RESUMO: O teletrabalho é uma modalidade de trabalho que se caracteriza pela realização de atividades profissionais fora das dependências físicas do empregador, por meio de tecnologias de informação e comunicação. Essa forma de trabalho ganhou destaque na atualidade, no entanto, esta modalidade de trabalho também traz desafios e riscos para os direitos dos trabalhadores, especialmente se tratando da efetividade do direito fundamental à privacidade. Sabendo que a privacidade é um valor constitucionalmente protegido, que abrange a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, bem como o sigilo de dados pessoais e profissionais. O teletrabalhador tem o direito de preservar sua privacidade em relação ao empregador e a terceiros, evitando interferências indevidas ou abusivas em sua esfera pessoal ou familiar. Neste artigo, pretendemos analisar o direito à privacidade do teletrabalhador identificando os principais desafios e as possíveis soluções no contexto atual.
Palavras-chave: direitos fundamentais, dignidade da pessoa humana, home office, privacidade, teletrabalho.
ABSTRACT: Telecommuting is a type of work that is characterized by carrying out professional activities outside the physical premises of the employer, through information and communication technologies. This form of work has gained prominence today, however, this type of work also brings challenges and risks to workers' rights, especially when it comes to the effectiveness of the fundamental right to privacy. Knowing that privacy is a constitutionally protected value, which covers intimacy, private life, honor and image of people, as well as the secrecy of personal and professional data. The teleworker has the right to preserve his privacy in relation to the employer and third parties, avoiding undue or abusive interference in his personal or family sphere. In this article, we intend to analyze the teleworker's right to privacy, identifying the main challenges and possible solutions in the current context.
Keywords: fundamental rights, human dignity, home office, telework, privacy.
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo aborda a efetividade do exercício dos direitos fundamentais da personalidade, como a privacidade e a intimidade do teletrabalhador. Isso se deve ao fato de que essa modalidade laboral não se restringe mais ao espaço físico da empresa, mas também ao ambiente doméstico e familiar do teletrabalhador, neste sentido, Schreiber (2013, p. 142-143) enfatiza que a norma diz muito pouco para o seu tempo como já se enfatizou em relação aos direitos da personalidade em geral, o desafio atual da privacidade não está na sua afirmação, mas na sua efetividade. A mera observação da vida cotidiana revela que, ao contrário da assertiva retumbante do Art. 21 Código Civil, a vida privada da pessoa humana é violada sistematicamente.
De acordo com Goldschmidt (2019), o teletrabalho pode representar riscos para o trabalhador que não se limitam apenas a problemas físicos ou ergonômicos, mas também afetam outras áreas de sua personalidade, como a honra, imagem, intimidade, liberdade, autoestima, sexualidade, saúde, lazer, integridade física e a proteção de dados pessoais, além de sua própria dignidade.
Conforme observado por Goldschmidt (2019), o objetivo do artigo em questão é o estudo da efetividade da proteção da privacidade, de modo que, o exercício dos direitos da personalidade não podem ser limitados de forma voluntária e o direito em si não pode ser renunciado ou transmitido pelo seu titular, exceto nos casos previstos em lei. Schreiber (2013) acrescenta que, se deixados livres, os indivíduos podem acabar renunciando a seus direitos mais essenciais, concordando com situações intoleráveis por força da necessidade, o que evidencia a importância da tutela desses direitos.
Neste contexto, surge o problema da pesquisa: Qual é o impacto do teletrabalho em home office na proteção da privacidade do trabalhador e como garantir a efetividade do exercício do direito à privacidade nessa modalidade laboral? Diante do questionamento acima, tem-se as seguintes hipóteses: (1) A privacidade do trabalhador é afetada negativamente pelo teletrabalho em home office devido à dificuldade de separação entre vida pessoal e profissional; (2) A adoção de medidas de segurança e privacidade, como a utilização de ferramentas de criptografia e a definição de regras claras para o uso de dispositivos e recursos da empresa, pode minimizar o risco de violação da privacidade do trabalhador; (3) A criação de políticas específicas para o teletrabalho em home office, considerando as particularidades da modalidade, pode ser uma forma efetiva de garantir a proteção da privacidade do trabalhador.
Para tanto, a presente investigação tem como problema geral analisar o impacto do teletrabalho em home office na proteção da privacidade do trabalhador e identificar medidas que possam garantir a efetividade do exercício do direito à privacidade nessa modalidade laboral. Sendo assim, seus objetivos específicos são: (1) Identificar as principais dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores em relação à privacidade durante o teletrabalho em home office; (2) Avaliar o impacto de medidas de segurança e privacidade adotadas pelas empresas no exercício do direito à privacidade pelos trabalhadores em home office. (3) Analisar a efetividade de políticas específicas para o teletrabalho em home office na proteção da privacidade dos trabalhadores.
Para alcançar os objetivos expostos, optou-se pelo método hipotético-dedutivo, sendo a metodologia descritiva quanto aos fins e de análise documental e revisão de bibliografia quanto aos meios de pesquisa (VERGARA, 2016).
O presente artigo é composto por cinco partes, sendo elas a introdução, onde é apresentado o problema, as hipóteses, os objetivos e a metodologia de pesquisa realizada por meio de pesquisas em bibliotecas, tanto físicas como digitais, em busca de livros, artigos publicados, revistas jurídicas e sites governamentais com as devidas referências apresentadas, ao final, são apresentadas as considerações finais.
2. A EFETIVIDADE DO DIREITO À PRIVACIDADE NO TELETRABALHO
2.1. Definição de teletrabalho em home office
O teletrabalho é uma forma de organização e realização do trabalho, distinta dos meios tradicionais para o desenvolvimento e execução das atividades laborativas. Esta nova forma de organizar o trabalho tem por característica principal estabelecer entre duas partes (uma entidade empregadora e um trabalhador) um conjunto de relações laborais à distância, asseguradas por instrumentos informáticos e/ou instrumentos de telecomunicações (REBELO, 2004, p. 3).
Alguns autores entendem que teletrabalho é mais do que uma nova forma de trabalhar, tratando-se de uma verdadeira quebra de paradigma sobre o trabalho tradicional, em razão de certo grau de liberdade. Para Aranda (2001, p. 29) o teletrabalho é, sobretudo, um modo de organização e execução diferente do modelo tradicional de trabalho.
Segundo Rebelo (2004, p. 8):
Contudo, com o desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação (TIC) a possibilidade de executar trabalho a partir do domicílio constitui um “novo modelo de organização” que oferece grande flexibilidade às entidades empregadoras, representando uma vantagem competitiva importante. Emerge então uma “nova forma trabalho” – o teletrabalho – que possibilita às empresas a opção (ou não) em gerir e organizar o trabalho a partir do domicílio, agora através do recurso às TIC, permitindo a emergência da denominada “terciarização do trabalho no domicílio” ligada ao amplo movimento de mudança tecnológica. A adoção de regras jurídicas relativas à flexibilidade da organização do trabalho procura responder à vontade das empresas para desenvolverem novas práticas em matéria de gestão de recursos humanos, mais adaptadas às exigências produtivas e de competitividade (REBELO, 2004, p. 11)
O teletrabalho é previsto legalmente no artigo 6º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que estabelece que não há distinção entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, no domicílio do empregado ou a distância, desde que sejam cumpridos os requisitos da relação de emprego. O parágrafo único desse dispositivo, adicionado em 2011, equipara, para fins de subordinação jurídica, os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio, embora o trabalho seja realizado remotamente, não há diferenças significativas em relação à proteção ao trabalhador. “Os direitos são os mesmos de um trabalhador normal. Ou seja, vai ter direito a carteira assinada, férias, 13º salário e depósitos de FGTS”, explica o ministro Agra Belmonte, do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
A Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017) introduziu um capítulo específico na CLT sobre o tema: o Capítulo II-A, "Do Teletrabalho", composto pelos artigos 75-A a 75-E. Esses dispositivos definem o teletrabalho como a prestação de serviços fora das dependências do empregador, predominantemente por meio de tecnologias de informação e comunicação que não se caracterizem como trabalho externo, excluindo as atividades externas como vendedor, motorista, ajudante de viagem e outras que não possuem um local fixo de trabalho.
O atual momento nunca foi tão propício para reflexão, debate e enfrentamento acerca dos limites à privacidade, à imagem e à intimidade frente às novas tecnologias que se apresentam cada vez mais intrusas, agressivas e contundentes. Nesse sentido, é preciso que se dê maior atenção ao direito à privacidade dos trabalhadores, não somente pela carga de fundamentalidade que carrega, mas pelo fato dele ser constituído de características e de atributos da pessoa humana, especialmente nos dias atuais, onde as relações laborais são transformadas pelo uso das tecnologias (DACHERI, 2019)
2.2. Impacto do teletrabalho na privacidade do trabalhador
Para Rebelo (2004), o direito à privacidade é um direito de controle das informações que afetam a pessoa (com relevância tanto para a forma quanto para o conteúdo da sua divulgação). Ou seja, é o direito que qualquer cidadão tem de não só reservar para si uma esfera da sua vida privada (mantendo-a secreta e intangível aos demais), mas também de poder evitar a instrumentalização ou a divulgação de informações sobre a sua pessoa.
A privacidade engloba a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem, com previsão expressa no art. 5º, inciso X, da Constituição Federal (BRASIL, 1988). Entretanto, a autodeterminação informativa nada mais é do que uma derivação daqueles, dado que todos estão abrigados como direitos da personalidade, sob o manto do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.
Schreiber (2013) argumenta que atualmente o direito à privacidade não se limita apenas à proteção da vida íntima do indivíduo, mas também inclui a proteção de seus dados pessoais. O direito à privacidade agora é mais amplo do que o direito à intimidade e envolve o controle da coleta e uso de dados pessoais em qualquer ambiente onde esses dados circulam. Em resumo, a privacidade pode ser definida como o direito ao controle da coleta e utilização dos próprios dados pessoais
Tem sua vida mapeada, seus hábitos, preferências e comportamentos revelados. Assim, a proteção da privacidade inclui atualmente a proteção dos dados pessoais e o direito ao controle da coleta e utilização desses dados (SCHREIBER, 2013). Quanto à autodeterminação informativa, alguns doutrinadores a consideram como um novo direito fundamental, enquanto outros entendem que se trata apenas de novas possibilidades de violação dos direitos de personalidade, em especial o direito à privacidade (REBELO, 2004).
No contexto do data mining, os dados pessoais podem ser utilizados na construção de perfis, resultando em uma preocupação com a privacidade dos indivíduos. De acordo com Moreira (2010), é um direito fundamental de cada pessoa preservar sua identidade e controlar a revelação e o uso dos dados que lhe dizem respeito, garantindo que o titular dos dados tenha consentido na recolha e no tratamento dos seus dados pessoais ou, pelo menos, os tenha conhecido, além de dispor do direito de aceder, retificar ou cancelar tais informações quando necessário.
De acordo com Schreiber (2013), apesar de o Código Civil brasileiro tratar apenas de alguns direitos da personalidade, sem ressalvar a existência de outros tantos além daqueles que contempla em seus artigos 11 a 21, essa omissão não impede que outras manifestações da personalidade humana sejam consideradas merecedoras de tutela, por força da aplicação direta do art. 1°, inciso III, da CF. Já a privacidade é tratada no artigo 21 do Código Civil, sendo criticado o fato de o legislador não ter desenvolvido o comando constitucional (art. 5º, inciso X) para regular as situações mais habituais de violações frequentes. Em relação à legislação trabalhista, a previsão dos direitos da personalidade do trabalhador encontra-se no artigo 223-C da CLT, introduzido pela Lei 13.467/2017, de forma exemplificativa e não taxativa (Goldschmidt, 2019). Por fim, o artigo 11 do Código Civil brasileiro estabelece que, em caso de necessidade decorrente de alguma circunstância fática ou econômica, o titular não pode renunciar a nenhum dos seus direitos de personalidade, devido à sua natureza irrenunciável, exceto em casos previstos por lei.
Segundo Pego (2019), as ferramentas virtuais de direção e controle utilizadas pelas empresas não poderão violar os direitos fundamentais do trabalhador, em especial a dignidade, a privacidade (intimidade e vida privada), à imagem e a inviolabilidade do domicílio. Apesar desta proteção decorrer das normas constitucionais, dotadas de eficácia direta e aplicação imediata, é salutar a edição de regras que reforcem esses limites.
Acredita-se não existir necessidade de mais “regras” ou “normas” para reforçar estes limites, conforme pontuou Pego (2019), basta a obediência e efetivo cumprimento das normas constitucionais fundamentais, até mesmo porque o ordenamento jurídico brasileiro possui volume expressivo de leis
2.3. Dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores em relação à privacidade
O desafio consiste em assegurar a aplicação prática do direito à privacidade do trabalhador, especialmente em um contexto de relação de trabalho em home office. Os riscos para o trabalhador não ficam adstritos somente a possíveis problemas físicos ou ergonômicos, mas prolongam-se para outras particularidades da sua personalidade, como a honra, imagem, intimidade, liberdade, autoestima, sexualidade, saúde, lazer, integridade física (GOLDSCHMIDT, 2019) e proteção de dados pessoais, assim como da sua própria dignidade.
Anteriormente, o domicílio do trabalhador servia como uma barreira física que permitia a plena expressão dos seus direitos de personalidade. No entanto, com o avanço tecnológico que permitiu a realização do trabalho remoto por meio do computador, este se tornou tanto uma ferramenta de trabalho quanto um mecanismo de controle, independentemente de qualquer norma.
Conforme explica Moreira (2010), a privacidade não se limita a englobar os aspectos mais íntimos e pessoais, mas supera-os na medida em que assentam sobre o próprio marco da relação de trabalho, englobando diversos outros aspectos. Assim, a privacidade pode ser definida como o direito a ter um âmbito de reserva inacessível no local de trabalho, à intimidade das relações com os seus companheiros de trabalho, à própria atividade sindical, às comunicações por qualquer meio, incluindo o e-mail e a internet, à recolha e tratamento de dados, à captação de imagens e sons, além de outros requisitos, à realização de testes de saúde de determinadas doenças, testes genéticos, assim como à realização de testes para controle de consumo de álcool.
É preciso conciliar o direito à privacidade do teletrabalhador, que agora utiliza ferramentas tecnológicas, com o local de trabalho virtual que é sua própria residência. Esse conflito surge porque a residência sempre foi considerada uma zona de reserva, onde apenas pessoas selecionadas são permitidas a entrar.
3. MEDIDAS DE SEGURANÇA E PRIVACIDADE NO TELETRABALHO EM HOME OFFICE
3.1. Adoção de medidas de segurança e privacidade pelas empresas
No Brasil, a legislação trabalhista não traz uma regulamentação específica sobre a privacidade no teletrabalho. No entanto, alguns dispositivos legais, como a CLT e a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), podem ser aplicados para garantir a proteção da privacidade dos trabalhadores em home office.
De acordo com a CLT, o empregador é responsável pela adoção de medidas de segurança e proteção da dignidade do trabalhador, o que pode incluir a proteção da privacidade. Além disso, a LGPD estabelece regras para o tratamento de dados pessoais pelas empresas, inclusive no contexto do teletrabalho.
As implicações jurídicas para empresas e trabalhadores envolvem a responsabilidade da empresa em garantir a proteção da privacidade do trabalhador em home office. As empresas devem estabelecer políticas claras de privacidade e segurança, incluindo a utilização de ferramentas de monitoramento e coleta de dados pessoais. É importante que essas políticas respeitem os direitos do trabalhador à privacidade e à proteção de dados.
Além disso, as empresas devem fornecer equipamentos e treinamentos adequados para o trabalho remoto, de forma a garantir a segurança das informações confidenciais e pessoais. Também é importante que as empresas forneçam treinamento adequado aos trabalhadores sobre as políticas de privacidade e segurança, bem como sobre o uso adequado de ferramentas de monitoramento.
Os trabalhadores, por sua vez, devem seguir as políticas estabelecidas pelas empresas e garantir a proteção das informações confidenciais e pessoais. É importante que os trabalhadores estejam cientes de seus direitos à privacidade e à proteção de dados, e que exijam o cumprimento desses direitos pelas empresas.
Embora a legislação trabalhista brasileira não traga uma regulamentação específica sobre a privacidade no teletrabalho, as empresas e os trabalhadores devem seguir as regras estabelecidas pela CLT e pela LGPD para garantir a proteção da privacidade e dos dados pessoais. As empresas devem estabelecer políticas claras e respeitar os direitos dos trabalhadores, enquanto os trabalhadores devem estar cientes de seus direitos e exigir o seu cumprimento.
3.2. Ferramentas de criptografia e regras claras para uso de dispositivos
As empresas devem adotar práticas éticas que respeitem a privacidade dos trabalhadores, permitindo que os trabalhadores usem seus próprios dispositivos pessoais para o trabalho e garantam que as ferramentas de monitoramento sejam utilizadas de maneira controlada e apresentadas de forma explícita.
Em resumo, de acordo com (Drummond, 2020), as medidas de segurança e privacidade são fundamentais para garantir a proteção das informações confidenciais e pessoais dos trabalhadores em home office, mas é importante equilibrá-las com o direito dos trabalhadores à privacidade. As empresas devem adotar medidas proporcionais e transparentes e garantir que os trabalhadores sejam informados e respeitados.
Além disso, é importante que as empresas estabeleçam regras claras para o uso de dispositivos no teletrabalho. Essas regras devem definir as condições de uso dos equipamentos, tais como a instalação de softwares de segurança, a utilização de senhas fortes, o acesso somente a redes seguras, a proibição de compartilhamento de dispositivos, entre outras.
As empresas também podem adotar medidas de segurança, como a configuração de políticas de bloqueio automático de dispositivos após um período de inatividade, o monitoramento remoto dos dispositivos e a proibição do uso de dispositivos pessoais para o trabalho remoto.
Por fim, (Drummond, 2020) é importante que as empresas e os trabalhadores estejam sempre atualizados sobre as novas ameaças à segurança e privacidade dos dados no contexto do teletrabalho, e adotem medidas de proteção sempre que necessário, a utilização de ferramentas de criptografia e a definição de regras claras para o uso de dispositivos são fundamentais para garantir a segurança e privacidade dos dados no teletrabalho. As empresas devem adotar medidas de segurança e conscientizar os trabalhadores sobre a importância de proteger as informações confidenciais e pessoais no exercício do teletrabalho.
3.3. Impacto das medidas de segurança e privacidade no exercício do direito à privacidade pelos trabalhadores em home office
A violação da dignidade nas relações laborais, na maioria das vezes, ocorre em razão do empregador extrapolar o seu poder empregatício, valendo-se da vulnerabilidade econômica dos empregados, os quais necessitam permanecer no emprego para manter a subsistência e, por conta disso, acabam se submetendo a condições indignas e lesivas aos seus direitos fundamentais (DACHERI, 2019).
A ofensa aos direitos de personalidade é decorrência do abuso do poder diretivo por parte do empregador. Ainda que o artigo 2° da Consolidação das Leis do Trabalho garanta ao empregador a prerrogativa de dirigir a prestação do serviço (BRASIL, 1943), tal normativa não o autoriza a ultrapassar os limites, que são determinados pelos direitos fundamentais e humanos (REIS, 2019).
No entanto, essas medidas também podem impactar o exercício do direito à privacidade pelos trabalhadores em home office. Por exemplo, o uso de softwares de monitoramento pode ser necessário para garantir a produtividade dos trabalhadores, mas pode gerar desconfiança e ansiedade entre eles. Da mesma forma, a utilização de dispositivos de segurança, como firewalls e VPNs, pode impedir o acesso a certos conteúdos na internet ou limitar o uso de dispositivos pessoais, como smartphones.
Além disso, a coleta de dados pessoais pode ser uma preocupação em relação à privacidade dos trabalhadores em home office. É importante que as empresas expliquem claramente quais dados estão sendo coletados, como serão utilizados e quem terá acesso a eles. Os trabalhadores devem ter o direito de acessar, corrigir e excluir seus dados pessoais.
Para minimizar esses impactos, as empresas devem implementar medidas de segurança e privacidade que sejam proporcionais às necessidades do trabalho e que respeitem os direitos dos trabalhadores à privacidade. As políticas de segurança e privacidade devem ser claras e transparentes, e devem ser comunicadas claramente aos trabalhadores.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na atual era da informação, em que os meios tecnológicos são cada vez mais necessários para a execução do trabalho, o teletrabalho em regime de home office coloca em risco o direito fundamental à privacidade. Ao ocupar o mesmo espaço físico do ambiente doméstico, onde não há uma clara distinção entre hora de trabalho e hora de descanso, torna-se difícil para o empregador estabelecer limites ao seu poder diretivo sem invadir a intimidade e a vida privada do teletrabalhador.
Embora o artigo 2° da CLT concede ao empregador a prerrogativa de dirigir a prestação do serviço, tal poder não deve ultrapassar os limites estabelecidos pelos direitos fundamentais. A utilização das novas Tecnologias de Informação e Comunicação como meio de controle, sem limites prévios, potencializa ainda mais os riscos à privacidade do trabalhador, especialmente em um contexto no qual a flexibilidade e a liberdade são preconizadas.
Assim, é necessário fixar limites ao poder diretivo do empregador, uma vez que ele é quem conduz a atividade econômica e estabelece as condições e obrigações da relação jurídica. Embora os meios tecnológicos tragam inúmeras vantagens para a relação de trabalho, sua aplicação deve ser regulada para evitar o parcial desaparecimento de direitos fundamentais como a privacidade, liberdade e dignidade dos trabalhadores.
No entanto, o uso não autorizado ou não transparente de dados pessoais pode levar a consequências negativas, como o aumento do risco de fraudes, violações de privacidade e discriminação. É importante que os indivíduos tenham controle sobre seus dados pessoais e saibam como eles estão sendo usados pelas empresas.
Além disso, é necessário que as empresas sigam as regulamentações e melhores práticas de proteção de dados, como a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) no Brasil e o Regulamento Geral de Proteção de Dados (GDPR) na União Europeia. Essas leis estabelecem regras claras sobre a coleta, o uso e o armazenamento de dados pessoais, além de preverem penalidades para as empresas que as descumprirem.
Contudo, diante do progresso tecnológico, é evidente o descompasso na elaboração de instrumentos jurídicos que abordam essa nova realidade, sendo inaceitável que o uso das novas tecnologias pelo empregador anule os direitos fundamentais de personalidade do trabalhador. Os diversos ramos do direito, em especial o laboral, não têm acompanhado a velocidade das mudanças sociais, culturais e tecnológicas, o que também afeta as relações de trabalho, incluindo a modalidade de teletrabalho em home office.
Os direitos fundamentais previstos na Constituição Federal de 1988, têm como objetivo garantir o mínimo de civilidade nos direitos sociais dos cidadãos e trabalhadores. Portanto, todas as relações privadas, incluindo as relações jurídicas trabalhistas, com ênfase no teletrabalho em home office, devem ser pautadas pelo respeito e aplicação dos direitos fundamentais, independentemente dos avanços tecnológicos, ferramentas de trabalho ou modalidade de trabalho.
Os avanços tecnológicos e a mudança de perspectivas e valores da sociedade, em todas as relações, sejam elas comerciais, sociais ou laborais, não permitem uma resposta de imediato, seja do legislador ou do ordenamento jurídico infraconstitucional, devendo buscar proteção irremediavelmente nos direitos fundamentais, em especial no princípio da dignidade da pessoa humana previsto constitucionalmente.
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Graduando do 10º período do curso de Direito no Centro Universitário UNA Betim/MG.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NETO, FRANCISCO ANTONIO DA SILVA. A efetividade do direito à privacidade do teletrabalhador no contexto atual Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 31 ago 2023, 04:09. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/62821/a-efetividade-do-direito-privacidade-do-teletrabalhador-no-contexto-atual. Acesso em: 23 nov 2024.
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