Resumo: O texto analisa a constitucionalidade da Lei Municipal nº 4.785/2008, vigente na Cidade do Rio de Janeiro e que garante a habitação de animais em condomínios.
Palavras-chave: animais – condomínio – propriedade – intimidade – assembléia – vizinhança – constituição – competência legislativa
A presença de animais em apartamentos sempre foi causa de discussões entre vizinhos. Por esse motivo, no Rio de Janeiro, se constata que os animais têm recebido especial atenção por parte do legislador. A mais recente, a Lei Municipal n° 4.785, foi a que mais ousou na matéria ao garantir a habitação de animais domésticos em unidades residenciais e apartamento de condomínios.
Em resumo, a Lei n° 4.785 determina que: (I) animais domésticos de qualquer porte são permitidos, mas a circulação deles em áreas comuns é regulada pela assembléia, aprovada por mais da metade de todo o condomínio; e (II) animais domésticos ferozes devem ser autorizados pela assembléia, e a circulação deles em áreas comuns é também é regulada pela assembléia.
Sobre o tema, o Enunciado n° 14.7.1, aprovado pelo Encontro de Juízes de Juizados Especiais Cíveis e Turmas Recursais do Rio de Janeiro (Aviso TJ/RJ n° 23/2008), expõe o entendimento que tem sido aceito nos tribunais: “A convenção condominial que proíbe a permanência de animais domésticos no prédio ou em apartamento, deve ser interpretada com bom senso e em consonância com o direito de propriedade, admitindo-se a presença daqueles de pequeno porte que não causem incômodo ou risco à segurança, sossego e à saúde dos vizinhos”.
Mas, embora a lei citada tenha repetido parcialmente o entendimento que prevalece nos tribunais brasileiros, verifica-se que o legislador municipal cometeu diversos equívocos que, inclusive, resultam na inconstitucionalidade de alguns artigos da lei.
O art. 1° da lei só concede direito de manter animais domésticos ao proprietário e ao inquilino, não mencionando outras categorias de possuidores ou cessionários de direitos reais. Essa omissão do legislador deve ser suprida pelo bom senso do intérprete da lei, que deve admitir a extensão do direito aos demais possuidores ou cessionários de direitos reais, pois não é razoável conceder tal direito ao inquilino e não prestigiar, por exemplo, o usufrutuário, o comodatário, o promitente comprador ou o enfiteuta.
O primeiro vício de constitucionalidade é encontrado no art. 2°. Ao determinar que a circulação de animais nas áreas comuns do condomínio ficará a cargo de decisão da assembléia geral, tomada pela maioria absoluta dos condôminos (mais da metade de todo o condomínio, não só os presentes à assembléia), a lei municipal usurpa função exclusiva de lei federal. Pois o art. 22, I, da Constituição Federal confere somente à União a competência de legislar sobre Direito Civil e, ao estipular um quorum de maioria absoluta para a aprovação da matéria, a lei municipal excede seus limites, uma vez que é o Código Civil Brasileiro (Lei Federal n° 10.406/2002) que rege condomínios edilícios.
Da mesma forma, o artigo 4° da lei também afronta a Constituição, tendo em vista que atribui à assembléia do condomínio a responsabilidade de permitir ou não animais domésticos ferozes. Ou seja, pela leitura dos arts. 2° e 4°, seria passível de invalidação judicial a cláusula de convenção ou regimento interno que atribui ao síndico ou ao conselho consultivo a tarefa de tal permissão, assim como o regulamento das áreas comuns aprovado pela maioria simples da assembléia.
Por fim, muito embora o intuito da Lei Municipal n° 4.785 seja louvável, verifica-se que os arts. 2° e 4° são inconstitucionais, uma vez que tratam de matéria cuja competência é exclusiva da União, não cabendo ao Município editar normas relativas ao Direito Civil, incluindo competência e forma de aprovação de matérias pelas assembléias de condomínios edilícios.
Precisa estar logado para fazer comentários.