Histórico.
Na sua importante e original obra a respeito do processo constitucional, o autor mineiro de Teófilo Otoni, José Alfredo de Oliveira Baracho elabora uma teoria geral dos controles constitucionais.[1]
A origem da teoria dos controles constitucionais estaria nos estudos doutrinários estadunidenses. Isto porque os limites ali impostos ao poder político ajudaram muito para a eficácia e a estabilidade das normas constitucionais e foram fundamentais para a consolidação das estruturas democráticas.
A finalidade da Constituição seria a de limitar a concentração de poder e distribuir as diversas funções estatais entre quem exercesse o poder público, a autoridade.[2]
De acordo com Lowenstein, os controles dos órgãos estatais são muito importantes para o desempenho de instituições democráticas contrariamente aos processos de concentração de poder.[3]
Para Montes,entende-se que o controle da constitucionalidade manifesta-se como aspecto concreto do controle jurídico.[4]
Baracho lembra que são usadas de maneira indistinta as expressões “controle constitucional” e “controle de constitucionalidade” para se nomear indistintamente o fenômeno do controle da legitimidade constitucional dos atos estatais. E ressalta que, na doutrina comparada, a expressão “controle de constitucionalidade é considerada mais apropriada.
É o que diz:
“Dentro de certo rigor terminológico, o controle da constitucionalidade é a categoria que determina a fiscalização dos órgãos constitucionais, através (sic) do limite de suas manifestações ou pronunciamentos”.[5]
Segundo Battaglini, em Esparta e Atenas não existia uma Corte Constitucional, nos moldes italianos atuais, descendente direta da criada pela Constituição da Áustria e influenciada por Hans Kelsen. O que havia na antiguidade era o choque entre a lei fundamental do Estado e outras leis que disciplinavam as relações humanas.[6]
Estudando as instituições políticas antigas, desde a Grécia, Battaglini revela aspectos úteis que podem mostrar alguma vinculação ao sistema de controle. Na Grécia a sanção era contra o proponente da ação e não contra a norma. Ocorre apenas a responsabilidade do cidadão pela atividade legislativa contrária à lei.[7]
Em Roma não havia um controle de constitucionalidade ou de legalidade, como na Grécia. O que existia era tão somente o tribuni plebis que era uma magistratura criada para proteger a plebe. Visava à defesa de uma classe e não da Constituição.[8]
No período medieval, o ato do soberano era limitado pelo direito natural, que o declarava formalmente nulo e não vinculante, para o juiz competente para aplicar o direito.
Maquiavel alerta aos que constituírem uma República para a necessidade de constituírem uma vigilância à liberdade.[9]
Battaglini aborda o Summus Magistratus, apesar de não considerá-lo verdadeiro e específico controle de conformidade da lei à norma constitucional.
A primeira Constituição que tratou do controle de constitucionalidade por meio de órgão especificamente criado foi a da Pennsylvania de 1776.
A Convenção de Filadélfia de 1787 foi importante palco de discussões acerca do controle de constitucionalidade da atividade legislativa, com reflexos no futuro Estado federal: controle da lei do Estado Federal e sobre a lei federal.[10]
Em França, a questão do problema da constitucionalidade nasce juntamente como período revolucionário do século XVIII. Siéyès escrevera projeto considerado o melhor elaborado e mais completo. Previa-se a criação de um Senado que exerceria uma espécie de poder moderador responsável pela prevenção e repressão contra quaisquer abusos de autoridade. Falou-se até mesmo em uma Corte Constitucional: “A Suprema Corte Constitucional provê à tutela da Constituição e da ordem interna do Estado em caso de carência do poder executivo”.[11]
A Constituição napolitana teria um título acerca da “Custódia da Constituição”.
A Constituição italiana do período de Napoleão (Constituição da República Cisalpina de 1797, art. 86) não teve influência a respeito do controle da legitimidade constitucional. O que era previsto em seu texto apenas possibilitava a anulação de ato legislativo por defeito de forma. Este poder pertencia ao Consiglio del seniori.
A Constituição Espanhola de 1812, no capítulo X, traz instituto que objetiva o controle de constitucionalidade da atividade legislativa. Tal instituto era conhecido como Disputación permanente de Cortes.
Romagnosi, na Itália, contribui com a doutrina chamada antagonisti costituzionali, em um regime de garantia constitucional. Nesta doutrina, o tribunal competente é o Senado, que exerceria a vigilância constitucional, dentro e fora do Estado.
A doutrina de Rosmini manifestava-se a favor da existência de um órgão que ao mesmo tempo que controlasse a constitucionalidade das leis, protegesse os direitos constitucionais dos cidadãos. [12]
Já em relação às experiências e doutrinas do controle de constitucionalidade nos países da antiga Germânia, basicamente os de língua alemã, Battaglini faz referência obrigatória à Constituição da Áustria de 1920 e sua previsão da Corte Constitucional austríaca, segundo influência direta de Hans Kelsen.
No entanto, a Constituição imperial, de 1867, primeiramente se manifestou acerca do Tribunal Constitucional.
Instituído pela lei constitucional de 21 de dezembro de 1867, regulamentado em 18 de abril de 1869, o Tribunal Constitucional ou Tribunal do Império era competente para julgar conflito positivo de atribuições entre dois Estados-Federados; conflito positivo de atribuição entre os Estados-Federados e órgãos estatais e julgar os recursos dos cidadãos por violação dos direitos políticos garantidos pela Constituição, esgotado o trâmite no juízo administrativo.[13]
Baracho observa que os estudos acerca do controle de constitucionalidade foram intensos, sendo restritos apenas em regimes políticos não democráticos ou perdendo sua importância em algumas fases de evolução de certos sistemas políticos.[14]
Cappelletti lembra que os povos europeus não devem se surpreender com a atualidade das discussões a respeito do controle judicial da constitucionalidade nos Estados Unidos da América. E lembra que o raciocínio do Juiz Presidente da Corte Suprema, Marshal, em Marbury vs. Madison, no sentido de que a Constituição é a lei superior e os juízes estão obrigados a aplicá-la sobre a lei ordinária que a contrarie.[15]
[1] BARACHO, José Alfredo de Oliveira. Processo Constitucional, Rio de Janeiro: Forense, 1984,pp. 146-190.
[2] (1984:146).
[3] LOWENSTEIN, Karl. Teoria de la Constitucion, Ediciones Ariel Barcelona, 1970, 2ª ed.,trad. Alfredo Gallego Anabitarte pp 250-251 apud BARACHO (1984:146-147).
[4] MONTES , F. J. Galvez. “El Control de la Constitucionalidad em Espana, La Espana de los años 70”, El Estado y la Política, vol. III, tomo I – Editorial Moneda y Crédito, Madrid, 1974, pp. 1292-1293 apud BARACHO (1984:148).
[5] (1984:148).
[6] BATTAGLINI, Mário. Contributi allá Storia del Controllo di Costituzionalità delle Leggi, Dott. A. Giuffrè-Editore, Milão, 1962, p.10.
[7] Idem.
[8] (1962:10-11).
[9] MAQUIAVEL, Discorsi sulla Prima Deca (Libro I, cap.V. apud BARACHO (1984:150).
[10] BARACHO (1984:150).
[11] BATTAGLINI, Mario, ob. cit., p. 53 apud BARACHO (1984:150-151).
[12] Apud BARACHO (1984:151).
[13] BATTAGLINI, Ob.cit. ant. pp. 160-161; EISENMANN, Charles.La Justice Constitutionnele et la Hault Cour Constitutionnelle d’Autriche,Paris, 1928 apud BARACHO (1984:152).
[14] BARACHO (1984:152).
[15] CAPPELLETTI, Mauro. El ”Formidable Problema” del Control Judicial y la contribuición del Analisis Comparado”, Revista de Estúdios Políticos, Centro de Estúdios Constitucionales,Madrid,Nova Época, nº 13, jan/fev.,1980, pp. 61-62, trad. de Faustino González apud BARACHO (1984:153).
Prof. Dr. Francisco de Salles Almeida Mafra Filho. Professor Adjunto da Faculdade de Direito da UFMT. Avaliador de Cursos de Direito (INEP). Supervisor de Cursos de Direito (SESu/MEC). Avaliador de Curso de Direito "ad hoc" da ANEAES - Paraguai.<br>Contato: [email protected]. <br>http://lattes.cnpq.br/5944516655243629.<br><br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FILHO, Francisco de Salles Almeida Mafra. O Histórico do Controle de Constitucionalidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 dez 2008, 08:28. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/coluna/146/o-historico-do-controle-de-constitucionalidade. Acesso em: 22 nov 2024.
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