Proclama nossa Constituição Federal de 1988 que a educação é um direito de todos e dever do Estado, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa humana, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Como não poderia deixar de ser, o Art. 206, I, da CF/88, estabelece que, dentre outros, o ensino será ministrado com base no princípio da igualdade de condições para o acesso e permanência na escola.
Naturalmente, num País de tantas desigualdades e injustiças sociais, marcado pela corrupção generalizada e a desmoralização da política, aonde a exploração da miséria de nosso povo sustenta as sucessivas abertura de contas bancárias em paraísos fiscais por nossos agentes públicos ímprobos, não bastaria à Constituição e às leis apenas prescrever que a educação é um direito.
Por isso, acertadamente, como visto, a Constituição determina que o Poder Público promova a igualdade de condições para o acesso e permanência de alunos carentes na escola.
Trata-se aqui da aplicação daquela mais sublime tradução do princípio da igualdade, consistente em tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na exata medida de suas desigualdades.
Seria mesmo ilógico, ou uma retórica cruel, sugerir que alunos carentes, pertencentes a comunidades da periferia das grandes cidades ou de longínquas e abandonadas zonas rurais, fossem dotados das mesmas condições de crianças e adolescentes moradores dos bairros da elite brasileira, para fazer frente ao transporte até a escola.
Quando se sabe que muitas vezes as crianças brasileiras pobres e seus pais não têm sequer o que comer em casa no dia-a-dia, a contratação onerosa de transporte escolar por essa gente, a título particular, se configura sabidamente como impraticável.
E foi pensando nessas dramáticas dificuldades de alunos carentes, quanto à garantia do acesso e permanência na escola, que o Art. 208, VII, da CF/88, determinou ao Estado que a educação de crianças e adolescentes deverá ser efetivada mediante a garantia de programas públicos de transporte escolar.
Destarte, nos termos da CF/88, o transporte escolar prestado pelo Poder Público constitui-se em garantia de alunos carentes para acesso e permanência na escola.
Ao contrário do que pensam alguns, o transporte escolar público prestado a alunos carentes não se constitui em pauta publicitária política alternativa de prefeitos, governadores, vereadores ou deputados, ávidos pela reeleição. É, sim, um dever constitucional, uma obrigação de todos os agentes públicos envolvidos com a educação de crianças e adolescentes.
Não é raro de se ver aquela cena de dezenas de famílias carentes amontoadas no saguão de algumas prefeituras e câmaras de vereadores aguardando a vinda de um político salvador, “presenteando” a comunidade com a notícia de que o transporte escolar finalmente terá início na região.
Ora, verdadeiro presente a essa gente seria a condenação judicial do agente público omisso, envolvido nessa grave sonegação de garantia constitucional fundamental expressa conferida a crianças e adolescentes. Sem prejuízo da pontual e regular oferta do transporte escolar, como dever e obrigação do Poder Público.
A Lei Federal nº 9.394/96, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, chancela a determinação constitucional do transporte escolar prestado pelo Poder Público, como garantia de acesso e permanência do aluno na escola.
Em seu Art. 10, VII, estabelece que os Estados incumbir-se-ão de assumir o transporte escolar dos alunos da rede estadual. Já no Art. 11, VI, obriga aos Municípios assumir o transporte escolar dos alunos da rede municipal. O que não afasta a responsabilidade solidária de todos os Entes da Federação frente ao particular insculpida no Art. 208, VII, da CF/88.
A Lei Federal nº 10.709/2003, que alterou a LDB, acrescentando os incisos acima, disciplinou ainda no seu Art. 3º que caberá aos Estados articular-se com os respectivos Municípios, para prover o transporte escolar de forma que melhor atenda aos interesses dos alunos.
Importante registrar que convênios celebrados entre Estados e Municípios devem observar única e obrigatoriamente o melhor interesse dos alunos, como determina o Art. 3º da Lei Federal nº 10.709/2003.
Não devem servir esses convênios entre Estados e Municípios a disputas entre essas Unidades da Federação para se exonerarem deste sagrado encargo constitucional e legal de prestar transporte escolar público e gratuito a alunos carentes. Rixas politiqueiras para se escapar da ação do Ministério Público e da Defensoria Pública não podem e não devem ser toleradas.
A articulação de Estados e Municípios, à luz do Art. 3º da Lei Federal nº 10.709/2003, é uma obrigação, visando sempre ao atendimento do melhor interesse dos alunos. E será sempre melhor interesse dos alunos a frequência e comparecimento pontual às salas de aulas. Jamais poderão Estados e Municípios, omissos ou indiferentes quanto às necessidades de crianças e adolescentes, sugerir que a evasão escolar seria um mal inevitável ante a não celebração do convênio tratando do transporte escolar.
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