Quem ainda não se viu prestes a atropelar ou ser atropelado no trânsito por um daqueles ciclomotores, que respire fundo e se proteja, pois você a qualquer momento estará prestes a entrar para esse rol.
Popularmente conhecido como “cinquentinha”, esse veículo se tornou febre em todas as cidades, visto o seu baixo preço, baixíssimo consumo de combustível e a errônea informação de que não há a necessidade do condutor ser habilitado para pilotá-la. Com a falsa informação, esses veículos são vendidos diariamente a qualquer pessoa, inclusive sendo comercializados em lojas de eletrodomésticos, principalmente importados da China.
Vemos esses veículos serem pilotados por pessoas descapacitadas para tanto, o que trás ao trânsito um estado de insegurança perene. Dezenas de acidentes são registrados envolvendo esses veículos. Em 90% das situações, a ocorrência vislumbra a culpa do piloto do ciclomotor.
Isso porque o piloto, normalmente pessoa não capacitada para conduzir esse veículo, não possui instrução suficiente para circular nas vias de trânsito comuns. Na verdade, esses pilotos desconhecem a legislação de trânsito e por acreditarem na falsa informação da desnecessidade da habilitação e, também, da desnecessidade do emplacamento do veículo, acreditam estarem fora do alcance da legislação de trânsito e mesmo da legislação penal.
Isso é um erro! Vamos explicar.
Ciclomotores, segundo o Código de Trânsito Brasileiro é o veículo de duas ou três rodas, provido de um motor de combustão interna, cuja cilindrada não exceda a cinqüenta centímetros cúbicos e cuja velocidade máxima de fabricação não exceda a cinqüenta quilômetros por hora.
Na seara legal encontramos estabelecido que para se conduzir veículo automotor, necessário se faz que seu condutor obtenha um desses documentos:
1- Permissão para Dirigir;
2- LADV - Licença de Aprendizagem de Direção Veicular
3- CNH - Carteira Nacional de Habilitação;
4- ACC - Autorização para Conduzir Ciclomotores;
O art. 141 do CTB dispõe:
O processo de habilitação, as normas relativas à aprendizagem para conduzir veículos automotores e elétricos e à autorização para conduzir ciclomotores serão regulamentados pelo CONTRAN.
Segundo a resolução nº 168 do CONTRAN, fica estabelecido quanto ao processo de habilitação do condutor de veículo automotor:
Art. 2º
O candidato à obtenção da Autorização para Conduzir Ciclomotor – ACC, (...), solicitará ao órgão ou entidade executivo de trânsito do Estado ou do Distrito Federal, do seu domicílio ou residência, ou na sede estadual ou distrital do próprio órgão ou entidade, a abertura do processo de habilitação para o qual deverá preencher os seguintes requisitos:
I – ser penalmente imputável;
II – saber ler e escrever;
III – possuir documento de identidade;
IV – possuir Cadastro de Pessoa Física – CPF.
Ainda, para se obter a Autorização para Conduzir Ciclomotor, ACC, além de ser maior de 18 anos, saber ler e escrever, ter RG e CPF, deve o candidato ser submetido, conforme o art. 3º do mesmo diploma legal, a:
· Avaliação Psicológica, preliminar e complementar, quando da primeira habilitação;
· Avaliação de Aptidão Física e Mental;
· Avaliação escrita, sobre a integralidade do conteúdo programático, desenvolvido em Curso de Formação para Condutor;
· Avaliação de Direção Veicular, realizado na via pública, em veículo da categoria para a qual esteja se habilitando.
O Código de Trânsito Brasileiro continua estabelecendo:
Art. 54.
Os condutores de motocicletas, motonetas e ciclomotores só poderão circular nas vias:
I - utilizando capacete de segurança, com viseira ou óculos protetores;
II - segurando o guidão com as duas mãos;
III - usando vestuário de proteção, de acordo com as especificações do CONTRAN.
Art. 55.
Os passageiros de motocicletas, motonetas e ciclomotores só poderão ser transportados:
I - utilizando capacete de segurança;
II - em carro lateral acoplado aos veículos ou em assento suplementar atrás do condutor;
III - usando vestuário de proteção, de acordo com as especificações do CONTRAN.
O CTB além de disciplinar quem pode conduzir os ciclomotores, disciplina onde estes estão autorizados a circular, vejamos:
Art. 57.
Os ciclomotores devem ser conduzidos pela direita da pista de rolamento, preferencialmente no centro da faixa mais à direita ou no bordo direito da pista sempre que não houver acostamento ou faixa própria a eles destinada, proibida a sua circulação nas vias de trânsito rápido e sobre as calçadas das vias urbanas.
Parágrafo único. Quando uma via comportar duas ou mais faixas de trânsito e a da direita for destinada ao uso exclusivo de outro tipo de veículo, os ciclomotores deverão circular pela faixa adjacente à da direita.
Quanto ao requisito de registro e consequente licenciamento do veículo, discorre o CTB em seu art. 129 que a regulamentação para tanto obedecerá legislação municipal. O órgão de trânsito de sua cidade este atento a este dispositivo legal?
No quesito infração e penalidades no trânsito, estabelece o CTB:
Art. 244.
Conduzir motocicleta, motoneta e ciclomotor:
I - sem usar capacete de segurança com viseira ou óculos de proteção e vestuário de acordo com as normas e especificações aprovadas pelo CONTRAN;
II - transportando passageiro sem o capacete de segurança, na forma estabelecida no inciso anterior, ou fora do assento suplementar colocado atrás do condutor ou em carro lateral;
III - fazendo malabarismo ou equilibrando-se apenas em uma roda;
IV - com os faróis apagados;
V - transportando criança menor de sete anos ou que não tenha, nas circunstâncias, condições de cuidar de sua própria segurança:
Infração - gravíssima;
Penalidade - multa e suspensão do direito de dirigir;
Medida administrativa - Recolhimento do documento de habilitação;
(...)
§ 1º (...)
b) transitar em vias de trânsito rápido ou rodovias, (...);
§ 2º Aplica-se aos ciclomotores o disposto na alínea b do parágrafo anterior:
Infração - média;
Ou seja, a legislação existe e disciplina o uso dos ciclomotores, um vírus que, se não fiscalizado de per si, se espalhará trazendo conseqüências ainda mais relevantes ao trânsito e aos pedestres.
Porém, é patente a falta de informação dos próprios órgãos fiscalizadores, uma vez que seus agentes(trânsito, polícia e afins) desconhecem por completo a legislação, fomentando de forma omissiva a proliferação do vírus ciclomoror.
Em que pese a legislação criminal ser omissa quanto à falta de Autorização para Conduzir Ciclomotor, no tocante ao crime previsto no art. 309 do CTB (Dirigir veículo automotor, em via pública, sem a devida Permissão para Dirigir ou Habilitação ou, ainda, se cassado o direito de dirigir, gerando perigo de dano), que comina pena de detenção de seis meses a um ano, vislumbramos a ocorrência do crime previsto no art. 132 do Código Penal, qual seja, “Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente”, cominando pena de detenção de três meses a um ano.
O crime do art. 132 do CP é cometido quando se expõe a vida de outrem a perigo direto e iminente. O condutor do ciclomotor que não possua a Autorização para Conduzir Ciclomotor, se enquadra perfeitamente na tipificação legal, expondo, provocando, submetendo a vida de outrem a perigo direto e iminente.
Dessa forma, concluímos que o fato de pilotar ciclomotor sem a devida Autorização para Conduzir Ciclomotor, além de ser passível a apreensão do veículo, por analogia lógica, enseja também a condução e a conseqüente apresentação do piloto junto à autoridade policial, em virtude de flagrância.
Enquanto as autoridades competentes e seus agentes de campo desconhecerem a legislação, cabe ao cidadão, refém da ignorância legislativa, vacinar-se contra esse, ainda, virulento meio de locomoção, mantendo-se a máxima distância deles.
José Ricardo Chagas
05.2011.
Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino; Especialista em Ciências Criminais e Especialista em Segurança Pública pela Universidade do Sul de Santa Catarina; Bacharel em Direito pela Universidade Estadual de Santa Cruz; Criminalista; Consultor e Parecerista; Professor de Direito Processual Penal e de Direito Penal da Faculdade Unime/Iuni e da Faculdade CESUPI; autor do livro Direito da Execução Penal: nova interpretação e novos comentários à Lei 7.210, publicado em 2012.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CHAGAS, José Ricardo. Da inabilitação pertinente para conduzir ciclomotor - crime Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 21 maio 2011, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/coluna/920/da-inabilitacao-pertinente-para-conduzir-ciclomotor-crime. Acesso em: 25 nov 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
Por: Adel El Tasse
Por: Sidio Rosa de Mesquita Júnior
Por: Eduardo Luiz Santos Cabette
Precisa estar logado para fazer comentários.