“A relação laboral tutelada faz do governo o avalista da relação contratual (...)”.
O universo da justiça laboral é repleto de contrariedades, com situações pontuais que espelham a insegurança na sua estrutura administrativa e jurídica. Isso ocorre quando o direito do trabalhador é vilipendiado em situações de praticas nocivas ao trabalho, porque este judiciário não detém o poder de processar criminalmente o empregador que comete delito trabalhista. Esta situação, apesar de não parecer essencial para as relações de trabalho, (e por essa razão não avançou), no sentido de garantir a competência ao juiz trabalhista, requer no espírito da nova competência (EC 45/2004) seja revista. O fato é que data venia, há muito este instituto, deveria ser também atribuição do julgador a quo, porque em permanente contato com as partes, depara-se com situações explicitas de crime contra o trabalho, a exemplo a apropriação indébita do empregador da parcela previdenciária (INSS) que é descontada no contra-cheque do trabalhador, sendo este item reivindicado pelo reclamante. Para os defensores do formalismo processual, reservamos o abrigo legal contido na Carta Magna no seu art. 5º, inciso LIV: "ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal", sendo o caminho da apuração do fato, a partir dos documentos existentes na ação trabalhista para promoção do “due process of law”, (devido processo legal).
A Emenda Constitucional nº 45/2004, não trouxe para a jurisdição trabalhista este avanço, muito embora seja latente a necessidade de especialização do Judiciário para o trato de tal relevante matéria, até porque, não se pode permitir que o empregador relapso saia ileso de uma audiência, quando é detectado o ilícito, estando ali, o conjunto de provas, (testemunhal e material), a respaldar o juízo no caso de uma decisão. Em que pese o legislador não ter avançado neste sentido, ainda que posterior deve clamar pela inclusão da competência criminal na JT, mesmo que este se obrigue ao encaminhamento da execução da sentença criminal ao juízo mais afeto. O juiz do Trabalho está investido de jurisdição no local dos fatos, sob ditame do artigo 307 do CPP, pode enquanto o juiz comunicar aos órgãos competentes a ocorrência de delito nos autos do processo (artigo 40 do CPP), pode dar voz de prisão, inclusive à testemunha que comete delito de falso testemunho ou em caso de desacato à sua autoridade. Como destaca Guilherme Guimarães Feliciano: “Os juízos do Trabalho exercitam, todavia, funções penais periféricas de ordem correcional e administrativa, que podem ser condensadas em três paradigmas, a saber, os institutos penais afins, o dever de noticiar (notícia-crime judicial compulsória – artigo 40 do CPP) e a prisão em flagrante”.
Existem alem da já mencionada questão previdenciária, outras lides criminais decorrentes de relação de trabalho em tramitação no judiciário federal e estadual. O Código Penal o Título IV dispondo sobre os crimes cometidos contra a Organização do Trabalho, artigos 197 a 207, mostra esta amplitude no campo laboral a exemplo do atentado contra a liberdade de contrato de trabalho e boicotagem violenta; contra a liberdade de associação; a liberdade de trabalho; paralisação de trabalho, seguida de violência ou perturbação da ordem; paralisação de trabalho de interesse coletivo; invasão de estabelecimento industrial, comercial ou agrícola, sabotagem; frustração de direito assegurado por lei trabalhista; frustração de lei sobre a nacionalização do trabalho; exercício de atividade com infração de decisão administrativa; aliciamento para o fim de emigração e aliciamento de trabalhadores de um local para outro do território nacional. No entanto, em que pese o enorme elenco, lembrando a competência para executar a conta previdenciária, no meu entendimento torna-se mister este jurisdicionado para formatar crime de apropriação. O fato é que existe no seio da comunidade trabalhista uma discussão permanente (até inócua) sobre a necessidade de existência de Justiça especializada ampliada utilizando os dispositivos de processualismo criminal, nas questões em que detectar a prática nociva à relação de trabalho.
Enquanto o debate em torno da complexidade das decisões na lides trabalhistas avança no sentido de procurar deter os exageros, é preciso olhar pela insegurança jurídica encontrada na rotina das decisões contra empregadores. Eis que algumas são de enorme interesse social, outras infelizmente, equivocadas, entre as quais a manutenção de leilões e praças sem julgar recursos estribados no apelo legal do artigo 1.052 do CPC que manda cessar a execução para julgar o mérito da ação que interfere neste processo, no caso de embargos, "Art. 1046. Quem não sendo parte no processo, sofrer turbação ou esbulho da posse de seus bens por ato de apreensão judicial, em casos como o de penhora, depósito, arresto, seqüestro, alienação judicial, arrecadação, arrolamento, inventário, partilha, poderá requerer que lhes sejam manutenidos ou restituídos por meio de embargados”. “§ 1º Os embargos podem ser de terceiro senhor e possuidor, ou apenas possuidor”." Lembrando ainda que este pode ser cominado com o "Art. 1048. Os embargos podem ser opostos a qualquer tempo no processo de conhecimento, enquanto não transitada em julgado a sentença, e, no processo de execução, até cinco dias depois da arrematação, adjudicação, ou remissão, mas sempre antes da assinatura da respectiva carta."
Por outro quanto à penhora de renda pelo valor bruto da execução, em contraste ao adotado nos TRTs e ignorado pelo primeiro grau, decisão, a saber: “Para não dificultar subsistência de empresa, o TRT de Campinas admite a penhorabilidade do seu faturamento em caso de ausência de outros bens, desde que seja o faturamento líquido”. (Proc. 02036-2004-000-15-00-8-MS) Rel. juiz Luiz Carlos Cândido Martins Sotero da Silva.
Fragale e Rezende ensinam que: (...), “porquanto a força de trabalho já foi despendida pelo trabalhador, não sendo possível o retorno à situação anterior”. Existem no país, 65 milhões de pessoas vivem na informalidade, em meio a esta anomalia, o exemplo da causa/efeito é do micro empresário condenado pela JT a pagar uma indenização de R$ 15 mil a um ex-funcionário, ele decidiu encerrar formalmente sua empresa - uma pizzaria -, mas continuar no negócio formalmente. Alegou desconhecimento da lei, havia registrado o funcionário seguindo uma regra trabalhista já extinta, mas hoje na informalidade, disse não ter medo de uma fiscalização. "Se ocorrer, eu regularizo a situação”. Trata-se de uma irregularidade, um retrocesso social para empregado e empregador, este relato aconteceu durante a realização do evento: "Riscos e Oportunidades de Empreender no Brasil", promovido pela Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e pela seccional paulista da OAB-SP, que reuniu empresários e juristas para debater a chamada insegurança jurídica no país. Na verdade a JT está mal, o executado sob pressão também, o ex-empregado idem, e o que fazer? Entendeu o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que instituindo o I Prêmio Conciliar é Legal, (práticas de conciliação individuais ou em grupos que contribuam para a pacificação de conflitos e para a modernização da Justiça brasileira), que premiando, resolve, atenua, é mais um paliativo, o problema não é este, está na sua essência e não na fórmula, é a cultura da morosidade fecundada na JT.
É necessário rever posicionamentos inadequados
A Justiça do Trabalho em sua origem não tinha o apego à formalidade, era pelo principio da oralidade, seus idealizadores e legisladores a moldaram com o ideal de justiça, para estabilizar as relações de trabalho, mas não imaginaram as conseqüências e os desdobramentos que aquelas regras sociais tão importantes iriam provocar quando nas mãos de pseudomodernistas embevecidos de poder estatal mudariam seu texto. A química deste projeto social laboral (resguardada a devida proporção) tem hoje o mesmo efeito da “Bomba Atômica”, porque segundo frase do cientista Albert Ainstein, “A liberação da energia atômica mudou tudo, menos nossa maneira de pensar”. Senão vejamos uma de suas impropriedades: a própria Carta Laboral no seu artigo 878 confere ao juiz o poder de promover a execução, sem a necessária tutela da parte, “jacta alea est”, mas o grande problema é a materialização deste suporte legal, e quase sempre este é desvirtuado por exagero ou por desprezo do seu manejo. Faltam subsídios, a indicação dos bens, se fazendo necessário requerer dados da Fazenda Pública, dos cartórios de registro, bancos e financeiras. Entregar para o juízo do trabalho, a tarefa de colher informações para executar é tão impróprio, quando o magistrado decidir matéria contrária à regra processual.
Muitos questionam, se existe a necessidade de uma execução inviabilizar um negócio, quando determinada de forma abrupta e violenta a ponto de causar um mal social maior, podendo o juízo propor a solução da lide, através de medidas que não gere dano irreparável ao empregador, até porque no negócio podem existir outros que poderão sofrer ao lado deste as conseqüências da constrição, ocasionando o atraso no recebimento de salário, e até mesmo a perda do emprego.
Isolada das demais justiça a JT é protegida por blindagem própria, e dessa forma não admite a interferência das Súmulas editadas pelo TST, jurisprudências dos tribunais de segunda instância e a integra das mudanças introduzidas pelo novo CPC e a Lei n° 11.232/2000. A relação laboral tutelada faz do governo o avalista da relação contratual, por conseqüência este tem a responsabilidade de fiscalizar com afinco e assim manter a relação profícua e vantajosa para o empregador que produz, o trabalhador que se mantém, estável socialmente. É fato que o Estado precisa dinamizar este conjunto produtivo, que é data maxima venia o principal alicerce da sua estabilidade econômica. Ocorre que sem a maestria dos integrantes da especializada, primado pela estabilidade nas relações e o perfeito equilíbrio do social laborativo, social produtivo, dificilmente o governo atingirá seu objetivo de pleno social.
Enquanto a legislação trabalhista continuar prevendo sem critério a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil (CPC), quando se trata de dano moral, entre outros, em razão da não anotação da CTPs e de faltas cometidas contra o empregado, com o acréscimo da ausência de anotações, retenção da CTPs derivadas da relação laboral no curso do contrato, esta parcela indenizatória será sempre alta. Admite-se que está não é a solução, as praticas lesivas continuam sendo cometidas, e cada vez mais, os mal segue ganhando novos formatos e variedades, a exemplo do constrangimento aplicado com castigos humilhantes, formação de lista “negra”, para frear contratação de trabalhadores que ingressaram com ação trabalhista, consultas a órgão de restrição ao crédito entre outros meios lesivos. Assim este modelo de penalidade pecuniária, embora pedagógica, não atinge seus efeitos, da mesma forma que este não pode ser cumprido por micros e pequenos empregadores, que se já não dispõe de verba para pagar a execução, de que adianta aumentar seu custo, aplicando penalidade de dano moral? Não seria este o caso típico de constrição criminal?
Vejamos o caso em que a 3ª Turma do TST não conheceu do recurso de revista (RR), da reclamada, numa ação em que uma ex-funcionária do Banco do Brasil, que foi vítima de assédio moral por parte do gerente de uma agência em Cuiabá (MT) para cumprir metas, receberá indenização no valor de R$ 100 mil por assédio moral. Ao analisar o pedido, o Juízo de primeiro grau tinha condenado a empresa ao pagamento R$ 50 mil de indenização. Inconformado com essa decisão, o BB recorreu ao TRT-23. A trabalhadora, por sua vez, também recorreu ao TRT23, insatisfeita com o valor da indenização, que considerou baixo e o tribunal majorou a indenização para R$ 100 mil. Assim, a Turma, ao seguir o voto do relator, decidiu, por unanimidade, não conhecer do recurso de revista do BB. (Proc. n.º 143400-27.2008.5.23.0002). estamos diante de um caso em que a reclamada é um dos maiores Bancos do mundo, sendo assim, não se pode aplicar a mesma regra em se tratando de um micro ou pequena empresa, ambas não suportariam o alto valor da sentença. Outro dispositivo agressivo, veio com a Lei nº 11.382/06 alterou o Código de Processo Civil (CPC), criando o artigo 655-A, legalizando a penhora on-line, mas seguindo a regra dos tribunais (jurisprudências e súmulas), esta deve recair até o limite de 30% da renda do executado, mas isso não é obedecido na JT.
Foi diretor de Relações Internacionais da Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT), editor do Jornal da Cidade, subeditor do Jornal Tribuna da Imprensa, correspondente internacional, juiz do trabalho no regime paritário, tendo composto a Sétima e Nona Turmas e a Seção de Dissídios Coletivos - SEDIC, é membro da Associação Brasileira de Imprensa - ABI, escritor, jornalista, radialista, palestrante na área de RH, cursou sociologia, direito, é consultor sindical, no setor privado é diretor de RH, especialista em Arbitragem (Lei 9.307/96). Membro da Associação Sulamericana de Arbitragem - ASASUL, titular da Coluna Justiça do Trabalho do jornal "Tribuna da Imprensa" do RJ, (Tribuna online), colunista da Tribuna da Imprensa online), no judiciário brasileiro.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PINHO, Roberto Monteiro. Insegurança jurídica da JT é preocupante Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 02 nov 2010, 08:33. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/coluna/740/inseguranca-juridica-da-jt-e-preocupante. Acesso em: 25 nov 2024.
Por: Carlos Nogueira
Por: Andrea Lury
Por: Roberto Monteiro Pinho
Por: Roberto Monteiro Pinho
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