ELOISA DA SILVA COSTA
(orientadora)
Resumo: O presente estudo teve como principal objetivo a análise da eutanásia no Código Penal cumulativamente à Constituição Federal, com doutrinas e jurisprudências como principal suporte. Com isso, coube analisar e apontar o desacordo entre o regimento jurídico e o que seria moralmente e eticamente correto, em detrimento a dignidade humana de vida e morte, analisando por um olhar mais jurídico sobre o assunto, na perspectiva dos anos que passam e rondam esse tema junto também com suas nuances, em vista de uma criminalização tão severa.
Palavras-chave: Eutanásia. Dignidade da vida humana. Constituição. Código Penal.
Abstract: This study had as its main objective the analysis of euthanasia in the Criminal Code cumulatively to the Federal Constitution, with doctrine and jurisprudence as main support. With this, it was appropriate to analyze and point out the disagreement between the legal regulation and what would be morally and ethically correct, to the detriment of the human dignity of life and death, analyzing through a more legal look on the subject, from the perspective of the years that have passed and surround this theme along with its nuances, in view of such a severe criminalization.
Keywords: Euthanasia. Dignity of human life. Constitution. Criminal Code.
Sumário: 1. Introdução. 2. Conceituação de eutanásia. 2.2. Conceituação de ortotanásia. 2.3. Semelhanças e diferenças entre eutanásia e ortotanásia. 3. O Código Penal e a tipificação da conduta de eutanásia. 4. O direito à vida frente à eutanásia. 5. A eutanásia no direito estrangeiro. 6. Considerações finais e referências.
A eutanásia, vem com a ação de apressar ou provocar a morte do sujeito de forma antecipada, de modo a proporcionar a alguma situação desagradável sem solução aparente, uma solução. É um tema extremamente polêmico, tendo em mente que o Brasil em sua esfera nacional se envolve de preceitos religiosos, morais e jurídicos no que tange a escolha de falecer por pura e mera vontade.
As questões que englobam o tema vão muito além desafiando a ética, a moral e até o direito ao longo do tempo, uma vez que o mundo em épocas anteriores temia a morte e doenças. Contudo, no novo mundo globalizado, um dos medos de uma certa porcentagem de pessoas é o prolongamento da vida, causando muitas vezes agonia perante um sofrimento extremo.
Pouco se conhece a eutanásia e suas diferenciações, ademais, muitos confundem com o suicídio assistido, uma vez que a eutanásia vislumbra pessoas em estados terminais de vida, e o segundo atinge pessoas que recorrem a terceiros para o auxílio à morte, sendo médico ou não, não tendo nenhuma relação com o estado de saúde física.
"Suicídio assistido designa a retirada da própria vida com auxílio ou assistência de terceiro, quando presentes as mesmas circunstâncias identificadas com relação à eutanásia: situação incurável e irreversível, bem como intenso sofrimento" (BARROSO, 2022, p.1168)
Vale destacar outras duas variações da eutanásia e suicídio assistido sendo uma delas a ser levada em consideração à distanásia, que visa respeitar o processo natural de vida, aplicando tão somente cuidados paliativos, com o intuito de amenizar possíveis sintomas que atingem, deixando o estado de leito o mais humanizado possível. Já ortotanásia uma das variações traz a vontade do paciente em parar com os cuidados paliativos sem cuidados médicos, por meios naturais.
Por fim, a morte assistida recai muito sobre o Código Penal, não validando a autonomia de um paciente, muitos em estado terminal, com um sofrimento incurável, de escolher terminar com a vida, sendo tratada, portanto, como um ato de homicídio. Diante desse emblema, e várias discussões, o Legislativo, a fim de evitar a ausência de um tratamento adequado, concordou com a distanásia, permitindo que aqueles que se encontrassem em estado terminal de enfermidades graves ou até incuráveis, fosse suspenso todo e qualquer procedimento, acarretando, uma omissão de socorro.
A eutanásia tem como finalidade a morte provocada de um agente enfermo ou não antes do previsto, ou seja, sem a morte por causas naturais ou decorrentes de uma doença. A morte, portanto, pode se dar de forma ativa, ao qual um terceiro provocará, ou passiva, ocasionada por algum ato de omissão, de forma indireta ou direta, por ato voluntário, que ocorre mediante expresso consentimento, involuntário, que se concluirá através do não consentimento do paciente, e por ato não voluntário, que somente ocorrerá na modalidade do agente ter sua vontade reconhecida, mas não a manifesta em estados de enfermidades extremamente graves.
"A eutanásia está ligada a uma deliberada ação, que tem em mira o encerramento da vida de uma pessoa que sofre de um mal terminal, padecendo de dores substanciais. A eutanásia ocorre, às vezes, por meio de uma ação direta, que busca e ocasiona a morte. Ministrar drogas letais a um paciente, com o objetivo de causar-lhe a perda das funções vitais, configura hipótese de eutanásia." (MENDES, 2023, p.618).
Sendo este no Brasil, um tema controverso que envolve temas morais, valores culturais, jurídicos e até mesmo religiosos, vendo que em outros países a situação não é tratada da mesma forma levando em conta as formas regulamentares e religiosas.
2.2. Conceituação ortotanásia
A ortotanásia consiste em ser a morte pelo seu processo natural. Nesse contexto, o sujeito encontra-se em processo natural de morte e é amparado para que seu fim chegue sem uma intervenção médica por meios artificiais para prolongar a vida.
Assemelha-se à eutanásia passiva onde consiste em atenuar o sofrimento de uma pessoa que está com uma doença terminal por meio da interrupção de tratamentos que prolongam a vida, mas que não possuem eficácia curativa nem melhoram a enfermidade, seria apenas para prolongar ou até mesmo dar certo tipo de conforto destinado ao fim.
"Em sentido oposto tem-se a ortotanásia, que é a morte em seu tempo certo, sem emprego de métodos extraordinários ou desproporcionais. Ela vem acompanhada, normalmente, de cuidado paliativo, para aplacar o sofrimento físico e psíquico do enfermo." (BARROSO, 2022, p.1168).
Tendo em vista que somente o médico pode realizar a ortotanásia e isso porque o ele não está obrigado a prolongar a vida ou aprazar a dor do paciente contra sua vontade, deixando-o apenas mais confortável e auxiliando a sua escolha de não prolongar com tratamentos.
2.3. Semelhanças e diferenças entre eutanásia e ortotanásia
Ambas discorrem sobre uma única coisa, a morte antecipada e intencional por escolha do indivíduo que está em sofrimento, normalmente acometido por uma doença letal, o que as diferem é que na eutanásia há auxílio médico realizado por meio de substâncias letais, sendo este modo tratado como ativo.
Já a ortotanásia é tratada como a forma passiva onde o sujeito escolhe por conta própria não levar adiante o tratamento, retirando assim medicamentos e tratamentos que fariam a manutenção da vida e o médico por mais que sua posição seja proteger a vida, não pode se opor as vontades dos pacientes.
3. O CÓDIGO PENAL E A TIPIFICAÇÃO DA CONDUTA DE EUTANÁSIA
No Brasil esta prática é ilegal podendo logo ele é caracterizado como crime, o ato de matar alguém, tendo seu embasamento jurídico no código penal brasileiro, tratando-se de homicídio culposo e simples com base no artigo art. 121, §1º, do Código Penal.
CP - Decreto Lei nº 2.848 de 07 de Dezembro de 1940
Art. 121. Matar alguém:
Pena - reclusão, de seis a vinte anos.
Caso de diminuição de pena
§ 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. Código Penal.
Assim como pode também ser caracterizado como auxílio ao suicídio já que ao ajudar a pessoa a morrer está tipificado no art. 122, do código penal.
Decreto Lei nº 2.848 de 07 de Dezembro de 1940
Art. 122. Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou a praticar automutilação ou prestar-lhe auxílio material para que o faça: (Redação dada pela Lei nº 13.968, de 2019) Código Penal.
Tendo em vista que o dever do Estado é resguardar a vida e zelar por ela, como tido em sua própria Constituição Federal. Muitas vezes a eutanásia é tida como suicídio assistido o que apesar de ser de forma errônea segundo alguns doutrinadores também não existem parâmetros para tal.
"O Código Penal brasileiro, que é de 1940, não extrai consequências jurídicas significativas das categorias acima. O suicídio assistido, apesar de suas peculiaridades e o caráter de benevolência, recai no tipo penal geral referente ao tema 450. Não deveria ser assim. É preciso deflagrar no Brasil o debate necessário que valorize a autonomia do paciente na terminalidade da vida, sem desconsiderar os riscos de abusos e distorções que podem ocorrer, recaindo sobre pessoas idosas e doentes" (BARROSO, 2022, p.1169).
Vemos ainda que apesar de toda autonomia dada ao cidadão brasileiro algumas decisões o Estado se sobrepõe sob ele, já que a vontade sob como levar o tratamento de doenças terminais no estágio final ainda é considerado um tabu.
"A eutanásia é tratada como homicídio e a própria ortotanásia – conduta legítima e, em muitos casos, desejável – acaba ficando em uma zona cinzenta, que poderia ser enquadrada como omissão de socorro452. Para evitar que a ausência de um tratamento legislativo específico para a ortotanásia induzisse os médicos a praticarem a distanásia, o Conselho Federal de Medicina terminou por editar uma resolução na matéria, permitindo a limitação do tratamento e a suspensão de procedimentos na fase terminal de enfermidades graves e incuráveis453." (BARROSO, 2022, p.1170).
Logo observamos até onde vão as vontades do ser humano, e até que ponto estas se sobrepõem as leis e ao que é dito como correto, enfrentando a moral, os costumes e o que é tido como vida digna pela Constituição Federal.
4. O DIREITO À VIDA FRENTE À EUTANÁSIA
Destaca-se que o direito à vida é um dos pressupostos constitucionais, previsto no art. 5ª da Constituição Federal. Trata-se na contramão, de um direito não absoluto, tampouco superior hierarquicamente.
Muito se debate acerca da questão, mas há de se mencionar, que a livre escolha de morte, é relacionada ao direito à morte digna, se tratando de um meio mais humanizado, técnico, que buscam amenizar um sofrimento incurável, defendendo o direito à liberdade da autodeterminação do agente para a escolha do melhor procedimento a ser tomado.
5. A EUTANÁSIA NA LEGISLAÇÃO ESTRANGEIRA
No Brasil por ser a vida um direito inviolável e pétreo entra em discussão quando se trata de outros países a flexibilização já vem acontecendo há algum tempo, principalmente em países europeus, que já vem há muito tempo legalizando e permitindo o ato da eutanásia e seus derivados.
"Diversos países do mundo, sobretudo na Europa, admitem e regulamentam a morte com intervenção, tanto a eutanásia (Bélgica, Holanda, Espanha, Colômbia) quanto o suicídio assistido (Suíça, Nova Zelândia, Itália, Alemanha), sempre com a imposição de critérios rigorosos e controlados." (BARROSO, 2022, p.1170).
O último pais a liberar a eutanásia foi Portugal nesta última sexta feira dia 12/05/2023 depois de anos com a proposta no parlamento.
“A lei específica que as pessoas são autorizadas a solicitar assistência para morte nos casos em que se encontrem “em situação de sofrimento intenso, com lesão definitiva de extrema gravidade ou doença grave e incurável”. A regra estabelece um intervalo de dois meses entre a aceitação do pedido e o procedimento propriamente dito e torna obrigatório o apoio psicológico.” (KHALIP, “Presidente de Portugal Sanciona Lei Que Permite Eutanásia”).
Fica claro que em todos os países que regulamentaram a favor da eutanásia tem fortes regulamentos e regras de como é o funcionamento desde o pedido até a realização dela.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A eutanásia é um tema complexo e altamente controverso que tem a anos gerado intensos debates éticos, morais e legais em todo o mundo. Como abordado neste artigo científico, à prática da eutanásia envolve o ato deliberado de terminar a vida de uma pessoa que sofre de uma doença incurável e que expressou seu consentimento para isso.
Considerando as diversas perspectivas sobre a eutanásia, é essencial levar em conta os princípios éticos fundamentais, como o respeito à autonomia e à dignidade humana, a proteção da vida e o alívio do sofrimento. Enquanto alguns argumentam que a eutanásia pode ser uma opção compassiva para acabar com o sofrimento prolongado e intolerável de pacientes terminais, outros levantam preocupações sobre possíveis abusos, falta de controle e deslizamento para práticas não voluntárias.
É crucial que a discussão e a regulamentação da eutanásia sejam pautadas em sólidos fundamentos éticos, levando em consideração os direitos individuais, a devida proteção dos pacientes mais vulneráveis e a garantia de cuidados paliativos adequados como alternativa à eutanásia. Além disso, o estabelecimento de critérios claros, procedimentos rigorosos e a supervisão adequada são indispensáveis para garantir que a eutanásia seja realizada dentro de um quadro ético e legal.
Embora alguns países tenham optado por legalizar a eutanásia, é importante reconhecer que cada nação possui seu próprio contexto social, cultural e legal, o que resulta em abordagens divergentes em relação à eutanásia. O diálogo contínuo e a pesquisa científica são cruciais para aprofundar o entendimento dos impactos da eutanásia na sociedade, no sistema de saúde e nas famílias dos pacientes.
No final das contas, a eutanásia permanece como um assunto complexo e multifacetado que exige uma análise cuidadosa dos princípios éticos e dos valores sociais em jogo. A busca por soluções que abordem adequadamente o sofrimento humano e garantam o respeito à dignidade individual é um desafio contínuo, que deve ser enfrentado com base em evidências científicas, reflexão ética e considerações jurídicas sólidas.
Artigo 121 Do Decreto Lei No 2.848 de 07 de Dezembro de 1940. 7 Dec. 1940, www.jusbrasil.com.br/topicos/10625629/artigo-121-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940. Acesso em 17/05/2023.
BARBOSA, Gabriela Sousa da Silva; LOSURDO, Frederico. Eutanásia no Brasil: entre o Código Penal e a dignidade da pessoa humana. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rinc/a/MKcqnSGvQrkG3z5HSHRkLhF/?lang=pt. Acesso em: 28/04/2023
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GOULART, Mariana. A eutanásia, o direito de morrer e suas implicações no direito penal: Análise da tipicidade no projeto de lei nº 236/12 do Senado Federal. Disponível em: https://www.emerj.tjrj.jus.br/paginas/trabalhos_conclusao/2semestre2019/pdf/MarianaGoulart.pdf. Acesso em: 19/04/2023
KHALIP, Andrei. “Presidente de Portugal Sanciona Lei Que Permite Eutanásia.” CNN Brasil, 17 May 2023, www.cnnbrasil.com.br/internacional/presidente-de-portugal-sanciona-lei-que-permite-eutanasia/. Acesso em 17/05/2023.
MENDES, G. F.; BRANCO, P. G. G. Curso de Direito Constitucional. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2023. E-book.
SARLET, I. W.; MARINONI, L. G.; MITIDIERO, D. Curso de Direito Constitucional. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2022. E-book.
Graduanda em Direito pela Universidade Brasil
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Emily Barboza da. As controvérsias da lei sobre a eutanásia e a dignidade da pessoa humana Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 jul 2023, 04:35. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/62167/as-controvrsias-da-lei-sobre-a-eutansia-e-a-dignidade-da-pessoa-humana. Acesso em: 23 nov 2024.
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