O princípio da reserva legal não é sinônimo do princípio da legalidade, senão espécie. “A doutrina não raro confunde ou não distingue suficientemente o princípio da legalidade e o da reserva de lei. O primeiro significa a submissão e o respeito à lei, ou a atuação dentro da esfera estabelecida pelo legislador. O segundo consiste em estatuir que a regulamentação de determinadas matérias há de se fazer necessariamente por lei formal” [1].
Ao princípio da reserva legal, a Constituição exige conteúdo específico. Ao princípio da legalidade, a Constituição outorga poder amplo e geral sobre qualquer espécie de relação. “Tem-se, pois, reserva de lei, quando uma norma constitucional atribui determinada matéria exclusivamente à lei formal (ou a atos equiparados, na interpretação firmada na praxe), subtraindo-a, com isso, à disciplina de outras fontes, àquela subordinadas”.[2]
O artigo 5.o, II, CF prevê que: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Trata-se de lei em sentido amplo, ou seja, qualquer ato normativo editado pelo Poder Legislativo (Constituição; leis complementares; leis ordinárias; resoluções) ou, excepcionalmente, pelo Poder Executivo (medidas provisórias e leis delegadas). Aqui temos a salva-guarda do amplo princípio da legalidade.
Já o princípio da reserva (lex populi) é mais restrito. Refere-se especificamente à emenda, lei complementar, etc. para regular determinado assunto. “Se todos os comportamentos humanos estão sujeitos ao princípio da legalidade, somente alguns estão submetidos ao da reserva da lei. Este é, portanto, de menor abrangência, mas de maior densidade ou conteúdo, visto exigir o tratamento de matéria exclusivamente pelo Legislativo, sem participação normativa do Executivo.”[3]
Até bem pouco tempo atrás, a Parte Especial do nosso atual Código Penal e a Lei de Contravenções Penais alcançavam vigência como decreto-lei. Seria comparativamente, hoje, aceitar a modificação maléfica ou criação de crimes por medida provisória[4] ou lei delegada.
Quando a Carta, em seu artigo 5.o, XXXIX estabelece que não haverá crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal, estamos diante de uma matéria reservada à lei formal. Somente a União, privativamente, através de seu Poder Legislativo, poderá discipliná-la (art. 22, I, CF). “A garantia da lex populi exige que, em matéria penal incriminadora, a lei respectiva siga estritamente o procedimento legislativo constitucional da lei ordinária.”[5] Fica vedada a interferência dos Estados-Membros ou Municípios, assim como a ingerência do Executivo ou Judiciário, na criação de crimes e penas[6].
ADI 3259 / PA – PARÁ AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Relator(a): Min. EROS GRAU Julgamento: 16/11/2005 Órgão Julgador: Tribunal Pleno Publicação: DJ 24-02-2006 PP-00005 VOL-02222-01 PP-00157AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N. 6.570/03 DO ESTADO DO PARÁ. SERVIÇOS DE LOTERIAS. REGRAS DE EXPLORAÇÃO. SISTEMAS DE CONSÓRCIOS E SORTEIOS E DIREITO PENAL. COMPETÊNCIA EXCLUSIVA DA UNIÃO PARA LEGISLAR SOBRE A MATÉRIA. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. Ao mencionar "sorteios" o texto da Constituição do Brasil está aludir ao conceito de loteria. Precedente. 2. Lei estadual que disponha sobre espécies de sorteios usurpa competência exclusiva da União. 3. Flagrante incompatibilidade entre a lei paraense e o preceito veiculado pelo artigo 22, inciso X, da CB/88. 4. A exploração de loterias constitui ilícito penal. A isenção à regra que define a ilicitude penal da exploração da atividade vinculada às loterias também consubstancia matéria de Direito Penal. Compete privativamente à União legislar sobre Direito Penal --- artigo 22, inciso I, CB/88. 5. Pedido de declaração de inconstitucionalidade procedente.
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