O Executivo Federal irá elevar, a partir de setembro deste ano em 35%, as alíquotas do IPI incidentes sobre os microondas, aparelhos de ar-condicionado e motos para proteger a Zona Franca de Manaus.
É o que dispõe o Decreto n° 7.741, de 30-5-2012 baixado pelo Executivo Federal com suposto fundamento nos incisos I e II, do art. 4°, do Decreto-lei n° 1.199, de 27-12-1971, que regulamenta o § 1°, do art. 153 da CF. Esse Decreto-lei fixa os limites e condições para o Executivo proceder as alterações das alíquotas do IPI. Qualquer majoração de alíquotas fora dos parâmetros fixados nesse diploma legal deverá ser submetido ao princípio da estrita legalidade, sob pena de desvio de finalidade e consequente inconstitucionalidade da medida.
Pois bem, esse Decreto n° 7.741/12, que entrará em vigor em 1° de setembro de 2012 por força do princípio da nonagesimidade (art. 150, § 1° da CF), aumenta em 35% as alíquotas de três produtos industrializados de início apontados, produzidos fora da Zona Franca de Manaus que já goza de proteção fiscal específica. Excede, portanto, em 5% o limite fixado na lei de regência da matéria.
Não é essa a primeira e nem será a última vez que o governo faz o mau uso do instrumento legislativo para majorar a alíquota do IPI, a pretexto de fazer uso da faculdade prevista no § 1°, do art. 153, da CF e regulado pelo Decreto-lei n° 1.199/71, que enumera os requisitos para o exercício do poder tributário, sem se submeter ao princípio da estrita legalidade.
No passado recente, o Decreto n° 7.567/2011 provocou o aumento do IPI da ordem de 30% em relação a veículos importados. Naquela ocasião, ao menos, respeitou-se o limite máximo de variação de alíquota permitida pelo Decreto-lei n° 1.199/71.
É preciso que se compreenda a razão da insubmissão dos quatro impostos (II, IE, IOF e IPI) ao milenar princípio da legalidade tributária. Esses impostos existem, não com a finalidade arrecadatória, mas fundamentalmente como instrumento ordinatório do Estado. É a chamada extrafiscalidade. No caso, indispensável é a motivação válida em termos legais e constitucionais. Se é para regular é preciso que se diga com clareza o que está sendo regulado.
No caso do IPI, que interessa para o presente estudo, a implementação do poder regulatório do Estado, por via de elevação ou diminuição de sua alíquota, só pode ocorrer em função da essencialidade do produto. Por isso, os produtos considerados supérfluos ou prejudiciais à saúde, como o fumo, o álcool etc. são apenados com alíquotas exacerbadas ou com tributação fixa de elevado valor.
Ora, a essencialidade ou não dos microondas, dos aparelhos de ar-condicionado e das motos, nada tem a ver com o local de sua produção (fora da Zona Franca de Manaus).
Assim, parece claro o desvio de finalidade da majoração de alíquotas levado a efeito pelo Decreto sob comento.
Em relação aos produtos importados houve dupla infração aos mandamentos constitucionais.
O IPI não é imposto idôneo para regular o comércio exterior. Para proteção do mercado interno o governo deve valer-se da elevação de alíquotas do imposto de importação que existe exatamente como instrumento de intervenção do Executivo na política de comércio exterior.
Dir-se-á que isso despertará a reação de organismos internacionais como a OMC, por exemplo.
De fato, as amarras que prendem o nosso país, decorrentes de acordos multilaterais firmados por força dos inafastáveis efeitos da globalização econômica, limitam o uso de instrumentos normativos protecionistas.
Mas, o que não se pode fazer diretamente não deve ser buscado por vias oblíquas e de forma camuflada, pois isso seria menosprezar a inteligência alheia.
Concluindo, mais uma vez burla-se o princípio da legalidade tributária a pretexto de exercer o poder extrafiscal, o que faz com que desconfiemos da finalidade arrecadatória perseguida pelo governo, para reforçar o caixa da União, hipótese em que deve atuar o princípio da legalidade tributária.
SP, 4-6-12.
* Jurista, com 24 obras publicadas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.
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