O Governo precisa apoiar-se em algo além das suas práticas pouco ortodoxas de fazer política, e eis que muito bem orientado se apegam à uma luz no fim do túnel. De fato não há segurança jurídica para o procedimento de impeachment da presidente, que não o respeito a última decisão do Supremo quando decidiu sobre o procedimento à partir do impeachment de Collor.
Dois ministros do STF, Teori Zavascki e Rosa Weber, concederam liminares suspendendo o trâmite definido pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), para a análise de pedido de impeachment pelos parlamentares.
As decisões foram motivadas por mandados de segurança propostos pelos deputados Wadih Damous (PT-RJ) e Rubens Pereira Júnior (PCdoB-MA). O plenário do STF, composto por 11 ministros, ainda terá que se pronunciar e tomar uma decisão definitiva sobre o assunto.
Damous e Pereira Júnior questionaram o procedimento estabelecido por Cunha em caso de rejeição dos pedidos de impeachment.
Uma terceira liminar, também proferida por Weber e de mesmo teor, atendeu pedido semelhante feito pelo deputado Paulo Teixeira (PT-SP).
A legislação brasileira prevê que cabe ao presidente da Câmara aceitar ou rejeitar se um pedido de abertura de processo de impedimento será analisado pelos parlamentares. Caso ele aceite, a Constituição Federal estabelece que é a Câmara que faz primeiramente essa análise e decide se um processo de impeachment será aberto. Caso dois terços dos deputados sejam favoráveis a isso, o Senado deverá em seguida realizar o julgamento.
Em setembro de 2015, deputados da oposição fizeram uma série de questionamentos a Cunha para definir como seria esse rito de análise na Câmara. Eles queriam saber, principalmente, como poderiam recorrer ao plenário no caso de Cunha arquivar os pedidos de abertura de impeachment.
Em resposta a esta questão de ordem proposta pela oposição, Cunha havia estabelecido que, em caso de rejeição, caberia recurso ao plenário da Casa - que poderia decidir pela retomada da tramitação por maioria simples (50% dos deputados mais um).
Na época, em artigo próprio levantamos a possibilidade d a decisão como uma "manobra" acordada por Cunha e pela oposição para evitar que o ônus de um eventual impeachment recaísse apenas sobre o Cunha. Ou seja, ela arquivaria os pedidos para assim permitir que fosse feito um recurso, em vez de simplesmente não tomar qualquer decisão e deixar em suspenso a questão.
Dissemos ainda no mesmo artigo que existiam vários pedidos sendo analisados por Cunha, mas o foco da oposição seria recorrer do arquivamento do pedido apresentado pelo jurista Hélio Bicudo, fundador do PT. Havia uma expectativa de que Cunha decidiria sobre isso nesta terça-feira, data que será postergada nos termos da decisão do Supremo. A decisão liminar do STF suspende o rito estabelecido por Cunha até o plenário do STF se pronunciar.
Os deputados que recorreram ao Supremo argumentam que um recurso ao plenário para desarquivar um pedido de impeachment só poderia ser aceito se contar com apoio de dois terços dos deputados e não apenas a maioria simples, como definido por Cunha.
Argumentam que o rito para análise do pedido de impeachment deve seguir as regras estabelecidas na lei 1.079/50, e não no regimento interno da Câmara. A lei, que trata especificamente das possibilidades de impeachment, prevê um trâmite mais longo que o regimento. Argumentam que isso é necessário para garantir o direito à defesa de Dilma.
Além da decisão do STF, outro fato contribui para Cunha adiar sua decisão. A oposição decidiu anexar ao pedido de Bicudo um documento argumentando que as "pedaladas fiscais" (atrasos de repasses do governo a bancos públicos para pagamentos de benefícios sociais) continuaram ocorrendo neste ano.
A intenção da oposição ao anexar esse novo documento é tentar rebater o argumento de que a presidente não pode ser cassada por atos anteriores ao atual mandato. Muitos juristas sustentam essa visão, mas outros consideram que em caso de reeleição o segundo mandato é um continuação do primeiro e, por isso, poderia haver impeachment por atos cometidos no primeiro mandato. Filiamo-nos aos defensores da 2ª tese, se há reeleição há a continuidade do mandato anterior, em lógica mais que ululante. A reeleição tem seus bônus ao mandatário, mas há que ter seus ônus.
Teori baseou sua decisão, liminar, no artigo 85 da Constituição, que estabelece que uma “lei especial” deve definir quais são os crimes de responsabilidade do presidente da República e como deverá ser seu julgamento. Quando julgou o caso Collor, o STF decidiu que o processo de impeachment é disciplinado pela Lei 1.079/1950. Na ocasião, a Corte definiu também que a votação no Congresso deve ser aberta.
Como esta lei especial não restou criada não podemos compactuar com teses casuísticas. Temos como última decisão plenária do Supremo Tribunal Federal que processo de impeachment se faria pautado na Lei 1.079/50 e assim se deve proceder, esta seria uma interpretação. Resta interpretarmos se o art. 218, parágrafo 3º do RI tem caráter casuístico como análise preliminar, se foi confeccionado já aventado a possibilidade de alcançar-se o processo de impedimento da presidente Dilma:
Art. 218. É permitido a qualquer cidadão denunciar à Câmara dos Deputados o Presidente da República, o Vice-Presidente da República ou Ministro de Estado por crime de responsabilidade.
§ 3º Do despacho do Presidente que indeferir o recebimento da denúncia, caberá recurso ao Plenário.
Assentamos para aclarar a resposta que a redação do art. 218 e de seu parágrafo 3º é de 1992. Há casuísmo?
De fato o art. 85 da CRFB, em seu parágrafo único, fala em lei especial, quando o regimento interno da Câmara dos Deputados poderia ser encarado como uma lei espacial, já que a natureza jurídica do regimento interno prevalece a tese de ser de lei ordinária. A Constituição não especificou o procedimento para aprovação da referida lei como fez em outros momentos, vale ressaltar. Entendemos que embora possível tal interpretação, que esta vertente teria sinais casuísticos que não nos parecem democráticos.
De fato não há segurança jurídica desejada quanto a questão pela ausência da legislação especial que a Constituição assim exigiu, por mora do Congresso Nacional em atender o chamado constitucional. Entendemos que o mais correto para o momento, para fugirmos de odiosos casuísmos de fundo politico-partidário é espelhar o procedimento utilizado para o impeachment de Collor, nos termos da decisão do Supremo à época, definido pela Lei 1079/50.
Importante, inobstante toda esta discussão, que o Supremo Tribunal Federal também não promova um odioso ativismo judicial, pronunciando-se ativamente apenas nos casos que se perceber real ofensa ao Diploma Constitucional quando não couber à outra funções de Poder. O Supremo deve ser visto como um Tribunal Constitucional que possui o seu viés político sim, capaz de decidir questões políticas para o qual for provocado, desde que não retire a constitucional competência das demais funções de Poderes, respeitando princípios como é o da Conformação Legislativa.
Inaceitável será a Corte Constitucional empunhar qualquer bandeira partidária e através de contorcionismos jurídicos capazes de embargar o pleno funcionamento do Estado Democrático de Direito, sob a pecha de que à ele caberia a última palavra. Não há democracia quando todas as suas instituições de poder funcionam nos termos dos mandos e desmandos de uma única ideologia de partido. Necessário a sociedade perceber um Supremo Tribunal Federal implementador dos mandamentos constitucionais, capaz de interpretar questões abertas e sem segurança jurídica de uma forma sistemática, instruído por seus valorosos princípios-normas sempre que necessários.
Quanto a prisão do presidente da Câmara Eduardo Cunha, que aliados da presidente vem jogando para imprensa, façamos o favor de proceder a leitura do art. 53, parágrafo 2º da CRFB. Operadores do direito não podem flertar com esta possibilidade, ainda que em prol de uma ideologia partidária.
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