A experiência profissional me leva a crer que a política de combate às drogas é uma insanidade estatal. Mas é algo muito bem articulado por quem detém o poder e lucra muito com o sistema de segurança atual. Não podia ser diferente, posto que os políticos não detém nenhuma expertise para tratar o problema e, por isso, adotam práticas tão infantis e que soam ridículo.
Segurança é coisa séria e pra quem entende do assunto, já medidas paliativas visam a politicagem barata, típicas do secretariado de segurança dos Estados, que ao assumirem a pasta, fecham os olhos para o problema e focam na propaganda das operações policiais e imprensa midiática.
Albert Einstein já considerava insanidade como “continuar fazendo sempre a mesma coisa e esperar resultado diferente", e esta é a base que me levou a repensar as práticas de repressão ao tráfico, analisando o sistema, seu núcleo e enfim, propondo nestas linhas uma solução definitiva, direta e terminativa no combate à venda de drogas no Brasil e no mundo.
Perceba que salta aos olhos que a política antidrogas muda de nome conforme a gestão de governo mas é sempre na mesma toada, ou seja, consegue somente diminuir a oferta de drogas no mercado, fazendo com que a demanda seja sempre maior que a oferta. Prática infantil e que torna as drogas ilícitas um produto sempre caro e desejado.
Como não há regulamentação estatal, o mercado se alto regula, numa verdadeira lei do mais forte, donde surge a violência relacionada ao trafico. Inicio estas linhas dizendo claramente que o combate às drogas é uma insanidade, pois, “o combate as drogas, mata mais que as drogas”, imaginem um “remédio que mata mais que a doença”. Foco errado, vitimiza quem não tem qualquer relação com o tráfico propriamente dito.
Decreto a partir de hoje, cientificamente, a falência desse sistema de enfrentamento equivocado. Os danos e sofrimentos provocados pela atual política de proibição às drogas tornadas ilícitas merecem tratamento sério e definitivo. Isto o que proponho. Por isso, claramente me pronuncio pela legalização e consequente regulação da produção, do comércio e do consumo de todas as drogas. Inicio esse urgente debate sobre o tema das drogas e apresento uma alternativa definitiva e sem vaidade para sanar o tráfico, crime este que tem arrasado com as famílias em todo o mundo.
Primeiramente, resta claro que não incentivo o uso de drogas e estou ciente das profundas preocupações, danos e sofrimentos que o abuso dessas substâncias, lícitas ou ilícitas, podem causar ao ser humano e uma cadeia de pessoas à sua volta. Isto é muito claro e evidente. Ocorre que reitero que a proibição e a política de “guerra às drogas” é equivocada e causa vencida, que causa dano maior e sofrimentos a terceiros alheios vítimas do sistema. Abra seu coração e haja com altruísmo para perceber.
As drogas que hoje são ilícitas, como a maconha, a cocaína, a heroína, foram proibidas já no início do século XX e foi nos anos 1970 que deu-se início a repressão aos produtores, comerciantes e consumidores dessas substâncias, com a introdução de uma política explicitamente fundada na guerra. Com efeito, a chamada “guerra às drogas” foi declarada pelo ex-presidente norte-americano Richard Nixon, nos Estados Unidos da América, em 1971, logo se espalhando pelo mundo. De início, foi usado o termo guerra, infeliz colocação que levou o mundo a copiar e continuar copiando um modelo falido de repressão e que vigora até hoje. Pasmem.
Essa política explicitamente fundada na guerra tem se revelado incapaz de atingir o objetivo de reduzir a disponibilidade das substâncias proibidas, pois jamais alcançará o fim da produção. Com efeito, passados 100 anos de proibição, não houve redução na circulação de tais substâncias. Ao contrário, nesses anos todos, as drogas ilícitas ficaram mais baratas, mais potentes, mais diversificadas e muito mais acessíveis do que eram antes de serem proibidas. Existe uma razão para isso e aqui não cabe o termo inocência. O combate às drogas, que coloca todos do sistema de segurança nesse foco, rende muito e movimenta uma máquina bilionária. É interessante para todos os poderes e políticos do sistema esse teatro sem qualquer finalidade prática. Pense no preso por tráfico e as pessoas ao seu redor, todos são mantidos graças a essa estrutura, judiciário, legislativo e executivo, advogados, promotores, etc.
A própria Organização das Nações Unidas (ONU) que, em 1998, prometia um mundo sem drogas em dez anos, posteriormente viu-se obrigada a reconhecer a expansão e diversificação do mercado das drogas ilícitas. O criminoso traficante está infiltrado em todas esferas de poder e decreta a pena de morte a quem lhe convier.
As apreensões realizadas em operações policiais se fazem em quilos, mas outras toneladas passam porque as fronteiras e os meios de transporte hoje são infinitos. A prisão e apreensão de drogas revelam a expansão da produção e do comércio e, ao reduzirem momentaneamente a oferta, acabam por proporcionar uma imediata supervalorização das mercadorias. Está tudo errado e creio que muitos já saibam disso, mas repito, todos lucram com essa máquina: que elege quem altera as leis, que depende de alvarás da justiça corrupta para se ver livre; de advogados para tratar processos durante anos arrecadando, entre outros abusos do sistema. Político não tem e nunca terá perfil para chefiar política séria de enfrentamento da raiz do problema das drogas.
Faz mister lembrar que a “guerra às drogas” não é exatamente uma guerra contra as drogas. Não se trata de uma guerra contra coisas, pois como quaisquer outras guerras, dirige-se contra pessoas: os produtores, comerciantes e consumidores das selecionadas substâncias proibidas. Seus resultados são mortes, prisões superlotadas, doenças contagiosas se espalhando, milhares de vidas destruídas, atingindo especialmente os mais vulneráveis dentre seus alvos – os pobres, marginalizados e os desprovidos de poder. Roubos, sequestros, homicídios e furtos existem para quitar o débito do tráfico de drogas, a segurança pública trabalha quase que exclusivamente para esse tema, abarrotando e corrompendo pessoas pela força econômica do tráfico. Completa insanidade é esperar do judiciário ou governos posturas firmes de enfrentamento, já são anos de espera.
A proibição e essa guerra é que não se harmonizam com a ideia de direitos humanos. São conceitos incompatíveis. Guerras e direitos humanos não são compatíveis em nenhuma circunstância, antes que alguém alegue que essa minha ideia vai contra os direitos dos homens. O mais evidente e dramático dos riscos e danos diretamente provocados pela proibição é a violência, resultado lógico de uma política baseada na guerra. Chega de imbecilidade, vamos tratar definitivamente o problema. O cidadão tem o direito legítimo de fazer suas escolhas, é usuário legítimo se assim entender e já resta comprovado que o Estado nunca será capaz de inibir. Compra-se drogas ilícitas com mais facilidade que remédio neste país.
Hoje, não há violência na produção e no comércio de cigarros nem álcool. Por que é diferente na produção e no comércio de maconha ou de cocaína? A resposta é evidente: a diferença está na proibição. Só existem armas e violência na produção e no comércio de maconha, de cocaína e das demais drogas tornadas ilícitas porque o mercado é ilegal. É óbvio isso. A sanguinária “guerra às drogas” caleja e adestra para a violência, a crueldade, as mortes e os desaparecimentos forçados. É chegada a hora de tirar o simples usuário da “boca de fumo”, aceitar suas escolhas e tributar para tratar os doentes e tirar a lucratividade do traficante.
O combate ao tráfico é paliativo e infantil, cheio de abutres que lucram com a política atual. Não é política de combate e sim um teatro contra as drogas. A pena de morte existe hoje no Brasil graças aos traficantes que há tempos determinam sem piedade quem vive e quem morre, senão vejamos, no Brasil, 27% do total de seus quase 600.000 presos são processados ou condenados por “tráfico” de drogas. Entre as mulheres, essa proporção chega à metade das presas. Com a proibição, o Estado acaba por entregar o próspero mercado das drogas tornadas ilícitas a agentes econômicos que, atuando na clandestinidade, não estão sujeitos a qualquer limitação reguladora de suas atividades. No mercado ilegal não há controle de qualidade dos produtos comercializados, o que aumenta as possibilidades de adulteração, de impureza e desconhecimento do potencial tóxico das drogas proibidas.
A ilegalidade é que cria a necessidade de aproveitamento imediato de circunstâncias que permitam um consumo que não seja descoberto, o que incentiva um consumo descuidado e não higiênico, cujas consequências aparecem especialmente na difusão de doenças transmissíveis como a AIDS e a hepatite. Além de criar a atração do proibido, acabando por incentivar o consumo por parte de adolescentes. A proibição ainda dificulta a assistência e o tratamento eventualmente necessários, seja ao impor ineficazes e ilegítimas internações compulsórias, seja por inibir a busca voluntária do tratamento, ao pressupor a revelação da prática de uma conduta tida como ilícita. Estamos tirando a chance de tratar quem deseja se ver livre das drogas, pois não há recursos já que optamos por proibir. O Estado não é capaz de proibir. Lógica evidente.
Passou da hora, é preciso pôr fim a essa falida e danosa política; acredito com maturidade e analisando todos esses pontos que aleguei, que é preciso legalizar e consequentemente regular a produção, o comércio e o consumo de todas as drogas, sem exceção. Quem não conhece a realidade da segurança pública talvez alegue que o Brasil não é maduro o suficiente para tal proposta, mera balela de quem vive em gabinete, a realidade mostra o contrário. O povo é sim capaz de se conscientizar e quer uma luz pra pedir socorro.
Legalizar não significa liberação ou permissividade. Longe disso. Não é ver usuários nas ruas sob efeito alucinógeno. Nada disso. Legalizar significa exatamente regular e controlar, o que hoje não acontece. Ao contrário do que acontece em um mercado legalizado, os chamados “traficantes” não estão submetidos a qualquer controle ou fiscalização sobre a qualidade dos produtos que fornecem; para obter maiores lucros, podem misturar a droga produzida e comercializada a outras substâncias ainda mais nocivas; não precisam informar qual o potencial tóxico da droga produzida e comercializada; não precisam fazer qualquer esclarecimento ou advertência aos consumidores sobre os riscos de seus produtos; estabelecem preços livremente; não pagam quaisquer impostos; não estão sujeitos a legislações trabalhistas, podendo empregar, como de fato empregam, até mesmo crianças em suas atividades de produção e comércio; vendem seus produtos onde quer que estejam consumidores; não precisam controlar a idade dos compradores.
Perceba friamente e sem paixão que legalizar significa pôr fim ao “tráfico”, afastando do mercado quem lucra e que age na clandestinidade e devolvendo ao Estado o poder de regular, limitar, controlar, fiscalizar e taxar a produção, o comércio e o consumo dessas substâncias, da mesma forma que o faz em relação às drogas já lícitas, como o álcool e o tabaco. É oportunidade ímpar de arrecadar e quebrar o lucro do traficante, investindo os impostos em quem deseja se livrar das drogas. É tratar o problema como se fosse de saúde e não de segurança pública, tirando o usuário das “bocas de fumo” e quebrando com o poderio econômico do criminoso traficante.
Essa é minha proposta que certamente reduzirá os efeitos nocivos das drogas e exterminará os efeitos de violência; mortes; encarceramento massivo; racismo e outras discriminações; agravamento de problemas de saúde; danos ambientais; e violação de direitos humanos. É a oportunidade de arrecadar e investir na educação dos jovens das próximas gerações contra o uso de drogas. É verdadeira falência do criminoso traficante que perderia seu cliente habitual refém de suas práticas criminosas. É o fim do poderio econômico do traficante já que drogas seriam vendidas em farmácias credenciadas. É o investimento na saúde de quem merece tratamento.
Legalizar e consequentemente regular a produção, o comércio e o consumo de todas as drogas, para assim pôr fim a essa falida, danosa e dolorosa política, é uma solução nascida da criatividade, compreensão, da compaixão e da solidariedade que proponho para os pensadores do sistema que querem alternativa para o extermínio do traficante e do tráfico de drogas.
Creio que algumas coisas precisam de um prazo para maturação, só não entendo paciência como sinônimo de postergação, pois enxergo diariamente a minha profissão como um teatro sem qualquer razão de ser. Pensei o sistema com simplicidade e me espantei pois encontrei a solução óbvia e definitiva para o mal do século chamado tráfico de drogas.
Professor de Direitos Humanos e Delegado de Polícia Judiciária Civil. Atualmente Delegado Controlador Geral de Administração e Finanças da PC-AM. Foi titular da DECON, 17º DP e 25º DP e Conselheiro do Fundo Estadual de Defesa do Consumidor (CONDECON).. Doutorando em Ciências Jurídicas. Formação como Mestre em Direito Ambiental. Autor dos livros: "Direitos Humanos, vocação do Delegado de Polícia" (ISBN 978-85-400-1964-5), "Consciência ambiental para efetivação da dignidade humana no sistema prisional" (ISBN 978-85-400-2178-5) e "Poder do Óbvio para Blindagem do Consumidor Consciente e Outras Justiças" (ISBN 978-65-89973-08-9).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CAETANO, Eduardo Paixão. Desfecho maduro para o aniquilamento do tráfico de drogas Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 jun 2015, 03:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/coluna/2140/desfecho-maduro-para-o-aniquilamento-do-trafico-de-drogas. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
Por: Adel El Tasse
Por: Sidio Rosa de Mesquita Júnior
Por: Eduardo Luiz Santos Cabette
Precisa estar logado para fazer comentários.