Dentre as várias alterações promovidas no ordenamento jurídico brasileiro pela Lei 12015/09 destaca-se a criação do chamado “Estupro de Vulnerável” ora previsto no artigo 217 – A, CP. Neste trabalho será explorado o problema da aplicação desse dispositivo quando disser respeito à prática de atos libidinosos consensuais envolvendo menores.
Não é problemático o caso em que um adolescente estupra com violência real outro adolescente, seja ele menor de 14 anos ou não. Havendo a violência real o ato infracional é indiscutível, configurando estupro ou estupro de vulnerável a depender da condição da vítima.
Entretanto, se um menor pratica atos libidinosos com outro menor de forma consensual, sendo que um deles ou ambos são menores de 14 anos a questão se complica, podendo configurar, nas palavras de Salvador Neto, uma situação – limite denominada de “estupro bilateral”. Nesses casos as circunstâncias em cotejo com o ordenamento legal indicariam a absurda conclusão de que um menor estaria estuprando o outro concomitantemente. Analisem-se alguns exemplos práticos:
1)Um garoto de 15 anos namora uma menina de 13 anos. Eles, consensualmente, trocam carícias sensuais e beijos lascivos durante o namoro. Como a menina tem menos de 14 anos, o rapaz estaria praticando ato infracional equivalente ao estupro de vulnerável!
2)Dois adolescentes de 12 anos namoram e mantém consensualmente relações sexuais. Ambos estariam praticando ato infracional de estupro de vulnerável um contra o outro!
Os exemplos poderiam se multiplicar e demonstrariam o contrassenso ou a falta de bom senso de certas responsabilizações infracionais acaso a legislação seja aplicada de forma inflexível. Nas palavras de João Batista Costa Saraiva: “em matéria de relacionamento sexual entre adolescentes, a nova regra do artigo 217 - A, CP exagera em face da realidade do país e de nossa adolescência, podendo criminalizar a conduta de muitos adolescentes e pré – adolescentes na descoberta de sua sexualidade”. Portanto, urge encontrar uma fórmula capaz de domesticar o excessivo rigor do artigo 217 – A, CP acaso aplicado “dura lex sed lex” para certas situações de supostos atos infracionais que envolvam atos libidinosos consensuais perpetrados entre crianças e/ou adolescentes de idades próximas ou idênticas, normalmente envolvidos em relacionamentos amorosos.
É bem verdade que a legislação em si não apresenta uma solução adequada para tais circunstâncias. No entanto, é possível encontrar na legislação comparada um caminho de abrandamento do rigor legal bem lembrado por João Batista Costa Saraiva em artigo publicado pelo Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. O referido autor apresenta o precedente da Suprema Corte do Estado da Geórgia, aplicando a chamada “Romeo and Juliet Law”. Ocorre que nos Estados Unidos da América do Norte, em vários Estados, o sexo consentido entre menores de 18 anos é criminalizado. No entanto, com o tempo se verificou que a aplicação pura e simples da norma sobredita conduzia a exageros punitivos, razão pela qual se editou uma legislação visando conter o furor da irracionalidade penal. Tal lei, apelidada de “Romeo and Juliet Law”, afasta a criminalização em todos os casos nos quais os envolvidos não tenham uma diferença de idade superior a cinco anos. Este parâmetro ofertado pela legislação e jurisprudência alienígenas certamente pode servir de base para uma orientação dos operadores do direito na aplicação comedida da regra penal contida no artigo 217-A, CP quando envolva sexo consensual entre menores.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
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