A governança do PT, tanto quanto as demais da Nova República – Sarney, Collor, FHC e Temer -, foi bastante corrupta (mensalão, Petrolão e por aí vai), mas corretamente aprovou a Lei de Acesso à Informação (LAI). A transparência da gestão pública federal garantida por essa lei passou a ser maior. Ainda não era o ideal, mas era bem ampla, tendencialmente democrática e republicana. Atos e assuntos ultrassecretos, claro, devem mesmo ser preservados. Mas estava praticamente tudo na lei. Nela havia um certo equilíbrio.
Na luta do combate à corrupção, o novo governo vem cometendo vários erros. Temos que corrigi-los. Por força do decreto-mordaça do Mourão (24/1/19), a transparência (dos atos, contratos e negócios públicos) será bem menor, porque ganhou força a ocultação. O que estão querendo esconder mais da população?
Objetivamente, em uma análise empírica e racional, não há como negar que o decreto-mordaça é muito prejudicial ao país.
A alteração para pior da legislação do PT é uma forma de “despetização” redondamente equivocada, porque vai permitir com maior facilidade o sigilo dos perversos pactos oligárquicos, dos “rolos”, das tramoias, das concessões e subvenções privilegiadas, das isenções corruptas, dos contratos fraudados.
Tudo isso é exatamente o que as elites bandidas do poder (leia-se, o que os barões-ladrões do Estado e do Mercado que mandam no país) querem preservar. O decreto-mordaça, escondendo informações, joga em favor dos vilões, dos larápios, dos privilegiados, não da ética e da moralidade da administração pública.
Incrementa-se o estado paralelo de exceção (o do sigilo, o da roubalheira, o da impunidade, o do desrespeito à lei, o da “omertà”), não o Estado de Direito Democrático (da transparência, da prestação de contas, da accountability).
Quanto mais “omertà” (silêncio da máfia), quanto mais sigilo, quanto mais ocultação, menor a divulgação dos fatos e maior a impunidade; são menos coisas para a população ficar sabendo (e se indignar). O que não se vê, como sabemos, não se critica.
“Meu governo será transparência total” (dizia Jair Bolsonaro em 7/1/19). Na prática se faz o oposto do discurso. Isso gera desconfiança no povo. O decreto-mordaça assinado por Mourão (24/1/19), ao permitir que mais 1.288 funcionários de segundo escalão possam decretar o sigilo de informações, apondo-se o selo de reservado (por 5 anos), secreto (por 15 anos) ou ultrassecreto (por 25 anos), diminuiu a transparência do agigantado e monstruoso Estado brasileiro (que deveria cuidar apenas das suas funções essenciais: educação, saúde, Justiça, segurança e fiscalização fundada em leis gerais e impessoais).
Funcionários comissionados de segundo escalão podem ser exonerados em qualquer momento. São muito mais instáveis que os altos cargos da administração. A tentação do uso do carimbão “secreto” vai aumentar. Já que Darwin está fora de moda, recorde-se que nem Eva resistiu à tentação.
Tarefa tão relevante deve ficar exclusivamente nas mãos de quem tem responsabilidade política, porque a transparência é da essência das democracias liberais modernas.
Mourão disse: temos que compatibilizar segurança com transparência, temos que diminuir a burocracia. Discurso eloquente, mas “cordialmente” enganoso. A lei original já garantia a segurança. Isso o governo já tinha. Logo, mexeu-se só na transparência, para diminui-la, para enfraquecê-la, para esgarçá-la.
O “vamos ter mais democracia” (dito por Mourão), na verdade, significa vamos ter mais impunidade, que já era enorme. Mais de 73 mil documentos foram declarados sigilosos pelo governo federal durante o período de 12 meses (de junho/07 a maio/08). A quase totalidade, sigilo por cinco anos. Mais da metade dos órgãos públicos (174, de 312 no total) não informam dados, diz a CGU (Ver G1). O que já era precário e nebuloso, vai ficar muito pior. Escuridão, em lugar da transparência do sol do meio dia.
Quem ganha com o decreto do Mourão? Os barões-ladrões que ampliam sua impunidade. Quem perde com isso? O povo, a democracia, porque não terá acesso a informações importantes que poderiam estimular posicionamentos críticos, num processo de aprendizagem coletiva, para melhorar o funcionamento da máquina pública.
Mais uma fresta que se abre nas estruturas da frágil e venal democracia brasileira assim como na luta contra a corrupção. Quanto mais se facilita a preservação do país nas mãos dos barões-ladrões, que nos governa de acordo com seus interesses, mais escombros e mais ruínas se acumulam. Coisa boa isso não é!
No Parlamento, sempre de forma empírica e racional, lutarei para derrubar as alterações promovidas por esse decreto-mordaça, porque ele favorece a corrupção. No STF o tema já está com a ministra Cármen Lúcia. Nas redes deveríamos todos gritar que queremos o fim da corrupção, não o seu incremento. O novo governo não está entendendo para que ele foi eleito.
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