RESUMO: O presente artigo se debruça sobre o conceito do direito fundamental à educação infantil, sob a perspectiva dos desafios e relevância da temática, principalmente, sob a visão do aspecto da garantia do acesso igualitário e de qualidade à educação na primeira infância. Assim, o principal objetivo do presente estudo reside na lacuna entre as diretrizes da lei e implementação efetiva de políticas públicas que assegurem o pleno desenvolvimento dos infantes desde a primeira infância, contribuindo para uma sociedade mais preparada para os atuais desafios contemporâneos.
Palavras-chave: Direito fundamental; Educação infantil; Desigualdade; Políticas públicas; Desenvolvimento infantil.
1. INTRODUÇÃO
O acesso universal e inalienável dos infantes à educação na primeira infância, trata-se de direito fundamental reconhecido e assegurado por diversas normativas legais e constitucionais que objetivam proteger o pleno desenvolvimento físico, cognitivo, emocional, social, além de uma cidadania ativa àqueles que se encontram na faixa etária de 0 a 5 anos.
Diante disso, analisar o presente estudo visa trazer reflexões sobre as implicações jurídicas e sociais de tal direito, principalmente sob a visão dos seus desafios e potencialidades na promoção do bem-estar infantil.
Nesse contexto, destaca-se que a falta de recursos, a qualidade das instituições, as desigualdades regionais e a necessidade de políticas públicas adequadas são elementos fundamentais que influenciam na resolução de tal problemática, já que existe uma lacuna entre o reconhecimento do direito e a sua implementação efetiva; comprometendo, assim, o futuro da população infanto-juvenil, além de perpetuar desigualdades.
Portanto, tal estudo lança luz sobre diversos questionamentos, dentre os quais, destacam-se: a necessidade da superação das barreiras que impedem a efetivação do direito ao ensino infantil, a utilização dos recursos financeiros adequados, a necessidade da formação contínua dos profissionais da educação, bem como da implementação de políticas públicas eficazes voltadas para a primeira infância; além da conscientização da participação ativa da sociedade civil em tal temática para que, assim, tal direito fundamental tenha a capacidade de promover mudanças significativas na vida dos infantes.
2 FUNDAMENTOS DO DIREITO À EDUCAÇÃO
A educação é direito de todo cidadão e dever do Estado, conforme preceituam os artigos 205 e 208, III, da Constituição Federal (CF), sendo, portanto, um dos principais elementos que trazem crescimento e progresso à sociedade; tornando-se, assim, de fundamental importância, a participação Estatal no desenvolvimento de ações que visem a concretização desse bem.
A pesquisa de Veronese e Vieira (2003) faz uma revisão sistemática da educação básica na legislação brasileira. De pronto, destaca-se que um dos pontos negativos do estudo é a falta expressa de elementos metodológicos importantes como objetivos, problemática, justificativa, metodologia e hipóteses.
Além mais, uma variável exposta no estudo é a de que a obrigação do Estado para com a educação surge com a Revolução Francesa. Antes desta, a educação era vista como um interesse privado, ou seja, não era considerada direito a ser garantido pelo Poder Público.
Assim, fazendo um resgate histórico, as autoras verificaram que até o século XVIII, mais precisamente até o ano de 1759, quando o Marques de Pombal expulsa a Companhia de Jesus dos domínios portugueses, predominou, no Brasil, a educação caracterizada pela presença quase absoluta dos jesuítas, com ênfase no caráter religioso do ensino.
Iniciando o estudo histórico comparativo das normas do ordenamento jurídico interno, Veronese e Vieira (2003) apontam que a Magna Carta outorgada em 1824 assegurava a gratuidade da instrução primária e inseria a criação de colégios e universidades no rol dos direitos civis e políticos (art. 179, XXXII e XXXIII). Contudo, as autoras admitem que a Constituição de 1871 foi a primeira carta constitucional da República preocupou-se mais com questões de ordem formal - como estabelecer competências do que com questões propriamente educacionais.
Por sua vez, as autoras expõem que com advento da Constituição de 1934, a Constituição Cidadã, a educação passava a ser vista como um direito de todos, devendo ser ministrada pelo Estado e pela família. Neste sentido, caberia ao Estado tragar, com exclusividade, as diretrizes da educação nacional
Insta destacar também que, o texto de 1967 é posto como um produto das contradições que assolavam o país. A exemplo, as autoras refletem que ao mesmo tempo em que o texto constitucional estendia a obrigatoriedade do ensino para a faixa dos sete aos quatorze anos (art. 168, §3°, II), permitia o trabalho infantil a partir dos doze anos (art. 158, X). Portanto, escancara mais um retrocesso da política social do Governo Militar, uma vez que a Carta de 46 estipulara em quatorze anos a idade mínima para o trabalho de adolescentes
Além mais, outro grande impacto para tal temática, ocorreu com o Golpe Militar, quando educação foi mitigada pela liberdade, em nítido prejuízo a qualquer processo educacional construtivo e eficaz.
Contudo, a despeito dos retrocessos elencados, avanços ocorreram no âmbito infraconstitucional, principalmente diante da publicação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB/96), Lei nº 9.394, em 20 de dezembro de 1996; já que, tal diretriz normativa estabeleceu os parâmetros para a educação básica.
Assim, atualmente, percebe-se a importância de um processo de ensino e aprendizagem que possibilite o aluno a capacidade de desenvolver, dentre outros importantes elementos, a habilidade de reflexão crítica.
Dentro desse contexto, as políticas públicas tornam-se um importante norte para uma educação de qualidade, já que compreendem um conjunto de ações, diretrizes e programas estatais que objetivam a concretização e garantias individuais estabelecidas, principalmente, pela Constituição Federal de 1988 (CFRB/88). Trata-se, portanto, de mecanismos que os entes estatais, de todas as esferas hierárquicas, possuem para garantir os inúmeros direitos ligados à cidadania.
Insta destacar também que no Brasil, a Constituição Federal de 1988 reconheceu o direito à educação como um direito fundamental de segunda dimensão. Por ser um direito social destinado a todos, cabe, assim, ao Estado desenvolver um conjunto de políticas públicas que viabilizem o acesso ao ensino desde sua modalidade básica ao chamado ensino superior.
Diante disso, com o advento da CFRB/88, o constituinte elencou um rol exemplificativo dos direitos e garantias fundamentais. Dentre estes, destaca-se a tutela aos direitos sociais que são considerados direitos subjetivos e podem ser exigidos para que se opere sua efetividade e irrenunciabilidade.
Nesta perspectiva, a educação foi o primeiro direito social a ser elencado pelo legislador constitucional em seu art. 6º. Diante de sua importância, sua efetivação é um dever do Estado, da Família e da Sociedade. Assim, o constituinte deixa claro que apenas com solidariedade e a colaboração de todos os entes sociais é que o processo de educação alcançará sua plenitude. Desta forma, a CFRB/88, art. 205 promulga que:
A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (BRASIL, 1988).
Portanto, enquanto dever jurídico do Estado, originalmente o legislador preocupa-se com o aspecto da qualidade do ensino e sua obrigação. Trata-se do reconhecimento do ente público de garantir ao indivíduo o seu pleno desenvolvimento individual. Assim, o legislador propicia a concretização da igualdade de oportunidades quando da oferta do ensino público obrigatório.
Dentro desse contexto é fundamental lembrar que no que tange ao aspecto do ensino e da aprendizagem formal, diante da sua função social, o legislador optou por ser um dever basilar do Estado. Todavia, tal responsabilidade não foi uma inovação do sistema jurídico pátrio, mas sim um alinhamento da Carta Magna com os diversos documentos que tratam da matéria dos direitos humanos. Neste sentido, destaca-se a Declaração Universal dos Direitos dos Homens (ONU, 1948), de 10 de dezembro de 1948, que, em seu art. 26, promulga que:
Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos a correspondente ao ensino elementar fundamental. O ensino elementar é obrigatório. O ensino técnico e profissional dever ser generalizado; o acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos em plena igualdade, em função do seu mérito (ONU, 1948).
A Educação é, portanto, responsável pela formação e transformação do ser humano; fazendo-o desfrutar da liberdade e autonomia que lhe é devida, além de ser um mecanismo eficaz de inclusão, construção da cidadania; bem como elemento de transformação social que possibilita a concretização do princípio da igualdade em seu sentido material.
Importante destacar também que, conforme a LDB/96, em seu art. 1º, a educação escolar deve se desenvolver predominantemente por meio do ensino e em instituições próprias. O legislador determina que o Estado tem o dever de ofertar à sociedade instituições de ensino de forma gratuita a todos.
Contudo, após análise de pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2019, é possível verificar que o país possui uma intensa desigualdade social cujos reflexos podem ser vistos, até mesmo, no âmbito educacional, uma vez que, a taxa média de analfabetismo no país é de aproximadamente 7% e pouco mais de 34% tem acesso ao ensino superior.
Ainda assim, a CFRB/88 é o marco fundamental que estabelece as bases legais para a educação no país. No artigo 205, fica clara a prioridade da educação como um direito de todos e dever do Estado, destacando seu papel como agente de transformação social.
Esclarece-se também que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA/90), por sua vez, reforça a importância da educação como um direito fundamental da criança, assegurando o acesso a uma educação de qualidade desde os primeiros anos de vida. Em especial, o artigo 54 do ECA/90 destaca que é dever da família, da comunidade, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à educação.
Nessa toada, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), em seu capítulo dedicado à educação infantil, estabelece a obrigatoriedade da oferta de educação infantil a todas as crianças a partir de quatro anos de idade, reforçando a importância desse direito como um alicerce fundamental para o desenvolvimento futuro.
Importante também destacar que, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é outra fonte normativa relevante, que delimita os objetivos e conteúdos a serem trabalhados na educação infantil. A BNCC busca promover uma educação de qualidade, voltada para o desenvolvimento integral da criança, considerando suas dimensões cognitivas, emocionais, sociais e físicas.
Nessa linha de raciocínio de garantia desse direito fundamental, o Plano Nacional de Educação (PNE) apresenta metas e estratégias específicas para o cumprimento do direito à educação, estabelecendo prazos e indicadores para avaliar o progresso na efetivação desse direito. Assim, o PNE alinha-se com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSD) e da Organização das Nações Unidas (ONU), que incluem como seus objetivos, a promoção de uma educação de qualidade e inclusiva.
Assim, a fundamentação teórica que respalda o direito fundamental à educação no ensino infantil baseia-se em um arcabouço normativo sólido, que reconhece a educação como um direito inalienável das crianças, além de estabelecer as diretrizes para sua efetivação. Tais fontes normativas, aliadas às teorias pedagógicas e sociológicas, embasam a compreensão da importância da educação infantil como um alicerce crucial para o desenvolvimento individual e social, contribuindo para a construção de uma sociedade mais igualitária e preparada para os desafios do nosso atual século.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo sobre a efetivação do direito fundamental à educação no ensino infantil buscou lançar luz sobre a temática de forma a trazer um paralelo sobre a importância da efetividade de tal direito para o desenvolvimento da sociedade como um todo.
Assim, apesar dos obstáculos identificados, é possível, sim, alcançar avanços significativos na promoção do acesso igualitário e de qualidade à educação na primeira infância, desde que os Poderes Legislativo, Judiciário e Executivo estejam alinhados para concretizar tal direito social.
Portanto, a alocação adequada de recursos financeiros, o investimento na capacitação contínua dos profissionais da educação e a mobilização da sociedade civil são caminhos para resolver o problema da disparidade no acesso à educação infantil.
Ademais, a efetivação do direito à educação infantil requer políticas públicas robustas e a participação ativa da comunidade. Além disso, as premissas secundárias, que consideraram a importância da qualidade das instituições e a necessidade de conscientização sobre o direito à educação na primeira infância, são também pontos cruciais de reflexão sobre a temática.
Diante disso, denota-se que uma educação de qualidade na primeira infância contribui para o desenvolvimento integral das crianças, preparando-as para um futuro mais promissor por meio do desenvolvimento integral de suas potencialidades, uma vez que a efetivação do direito à educação infantil é de fundamental importância para construir uma sociedade mais justa, inclusiva e igualitária, sendo um importante caminho para reduzir as desigualdades sociais.
REFERÊNCIAS
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Pós-graduada em Direito e Estado.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NASCIMENTO, RAPHAELA DA SILVA. Efetivação do direito fundamental à educação no ensino infantil: desafios e perspectivas Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 out 2023, 04:23. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/63392/efetivao-do-direito-fundamental-educao-no-ensino-infantil-desafios-e-perspectivas. Acesso em: 23 nov 2024.
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