Co-autor Celso Moreira Ferro Júnior
Quando a sede de um grande evento global é escolhida, caso de uma copa do mundo de futebol ou de uma olimpíada, conforme aconteceu recentemente em relação à Federação Internacional de Futebol (FIFA) e ao Comitê Olímpico Internacional (COI), ambos indicando o Brasil como país sede de tais competições desportivas, os preparativos de segurança podem ter de incluir itens de complexidade eventualmente não-imaginada. A maioria das pessoas pensa em segurança como uma atividade relativamente simples conceitualmente, por mais abrangente que ela possa ser em sua magnitude e respectivo planejamento e implementação. Ela não é assim. A questão é hoje ainda mais complexa, até mesmo do que sua grande magnitude já possa fazer parecer. A atividade de segurança de grandes eventos é essencialmente extensa.
Diante de ameaças como as de conotação nuclear e radiológica (inclusive de conotação terrorista), a já complexa atividade de segurança de grandes eventos deixou de estar circunscrita apenas a sistemas de identificação e credenciamento; de controle de acessos envolvendo sensores e alarmes; de detecção de armas e artefatos explosivos; de atividades proativas de fiscalização e controle por grandes efetivos empregados diretamente em serviços de segurança operados por agentes policiais e especiais, etc. O Portfólio da segurança de grandes eventos abarca também outros componentes mais, comumente fora do alcance intuitivo do grande público -- é o caso da "segurança nuclear e radiológica".
Poderá parecer estranho ou exótico, em um primeiro momento, mas o Brasil e os brasileiros, face o país ir sediar a futura Copa do Mundo de Futebol de 2014 e a 31ª Olimpíada da Era Moderna de 2016, irão presenciar uma estreita parceria entre o Conselho Nacional de Energia Nuclear (CNEN) do governo central do país (Ministério da Ciência e Tecnologia) com seu homólogo global, a Agência Internacional de Energia Atômica (International Atomic Energy Agency -- IAEA).
A IAEA é uma Organização Internacional (OI) especializada da família da Organização das Nações Unidas -- ONU (United Nations). Ela trata, dentre outras questões, do importante tema contemporâneo da segurança nuclear e radiológica, aí incluída a segurança de grandes eventos globais. A IAEA tem sido manchete global nos últimos anos, em face de sua atuação no tocante a suspeitas de estabelecimento de instalações nucleares para fins não-pacíficos na Coréia do Norte, Irã e Iraque.
No Brasil dos próximos sete anos a IAEA vai ser notícia também. Ao longo desses anos vindouros deverão ocorrer intensas atividades preparatórias de planejamento da segurança nuclear e radiológica, tanto da Copa do Mundo de Futebol no Brasil de 2014 quanto das Olimpíadas de 2016 do Rio de Janeiro. As atividades de "segurança nuclear", incluindo a elaboração de planos contingenciais, treinamento de pessoal e simulações realizadas sob os auspícios da IAEA, conforme acontecem via-de-regra serão realizadas fora do escrutínio direto da mídia e do grande público, de maneira coerente com o grande objetivo de minimizar riscos e fortalecer os respectivos mecanismos de prevenção.
Em termos de grandes eventos globais, a questão da segurança nuclear e radiológica envolve meses ou mesmo anos de exaustiva e detalhada preparação no planejamento, treinamento teórico e simulações práticas para aqueles que estarão diretamente envolvidos nas respectivas atividades tático-operacionais. A IAEA, como de praxe, será uma protagonista técnica internacional de tudo isso, interagindo com seu homólogo brasileiro e organizações locais envolvidas diretamente nos grandes eventos por acontecer.
O órgão homólogo brasileiro da IAEA é a Comissão Nacional de Energia Nuclear -- CNEN. Também deverão interagir com a CNEN/IAEA os órgãos técnico-acadêmicos nacionais, de inteligência, bem como forças policiais e de defesa civil, tanto estaduais quanto federais. De maneira específica, a IAEA baseia a segurança nuclear e radiológica de grandes eventos na possibilidade ou risco de exposição radioativa nuclear das multidões de milhares de pessoas que acorrem a esses grandes eventos globais ou seus locais de realização. Tendo isso em conta, os fatores de risco correspondentes no Brasil serão estudados, avaliados e monitorados pela comunidade técnico-científica e de inteligência do país, sob a assistência técnica proporcionada pela cooperação internacional IAEA/CNEN.
Ficarão assim determinadas e indicadas, para as organizações locais e federais envolvidas na preparação e responsabilidade pelas atividades de segurança, as melhores práticas de prevenção, contenção e "resposta coordenada" a serem desenvolvidas em termos de segurança nuclear e radiológica dos futuros eventos de 2014 e 2016. Em tal contexto estarão incluídas, inclusive, atividades de planejamento, treinamento e instrução para um eventual emprego de técnicos civis, policiais e bombeiros envolvidos na coordenação e controle de incidentes nucleares e radiológicos, incluindo até mesmo os chamados "esquadrões anti-bomba".
É de esperar que as missões de assessoria técnica internacional da IAEA no Brasil abranjam temas como (i) os vários aspectos da detecção e controle de radiação; (ii) as diferentes medidas de proteção contra os efeitos da radiação, bem como; (iii) as atividades de pronta-resposta em situações de emergência nuclear. Assim aconteceu em relação aos eventos globais mais recentemente realizados no mundo, os 29ºs Jogos Olímpicos em Beijing, China, de 2008; os 15ºs Jogos Pan-Americanos realizados no Rio de Janeiro em 2007; a Copa do Mundo de Futebol na Alemanha de 2006 e; os 28ºs Jogos Olímpicos em Atenas, Grécia, de 2004.
As atividades de assessoria técnica internacional da IAEA incluem, mas não se restringem aos grandes eventos globais contemporâneos, no que tange o tema permanente da segurança nuclear e radiológica. A segurança nuclear e radiológica, de maneira geral, é parte do mandato da IAEA como Organização Internacional (OI) especializada da família de OIs da ONU. O Escritório de Segurança Nuclear (Office of Nuclear Security -- ONS) da IAEA (sediada em Viena, Áustria) lida rotineiramente com os países que fazem parte da ONU em situações como a realização de grandes eventos globais. Os instrumentos desenvolvidos pela IAEA na área de cooperação internacional incluem estudos, publicação e distribuição de manuais para orientação em questões de segurança nuclear; realização de conferências e consecução de atividades de treinamento, incluindo cursos, seminários e workshops.
Em última instância, as atividades dessa OI especializada -- a IAEA -- estão voltadas permanentemente para o estabelecimento de infra-estruturas nacionais de proteção nuclear e radiológica. Isso inclui a prevenção contra o desvio de materiais radioativos; a proteção de instalações e sistemas de transportes do setor; a prevenção de sabotagens; bem como o controle e contenção do tráfico ilícito de material nuclear. Por tudo isso, a AIEA e seus acordos de cooperação internacional são algo intrínseco ao planejamento e realização de grandes eventos globais.
Foi assim que ocorreu quando dos Jogos Pan-Americanos de 2007 no Rio de Janeiro. No âmbito do convênio com o Brasil, então realizado, a OI especializada cedeu equipamentos de monitoramento à CNEN, bem como ofereceu treinamentos específicos para eventos de grandes dimensões. Segundo declarações, à época, do presidente da CNEN, "o acordo assinado é um exemplo das intenções da Comissão, como a instituição reguladora do setor, em assegurar o uso pacífico e seguro da energia nuclear no Brasil. E para atingir este objetivo, conta com o permanente e frutífero diálogo com a AIEA." A atuação da CNEN/AIEA durante o Pan/2007 voltou-se primordialmente para as atividades de prevenção, identificação e atendimento a eventuais incidentes com materiais nucleares e radioativos (felizmente não acontecidos). A Comissão apoiou a Coordenação das Ações de Segurança dos Jogos Pan-Americanos, tendo como foco os locais de competição, a Vila Olímpica e os aeroportos. Equipes de resposta a emergências (da Força Nacional de Segurança Pública) estiveram em condições de pronto emprego durante o transcurso de todo evento.
O Brasil, de maneira discreta e praticamente invisível cumpriu esse importante papel com a nação e a comunidade internacional. A segurança e prevenção nuclear já são do domínio, portanto, do Estado Brasileiro. E não poderia ser diferente, já que cada país precisa desenvolver tais especialidades enquanto parte da comunidade global, em tempos de translocalização não só de eventos globais, mas também do crime e da violência. Angelo Reyes, quando Secretário de Defesa das Filipinas (2001-2003), já pontificava: "Diferentes países possuem diferentes situações peculiares, realidades, realidades políticas e realidades demográficas que limitam sua capacidade de responder ao que existe de ameaçador no terrorismo. Por isso precisam calibrar suas respostas, já que diferente disso, a 'cura' pode ser pior do que a doença."
28 de outubro de 2009
Doutor pela "The George Washington University" (GWU) Washington, D.C, EUA. Ex-Agente da Segurança Pública (Tenente-Coronel Reformado da Polícia Militar do Distrito Federal - PMDF). Ex-Coordenador de pós-graduação em Gestão da Segurança Pública do Núcleo de Estudos em Segurança Pública (NUSP) da UPIS - Faculdades Integradas e ex-Coordenador para Assuntos de Segurança Pública do Núcleo de Estudos em Defesa, Segurança e Ordem Pública (NEDOP) do Centro Universitário UNIDF. Blog: http://blogandoseguranca.blogspot.com/
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DANTAS, George Felipe de Lima. A Complexidade da Segurança de Grandes Eventos Globais: Segurança Nuclear e Radiológica Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 01 nov 2009, 11:26. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/coluna/423/a-complexidade-da-seguranca-de-grandes-eventos-globais-seguranca-nuclear-e-radiologica. Acesso em: 24 nov 2024.
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