O nosso processo legislativo, submetido ao regime de votação nas duas casas do Congresso Nacional, é bastante moroso. Não consegue acompanhar a dinâmica da evolução social, impondo-se interpretação dos textos à luz a realidade vigente.
Inúmeros preceitos constitucionais dependem de regulamentação por via de lei complementar ou de lei ordinária. Para suprir essa omissão legislativa, às vezes, a Corte Suprema tem agido como legislador positivo que, de rigor, implica violação do princípio da separação dos Poderes.
Por outro lado, as normas processuais, bem como as normas de natureza tributária são produzidas por atacado, aos montes, estas últimas como decorrência das Medidas Provisórias. Os casos de urgência e relevância (art. 62, da CF) já se incorporou na rotina do legislador palaciano contando a conivência do Poder Legislativo, cujos membros aproveitam o rito privilegiado da tramitação do projeto de lei de conversão para enxertar matérias de seu interesse, às vezes, sem qualquer conexão com a matéria originalmente regulada pela medida provisória.
O excesso de instrumentos normativos nas áreas do processo civil, cujo estatuto vem sendo remendado a todo instante, e do direito tributário está tornando caótica a nossa legislação, afetando o princípio da segurança jurídica a refletir na ação dos operadores do direito que se deparam com problemas técnicos antes inexistentes, trazendo à baila intermináveis discussões acerca da vigência e aplicação da lei no tempo. Criar uma montanha de normas para resolver os problemas existentes, que resultaram precisamente da inaplicação de preceitos legais existentes, não é uma boa solução. É preciso que as leis conformadas com os textos constitucionais sejam efetivamente aplicadas para todos e contra todos, com o afastamento liminar daquelas desconformes.
Temos, também, a produção de leis desnecessárias ou inúteis. Leis que fixam datas comemorativas, leis que instituem homenagens às diversas categorias profissionais, leis interpretativas usurpando as funções da doutrina e da jurisprudência e leis que chovem no molhado.
Nesta última categoria podemos citar a recente Lei de nº 12.120, de 15-12-2009 que, a pretexto de facilitar a aplicação da Lei nº 8.429/92, lei que define os atos de improbidade administrativa, inseriu duas alterações irrelevantes, ao invés de procurar fazer uma reformulação mais profunda na citada lei, regulando melhor o processo judicial, por exemplo, para tornar efetivas as sanções nela previstas.
A primeira alteração ocorreu no caput do art. 12 permitindo a aplicação isolada ou cumulativa das sanções previstas, como se isso já não estivesse implícito no texto. Tem caráter interpretativo. Parece óbvio que de inúmeras sanções previstas o juiz somente aplicará aquelas pertinentes a cada caso concreto e desde que comprovada a infração. Não teria sentido, por exemplo, cassar o mandato de um ex Prefeito a pretexto de que essa sanção consta da lei.
A outra modificação padece de vício pior. Como se diz na gíria, simplesmente, choveu no molhado. Acrescentou uma expressão do inciso I, do art. 21 que prescreve:
“Art. 21. Aplicação das sanções previstas nesta lei independe:
I – da efetiva ocorrência de dano a patrimônio, salvo quanto à pena de ressarcimento”.
A expressão final acrescida pela Lei nº 12.120/2009 é absolutamente desnecessária pela simples razão de que o ressarcimento pressupõe dano ao patrimônio público, como de resto já está expresso no inciso I, do art. 12 da Lei nº 8.429/92 que capitula diversas penalidades, dentre as quais, a de “ressarcimento integral do dano, quando houver”.
Embora aplaudida a iniciativa legislativa por alguns especialistas, como se vê da repercussão na mídia, é lamentável que o Legislativo gaste o precioso tempo com elaboração e aprovação de leis da espécie, em prejuízo de outras urgentes e necessárias para conferir eficácia a normas constitucionais de eficácia contida.
SP, 5-3-2010.
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