A bola da Copa das Confederações, de 2013, se chamará “Cafusa”, que é o acrônimo formado a partir de três palavras: Carnaval, futebol e samba. Foi apresentada pelo jogador Cafu, capitão do pentacampeonato conquistado pelo Brasil. A palavra “Cafusa” não tem nada a ver com cafuzo, que é o filho de índios com negros. A bola vai se chamar “cafusa” com “s” (porque, repita-se, é um acrônimo). Três fortes elementos da cultura brasileira estão sendo prestigiados neste conglomerado de sílabas: carnaval, futebol e samba.
Mas se quiséssemos expressar a realidade cultural brasileira com mais precisão teríamos que agregar ao acrônimo mais duas sílabras: “co” de corrupção e “vi” de violência. “Cafusacovi”, hoje, expressaria com mais fidelidade a realidade (o retrato em branco e preto) do nosso país, que não é só alegria (carnaval, futebol e samba), senão também corrupção e fraudes (mensalão do PT, mensalão do PSDB e do DEM, Rosegate) e muita violência (o Brasil é o 20º país mais violento do mundo e terceiro da América Latina, com cerca de 53 mil mortes em 2012, conforme previsão do nosso delitômetro, no institutoavanteabrasil.com.br). Quando o tema é violência contra a mulher, o Brasil ocupa a 7º posição, dentre 87 países pesquisados (Mapa da Violência 2012)
Para a Copa de 2014 será lançada uma nova bola, com o nome de “Brazuca” (palavra que relaciona algo com a cultura brasileira), que lembra “bazuca”, “arma portátil antitanque, usada pelos norte-americanos na Segunda Guerra Mundial (a partir de 1942) e cujo cano de 75 mm de calibre lança o projétil a cerca de 60 m”. E arma, claro, traz consigo a ideia de violência.
O mascote do mundial, um tatu-bola, vai se chamar “Fuleco”, que é um dos incontáveis apelidos do ânus. O mesmo que cu. Exemplos do uso da palavra Fuleco (encontrados na internet): “Vai tomar no fuleco!”; “fuleco de bêbado não tem dono”; “Quem tem fuleco tem medo”; “Passarinho que come pedra sabe o fuleco que tem”; “fuleco não tem acento”. Fuleco, de outro lado, lembra a palavra fuleiro, que significa coisa ou pessoa de baixa qualidade, que bem descreve o Brasil em termos de corrupção e de combate a ela.
De 0 a 10, nosso país tem nota 3,7 na escala da corrupção (em 2011), tendo caído quatro posições e ocupa o 73º lugar na lista com 183 nações elaborada pela Transparência Internacional. No que diz respeito ao controle e à prevenção da corrupção, como se vê, o Brasil é bastante fuleiro.
O grave problema da corrupção enraizada na nossa tradição é que não se muda uma cultura por decreto (sim, pela exemplaridade). O vírus da corrupção se irradiou por todos os órgãos públicos, sobretudo os políticos, e hoje atinge (como enfatizou Gaudêncio Torquato – O Estado de S. Paulo de 02.09.12, p. A2) o custo estratosférico de R$ 80 a R$ 100 bilhões, segundo estudo da Fiesp, algo em torno de 1,4% do PIB, que significa uma parcela significativa no total dos recursos movimentados pela corrupção no mundo, que a Transparência Internacional calcula em US$ 1 trilhão por ano.
No Brasil a chance de um funcionário público responder a um processo por corrupção é de menos de 5%, conforme a Controladoria-Geral da União. Mais de 70% da população, segundo o Ibope (pesquisa contratada pela Fiesp), se diz tolerante com a corrupção, enquanto o percentual que admite ter cometido algum deslize ético e poderia cair na malha corruptiva, caso fosse nela jogado, é até maior. Nosso atraso social (conclui o articulista) está intimamente ligado ao nosso “individualismo amoral”, ou seja, “nossa ética joga os interesses de curto prazo sobre os de longo prazo”. Seríamos, sob essa ótima, de um modo geral, fuleiros.
Nada foi intencional, muito provavelmente, mas a Fifa acabou retratando traços marcantes da cultura brasileira de hoje (e de sempre) com o nome da bola da Copa das Confederações (Cafusa: carnaval, futebol e samba), somado ao nome dado ao tatu-bola, “fuleco” (que constitui um nome bastante fuleiro) e ao nome da bola da Copa do Mundo (brazuca), que lembra bazuca (arma): todos esses elementos conjugados forma um retrato da cultura alegre, zoneada e trágica do Brasil: carnaval, futebol, samba, corrupção e violência. Claro que o Brasil não é só isso, “Cafusacovi”, mas parece indiscutível que esse acrônimo traduz traços marcantes da nossa alegre e, ao mesmo tempo, triste realidade.
*LFG – Jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil e coeditor do atualidadesdodireito.com.br. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Estou no www.professorlfg.com.br.
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