A repatriação de dinheiro criminosamente enviado ao exterior não é novidade no mundo financeiro mundial. Tudo depende do como, quando e o preço disso. Em países libertinos (mais cleptocratas), a repatriação é tratada pela mídia como algo éticamente neutro (“mera regularização”). Não se chama atenção para o seguinte: que a anistia penal ampla aos criminosos evasores transmite a sensação a todos aqueles que pagaram seus impostos no Brasil e deliberaram não esconder seu dinheiro do exterior de que são otários (membros do Otary Club). Isso é um veneno mortífero para o império da lei. Por esse caminho enviesado, da anomia se chega rapidamente à anarquia. Seja “esperto” e “malandro” (se você for pego, uma lei de anistia geral vai te amparar).
Quando saiu a lista do HSBC da Suíça (mais de 7 bilhões de dólares clandestinos em mais de 8 mil contas de quase 6 mil correntistas brasileiros), que constitui só uma pequena amostragem do quanto que algumas elites verde-amarelas (algumas, repita-se!) continuam se dedicando impunemente à bandidagem venal (corrupção, sonegação, evasão etc.), promovendo a lavagem dos seus capitais ilícitos inclusive fora do País (ilícitos porque decorrentes de corrupção, tráfico de drogas etc. e/ou porque mandados clandestinamente, sem pagamento de impostos), a mídia nacional deu uma olhada por cima e, não encontrando nenhum nome ligado diretamente aos inimigos preferenciais da ocasião (leia-se, ao lulopetismo corrupto), jogou o assunto para o esquecimento.
No Senado instalou-se uma CPI para apurar essa bandidagem venal das elites (jamais houve qualquer comprovação de que favelados tenham dinheiro escondido na Suíça). As ciências criminológicas admitem uma possível ligação causal entre a bandidagem venal com a bandidagem violenta, que tanto assusta o Brasil. Mas isso é tema para outro artigo (porque a criminalidade violenta é muito complexa). A CPI anda a passos de tartaruga, evidentemente. É que da lista do HSBC constam vários nomes que financiaram as campanhas eleitorais de vários políticos (não de todos eles, claro). Os políticos que fazem caixa 1 com esse dinheiro das empresas (hipotecando seus mandatos) e que praticam caixa 2 e caixa 3 são farinha do mesmo saco (leia-se: da mesma bandidagem venal). Tal como na CPI da Petrobras, é bem provável que “de onde menos se espera é que não sai nada mesmo” (Barão de Itararé).
Logo que o Brasil se tornou, de forma inesperada, independente (1822), instalou-se uma Assembleia Constituinte (1823). José Bonifácio de Andrada propôs acabar com o tráfico de escravos no Brasil (que só viria acontecer em 1888). A elite de negreiros (assim eram chamados os traficantes de escravos, que bancavam as contas da Monarquia), constituída por portugueses, em geral, quebrou o pau, fechou o tempo e fez com que o Imperador (D. Pedro I) abortasse a Constituinte. José Bonifácio foi expulso do Brasil e nossa 1ª Constituição foi outorgada, em 1824. Esse foi o primeiro ato de prepotência e arrogância das elites endinheiradas bandidas (falo das “bandidas”, evidentemente) sobre o governo brasileiro independente (veja Raymundo Faoro, citado por Marcos Costa, O reino que não era deste mundo, p. 9).
Daí para cá, as elites acostumadas à bandidagem (isso não significa que todas elas o sejam, curialmente), como sucessoras dos traficantes de escravos, nunca deixaram de mandar e desmandar a seu capricho. Levam dinheiro para fora e não declaram isso ao governo (clandestinidade). Isso significa evasão de divisas, sonegação e lavagem de capitais (sem contar algumas falsidades, crime organizado, corrupção, descaminho, caixa dois etc.). Depois de todo tipo de descontrole e de “malfeitos” e estando o governo lulopetista numa pindaíba danada, chegou o momento de regularizar os recursos situados fora do Brasil. Por um vil dinheiro (que deveria ser sequestrado, antes de ser regularizado), o desmoralizado e impotente governo do mensalão e do petrolão deliberou jogar para os ares todos os princípios morais e está aceitando a concessão de anistia plena para a bandidagem venal (sem sequer prever um tempo de suspensão da pretensão punitiva, como ocorre com o Refis).
Conforme a letra final da lei, que está sendo elaborada como mandam os vários figurinos intervenientes, incontáveis crimes apurados pela Lava Jato (relacionados com contas secretas fora do Brasil) serão anistiados. Mais: os parlamentares não querem nem sequer que se discuta a origem do dinheiro levado para fora. A anistia iria abarcar não apenas os traficantes de dinheiro ilícito, senão também os traficantes de drogas, de armas, de crianças, de animais, de mulheres etc. Querem anistiar tudo! Volúpia incontida. Com certeza, uma lei tão imoral e deplorável como essa vai significar mais um rebaixamento internacional do Brasil no “grau de investimento”. A partir daí a economia será uma crise agravada.
Estão brincando com fogo e imaginando que ainda somos uma colônia periférica do mundo globalizado. A bandidagem venal no Brasil, para além de magalomaníaca, não tem nenhuma noção de limites. Ministérios Públicos e Magistraturas, até aqui, nem um pio sobre a anistia. Seus silêncios parecem evidenciar conformidade com a clássica fama (muitas vezes injusta) de que são instituições sadomasoquistas: que lambem as botas dos de cima (masoquistas frente aos poderosos) e massacram sadicamente nas cadeias podres inclusive os desdentados pobres que nunca praticaram crimes violentos.
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