PRIMEIRA POLÊMICA: O pedido de impeachment é apreciado pelo Plenário da Câmara dos Deputados uma única vez ou duas? Esse tema não está sendo debatido na mídia. Porém, está na lei 1.079/50 (que regula o processo do impeachment). Vejamos:
“Art. 20. A Comissão [Especial, com 65 membros] a que alude o artigo anterior se reunirá dentro de 48 horas e, depois de eleger seu Presidente e relator, emitirá parecer, dentro do prazo de dez dias, sobre se a denúncia deve ser ou não julgada objeto de deliberação. Dentro desse período poderá a comissão proceder às diligências que julgar necessárias ao esclarecimento da denúncia”.
Conjugando-se os arts. 20 e 22 da lei 1.079/50 fica claro que a Comissão Especial deve emitir dois pareceres. O primeiro versa sobre a admissibilidade, ou não, da denúncia (art. 20). Mero juízo de admissibilidade do pedido, sem entrar no mérito. Nele somente se analisa o aspecto técnico do pedido. Osegundo parecer (do art. 22, § 2º) diz respeito à “procedência ou improcedência” do pedido. É o mesmo procedimento dos recursos em geral: primeiro vem o juízo de admissibilidade (mera delibação) e depois o juízo de mérito (procedência ou improcedência, provimento ou improvimento).
A Comissão especial tem 10 dias para emitir o primeiro parecer (mero juízo de delibação). Se necessário, pode proceder às diligências que julgar convenientes ao esclarecimento da denúncia.
De acordo com o § 1º do mesmo art. 20,
“O parecer da comissão especial [o primeiro] será lido no expediente da sessão da Câmara dos Deputados e publicado integralmente no Diário do Congresso Nacional e em avulsos, juntamente com a denúncia, devendo as publicações ser distribuídas a todos os deputados.
- 2º Quarenta e oito horas após a publicação oficial do parecer da Comissão especial, será o mesmo incluído, em primeiro lugar, na ordem do dia da Câmara dos Deputados, para uma discussão única.
Art. 21. Cinco representantes de cada partido poderão falar, durante uma hora, sobre o parecer, ressalvado ao relator da comissão especial o direito de responder a cada um.
A denúncia pode ser arquivada (de plano) pelo Plenário da Câmara? Sim (ou não). É o que diz o art. 22:
“Art. 22. Encerrada a discussão do parecer, e submetido o mesmo a votação nominal, será a denúncia, com os documentos que a instruam, arquivada, se não for considerada objeto de deliberação. No caso contrário, será remetida por cópia autêntica ao denunciado, que terá o prazo de vinte dias para contestá-la e indicar os meios de prova com que pretenda demonstrar a verdade do alegado.
Se arquivada a denúncia, o assunto está encerrado. A CF não fala nada sobre o quórum necessário para essa votação. A lei tampouco. Seria então, por ilação, a maioria simples (metade + um dos integrantes da Câmara).
Se admitida a discussão da denúncia (se admitida sua processabilidade), vem a fase de defesa (prevista no caput do art. 22) e, depois, as diligências e as provas. É o que prevê o art. 22, § 1º:
“§ 1º Findo esse prazo e com ou sem a contestação, a comissão especial determinará as diligências requeridas, ou que julgar convenientes, e realizará as sessões necessárias para a tomada do depoimento das testemunhas de ambas as partes, podendo ouvir o denunciante e o denunciado, que poderá assistir pessoalmente, ou por seu procurador, a todas as audiências e diligências realizadas pela comissão, interrogando e contestando as testemunhas e requerendo a reinquirição ou acareação das mesmas.
Somente depois dessa fase de diligências e provas é que a Comissão emitirá seu segundo parecer (o de mérito):
- 2º Findas essas diligências, a comissão especial proferirá, no prazo de dez dias, parecer sobre aprocedência ou improcedência da denúncia.
O parecer (segundo) deve ser submetido a duas discussões, respeitando-se o prazo de 48 horas:
- 3º Publicado e distribuído esse parecer [o segundo] na forma do § 1º do art. 20, será o mesmo, incluído na ordem do dia da sessão imediata para ser submetido a duas discussões, com o interregno de 48 horas entre uma e outra”.
O § 4º do art. 22 deixa claro que somente agora haverá discussão sobre a procedência ou improcedência do pedido. Na primeira vez a Câmara delibera somente sobre a admissibilidade (ou não) do pedido. Na segunda vez é que decide sobre o mérito (procedência ou improcedência).
“§ 4º Nas discussões do parecer sobre a procedência ou improcedência da denúncia, cada representante de partido poderá falar uma só vez e durante uma hora, ficando as questões de ordem subordinadas ao disposto no § 2º do art. 20”.
Terminadas as discussões, vem a votação nominal:
Art. 23. Encerrada a discussão do parecer, será o mesmo submetido a votação nominal, não sendo permitidas, então, questões de ordem, nem encaminhamento de votação.
Se julgada procedente a denúncia, fica “decretada a acusação pela Câmara”, ou seja, a Câmara é apenas a Casa acusatória (porque o julgamento final compete ao Senado e não à Câmara).
“§ 1º Se da aprovação do parecer resultar a procedência da denúncia, considerar-se-á decretada a acusação pela Câmara dos Deputados”.
- 2º Decretada a acusação, será o denunciado intimado imediatamente pela Mesa da Câmara dos Deputados, por intermédio do 1º Secretário.
- 3º Se o denunciado estiver ausente do Distrito Federal, a sua intimação será solicitada pela Mesa da Câmara dos Deputados, ao Presidente do Tribunal de Justiça do Estado em que ele se encontrar.
- 4º A Câmara dos Deputados elegerá uma comissão de três membros para acompanhar o julgamento do acusado.
SEGUNDA POLÊMICA: A segunda polêmica está sendo levantada por F. Rodrigues (UOL). É a seguinte: por força do § 5º do art. 23 da Lei 1.079/50 o presidente da República fica suspenso do exercício das duas funções logo após a decretação da acusação pela Câmara (logo após a Câmara, por 342 votos, admitir a acusação). Vejamos:
“§ 5º São efeitos imediatos ao decreto da acusação do Presidente da República, ou de Ministro de Estado, a suspensão do exercício das funções do acusado e da metade do subsídio ou do vencimento, até sentença final”.
A CF (art. 86, § 1º, II) diz que o Presidente da República ficará suspenso das suas funções “após a instauração do processo pelo Senado Federal”. Sobre esse tema já existe uma ADPF (378) no STF, manejada pelo PC do B (relator Luiz Fachin).
A Lei é de 1950. A CF é de 1988. A lei é ordinária (infraconstitucional). A Constituição tem supremacia normativa (vale mais). Logo, s.m.j., não há nenhuma dúvida de que o afastamento (a suspensão) do Presidente se dá com a instauração do processo de impeachment pelo Senado Federal. Não bastam os 342 votos da Câmara dos Deputados.
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