A “operação Lava Jato”, mais uma vez, é destaque midiático em virtude da condenação de Eduardo Consentino da Cunha, ex-deputado federal, mais conhecido como Eduardo Cunha, que além de perder o mandato parlamentar e foi preso na referida operação em 19/10/2016, condição que ainda se encontra.
A sentença prolatada pelo Juiz Federal Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, resultou em um trabalho de 109 páginas, condenando Eduardo Cunha à pena total de quinze anos e quatro meses de reclusão e multa, pelos crimes de corrupção passiva (art. 317, do CP), lavagem de dinheiro (Lei n. 9.613/98, art. 1º) e Evasão fraudulenta de divisas (Lei n. 7.429/86, art. 22).
Antes de adentrarmos na análise da referida condenação, vale destacar os resultados da operação Lava Jato, até a presente data, o que fazemos com as informações disponibilizadas no site do MPF (http://lavajato.mpf.mp.br/entenda-o-caso):
a) Resultados no STF: Foram mais de 1925 manifestações, 171 buscas e apreensões, 156 quebras de sigilo fiscal, 215 quebras de sigilo bancário, 147 quebras de sigilo telefônico, 34 quebras de sigilo telemático, 5 quebras de dados, 19 sequestros de bens, 4 sequestros de valores, 85 inquéritos instaurados, 413 investigados em diversas classes processuais, 20 denúncias com 2 aditamentos, 68 acusados, 3 ações penais, 49 acordos de colaboração premiada homologadas perante o STF e R$ 79 milhões de reais repatriados.
b) Resultado total da operação Lava Jato: 1434 procedimentos instaurados, 746 buscas e apreensões, 202 conduções coercitivas, 91 prisões preventivas, 101 prisões temporárias e 6 prisões em flagrante, 183 pedidos de cooperação internacional (sendo 130 pedidos ativos para 33 países e 53 pedidos passivos com 24 países), 155 acordos de colaboração premiada firmadas com pessoas físicas, 10 acordos de leniência e 1 termo de ajustamento de conduta, 58 acusações criminais contra 260 pessoas (sem repetição de nome), sendo que em 26 já houve sentença pelos crimes de corrupção, crimes contra o sistema financeiro internacional, tráfico transnacional de drogas, formação de organização criminosa, lavagem de ativos, entre outros. Até o momento foram 130 condenações, contabilizando 1.362 anos, 5 meses e 21 dias de pena (sem a atualização da condenação de Eduardo Cunha). Foram ainda abertas 7 ações de improbidade administrativa contra 38 pessoas físicas e 16 empresas pedindo o pagamento de R$ 12,5 bilhões. Valor total do ressarcimento pedido, incluindo as multas a serem aplicadas é de aproximadamente R$ 38,1 bilhões. Os crimes já denunciados envolvem o pagamento de propina de cerca de R$ 6,4 bilhões, sendo que R$ 10,3 bilhões são alvo de recuperação por acordos de colaboração, sendo R$ 756,9 milhões objeto de repatriação e R$ 3,2 bilhões em bens dos réus já bloqueados.
A referida operação Lava Jato é a maior e mais duradoura investigação de corrupção e lavagem de dinheiro que o Brasil já enfrentou. Iniciada em 2009, envolve vários setores da persecução criminal, tanto na primeira, quanto na segunda instância, em virtude dos vários atores investigados, muitos com foro privilegiado perante o Supremo Tribunal Federal.
Após tais considerações, adentramos na análise da decisão prolatada nos autos do processo eletrônico n. 505160623.2016.4.04.7000, da 13ª Vara Federal de Curitiba, ressaltando-se que não será objetivo entrar nas minúcias de mérito, uma vez que só tivemos acesso à sentença.
A sentença segue um padrão das sentenças penais, trazendo primeiramente um relatório, onde são expostas as ocorrências processuais desde a denúncia até as alegações finais. Em seguida, o magistrado passa à fundamentação, ocasião em que discorre sobre as prejudiciais de mérito para em seguida dispor sobre a imputação. Ao final, traz o dispositivo, disponibilizando às partes a dosimetria da pena, nos termos do sistema trifásico estabelecido no art. 68 do Código Penal.
As alegações finais da acusação (Ministério Público Federal) foram assim sintetizadas pelo magistrado:
O MPF, em alegações finais (evento 251), argumentou: a) que não há nulidades a serem reconhecidas? b) que restou provada a materialidade e a autoria dos crimes? d) que foi provado que o acusado Eduardo Cosentino da Cunha solicitou e recebeu 1.311.700,00 francos suíços em conta oculta na Suíça e depois os transferiu para outras contas ocultas? e) que foi provado que o dinheiro teve origem em contrato de aquisição do Bloco 4 em Benin pela Petrobrás da empresa CBH? f) que o pagamento era espécie de "pedágio" em troca de apoio ao Governo? g) que foram detectadas diversas irregularidades no processo de aquisição pela Petrobrás do Bloco 4 em Benin? h) que a utilização de contas no exterior em nome de trusts e a falta de declaração desses ativos configura lavagem de dinheiro? i) que o acusado utilizou parte dos valores em gastos de cartões de crédito para aquisição de bens e serviços de luxo? j) que Jorge Luiz Zelada foi nomeado e mantido como Diretor da Área Internacional da Petrobrás pelo apoio de agentes políticos do PMDB, inclusive do acusado Eduardo Cosentino da Cunha? k) que, em contrapartida, os nomeados angariavam vantagem indevida em contratos da Petrobrás e que repartiam com os agentes políticos, no caso Eduardo Cosentino da Cunha? l) que o álibi apresentado por Eduardo Cosentino da Cunha não está acompanhado de provas? m) que ainda que o ex-deputado Federal Fernando Diniz tenha algum envolvimento nos crimes, isso não elimina a responsabilidade criminal de Eduardo Cosentino da Cunha? n) que também restou configurado o crime de evasão de divisas por não terem sido declarados os saldos das contas no exterior? o) que não há consunção entre o crime de lavagem e o de evasão? p) que as vetoriais do art. 59 do CP são desfavoráveis ao acusado? q) que deve ser considerada a agravante de violação de dever inerente ao cargo? r) que deve ser decretada a perda dos valores bloqueados no exterior e que deve ser fixado valor mínimo para o dano decorrente do crime em USD 77.500.000,00.
Por outro lado as alegações finais da defesa, foram sintetizadas nos seguintes moldes:
A Defesa de Eduardo Cosentino da Cunha, em alegações finais (evento 263), argumenta: a) que a inicial é inepta relativamente aos crimes de corrupção passiva, por falta da descrição do ato de ofício, e de lavagem de dinheiro porque não teria havido ocultação e dissimulação? b) que houve nulidade na transferência do processo da Suíça para o Brasil por inexistência de previsão legal desse procedimento na lei brasileira? c) que houve nulidade por falta de decretação da quebra judicial do sigilo bancário do acusado na Suíça? d) que houve nulidade por violação do princípio da dupla incriminação, uma vez que o crime de evasão de divisas não está previsto na lei suíça? e) que houve nulidade das provas produzidas no procedimento de investigação 1.25.000.003027.201514 por violação da prerrogativa de foro? f) que houve cerceamento de defesa pelo indeferimento de diligências complementares na fase se do art. 402 do CPP? g) que houve cerceamento de defesa em virtude do indeferimento parcial de perguntas ao Exmo. Sr. Presidente da República Michel Temer? h) que a denúncia é improcedente? i) que Eduardo Cunha não foi responsável pela nomeação de Jorge Luiz Zelada? j) que não há ato de ofício atribuível a Eduardo Cunha na aquisição dos direitos de exploração do Bloco 4 em Benin? k) que Eduardo Cunha recebeu na conta no exterior devolução de empréstimo concedido a Fernando Alberto Diniz? l) que o acusado não tinha o dever de declarar as contas no exterior, já que seriam elas titularizadas pelos trusts? m) que houve apenas movimentação lícita do dinheiro nas contas e não lavagem? n) que o montante repassado da conta Netherton para a conta Kopek era proveniente da conta Triumph e não da conta Orion (fl. 167)? o) que não houve crime de lavagem de dinheiro, pois o acusado apenas instituiu trusts com bens lícitos de sua titularidade? p) que o mero recebimento de vantagem indevida não configura crime de lavagem de dinheiro? q) que caso reconhecidos os crimes de lavagem de dinheiro, deve ser admitida a continuidade delitiva? r) que entre crime de lavagem e de evasão haveria consunção? e s) que o crime de evasão deve ser considerado único. Pleiteia ao final que a presente ação penal seja julgada em conjunto com a ação penal conexa 502768535.206.404.7000, a fim de evitar que o Juízo torne-se suspeito para julgar os acusados no outro processo.
Uma vez apresentas as alegações finais, passa o magistrado a prolatar sua decisão, discorrendo inicialmente sobre os motivos da fixação da competência da Justiça Federal, bem como o porquê da competência daquele juízo, assim resumido:
a) Crimes que se iniciaram no Brasil e terminaram no exterior (corrupção e lavagem transnacional, com depósitos no exterior). O Brasil assumiu o compromisso de prevenir ou reprimir os crimes de corrupção e de lavagem transnacionais, conforme Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção de 2003 e que foi promulgada no Brasil pelo Decreto 5.687/2006. Havendo previsão em tratado e sendo os crimes de corrupção e lavagem transnacionais, incide o art. 109, V, da Constituição Federal, que estabelece o foro federal como competente.
b) O crime do art. 22 da Lei n.º 7.492/1986 (evasão de divisas) também determina a competência da Justiça Federal, conforme art. 109, VI, da Constituição Federal.
c) Crime praticado por autor que exercia mandato de Deputado Federal, também atrai a competência federal, inicialmente do Supremo Tribunal Federal e posteriormente da Justiça Federal, com a perda do mandato.
d) A competência do juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba não foi arguida pela defesa do acusado, além de o STF ter reconhecida a competência daquele juízo por mais de uma vez.
Após afastar os argumentos defensivo de inépcia da denúncia, o MM. Juiz afasta os argumentos da defesa no tocante à suposta nulidade pela transferência de provas da Suíça para o Brasil, inclusive com quebra de sigilo bancário do acusado naquele país, sem ordem judicial. Utilizou como fundamento para validar o procedimento probatório:
O procedimento de transferência da investigação, que não passa de uma transmissão da prova colhida na Suíça para o Brasil, encontra apoio expresso não só no artigo IV do Tratado de Extradição entre Brasil e Suíça promulgado pelo Decreto 23.997, de 13/03/1934, como nas largas disposições do Tratado de Cooperação Jurídica em Matéria Penal entre Brasil e Suíça promulgado pelo Decreto nº 6.974, de 07/10/2009.
Além disso, afirmou que “A previsão é ainda consistente com as normas de tratados internacionais, inclusive da Convenção das Nações Unidas contra o Crime de Corrupção, promulgado no Brasil pelo Decreto n.º 5.687/2006”. Destacando ainda que referido questionamento foi objeto de análise pelo Plenário do STF em 22 de junho de 2016, ocasião em que foi afastado qualquer vício.
No tocante à quebra de sigilo bancário ocorrido na Suíça, indicou como óbice aos argumentos defensivos que “não cabe questionar no Brasil a validade dos atos jurídicos praticados em outro país”, uma vez que não tem a Justiça brasileira condições de averiguar a conformidade de tais atos jurídicos a luz da legislação da Suíça. Além disso, aduziu que nos casos de cooperação jurídica internacional, os atos jurídicos seguem as leis e regras vigentes no país nos quais os atos são produzidos, não cabendo “conferir efeito extraterritoriais à legislação brasileira para questionar a validade de atos jurídicos praticados na Suíça com base na lei suíça”.
Além disso, quem define o alcance e os limites da cooperação internacional são as autoridades do País ao qual ela é requerida, citando como exemplo a extradição (art. 91, da Lei n. 6815/80), sendo que no caso julgado, não houve nenhuma restrição ou condicionamento das autoridades daquele país, referente à utilização do material probatório para sustentar uma acusação por crime de evasão fraudulenta de divisas, destacando ainda que o referido questionamento, também foi objeto de decisão do STF, quando do recebimento da denúncia no Inquérito 4146.
No tocante à alegação da defesa de cerceamento em virtude do indeferimento de parte das provas requerida na fase do art. 402 do CPP, aduziu que a decisão foi devidamente fundamentada, transcrevendo o inteiro teor da decisão, demonstrando que a defesa na referida fase, pretendia reabrir por completo a instrução criminal, sendo que mesmo assim, na ocasião foi deferida algumas diligências, cujo caráter não se mostravam protelatórios.
Quanto à alegação da defesa de cerceamento por indeferimento de parte dos quesitos apresentados para oitiva do Exmo. Sr. Presidente Michel Temer, o magistrado registrou, além de a maioria dos quesitos formulados pela defesa não terem relação com a ação penal, tudo indicava que a defesa pretendia provocar alguma espécie de intervenção da parte de em favor do acusado Eduardo Cunha. Além disso, as perguntas quesitadas, fugiria da competência daquele juiz para apurar supostas condutas por parte do Presidente da República, não se admitindo que o processo judicial seja utilizado para a transmissão de “ameaças, recados ou chantagens a autoridades ou testemunhas de fora do processo”.
Também foram afastadas as alegações de suspeição do magistrado, bem como os argumentos de que testemunhas foram coagidas ilegalmente para firmarem acordos de colaboração premiada, tendo ainda o magistrado registrado que “As prisões preventivas decretadas no presente caso e nos conexos devem ser compreendidas em seu contexto. Embora excepcionais, as prisões cautelares foram impostas em um quadro de criminalidade complexa, habitual e profissional, servindo para interromper a prática sistemática de crimes contra a Administração Pública, além de preservar a investigação e a instrução da ação penal”.
Registra o julgador que “na evolução das apurações, foram colhidas provas de um grande esquema criminoso de cartel, fraude, corrupção e lavagem de dinheiro no âmbito da empresa Petróleo Brasileiro S/A Petrobras cujo acionista majoritário e controlador é a União Federal”, revelando ainda que “grandes empreiteiras do Brasil, entre elas a OAS, UTC, Camargo Correa, Odebrecht, Andrade Gutierrez, Mendes Júnior, Queiroz Galvão, Engevix, SETAL, Galvão Engenharia, Techint, Promon, MPE, Skanska, IESA e GDK teriam formado um cartel, através do qual teriam sistematicamente frustrado as licitações da Petrobras para a contratação de grandes obras”, sendo que as empresas componentes do cartel pagavam sistematicamente propinas a dirigentes no percentual entre um a três por cento em média, sobre os contratos firmados.
Destacou vários casos já julgados, citando a condenação de José Dirceu de Oliveira e Silva, ex-parlamentar federal e ex-Ministro da Casa Civil, assim como os ex-Deputados Federal João Luiz Correia Argolo dos Santos e Pedro da Silva Correa de Oliveira Andrade Neto, afirmando que o caso em julgamento se insere no mesmo contexto dos casos citados, ou seja, acertos de propina em contratos da Petrobrás, com o enriquecimento ilícito dos envolvidos agentes políticos, com o respectivo financiamento criminoso de partidos políticos, chegando-se à cifras de um prejuízo de USD 34.500.000,00 (trinta e quatro milhões de dólares), afirmando que a Comissão Interna de Apuração da Petrobrás calculou o prejuízo em cerca de USD 77,5 milhões de dólares.
Na sequência o magistrado discorre sobre as provas produzidas, em especial a movimentação financeira até chegar na quantia de $ 1,5 milhões de dólares depositados na conta do acusado Eduardo Cunha, fazendo um resumo conclusivo:
É possível concluir, com base na prova documental, que, do preço pago pela Petrobrás pela aquisição de 50% dos direitos de exploração do Bloco 4 em Benin, no montante de USD 34.500.000,00, à CBH, de Idalécio de Castro Rodrigues de Oliveira, foram pagos, em 05/05/2011, USD 10 milhões à Acona Internacional, de João Augusto Rezende Henriques, como comissão pelo sucesso da representação por este junto à Petrobrás dos interesses da CBH, sendo que USD 1.500.000,00 dos aludidos dez milhões foram sucessivamente transferidos, entre 30/05/2011 a 23/06/2011, para conta em nome da Orion SP, de propriedade e controlada por Eduardo Cosentino da Cunha. Posteriormente, a conta em nome da Orion SP foi encerrada e o saldo, de 970.261,34 francos suíços e de 22.608,37 euros, foi transferido, em 11/04/2014, para a conta em nome da Netherton Investments, de propriedade e controlada por Eduardo Cosentino da Cunha.
Além da movimentação financeira acima, o juiz fez referência à colaboração premiada de Nestor Cunhat Cerveró, inclusive transcrevendo trechos do seu depoimento como testemunha, além de outras testemunhas, a exemplo de Eduardo Costa Vaz Musa, Jorge Luiz Zelada, entre outras, indicando os elementos para afastar os álibis da defesa em face dos crimes imputados.
Finaliza a decisão condenado Eduardo Consentino da Cunha, como incurso em:
a) Um crime de corrupção passiva do art. 317 do CP, cuja pena abstrata é de reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa, aplicando-se uma causa de aumento de pena um terço referente ao §1º do esmo artigo, pela solicitação e recebimento de vantagem indevida no contrato de aquisição pela Petrobrás dos direitos de exploração do Bloco 4 em Benim.
b) Três crimes de lavagem de dinheiro (art. 1º da L. 6.913/98), punido com pena de reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e multa, pelo recebimento e movimentação posterior de produto de crime de corrupção (delito antecedente), mediante a conduta de ocultação e dissimulação envolvendo as contas da Orion SP e Netherton Investimentos;
c) Dois crimes de evasão fraudulenta de divisas (art. 22 da L. 7.429/86), com pena de Reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa, pela manutenção de depósitos não declarados no exterior;
Em seguida passou à dosimetria da pena, seguindo rigorosamente os mandamentos do art. 68 do CP, no tocante ao sistema trifásico, analisando primeiro as oito circunstancias judiciais do art. 59 do código penal, circunstâncias estas que vão se repetindo em todos os delitos, com pequenas variações, senão vejamos:
Dosimetria do crime de corrupção passiva (art. 317, e §1º, CP, reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa):
1ª fase da dosimetria do crime de corrupção passiva: Eduardo Cosentino da Cunha responde a outras ações penais (ação penal 6020383.2016.4.01.3400 em trâmite perante a 10ª Vara Criminal Federal de Brasília, e antiga ação penal 982 perante o Supremo Tribunal Federal enviada ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região), mas não foi ainda por elas julgado. Então será considerado como tendo bons antecedentes. Conduta social, motivos, comportamento da vítima são elementos neutros. Circunstâncias devem ser valoradas negativamente. A prática do crime corrupção envolveu o recebimento de cerca de um milhão e quinhentos mil dólares, considerando apenas a parte por ele recebida, o que é um valor bastante expressivo, atualmente de cerca de R$ 4.643.550,00. Consequências também devem ser valoradas negativamente, pois os vícios procedimentais na aquisição do Bloco 4 em Benin geraram um prejuízo estimado à Petrobrás de cerca de 77,5 milhões de dólares, conforme cálculo realizado pela Comissão Interna de Apuração da Petrobrás (item 235). A corrupção com pagamento de propina de um milhão e quinhentos mil dólares e tendo por consequência prejuízo ainda superior aos cofres públicos merece reprovação especial. A culpabilidade é elevada. O condenado recebeu vantagem indevida no exercício do mandato de Deputado Federal, em 2011. A responsabilidade de um parlamentar federal é enorme e, por conseguinte, também a sua culpabilidade quando pratica crimes. Não pode haver ofensa mais grave do que a daquele que trai o mandato parlamentar e a sagrada confiança que o povo nele deposita para obter ganho próprio. Agiu, portanto, com culpabilidade extremada, o que também deve ser valorado negativamente. Tal vetorial também poderia ser enquadrada como negativa a título de personalidade. Considerando três vetoriais negativas, de especial reprovação, fixo, para o crime de corrupção ativa, pena de quatro anos e seis meses de reclusão.
2ª fase da dosimetria do crime de corrupção passiva: Não há atenuantes ou agravantes a serem reconhecidas. A agravante pretendida pelo MPF, do art. 61, II, g, do CP, é inerente ao crime de corrupção.
3ª fase da dosimetria do crime de corrupção passiva: Tendo havido a prática de atos de ofício com infração do dever funcional, aplico a causa de aumento do §1º do art. 317 do CP, elevando-a para seis anos de reclusão.
A pena de multa no crime de corrução passiva foi fixada em 150 dias multa (entre 10 a 360) e, em virtude da situação econômica e financeira de Eduardo Cunha, o valor do dia multa foi fixado no valor máximo, ou seja, 5 salários mínimos, vigentes ao tempo do último crime praticado (06/11). Fazendo os cálculos com base no salário mínimo da época R$ 545,00, teríamos a seguinte operação 150 dias multa x 5 x R$ 545,00 = R$ 408.750,00, valores estes que deverão ser atualizados quando da execução da pena, que após o trânsito em julgado, serão cobrados pela Fazenda Nacional.
Dosimetria dos crimes de lavagem de dinheiro (art. 1º, da Lei n. 9.613/98, reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e multa):
1ª fase da dosimetria do crime de lavagem de dinheiro: Eduardo Cosentino da Cunha responde a outras ações penais (ação penal 6020383.2016.4.01.3400 em trâmite perante a 10ª Vara Criminal Federal de Brasília, e antiga ação penal 982 perante o Supremo Tribunal Federal enviada ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região), mas não foi ainda por elas julgado. Então será considerado como tendo bons antecedentes. Conduta social, motivos, comportamento da vítima são elementos neutros. Circunstâncias devem ser valoradas negativamente. A lavagem, no presente caso, envolveu especial sofisticação, com a utilização de não uma, mas duas contas secretas no exterior, em nome de trusts diferentes, com transações entre elas, inclusive com fracionamento quando do recebimento do produto do crime para dificultar rastreamento. Tal grau de sofisticação não é inerente ao crime de lavagem e deve ser valorado negativamente a título de circunstâncias (a complexidade não é inerente ao crime de lavagem, conforme precedente do RHC 80.816/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma do STF, un., j. 10/04/2001). Consequências devem ser valoradas negativamente. A lavagem envolve a quantia substancial de cerca de um milhão e quinhentos mil dólares. A lavagem de significativa quantidade de dinheiro merece reprovação a título de consequências. A culpabilidade é elevada. O condenado realizou condutas de ocultação e dissimulação, entre 2011 a 2014, quando no exercício do mandato de Deputado Federal. A responsabilidade de um parlamentar federal é enorme e, por conseguinte, também a sua culpabilidade quando pratica crimes. Não pode haver ofensa mais grave do que a daquele que trai o mandato parlamentar e a sagrada confiança que o povo nele depositou para obter ganho próprio. Agiu, portanto, com culpabilidade extremada, o que também deve ser valorado negativamente. Tal vetorial também poderia ser enquadra como negativa a título de personalidade. Considerando três vetoriais negativas, de especial reprovação, fixo, para o crime de lavagem de dinheiro, pena de cinco anos de reclusão. Fixo multa proporcional para a lavagem em cento e dez dias multa.
2ª fase da dosimetria do crime de lavagem de dinheiro: Não há atenuantes ou agravantes.
3ª fase da dosimetria do crime de lavagem de dinheiro: Entre todos os crimes de lavagem, reconheço continuidade delitiva. Considerando a quantidade de crimes, dois, elevo a pena do crime mais grave em 1/6, chegando ela a cinco anos e dez meses de reclusão e cento e vinte e sete dias multa.
No crime de lavagem de dinheiro a pena de multa foi fixada no total de 127 dias multa, sendo que cada dia foi valorado em 5 salários mínimos, vigente ao tempo do crime (04/2014), ou seja R$ 724,00, o que totaliza um montante de R$ 459.740,00, valor este que deverá ser atualizado quando da sua execução, que se fará pela Fazenda Nacional.
Dosimetria dos crimes de evasão de divisas (art. 22 da L. 7.429/86), com pena de Reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa
1ª fase da dosimetria do crime de evasão de divisas: Eduardo Cosentino da Cunha responde a outras ações penais (ação penal 6020383.2016.4.01.3400 em trâmite perante a 10ª Vara Criminal Federal de Brasília, e antiga ação penal 982 perante o Supremo Tribunal Federal enviada ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região), mas não foi ainda por elas julgado. Então será considerado como tendo bons antecedentes. Conduta social, motivos, consequências, comportamento da vítima são elementos neutros. Circunstâncias devem ser valoradas negativamente, considerando o montante elevado dos valores cuja declaração foi omitida (itens 471 e 472). A culpabilidade é elevada. O condenado realizou as condutas delitivas, entre 2007 a 2014, quando no exercício do mandato de Deputado Federal. A responsabilidade de um parlamentar federal é enorme e, por conseguinte, também a sua culpabilidade quando pratica crimes. Não pode haver ofensa mais grave do que a daquele que trai o mandato parlamentar e a sagrada confiança que o povo nele depositou para obter ganho próprio. Agiu, portanto, com culpabilidade extremada, o que também deve ser valorado negativamente. Tal vetorial também poderia ser enquadrada como negativa a título de personalidade. Considerando duas vetoriais negativas, de especial reprovação, fixo, para o crime de evasão fraudulenta de divisas, pena de três anos de reclusão. Fixo a multa proporcional para a lavagem em noventa e cinco dias multa.
2ª fase da dosimetria do crime de evasão de divisas: Não há atenuantes ou agravantes.
3ª fase da dosimetria do crime de evasão de divisas: Entre todos os crimes de evasão, reconheço continuidade delitiva. Considerando a quantidade de crimes, dois, elevo a pena do crime mais grave em 1/6, chegando ela a três anos e seis meses de reclusão e cento e sete dias multa.
No crime de evasão de divisas fixou o valor do dia multa em 5 vezes o salário mínimo, vigente ao ano de 2014, ou seja R$ 724,00, de forma que quando dos cálculos, será possível chegar no montante de 107x5xR$ 724,00 = 387.340,00, valor este que deverá ser atualizado quando da sua execução, que se fará pela Fazenda Nacional.
Por fim, em virtude do concurso material de crimes (art. 69, CP), o juiz realizou a soma das penas, totalizando quinze anos e quatro meses de reclusão, estabelecendo o regime fechado de cumprimento de pena, bem como condicionando a progressão de regime à devolução ou ressarcimento dos valores nos termos do §4º, do art. 33 do CP.
A sentença não diz, mas fizemos os cálculos do total da multa fixado que resultou em R$ 1.255.830,00 (um milhão, duzentos de cinquenta e cinco mil e oitocentos e trinta reais), cujos valores, após trânsito em julgado, serão convertidos em dívida ativa a ser cobrado pela Fazenda Nacional, com a devida atualização.
Como efeito da condenação pelo crime de lavagem de dinheiro (art. 7º, II, da Lei nº 9.613/1998), decretou a interdição para o exercício de cargo ou função pública ou de diretor, membro de conselho ou de gerência das pessoas jurídicas referidas no art. 9º da mesma lei pelo dobro do tempo da pena privativa de liberdade. Aqui verificamos a necessidade de embargos de declaração, uma vez que deixa a entender que a interdição será pelo dobro de 15 anos e 4 meses, sendo que a condenação pelo crime de evasão de divisas foi de três anos e seis meses de reclusão, não devendo esse efeito da condenação ser estendidos aos demais crimes.
Fixou um valor mínimo de indenização praticado (art. 387, VI, CPP) pelo crime contra a Petrobrás, no montante de 1,5 milhões de dólares, bem como a condenação nas custas processuais, mantendo a prisão preventiva de Eduardo Cunha.
Ao final, rendeu homenagem ao falecido Ministro Teori Zavascki, tendo em vista a sua grande atuação no processo da Lava Jato que tramita no Supremo Tribunal Federal, fazendo referência à possibilidade de aprovação da nova Lei de abuso de autoridade, sem as salvaguardas necessárias, para evitar o efeito prático da criminalização da interpretação de lei, colocando em risco a independência judicial, subordinando-a ao interesse dos poderosos.
Este é o resumo da decisão que condenou Eduardo Constantino Cunha, cuja sentença se mostrou bem fundamentada e organizada, disponibilizando às partes (acusação e defesa) elementos suficientes para a formação de um juízo de valor, com vista ao manejo de eventual recurso de apelação. Além disso, mesmo sem ter acesso às peças processuais, pelo resumo das alegações finais da acusação e defesa é possível afirmar que os profissionais envolvidos (MPF e advogados), tiveram excelente atuação, especialmente a defesa, que aparentemente utilizou-se de todos os recursos e teses jurídicas para buscar um melhor resultado para o acusado, respondendo à orientação constitucional de que o “advogado é indispensável à administração da justiça” (art. 133, CF).
Parabéns a todos!
Mestre em Direito Penal Internacional pela Universidade de Granada - Espanha. Mestre em Direito e Políticas Públicas pelo UNICEUB. Especialista em Direito Penal e Processo Penal pelo ICAT/UDF. Pós-graduado em Gestão Policial Judiciária pela ACP/PCDF-FORTIUM. Professor Universitário de Direito Penal e Orientação de Monografia. Advogado. Delegado de Polícia da PCDF (aposentado). Já exerceu os cargos de Coordenador da Polícia Legislativa da Câmara Legislativa do Distrito Federal (COPOL/CLDF), Advogado exercendo o cargo de Assessor de Procurador-Geral da CLDF. Chefe de Gabinete da Administração do Varjão-DF. Chefe da Assessoria para Assuntos Especiais da PCDF. Chefe da Assessoria Técnica da Cidade do Varjão - DF; Presidente da CPD/CGP/PCDF. Assessor Institucional da PCDF. Secretário Executivo da PCDF. Diretor da DRCCP/CGP/PCDF. Diretor-adjunto da Divisão de Sequestros. Chefe-adjunto da 1ª Delegacia de Polícia. Assessor do Departamento de Polícia Especializada - DPE/PCDF. Chefe-adjunto da DRR/PCDF. Analista Judiciário do TJDF. Agente de Polícia Civil do DF. Agente Penitenciário do DF. Policial Militar do DF.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: COIMBRA, Valdinei Cordeiro. Síntese da condenação de Eduardo Cunha: sentença penal proferida pelo juiz Sérgio Moro (Operação Lava Jato) Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 03 abr 2017, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/coluna/2591/sintese-da-condenacao-de-eduardo-cunha-sentenca-penal-proferida-pelo-juiz-sergio-moro-operacao-lava-jato. Acesso em: 25 nov 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
Por: Adel El Tasse
Por: Sidio Rosa de Mesquita Júnior
Por: Eduardo Luiz Santos Cabette
Precisa estar logado para fazer comentários.