveriam ser vistos como provas de ausência de contagiosidade. (UNESCO e COMEST, 2021, p. 3).
Por esta razão, pelas incertezas quanto a duração e ainda aos efeitos adversos não amplamente conhecidos, não mencionados nesta oportunidade, que, por si, deve-se conduzir a liberdade do indivíduo de se inocular ou não, sem violar a sua liberdade constitucional de ir, vir e permanecer.
Nessas circunstâncias, resta claro que a recomendação de exigência do passaporte vacinal imposta de maneira apressada e constrangedora, não incentiva à vacinação, e sim há uma obrigatoriedade indiretamente forçada, ferindo assim, a dignidade da pessoa humana, pois restringe arbitrariamente a liberdade de locomoção.
4 VIOLAÇÃO DO DIREITO À IGUALDADE ENTRE VACINADOS E NÃO VACINADOS
O princípio constitucional da igualdade está previsto na Constituição Federal de 1988, onde dispõe em seu artigo 5°, caput, em face da lei: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes.” (BRASIL, 1988, não paginado)
A materialização do direito à igualdade deve se dar “através dos mandamentos constitucionais de não discriminação, de tolerância, de respeito às diferenças e de combate ao preconceito e ao racismo” (MARMELSTEIN, 2019, p. 76). A CF/88 promove e protege a igualdade para eliminar “qualquer tratamento diferenciado a um grupo ou categoria de pessoas, visando prejudicá-las. Dentro desse contexto, conclui-se que todos os benefícios jurídicos concedidos a qualquer pessoa não podem ser negados para outras sem uma justificativa plausível” (MARMELSTEIN, 2019, p. 76).
Entende-se que este direito constitucional fundamental é respaldado no sentido de que todos os seres humanos são iguais, e por isso, merecem ser tratados com as mesmas garantias, direitos e deveres.
Intrinsecamente, esse princípio veda quaisquer tipos de diferenciações arbitrárias, absurdas e injustificáveis no tratamento dos valores previstos da Constituição Federal, pressupondo, inclusive, que as pessoas colocadas em situações diferentes sejam tratadas de forma desigual, protegendo, assim, a equidade na outorga dos direitos e cobrança dos deveres sociais, pois dispensar “tratamento isonômico às partes significa tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na exata medida de suas desigualdades.” (NERY JÚNIOR, 1999, p.42).
Impende destacar, que o direito à igualdade, traduz-se em norma de eficácia plena, cuja exigência independe de qualquer norma regulamentadora, assegurando a todos, independentemente de raça, cor, sexo, classe social, situação econômica, orientação sexual, convicções políticas e religiosas, igual tratamento perante a lei, mas, também e principalmente, igualdade material ou substancial. (NERY JÚNIOR, 1999).
Assim, da análise do princípio da igualdade, faz-se necessário trazer à colação, o pronunciamento da UNESCO, diante do passaporte sanitário de vacinação contra a COVID-19, no qual deixa claro que este não deve ser elaborado e que não haja a implementação, tampouco sua utilização como privilégio, assim como não infrinja a liberdade de escolha, mas que sejam usados como uma forma de criar um ambiente mais seguro para todos em termos epidemiológicos. (UNESCO e COMEST, 2021, pp. 2 e 3)
Também é alertado no mesmo documento, quanto ao tratamento discriminatório e a desigualdade social entre vacinados e não vacinados que o certificado pode consequentemente ensejar. A Declaração adverte que a medida não deve resultar em divisões sociais, sendo de grande importância fornecer meios alternativos que garantam a liberdade individual e o acesso a todos, considerando os diferentes panoramas de uma sociedade, a exemplo da idade e da condição social.
Os certificados COVID-19 podem criar formas injustas de discriminação e exclusão, as quais devem ser evitadas. O tratamento desigual de pessoas com base em ter ou não ter um certificado COVID-19 pode causar estigmatização e divisões sociais. Quando tais atestados são necessários para se obter acesso a atividades ou locais específicos, especialmente em espaços públicos, isso não deve resultar na exclusão daqueles que não podem se vacinar, por exemplo, devido a gravidez, condição médica, falta de vacinas ou recusa à vacina. Nesses casos, um resultado confiável de teste negativo recente também deve permitir o acesso, e os testes devem ser disponibilizados e facilmente acessíveis a qualquer pessoa, gratuitamente ou por um preço baixo. Além disso, a introdução de certificados COVID-19 não deve resultar em divisões sociais, por exemplo, entre pessoas vacinadas e não vacinadas, entre pessoas que precisam do certificado para realizar seu trabalho e aquelas não precisam dele, e entre pessoas que têm acesso aos certificados e aquelas que não o têm, como migrantes e refugiados sem documentos, a menos que eles sejam absolutamente necessários para uma quarentena eficaz. Para efetivar isso na prática, é necessária regulamentação.” (UNESCO e COMEST, 2021, p. 2)
Contudo, da simples leitura, enxerga-se que a exigência do passaporte sanitário de vacinação na realidade prática, faz com que haja uma espécie de casta, a partir do momento em que dá tratamento diferente àqueles que optaram por vontade própria ou por qualquer motivo alheio à sua vontade, por exercer o direito de não se submeter à imunização contra o SARS-CoV-2, pela via das vacinas atualmente oferecidas no território nacional. Havendo assim uma espécie de discriminação entre pessoas vacinadas e não vacinadas, o que colide com as normas positivadas na CF/88 da seguinte forma:
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República ederativa do Brasil: [...] III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. [...] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais; [...]. (BRASIL, 1988, não paginado)
Considerando, com base nos termos citados, tal exigência acarreta arbitrariedade e abuso de poder, já que cria fator de desigualdade e segregação social ao colocar em um círculo, cidadão contra cidadão, em uma gama construída por desconfiança e separatismo, o que é vedado pela Constituição da República, Lei Fundamental, que defende o direito de igualdade, ferindo assim, a dignidade da pessoa humana.
5 MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DA AUTONOMIA MÉDICO-PACIENTE PELA DESCONSIDERAÇÃO DAS DECISÕES MÉDICAS
Além dos direitos fundamentais de liberdade e igualdade, a exigência do passaporte sanitário de vacinação contra a COVID-19, afronta o princípio da autonomia privada, que está diretamente ligada ao princípio da liberdade e diz respeito à ideia de que o “Estado deve tratar as pessoas sob o seu domínio como agentes responsáveis e capazes de tomar por si próprios as decisões que lhes dizem respeito” (MARMELSTEIN, 2019, p. 106). Além do mais, esta proteção traz a “perspectiva da pessoa humana como ser em busca da autorrealização, responsável pela escolha dos meios aptos para realizar as suas potencialidades” (MENDES; BRANCO, 2018, p. 267).
Assim, o termo autonomia denomina-se como a capacidade de se autodeterminar ou autogovernar, conforme suas próprias decisões. Consequentemente, para que um indivíduo seja autônomo, capaz de realizar escolhas, é necessário que este indivíduo seja capaz de agir intencionalmente e que tenha liberdade para tal.
A autonomia é o direito à autodeterminação do ser humano em decidir questões que dizem respeito a sua vida, assim como sua saúde físico-psíquica e sua submissão à inoculação de uma vacina cuja eficácia é incerta.
No texto do Código de Ética Médica (CEM), Resolução CFM n° 2.217, de 27 de setembro de 2018, modificada pelas Resoluções CFM nº 2.222/2018 e 2.226/2019, os princípios fundamentais que norteiam a profissão médica do país é cristalina ao garantir a autonomia profissional, eximindo de exercer atos que contrariem sua consciência, ou seja, prática, conhecimento e sabedoria. O documento, deixa expressamente claro que médico é dotado de autonomia para exercer sua profissão e não deve renunciar a sua liberdade profissional. (CFM, [2019]).
Nesse mesmo sentido, o próprio Conselho Federal de Medicina (CFM), assegurou “ao paciente maior de idade, lúcido, orientado e consciente, no momento da decisão, o direito de recusa à terapêutica proposta em tratamento eletivo” (CFM, [2019], não paginado), o que dirá em relação à exigência de se submeter ao tratamento experimental, se submetendo à inoculação de imunomodulador com tecnologia inovadora, inadvertidamente apresentado como “vacina”, sem ao menos ter concluído todas as fases para autorização de comercialização exigidas pela própria ANVISA e cujos efeitos a longo prazo não podem sequer serem cogitados.
Neste contexto, é preciso destacar que a ANVISA pontuou expressamente na Resolução RDC n° 475, de 10 de março de 2021, que as vacinas contra COVID-19 sem registro definitivo foram autorizadas temporariamente em caráter experimental – termo utilizado pela própria ANVISA no art. 3° dessa norma, in verbis:
Os medicamentos e vacinas contra COVID-19 autorizadas temporariamente para uso emergencial para a prevenção da COVID-19 serão destinadas ao uso em caráter experimental, preferencialmente, em programas de saúde pública do Ministério da Saúde. (BRASIL, 2021)
Além disso, a própria ANVISA, na Instrução Normativa n° 45, de 21 de agosto de 2019, regulamentou as Boas Práticas de Fabricação complementares a Medicamentos Experimentais, apresentando o seguinte conceito de Medicamento Experimental, no art. 3º, XI:
medicamento experimental: produto farmacêutico em teste, objeto do Dossiê de Desenvolvimento Clínico de Medicamento (DDCM), a ser utilizado no ensaio clínico, com a finalidade de se obter informações para o seu registro ou pós-registro; ou Forma farmacêutica de uma substância ativa ou placebo testada ou utilizada como referência em um ensaio clínico, incluindo um produto com registro quando utilizado ou montado (formulado ou embalado) de uma forma diferente da registrada, ou quando utilizado para uma indicação não registrada, ou quando usado para obter mais informações sobre a forma registrada (BRASIL, 2019).
Embora um estudo recente, com base em dados populacionais, sugira que as vacinas utilizadas no Reino Unido parecem ser altamente eficazes na redução da transmissão, somente agora estão se consolidando as evidências sobre o quanto diferentes vacinas ajudam a prevenir a propagação da doença. Além disso, a eficácia da vacina é variável: a OMS aceita um valor de eficácia superior a 50%, com um limite inferior de 30%. A imunidade produzida pelas vacinas é alcançada apenas algumas semanas após a vacinação, e sabe-se que infecções pós- vacinação que requerem hospitalização ocorrem em indivíduos vacinados, embora em uma porcentagem muito pequena. Além disso, vacinas normalmente consideradas de alta eficácia podem se tornar obsoletas com o surgimento de novas variantes do vírus. (UNESCO e COMEST, 2021, p.3).
Assim, em virtude da autonomia privada as pessoas deveriam poder escolher se se submetem ou não à vacinação contra a COVID-19, bem como, em decorrência da autonomia profissional o parecer do médico se seu paciente deve ou não tomar a vacina deveria ser respeitado. O próprio CFM garante a autonomia do médico, do paciente e a valorização da relação médico paciente, “sendo essa a mais próxima possível, com o objetivo de oferecer ao doente o melhor tratamento médico disponível no momento" (CFM, 2021, pág. 3, grifo nosso).
Em que pese a Lei 13.979/2020, que dispôs sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional, decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019, prevendo, entre outras medidas, a possibilidade de vacinação (Lei 13.979/2020, art. 3º, III, d), não se pode olvidar que a preservação da vida e a autonomia da pessoa lúcida são soberanas. E que qualquer tentativa de eludir isso é “materialmente inconstitucional” (CAPEZ, 2009, p. 07, grifo nosso).
No entanto, ao ser chamado para a interpretação prática da referida alínea, a decisão do ministro Ricardo Lewandowski quando do julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) n.º 754 no dia 14/02/2022 covardemente explica que:
No sentido de que (i) “a vacinação compulsória não significa vacinação forçada, por exigir sempre o consentimento do usuário, podendo, contudo, ser implementada por meio de medidas indiretas, as quais compreendem, dentre outras, a restrição ao exercício de certas atividades ou à frequência de determinados lugares, desde que previstas em lei, ou dela decorrentes”, esclarecendo, ainda, que (ii) “tais medidas, com as limitações expostas, podem ser implementadas tanto pela União como pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, respeitadas as respectivas esferas de competência”, (BRASIL, 2022, grifo nosso)
Embora tenha o Supremo Tribunal Federal (STF) permitido a coerção indireta da vacina, a realidade presenciada é que as pessoas estão sendo coagidas a cederem a sua integridade moral, física e psicológica para atender a imposições estatais ou privadas, sob pena de sofrer graves restrições e seus direitos serem tolhidos.
Destarte, o Código de Nuremberg afirma categoricamente, e na melhor medida kantiana, que “requer que o pesquisador proteja os melhores interesses do seu paciente, mas também proclama que os sujeitos possam ativamente protegerem a si mesmos”, (TRIBUNAL INTERNACIONAL DE NUREMBERG, 1947, não paginado, grifo nosso) o que foi vivenciado na prática foi uma total inversão de valores com voltas à barbárie de antigamente.
Não bastasse, na ocasião que os preceitos para limitação dos direitos e liberdades individuais foram avaliados, entendeu-se que " (…) o Estado pode ordenar experimentos fatais em seres humanos, mas os médicos permanecem responsáveis por não realizá-los", (TRIBUNAL INTERNACIONAL DE NUREMBERG, 1947, não paginado, grifo nosso). Ou seja, embora legal, essa intimidação é flagrantemente imoral, imolando tudo o que se conquistou a respeito dos Direitos, Garantias e Liberdades Individuais até hoje.
Ora, se o Estado ameaça os indivíduos sob sua tutela de terem seus direitos fundamentais de liberdade e autonomia cerceados mediante a recusa de fazer parte de um experimento, ainda que testado, seguro e com efeitos colaterais leves, está configurada lesão de sua dignidade, princípio este tão valorizado pelo nosso ordenamento jurídico.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A dignidade humana é um princípio que surgiu na consistência de qualidade essencial de cada ser humano, constituindo o coração e a gênese que assegura condições materiais mínimas de sobrevivência.
Destarte, a Constituição Federal de 1988 aperfeiçoou o princípio da dignidade humana à condição de centro de todo ordenamento jurídico, consagrando-o como fundamento basilar da República, previsto no artigo 1°, inciso III. Conseguinte, o princípio da dignidade da pessoa humana nasceu para garantir a vida digna para proteger o ser humano, mantendo e garantindo o viver com dignidade regado de respeito mútuo entre os cidadãos.
No entanto, o legislador constituinte ainda se empenhou em trazer no texto constitucional, um extenso rol de direitos para garantir assim a sua proteção e efetividade, estando a maioria previstos no Título II, artigo 5°. Sua incorporação nos direitos fundamentais, estabeleceu direitos e garantias, fazendo com que o ser humano seja protegido, repudiando situações que agridam sua pessoa. Da interpretação do artigo 5°, entende-se que todos os direitos fundamentais são clarificações provenientes da dignidade da pessoa humana, sendo assim fundamental para a ordem jurídica. À vista da sua sagrada importância para a Constituição, qualquer desrespeito ou a menor ofensa, viola sua essência.
Assim, no contexto atual de passaporte sanitário, podem ser mencionados diversos efeitos indesejados como resultado, a segregação desumana entre as pessoas; restrições ilegais; restrições aos direitos fundamentais e sociais; e, outros tipos de abusos e preconceitos.
O passaporte sanitário em diferentes situações, condiciona o exercício de garantias fundamentais e direitos humanos à submissão contra a vontade do indivíduo a tratamento de saúde com risco à saúde e vida do paciente, e isto configura violação do sistema de proteção contra o Estado na vida privada e íntima.
Em relação à liberdade pode-se facilmente destacar que a criação de hipóteses não previstas em Lei para privar alguém de liberdade de ir, vir e permanecer fere o princípio da legalidade e devido processo legislativo posto que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.”
É indiscutível que a mera exigência de um comprovante do passaporte sanitário, para a locomoção dos indivíduos dentro de seu próprio território já que conduz à segregação de cidadãos, sendo, evidentemente incompatível com o ordenamento jurídico brasileiro vigente.
A imposição do passaporte vacinal fere, ainda, o princípio da igualdade, pois a imposição segrega os indivíduos, passando a ideia de haver castas dentro da sociedade brasileira – a dos vacinados e a dos não vacinados -, o que indubitavelmente é incompatível com o estado democrático de direito colidindo com os artigos 3°, inciso IV e artigo 5°, inciso XLI, da Constituição Cidadã.
A dignidade humana em sua dimensão de autodeterminação do indivíduo se configura pela garantia que o ordenamento jurídico confere ao indivíduo de prevalecer sua decisão mesmo que contrária ao desejo da maioria ou mesmo de agentes públicos titulares de cargos que agem em nome do Estado. Portanto, quando se cria uma condição excepcional não prevista na constituição para substituir a vontade do indivíduo pela do Estado estamos diante de uma violação ao direito à liberdade e à autonomia.
Diante disso é possível concluir que a exigência do passaporte sanitário de vacinação contra a COVID-19, está em confronto com a Constituição Federal, ainda, não observa os requisitos da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, não acompanhas as recomendações impostas e muito bem esclarecidas pela UNESCO e pela Organização Mundial da Saúde, não respeita as resoluções do Conselho Regional de Medicina e tampouco apresenta elementos científicos para justificar a imposição dele. Nesta vertente, a exigência é arbitrária e ilegal, além de afrontar direitos fundamentais consagrados na Constituição Pátria, violando assim, a dignidade da pessoa humana.
REFERÊNCIAS
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[1] Mestre em Direito. Professora da Faculdade de Ciências Jurídicas de Paraíso do Tocantins (FCJP).
Graduando do curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas de Paraíso do Tocantins (FCJP).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MARTINS, Ana Caroline Silva de Medeiros. A exigência do passaporte sanitário de vacinação contra a covid-19 como fator de violação da dignidade da pessoa humana Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 20 out 2022, 04:56. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/59606/a-exigncia-do-passaporte-sanitrio-de-vacinao-contra-a-covid-19-como-fator-de-violao-da-dignidade-da-pessoa-humana. Acesso em: 04 dez 2024.
Por: Mirela Reis Caldas
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
Por: JAQUELINA LEITE DA SILVA MITRE
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