É bem verdade que o Brasil é o 20º país mais homicida do mundo (27,3 mortes a cada 100 mil habitantes), palco de verdadeira epidemia de violência (já que possui taxa superior a 10 mortes por 100 mil habitantes, conforme determina a OMS - Organização Mundial de Saúde), sinônimo de um país truculento, não pacífico.
É bem verdade que das unidades federativas, São Paulo vivencia uma onda de ataques, mortes, embates, extermínio, esquadrões da morte, violência em demasia. Há uma verdadeira crise na política de segurança pública. Tudo isso é verdade. Porém, temos que tomar cuidado com alguns sensacionalismos. Um exemplo: a matéria veiculada (22.11.12) no Jornal o Estado de São Paulo.
Tomando por base os dados da Secretaria de Segurança Pública do estado de São Paulo, o jornal anunciou que os casos de homicídios aumentaram 92% na capital ante outubro de 2011, passando de 78 para 150 (em outubro 2012). Ou seja, foram comparados números de homicídios de dois meses soltos (e não do período de um ano entre eles), quais sejam o de outubro de 2011 (78 mortes) e o de outubro de 2012 (150 mortes), anunciando o brutalmente assustador crescimento de 92% no número de mortes na capital. O percentual não é inverídico, mas não houve contextualização.
Não é possível tirar qualquer conclusão analisando-se apenas dois meses soltos, sem que se considere um período mínimo de, ao menos, um ano (o qual também não deixa de ser um lapso curto de tempo).
Faz parte das técnicas midiáticas, da era da espetacularização. Se a matéria não dramatizar não vende. O que vende é o sensacionalismo. A matéria é imediatista, articulada para a comoção e clamor social. Sensacionalista e que não retrata coerentemente o quadro de violência em São Paulo. Embora o número de homicídios dolosos na capital tenha, de fato, sofrido um aumento de 25% entre 2011 e 2012, já que no ano passado o número de mortes era 267 alcançando 333 homicídios em 2012 (levantamento do Instituto Sou da Paz), não há como ignorar a queda de 75% no número de assassinatos entre 2003 e 2011 (de 1.064 mortes violentas em 2003 passamos para 267, em 2011), situação que contribuiu sensivelmente para o Estado de São Paulo se destacar como o terceiro estado menos violento do país.
A população precisa ser devidamente informada. É fundamental a contribuição dada pelo jornalismo para o entendimento da realidade. Não podemos nunca dispensar a mídia. Ela é relevante. O que deveríamos desprezar é o sensacionalismo, que leva ao discurso do pânico, uma das técnicas utilizadas pelo populismo penal. O populismo midiático serve justamente para manipular parcela significativa da população, com o intuito de obter consenso e apoio, legitimando seus noticiários, ainda que sejam desprovidos (muitas vezes) de qualquer coerência temporal. Enfrentar uma problemática tão complexa e sistêmica como a violência exige seriedade e planejamento. Notícias midiáticas (chamadas sangrentas) e imediatistas não contribuem para conscientizar a sociedade, incitam e fomentam o clamor por mais enrijecimento penal e dureza com o crime, inclusive extralegal. Estão retornando os esquadrões da morte em São Paulo (O Estado de S. Paulo de 23.11.12, p. C1) e isso comprova a generalizada anomia (ausência da efetividade das normas).
*LFG – Jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil e coeditor do atualidadesdodireito.com.br. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Estou no www.professorlfg.com.br.
** Colaborou: Natália Macedo Sanzovo, Advogada, Pós Graduanda em Ciências Penais, Pesquisadora e Coordenadora do Instituto Avante Brasil.
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