1 - INTRODUÇÃO
É o direito do empregador de alterar de forma impositiva e unilateral as condições de trabalho do empregado, visando fazer modificações relativas à prestação do serviço. Esse direito decorre do poder diretivo do empregador e tem como finalidade adequar o trabalho do empregado às transformações sociais e econômicas pelas quais a empresa passa.
Alguns doutrinadores defendem que o jus variandi, no que diz respeito as alterações referentes ao modo, lugar e tempo da execução do trabalho, não causaria qualquer violação ao contrato, pelo contrário, seria inerente a ele.
Quanto ao modo, observe-se o seguinte: o empregador e o empregado na celebração do contrato definem a forma como será executado o serviço e conseqüentemente sua contra prestação. No entanto, pelo jus variandi, o empregador poderá alterar a forma de execução do contrato, visando uma maior produtividade, desde que não cause prejuízos à saúde do trabalhador.
No que diz respeito ao lugar, a realização dos serviços acontecem no local definido pelas partes envolvidas e sua alteração só é lícita com a concordância do empregado. Há casos, porém, em que se faz a alteração sem o consentimento do obreiro, nos casos de fechamento do estabelecimento comercial, em que pode haver a transferência para outro e em outra localidade e quando a mudança do domicílio for inerente ao cargo.
E quanto ao tempo, o empregado realiza suas atividades no horário definido pelo empregador, e sua alteração pode ocorrer, desde que respeitados os intervalos previstos na lei.
Assim, a regra que persiste no contrato de trabalho é de que não pode haver alteração sem que o empregado tenha conhecimento, salvo nos casos acima elencados. Sendo o jus variandi, porém, exceção a essa regra, de modo que o empregador só deve se utilizar dessa prerrogativa quando não trouxer prejuízo ao empregado, o que configuraria a arbitrariedade.
Há várias definições do uso do jus variandi pela jurisprudência e doutrina, inclusive, o tema é tratado de forma bastante polêmica, vejamos:
Assim preconiza Sérgio Pinto Martins “O empregador poderá fazer, unilateralmente, ou em certos casos especiais, pequenas modificações no contrato de trabalho que não venha alterar significativamente o pacto laboral, nem importem prejuízo ao operário.”(Op. cit., 292).
José Augusto Rodrigues Pinto se posiciona da seguinte forma:
O jus variandi ou direito de alterar é o direito reconhecido ao empregador de, no exercício de seu poder de direção da empresa, impor modificações na execução do trabalho, que podem significar alteração das próprias condições originais do ajuste (PINTO, 2003, p. 437).
Para esses dois autores, o jus variandi quer dizer alteração no contrato de trabalho, no entanto, discordamos desses posicionamentos. O jus variandi está ligado ao poder do empregador de fazer alterações nas cláusulas contratuais, e não no que foi objeto de ajuste na elaboração do pacto laboral.
Desse pensamento se filiam Alice Monteiro de Barros e Maurício Godinho Delgado, respectivamente:
O jus variandi é a faculdade concedida ao empregador, com fundamento no poder diretivo, de realizar modificações e variações na prestação de serviços conforme as circunstâncias, exigências ou perigos que surjam na realidade fática ( BARROS, Op. cit., p. 840)
O jus variandi é uma prerrogativa (juridicamente limitada, é bem verdade) de adequação e redirecionamento da prestação laboral contratada, que a ordem jurídica assegura ao empregador no trascorrer do contrato, conforme art. 2º, caput, da CLT, e art. 1º, IV, in fine, da CF/88. (DELGADO, Op. cit., p. 48).
Os ilustres doutrinadores acima citados têm um posicionamento em consonância com o conceito de Simone C. Gonçalves, que adota:
O jus variandi é a faculdade do empregador, exercida em virtude do seu poder diretivo, de introduzir, unilateralmente e dentro de limites, modificações nos aspectos circunstanciais referentes à prestação de serviço do empregado e a organização da empresa (GONÇALVES, Op. cit., p. 48).
Neste ínterim, entende-se por jus variandi como sendo decorrência lógica do poder diretivo do empregador em que pode haver alterações nas cláusulas contratuais de forma que não altere significativamente o ajuste laboral. E que essa alteração sofre limitação nos direitos do empregado, que veremos ainda neste capítulo.
2 – EMBASAMENTO LEGAL – O PODER DIRETIVO
O jus variandi é entendido como sendo o poder diretivo em movimento. Assim se posiciona Magno:
O empregador se permite ajustar a prestação obrigacional do empregado às alterações estruturais e conjunturais da empresa (MAGANO, 1982, op. cit. p. 214).
A origem do poder diretivo liga-se ao controle da execução das tarefas pelo empregado, com o intuito de definir os rumos seguidos pela empresa. O empregador, dono do empreendimento, exerce a fiscalização e comando da atividade do empregado, podendo ditar regras a serem seguidas por este.
Para Viana,
O campo do jus variandi é o mesmo do poder diretivo stricto sensu, do qual é conseqüência direta, ou um modo de atuação. Assim, ao variar, o empregador se move por entre as cláusulas do contrato, ocupando, liberando e reocupando, a cada instante, novos espaços (VIANA, 1996, p. 214).
Sobre o poder diretivo hão de ser feitas algumas considerações. Ele deriva do trabalho subordinado e passou a existir após a revolução Industrial. Originalmente, esteve ligado ao poder regulamentar, sendo este o poder do empregador de emitir normas gerais e abstratas, podendo dirigir a atividade do empregado, exercitando o seu poder diretivo. Decorre da lei e do próprio contrato de emprego.
Alguns doutrinadores defendem que se trata de direito subjetivo do empregador, podendo este se utilizar ou não do poder diretivo que lhe é conferido como uma faculdade.
A CLT não conceitua o poder diretivo em seu texto, no entanto, vem implícito a menção a tal poder em seu art. 2º, quando diz que é o empregador quem dirige a prestação pessoal de serviços, e que por esta característica estar-se-ia a entender o exercício do poder diretivo facultado ao empregador.
Sendo a Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT o instrumento mais importante na normatização do trabalho, é ela quem melhor define o poder diretivo. É de se ressaltar que o poder diretivo não só é importante para a caracterização do contrato de trabalho, mas para a rotina da empresa.
3 – CLASSIFICAÇÃO DOS JUS VARIANDI
O jus variandi é dividido pela doutrina em ordinário e extraordinário. O primeiro faz menção à alteração unilateral de aspectos da atividade laboral não regulados quer por norma jurídica, quer pelas cláusulas do respectivo contrato de trabalho. O segundo, por sua vez, permite alterações unilaterais em casos excepcionais, admitindo-se alterações tanto nas condições de trabalho do Empregado como nas cláusulas contratuais.
No tocante ao ordinário, menciona Marcio Túlio Viana da seguinte forma:
Campo do jus variandi é o espaço em branco entre cláusulas, onde nada se previu especificamente. Ali o empregador se movimenta, preenchendo os vazios de acordo com a sua própria vontade.[...]. E por ser assim, talvez se possa dizer – por paradoxal que pareça – que a originalidade do contrato de trabalho está pouco “fora” dele, no poder de se exigir o que não se ajustou. [...]. Entenda-se: como ocorre com o poder diretivo em geral, o jus variandi tem fonte no contrato: é contratado. Mas se realiza através da vontade de um só, exatamente por se situar num campo em que a outra vontade não se expressou de antemão. (VIANA, 1996, p.214.)
Maurício Delgado Godinho (op. cit, p.1007) entende que pelo jus variandi ordinário, de maneira geral, ajustam-se, modulam-se ou se alteram aspectos da relação entre as partes. Contudo, tais aspectos seguramente têm importância instrumental à dinâmica e evolução empresarial.
Por este tipo de jus variandi, em que a modificação não atinge as cláusulas do contrato, poderá ele ser exercido a qualquer momento, sem necessidade de uma situação especial.
Quanto ao jus variandi extraordinário, Simone C. Gonçalves diz:
Utilizado somente em caso de emergência e em caráter transitório, consiste na possibilidade de o empregador modificar as condições de trabalho do empregado, em face de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, devidamente comprovados. Por tal motivo, as modificações introduzidas pelo jus variandi excepcional são mais amplas, podendo atingir cláusulas do contrato de trabalho e, até mesmo, causar prejuízo ao empregado (GONÇALVES, Op. cit., p.98).
De forma provisória ou não, situação genérica ou autorizada, o instituto do jus variandi extraordinário concerne à alteração unilateral de cláusula contratual somente em casos excepcionais e atua em campo e matérias reguladas pelo contrato ou norma jurídica.
No Jus variandi extraordinário o empregado não deve se recusar a obedecer às determinações do empregador, uma vez que este só se utiliza daquele direito quando da necessidade de alterações excepcionais, e a recusa do empregado pressupõe o cometimento de falta grave, já que o obreiro deve estar em colaboração com o empregador.
É de se ressaltar que está se tratando aqui de uma eventualidade no contrato de trabalho, algo necessário ao andamento das atividades laborativas, em que não eram previstas na execução.
O jus variandi, porém, encontra limites ao seu exercício, quais sejam, nos princípios da boa fé, dignidade da pessoa humana, da não-discriminação e no jus resistentiae, inclusive em se tratando do extraordinário, que admite uma maior flexibilização.
4 – ALTERAÇÃO CONTRATUAL X JUS VARIANDI
Tanto a alteração contratual, como o conceito de jus variandi já foram tratados em tópicos anteriores, merecendo apenas uma distinção entre eles para saber quando o empregador está tratando de um ou de outro instituto.
Neste ínterim, serão levadas em conta suas características, frise-se que o jus variandi aqui utilizado é o ordinário, pois o extraordinário se aplica à alteração contratual.
Posiciona-se José Engel da seguinte forma sobre o tema:
A alteração do contrato de trabalho acarreta a modificação das próprias cláusulas do contrato, como as atinentes ao quantum salarial, função exercida, localidade da prestação de serviço, jornada de trabalho, turno de trabalho, etc. Atinge, pois, seu conteúdo básico e não apenas aspectos circunstanciais do contrato. Vê-se restringido, portanto, pelo Princípio legal da imodificabilidade unilateral das condições de trabalho. (ENGEL, Op. cit., p.115).
A alteração contratual, como o nome propriamente dito, altera cláusula do contrato, enquanto que o jus variandi atinge apenas os aspectos circunstanciais, não adentrando no conteúdo do contrato de trabalho.
Assim menciona Simone Gonçalves: “não se admitem, em seu nome, variações substanciais, relativas ao salário, jornada de trabalho, local e qualificação profissional” (GONÇALVES, Simone Cruxên. Op. cit., p. 63).
Magano, sobre distinção entre alteração contratual e jus variandi defende que “a variação diz respeito às modificações ocorridas nas pregas do contrato, isto é, nos espaços em branco existentes entre as suas cláusulas, ao passo que a alteração acarreta a modificação das referidas cláusulas”. (MAGANO, Op. cit., p. 123).
Para Bernardes:
[...] inexiste a possibilidade de qualquer inovação levada a efeito pelo Empregador, na esfera do Jus variandi, ser atingida pelo princípio da inalterabilidade, dado que isto implicaria uma situação contraditória, pois se o jus variandi é o direito de variar unilateralmente, e continuamente, o seu exercício não pode sujeitar-se ao princípio da inalterabilidade unilateral. Destarte, nenhuma relação limitativa existe entre o art. 468 da CLT e o Jus variandi. (BERNARDES, op. cit., p. 328.)
Destarte, é de notar a distinção entre alteração contratual e jus variandi. Aquele diz respeito às pequenas alterações, por exemplo, no horário de trabalho, enquanto que o outro há mudanças bastante significativas, sejam na função do trabalho ou mesmo no turno exercidos pelo empregado.
Por se tratar, o jus variandi, de pequenas modificações no contrato, mais precisamente nas lacunas do contrato, fica portanto submetido a controles, limites, para que não abuse ou desvie seu poder. Os limites serão estudados no próximo tópico.
5 - O JUS RESISTENTIAE
É o direito do empregado de resistir às alterações impostas pelo empregador para que não viole as cláusulas pactuadas. Esse direito surge em contraposição ao jus variandi e funciona como limite da subordinação.
Segue esse entendimento o ilustre Evaristo de Moraes Filho: “encontra aí a subordinação os seus próprios limites, que passam a se conflitar com o jus resistentiae do empregado às ordens ilegais, ilícitas ou contrárias às cláusulas contratuais”. (MORAES FILHO, 1978, p. 213.)
Para Sérgio Pinto Martins: “O empregado poderá também opor-se a certas modificações que lhe causem prejuízos, ou seja, ilegais, que é o que se chama de jus resistentiae, inclusive pleiteando a rescisão indireta do contrato de trabalho”. (MARTINS, op. cit., p. 293.)
O jus resistentiae atinge áreas da relação de emprego que transpõem a fronteira da simples observância das condições do contrato, sendo dotado de uma abrangência maior que o jus variandi no que atine ao rigor excessivo e à urbanidade de tratamentos dispensados ao empregado.
Enquanto que o jus variandi é atributo jurídico do empregador, o jus resistentiae é necessidade do empregado. Esses dois institutos se opõem e se completam quando da alterabilidade do contrato individual de emprego.
Maurício Godinho Delgado assim enuncia:
O jus resistentiae torna-se, na prática, mitigado, uma vez que o risco de rompimento do contrato pelo empregador inibe eventual posição defensiva do empregado em face de determinações abusivas recebidas. O princípio desponta como um segundo fator – ao lado da diretriz da inalterabilidade contratual lesiva – a privilegiar a perspectiva protetiva dos interesses obreiros na dinâmica das alterações contratuais objetivas no direito do Trabalho (DELGADO. Op. cit., p. 1006).
O jus resistentiae do empregado é a prerrogativa que lhe é conferida visando oposição a qualquer determinação ilícita uma vez acometida pelo empregador. No entanto, há vários casos em que o empregado não se utiliza dessa prerrogativa, por não gozar de estabilidade no emprego.
6 - CONCLUSÃO
A proteção contra a despedida do empregado sem justa causa ou motivação consiste na imposição dos limites subjetivos do empregador ou seu arbítrio em contrapartida a sua faculdade de romper unilateralmente o contrato.
O empresário deve se utilizar de critérios objetivos, com a necessidade de motivação para despedir o empregado, de forma que não acarrete um grande número de desemprego ou informalidade.
É de se notar que o contrato de trabalho é bilateral, tendo como sujeitos o empregado e o empregador. Neste caso, as alterações que venham a ser feitas devem acontecer de forma que não prejudique um sujeito ao outro. No entanto, foi enfatizado neste trabalho o poder de direção conferido ao empregador, o jus variandi, que nada mais é que a possibilidade de alteração ou modificação no contrato. é importante destacar que essa prerrogativa conferida ao empregador deve visar um melhor desenvolvimento das atividade laborais.
Também foi objeto do nosso estudo, as limitações a serem seguidas pelo empregador, em contrapartida aos princípios norteadores e ao jus resistentiae. Frise-se aqui que no tocante aos princípios merece destaque o princípio a dignidade da pessoa humana que foi erigido a princípio fundamental, em que prega que o ser humano embora tratado com empregado não deve ser visto como mero instrumento para realização dos fins alheios.
O que se espera aqui é que seja o empregado tratado com respeito, dignidade. Há vários casos em que o empregador decide despedir o empregado sem ao menos lhe dar qualquer satisfação, e o empregado por ter sido uma pessoa boa, necessária, durante anos se pergunta como aquilo está acontecendo, o que ele fez para merecer tal conduta do empregador. O empregado espera ao menos que o patrão lhe diga porque não o quer mais, qual motivo da sua despedida, enfim, ele quer um pouco de respeito e que seja tratado com dignidade.
O jus variandi, portanto, deve ser experimentado nos limites estudados, e entre outros, no da razoabilidade, reconhecendo-se alguns direitos sobre o empregado sem a intenção de prejudicar-lhe, causar prejuízos ou ainda cometer abusos de direito.
Há uma tendência na jurisprudência que avança no conceito e aplicação do jus variandi e do jus resistentiae seguida da necessidade de flexibilização das normas trabalhistas, porém, enquanto não avançam o mundo e o direito de trabalho de modo que a população tenha um nível sócio-econômico condizente com as suas necessidades, devem ser levados em conta os limites do jus variandi, para que este não seja utilizado de forma arbitrária.
REFERÊNCIAS
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DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 5. ed. São Paulo: LTr, 2006.
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2006.
ENGEL, Ricardo José. O Jus variandi no contrato individual de trabalho: um estudo teórico – critico em face de princípios gerais do direito aplicáveis ao direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2003
GONÇALVES, Simone Cruxên. Limites do jus variandi do empregador. São Paulo: LTr, 1997.
MAGANO, Octávio Bueno. ABC do direito do trabalho. São Paulo: Revista dos tribunais, 1998.
MAGANO, Octávio Bueno. Do poder diretivo na empresa. São Paulo: Saraiva, 1982.
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao direito do trabalho. 30. ed. São Paulo: LTr, 2004.
ROMITA, Arion Sayão. Direitos fundamentais nas relações de trabalho. São Paulo: LTr, 2005.
VIANA, Marcio Túlio. Direito de resistência: possibilidades de autodefesa do empregado em face do empregador. São Paulo: LTr, 1996.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RESENDE, Aline de Sá. Jus variandi do empregador Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 28 out 2010, 08:44. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/22021/jus-variandi-do-empregador. Acesso em: 23 dez 2024.
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