RESUMO: Tratar de Direito Eleitoral é passear por vasto, amplo e longínquo ramo do direito, um dos mais complexos e um dos mais relevantes, se não o mais, perante a sociedade. Busca-se abordar aqui a importância do voto, suas características constitucionais, sua derivação do Estado Democrático de Direito e os principais fatos que viciam a lisura, normalidade e legitimidade das eleições, tudo isso no intuito de clarear e coibir quaisquer atos que possam modificar ou suprimir a vontade livre do eleitor no procedimento eletivo.
Palavras-chave: Direito Eleitoral; Abuso de Poder Econômico; Abuso de Poder Político; Captação Ilícita de Sufrágio.
ABSTRACT: Treating the Electoral Law is walking through vast, distant and broad area of law, one of the most complex and one of the most important, if not more, before the company. It aims at addressing here the importance of voting, their characteristics constitutional, its derivation of the democratic rule of law and key facts that vitiating the smoothness, normalcy and legitimacy of the elections, all this in order to lighten and curb any acts which may modify or suppress the free will of the voters in the elective procedure.
Keywords: Electoral Law; Abuse of Economic Power; Abuse of Political Power; Unlawful Capture of Suffrage.
SUMÁRIO: Introdução; 1 O Estado Democrático de Direito; 2 Breve Histórico do Voto; 3 A Importância do Voto; 4 Abuso de Poder Econômico e Político; 5 Captação Ilegal de Sufrágio (Art. 41-A da lei 9.504/97); 6 Considerações Finais; Referências.
INTRODUÇÃO
O Direito Eleitoral, pertencente ao Direito Público, traz no seu bojo o estudo das normas e procedimentos que viabilizam o funcionamento do poder de votar, baseado, principalmente, nos princípios da celeridade, igualdade de tratamento dos candidatos, normalidade e legitimidade das eleições, dentre outros.
O presente artigo aborda claramente as questões básicas no tocante às principais condutas que maculam a lisura do pleito eleitoral no intuito de esclarecer aos leitores, como também conscientizá-los do quão importante é o voto, em virtude de ser o principal meio de tentativa de mudanças tanto perquiridas pela sociedade. Trata da derivação do voto do Estado Democrático de Direito, trazendo posteriormente, um breve histórico do voto no âmbito nacional.
Posteriormente, explicita as principais condutas utilizadas pelos maus políticos, com escopo de servir aos eleitores de instrumentos de moralização das campanhas eleitorais no intuito de que, não só o Ministério Público ou a Polícia Federal atue no combate a tais ilícitos, como também, qualquer cidadão possa ajudar oferecendo a notícia crime, ao terem ciência de que tal conduta fere a normalidade e legalidade das eleições.
1 O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO
A denominação “ESTADO” (derivada do latim status = estar firme), surgiu em 1513 com o advento do livro “O Príncipe” de Maquiavel, indicando uma sociedade política. Esta expressão foi usada pelos italianos quando queriam se referir a uma determinada cidade independente, como, por exemplo, stato di Firenze.
Qualquer Estado que respeite as liberdades civis, a supremacia da vontade popular e a igualdade de direitos, mediante proteção jurídica, pode ser considerado como Democrático de Direito. Daí tem-se a forma pela qual o Estado exerce seu poder soberano (democracia), por meio de pessoas eleitas pelo povo, ou seja, as funções típicas e indelegáveis do Estado são exercidas por indivíduos eleitos pelo povo, baseados em regras previamente estabelecidas que servem de rumo para regerem o pleito eleitoral.
No entanto, como o Estado Democrático é aquele em que o próprio povo governa, atualmente seria inviável a consulta popular, a externalização da vontade direta, sobre todos os assuntos de interesse público, haja vista que os colégios eleitorais são numerosos e estas decisões ocorrem diariamente, a tal ponto de impossibilitar a prática de pronunciamento direto do povo sobre a totalidade de questões que são de seu interesse. Entretanto, apesar das dificuldades, há a possibilidade da prática de pronunciamento do povo (apesar da não possibilidade de ampla discussão antes da deliberação), através de institutos com previsão constitucional, quais sejam:
a) Referendo, do latim referendum, consiste numa consulta à opinião pública posterior sobre determinado ato governamental, podendo ser para introdução de uma emenda constitucional ou de uma lei ordinária, quando esta afetar interesse público relevante. A lei nº 9709/98, que regulamentou a execução dos plebiscitos e referendos, no seu art. 2º, §2º, definiu que o referendo é convocado com posterioridade a ato legislativo ou administrativo, cumprindo ao povo a respectiva ratificação ou rejeição;
b) Plebiscito: consiste numa consulta prévia à opinião popular, ou seja, consulta prévia que se faz aos cidadãos no gozo de seus direitos políticos, sobre determinada matéria a ser posteriormente discutida pelo Congresso Nacional. A lei supracitada, seu art. 2º, §1º, define que o plebiscito é convocado com anterioridade a ato legislativo ou administrativo, cabendo ao povo, pelo voto, aprovar ou denegar o que lhe tenha sido submetido.
c) Iniciativa Popular, caracterizada no direito de propor uma emenda constitucional ou um projeto de lei, é definida no art. 13 da também lei já supracitada como a possibilidade de apresentação de projeto de lei à Câmara dos Deputados, subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles.
Contudo, hoje em dia, observa-se que a democracia é representativa, onde o povo concede um mandato a alguns cidadãos, para que estes, na condição de representantes, externem a vontade popular, tomando decisões de âmbito geral, de interesse da sociedade, como se o próprio povo estivesse governando, e não com o intuito primordial de favorecimento pessoal. Neste enfoque, preleciona o professor Dalmo de Abreu Dallari (2002, p. 158) ao expor algumas características relevantes do mandato, quais sejam:
[...] a) o mandatário, apesar de eleito por uma parte do povo, expressa a vontade de todo o povo, ou pelo ao menos, de toda a circunscrição eleitoral onde foi candidato, podendo tomar decisões em nome de todos os cidadãos da circunscrição, ou mesmo de todo o povo do Estado se tiver sido eleito para um órgão de governo do Estado. b) Embora o mandato seja obtido mediante um certo número de votos, ele não esta vinculado a determinados eleitores, não se podendo dizer qual o mandato conferido por certos cidadãos. c) O mandatário, não obstante decidir em nome do povo, tem absoluta autonomia e independência, não havendo necessidade de ratificação das decisões, além do que as decisões obrigam mesmo os eleitores que se opunham a elas. d) O mandato é de caráter geral, conferindo poderes para a prática de todos os atos compreendidos na esfera de competência do cargo para o qual alguém é eleito. e) O mandatário é irresponsável, não sendo obrigado a explicar os motivos pelos quais optou por uma ou por outra orientação. f) Em regra o mandato é irrevogável, sendo conferido por prazo determinado.
Neste diapasão, como características primordiais do Estado Democrático de Direito, verifica-se que as leis são criadas pelos próprios Estados, mediante seus representantes politicamente constituídos e, uma vez aplicada a lei, o próprio Estado fica adstrito ao cumprimento das regras e dos limites por ele mesmo impostos, ou seja, o próprio poder estatal é limitado pela lei, não sendo absoluto, e o controle desta limitação se dá por meio do Poder Judiciário, devendo este possuir autoridade e autonomia com fito de garantir que as leis existentes cumpram o seu papel de impor regras e limites ao exercício do poder estatal.
Norberto Bobbio apud Jaime Barreiros Neto (2009, p.39), traça algumas características essenciais da democracia, quais sejam:
a) Todos os cidadãos que tenham alcançado a maioridade etária sem distinção de raça, religião, condição econômica, sexo, devem gozar de direitos políticos, isto é, cada um deles deve gozar do direito de expressar sua própria opinião ou de escolher quem a expresse por ele; b) O voto de todos os cidadãos deve ter peso igual; c) Todos aqueles que gozam dos direitos políticos devem ser livres para poder votar segundo sua própria opinião formada, ao máximo possível, livremente, isto é, em uma livre disputa entre grupos políticos organizados em concorrência entre si; d) Devem ser livres também no sentido de que devem ser colocados em condições de escolher entre diferentes soluções, isto é, entre partidos que tenham programas distintos e alternativos; e) Seja para as eleições, seja para as decisões coletivas, deve valer a regra da maioria numérica, no sentido de que será considerado eleito o candidato ou será considerada válida a decisão que obtiver o maior número de votos; f) Nenhuma decisão tomada por maioria deve limitar os direitos da minoria, particularmente o direito de se tornar por sua vez maioria em igualdade de condições.
Neste enfoque, faz-se imperioso destacar que, para a caracterização do regime democrático há necessidade de ponderação de dois princípios fundamentais, quais sejam, Liberdade e Igualdade, consoante o magistério de Norberto Bobbio apud Jaime Barreiros Neto (2009, p.41):
Os valores últimos nos quais se inspira a democracia, com base nos quais distinguimos os governos democráticos dos governos que não os são, são a liberdade e a igualdade. A Declaração Universal dos Direitos do Homem começa, como todos sabem, com estas sacrossantas palavras: ”Todos os seres humanos nascem livres em dignidade e direitos”. A verdade é que os seres humanos, ao menos em sua grande maioria, não nascem nem livres, nem iguais. Seria muito mais exato dizer: “Os homens aspiram a tronar-se livres e iguais”. A liberdade e a igualdade são não um ponto de partida, mas sim um ponto de chegada. A democracia pode ser considerada um processo, lento mas irrefreável, no sentido da aproximação desta meta. Mas a meta é na sua plenitude inatingível, por uma razão intrínseca aos dois princípios mesmos da liberdade e da igualdade. Esses dois princípios são entre si, em ultima instância, quando levados às suas extremas consequências incompatíveis. Uma sociedade na qual estejam protegidas todas as liberdades, nelas incluída a liberdade econômica, é uma sociedade profundamente desigual, não obstante o que digam sobre ela os fatores do mercado. Mas, ao mesmo tempo, uma sociedade cujo governo adote medidas de justiça distributiva tais que tornem os cidadãos iguais não apenas formalmente ou diante das leis, como se diz, mas também substancialmente, é obrigada a limitar muitas liberdades.
De mais a mais, importa frisar que apesar de vigorar numa democracia a vontade da maioria, não significa afirmar que haverá um domínio da maioria, muito menos um absolutismo. É assim que pensa o constitucionalista português J. J. Gomes Canotilho (2002, p, 327-328), ao lecionar que:
A maioria não pode dispor de toda a “legalidade”, ou seja, não lhe está facultado, pelo simples fato de ser maioria, tornar disponível o que é indisponível, como acontece, por exemplo, com os direitos, liberdades e garantias e, em geral, com toda a disciplina constitucionalmente fixada (o princípio da constitucionalidade sobrepõe-se ao princípio maioritário). Por vezes, a importância do assunto exige maiorias qualificadas não só para se garantir a bondade intrínseca da decisão mas também para a proteção das minorias. Por último, devem referir-se aos limites internos do princípio majoritário: se ele tem a seu favor a possibilidade de as suas decisões se tornarem vinculativas por serem sufragadas por um maior número de cidadãos, isso não significa que a solução maioritária seja materialmente mais justa nem a única verdadeira. O princípio maioritário não exclui, antes respeita, “o pensar de outra maneira”, “o pensamento alternativo”. Noutros termos: o princípio maioritário assenta politicamente num “relativismo pragmático” e não num “fundamentalismo de maiorias”. Para utilizarmos as palavras de um ex-presidente do Tribunal Constitucional Alemão: o pressuposto básico da praticabilidade do princípio maioritário é a ausência de pretensões absolutas de verdade.
2 BREVE HISTÓRICO DO VOTO
O voto no Brasil, sinteticamente, é datado de 1532, quando se convocou eleições visando escolher o conselho administrativo da vila de São Vicente, onde só eram votantes os chamados “homens bons” - termo designando de gente qualificada pela linhagem familiar pela renda e propriedade, bem como pela participação na burocracia civil e militar da época.
Durante o Império, em 1824, foi outorgada por D. Pedro I a primeira Constituição Brasileira, definindo as primeiras normas de nosso sistema eleitoral. Ela criou a Assembléia Geral, o órgão máximo do Poder Legislativo, composto por duas casas: o Senado e a Câmara dos Deputados (a serem eleitos pelos súditos do Império). O voto era obrigatório, porém censitário: só tinham capacidade eleitoral os homens com mais de 25 anos de idade e uma renda anual determinada. Estavam excluídos da vida política nacional quem estivesse abaixo da idade limite, as mulheres, os assalariados em geral, os soldados, os índios e os escravos.
Por conseguinte, em 1881, a Lei Saraiva introduziu o voto direto, mas ainda censitário. Desse modo, até o fim do Império, somente 1,5% da população brasileira tinha capacidade eleitoral.
Na República não houve uma mudança rápida desse quadro. Na primeira eleição direta para presidente da República, em 1894, Prudente de Morais chegou ao poder com cerca de 270 mil votos que representavam quase 2% da população brasileira da época.
Somente no século XX houve uma ampliação do direito de voto. O voto feminino, por exemplo, data de 1932 e foi exercido pela primeira vez em 1935. No entanto, em função da ditadura de Getúlio Vargas (1937-1945), as mulheres não podiam votar e só retomaram este direito em 1946 devido à universalização do voto na Carta Magna daquele ano. Vale lembrar que a ditadura de Vargas e a dos militares de 64 privaram o eleitorado nacional do voto para presidente por nove vezes e que, em 117 anos de República com 34 presidentes, somente 16 se elegeram pelo voto direto.
Hodiernamente, com o advento da Constituição de 1988, a capacidade eleitoral ativa é devida aos que têm nacionalidade brasileira com idade mínima de dezesseis anos para alistar-se, sendo obrigatório o voto para os de idade entre dezoito e setenta anos, e facultativo para os que têm dezesseis e dezessete anos e para os maiores de setenta anos, estando pois, proibidos de votar os estrangeiros e aqueles que prestam o serviço militar obrigatório.
3 A IMPORTÂNCIA DO VOTO
A priori, é necessário expor que as causas corruptivas no Brasil têm aprofundamento histórico bastante fértil, haja vista que desde as Capitanias Hereditárias, com a distribuição indiscriminada de terras, passando pela política de colonização européia e chegando até o vigente século, observa-se a grande concentração de renda e poder em mãos de pouquíssimos. Estes, em sua maioria, dominam a política, a economia, os meios de comunicação, etc.
Verifica-se que, desde os tempos de Rui Barbosa apud Marcos Souto Maior Filho (2008, p. 25), essa prática nefasta é cometida, pois ele mesmo registrou seu pensamento acerca dos falsários de moeda e sua similitude com os compradores de voto:
No caso político não há, moral ou juridicamente, diferença. Falsários em matéria de moeda e falsários em matéria de voto são velhacos e perversos, dados uns e outros à cultura da falsidade sob formas diversas na sua manifestação, mas igualmente abjetos e perniciosos. Sob este derradeiro aspecto, se o falsificador eleitoral discrepa do falsificador monetário, será em que, dos dois ramos de criminalidade, o primeiro é ainda mais destruidor e subversivo do que o segundo (falsificador monetário). (...) Corrompe a moral pública, esbulha a Nação da sua soberania, avilta os poderes do Estado, escraviza o povo, e entroniza na administração a mediocridade, a ignorância, a ladroeira.
O entranhamento dessa conduta abominável nos costumes da sociedade é prática antiga, desde os tempos de Roma, conforme sustenta o cientista político, quando afirma:
[...] Isso vem de uma longa tradição clientelista que remete à Roma, onde os ricos e poderosos satisfaziam os chamados clientes distribuindo coisas. É uma tradição que aqui desembocou no clientelismo que conhecemos. Na história do País, o clientelismo se manteve a partir de uma concepção patrimonialista do Estado e é expressada através da cultura de que quando se tem acesso aos ricos, se tem acesso ao Estado.No caso da compra de votos, como ela se manifesta entre os que têm menor renda, boa parte dos pobres acha que política é coisa de rico e que eles (políticos) só procuram no momento das eleições. (JOVINIANO NETO, 2008, p. 16)
Infelizmente, ainda domina nos pleitos eleitorais do Brasil a corrupção, levando o país a ser desrespeitado e descredibilizado perante a sua própria sociedade como também perante a sociedade internacional. A corrupção é decorrente das desigualdades e das limitações do sistema democrático, e por isto verifica-se que o problema não só ocorre no Brasil como também no âmbito internacional.
Neste sentido, o filósofo italiano Norberto Bobbio, na sua obra O Futuro da Democracia (2000, p. 45), registrou a prática repugnante da compra de voto no atual sistema de expansão dos capacitados eleitorais ativos:
Nos regimes democráticos, como é o italiano, onde a percentagem dos votantes é ainda muito alta (embora diminua a cada eleição), existem boas razões para se acreditar que esteja em diminuição o voto de opinião e em aumento o voto de permuta (voto de scambio), o voto, para usar a terminologia mais crua mas talvez menos mistificadora, o voto clientelar, fundado (freqüentemente de maneira ilusória) sobre o do ut des (apoio político em troca de favores pessoais).
Importante destacar ainda, que no relatório da organização não-governamental Transparency International pertinente à corrupção, o Brasil ocupa a 49ª posição dentre noventa países avaliados, tendo uma nota 3,9 numa escala que varia de 0 a 10.
Contudo, há muito tempo a sociedade civil clama por instrumentos hábeis e rápidos no combate a maus políticos, no intuito de afastá-los da disputa ou do exercício do cargo quem desvirtua-se dos caminhos traçados corretamente, seja numa campanha eleitoral, seja no seu mandato ou até mesmo na sua conduta pessoal. Reiteradamente vem à tona, via imprensa, escândalos envolvendo maus políticos no tocante à corrupção eleitoral, tráfico de influência, desvio de verbas e principalmente a fraude denominada de “caixa dois”, como também práticas de improbidade administrativa.
Em razão disso, a sociedade clama por respeito à condutas éticas e morais pelos seus representantes, afinal de contas a vontade pessoal não pode se sobrepor à vontade popular.
Desse modo, é pertinente ter a consciência de que o voto é um instrumento de validação dos objetivos traçados pela Constituição, de modo que é de bom alvitre que cada cidadão deva efetuar a sua escolha de forma lúcida, questionando-se acerca de alguns aspectos que o levarão a votar em determinado candidato, ou seja, devem ter uma estruturação substancial ideológica do quão importante é o seu voto, na medida em que terão o instrumento de influenciação na própria vida e na vida dos seus pares, influenciando de forma indireta na implementação de políticas públicas.
Deve-se evitar votar apenas porque determinado candidato reside na sua rua ou bairro, deve-se evitar votar em candidatos porque sua família sempre votou nele, haja vista que o voto é individual, direto e secreto, ou seja, os eleitores devem ter comportamentos racionais da importância das eleições.
Neste enfoque, ensina o professor Augusto Aras, na sua obra Fidelidade e Ditadura (Intra) Partidárias (2011, p. 34), ao ressalvar que:
São graves e enormes as responsabilidade que incidem sobre cada cidadão em defesa da democracia, mormente em prol das gerações futuras, sob pena de termos que amargar as projeções catastróficas hollyoodianas as quais, em obras de ficção, demonstram poder a arte de imitar a vida!
Decerto ainda, observar que, ao exercer o direito de sufrágio, o cidadão deve ter ciência de que o voto, hoje, é considerado, juridicamente, dado ao partido político e não ao candidato-cidadão.
Tal entendimento foi adotado pelo STF, no Mandado de Segurança 26.603, cuja relatoria foi do Ministro Celso de Mello, ao abraçar a Teoria do Mandato Representativo Partidário, conforme ensina o professor Augusto Aras ao lembrar o voto do Decano do STF, citando-o, ao dispor que:
“Bastante significativo no ponto, também, Senhor Presidente, é o entendimento de Augusto Aras, Professor e Procurador Regional da República, expressa em preciosa monografia sobre o tema ora em exame, cuja leitura é altamente recomendável e na qual, rememorando, registra com especial ênfase que no presente sistema de partidos revela-se essencial o reconhecimento do dever de respeito pelos representantes eleitos aos compromissos pragmáticos da representação partidária, observando-se que ele registra a aprovação de um novo modelo de representação em cujo âmbito se harmoniza as relações entre o partido político, o candidato eleito e o próprio eleitor. Diz então o ilustre autor: “como o fortalecimento da democracia representativa passa pelo fortalecimento dos partidos políticos, há de se concluir que nos Estados de Partidos parcial o titular do mandato já é o partido político – e não o seu filiado eleito por sua legenda – na perspectiva de um novo modelo denominado “mandato representativo partidário”, que se apresenta como resultado da evolução dos “mandatos imperativo e representativo” oriundos, respectivamente, do “Ancien Régime” e do Estado liberal.
O “mandato representativo partidário” opera a partir da conjugação de elementos comuns aos modelos precedentes(“mandatos imperativo e representativo”) para fazer brotar uma nova concepção de mandato político em que este tem por titular o partido e está baseado:
a) Na subordinação do eleito ao estatuto e ao ideário programático do seu partido por meio do qual o obteve, a espelhar a confiança do povo na agremiação, como única realidade da técnica político-jurídica hábil a representar aqueles valores em torno dos quais se opera o “consenso social” pelo voto da maioria;
b) Na representação que o partido político recebe dos eleitores para agir em seu nome (autorização), cujo exercício há de se dar por meio dos seus filiados ante a sua qualidade de pessoa jurídica (realidade da técnica político-jurídica) que não dispõe de corpo físico para tanto (...).
As consequências práticas dessas ponderações podem ser visualizadas na hipótese em que um parlamentar, durante o exercício do mandato, decide sair do partido, sem motivo legítimo, enfraquecendo, com isso, a força política da agremiação na casa legislativa e no governo.
A mudança imotivada de partido se afigura como ato abusivo que não se coaduna com a ordem democrática, tendo em vista que, além da filiação ser requisito prévio de elegibilidade, poucos são os concorrentes nas eleições proporcionais que conseguem obter votos suficientes para atender ao quociente eleitoral e se elegerem”
Nesse sentido, o voto torna-se, conforme a Constituição Federal, o principal exercício de sufrágio, por se tratar de ato político que viabiliza o direito público subjetivo que tem o cidadão de eleger, ser eleito e de participar da organização e da atividade do poder estatal. Portanto não se confunde com o sufrágio. O voto é o exercício do direito de sufrágio.
Logo, num país considerado como sendo Estado Democrático de Direito, deve-se observar as regras eleitorais, evitando vícios que maculam a lisura da disputa dos pleitos, principalmente os abusos historicamente comprovados e muito comumente praticados, quais sejam: captação ilícita de sufrágio, compra de votos (corrupção eleitoral), abuso de poder econômico e político nos atos de campanha eleitoral, dentre outros.
O voto apresenta-se como meio de exercer a soberania popular. É previsto no art. 14 da Constituição Federal, dentre um dos direito políticos, possuindo algumas características constitucionais, dentre as quais: secreto, obrigatório, personalíssimo, direto e periódico. No entanto, a sua obrigatoriedade não consta no art. 60, §4º como cláusula pétrea, podendo ser abolida eventualmente mediante Emenda Constitucional.
Por ter sido tão emblemático a conquista do direito de votar é que se busca coibir práticas que comprometam a lisura do pleito, afetando a vontade popular e o resultado das urnas. É nesse aspecto que a Lei 9.504/97 (Lei que estabelece normas para as eleições) prevê no seu Art. 41-A a captação ilícita de sufrágio, vedando condutas que menosprezam o poder de voto, que levam o eleitor a alienar a sua liberdade de escolha, o seu poder, em troca de vantagens econômicas.
Trata-se, pois, de um, dentre alguns exemplos, em que se verifica a tentativa de blindagem da legislação às condutas espúrias que maculam substancialmente o pleito eleitoral. É, na verdade, decorrência do Princípio Constitucional da Autenticidade Eleitoral, doutrinado pela professora Eneida Desirre Salgado, em sua obra Princípios Constitucionais Eleitorais (2010, p. 33), de sorte a permitir a formação da vontade política sem vícios e sem distorções. É nesta mesma toada que sustenta:
a autenticidade eleitoral também é um componente que faz parte do arcabouço que forma a estrutura do Estado de Direito, haja vista que na formação dos parlamentos e na indicação democrática do chefe do poder executivo, os procedimentos devem ser amparados em garantias de igualdade e de liberdade, sob pena de ilegitimidade do sistema representativo (2010, p. 33).
Importa ressaltar, por relevante, que o tema em destaque é também decorrente de um dos princípios constitucionais eleitorais mais importantes, qual seja, o da Máxima Igualdade na Disputa Eleitoral. Isso porque, impõe-se uma regulação das campanhas eleitorais, de sorte a invocar intervenção estatal para assegurar equilíbrio na disputa, evitando-se manifestações a torto e a direito, evitando-se condutas que possam influenciar de modo negativo no voto dos eleitores.
Eneida Desirre Salgado sustenta que:
o principio constitucional da máxima igualdade na disputa eleitoral exige a restrição à liberdade de campanha e à atuação dos meios de comunicação no pleito para evitar que haja a influência indevida de um fator tido como irrelevante e que o acesso aos meios de comunicação (permitido pelo poder econômico ou pela relação de um partido ou candidato com seus dirigentes) leve ao desequilíbrio, atingindo o pluralismo e a liberdade de formação de opinião. (2012, p.188)
É neste sentido que se conclui pela imposição da coibição dos abusos na campanha, ou seja, a legislação eleitoral deve reprimir os abusos da disputa eleitoral, seja de qualquer tipo, na medida em que prevê instrumentos processuais para a devida apuração e respectivas sanções jurídicas e políticas quando restar evidenciado.
4 ABUSO DE PODER ECONÔMICO E POLÍTICO
O abuso de poder ofende a liberdade do sufrágio e a igualdade na disputa eleitoral pelo aliciamento ilegítimo de eleitores, se apresentando de duas formas: político e econômico. O primeiro é caracterizado quando há, de maneira geral, o uso indevido da máquina administrativa. O segundo caracteriza-se nos casos de uso de recursos que sejam considerados ilegais pela legislação eleitoral vigente, mais especificamente pelo descumprimento das normas relativas à arrecadação dos fundos de campanha. Ressalte-se, ainda, que há o abuso de poder na propaganda eleitoral e nos meios de comunicação social.
Aduz-se que, para configuração do abuso de poder econômico é necessário existir potencialidade, ou seja, é necessário um abuso tal que contamine a legitimidade do resultado, que desequilibre a disputa política ou haja a probabilidade de comprometimento da normalidade ou da legitimidade. Isso porque, o abuso de poder interfere diretamente na tomada de decisão do eleitor, caracterizando, assim, uma afronta ao princípio democrático, atingindo o bem jurídico de maior consideração no Direito Eleitoral, que é a normalidade e legitimidade das eleições.
Nesse sentido o pensamento do Ministro Relator do TSE, Eduardo Alckmin, no REsp. n. 16.048/SP de 16/03/2000:
A caracterização do abuso de poder depende da demonstração da potencialidade que os fatos tenham de influir no resultado do pleito, podendo atos isolados que não configurem abuso vira configurar corrupção eleitoral.
A vedação ao abuso de poder econômico tem por escopo tutelar a liberdade do voto. Tal proteção é verificada em âmbito constitucional, como também em âmbito infraconstitucional. Tal interpretação, respectivamente, é extraída do artigo 14, §9º da CF/88 ao estabelecer que os valores protegidos são probidade administrativa, moralidade para o exercício do mandato, normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou político, e do artigo 237 do Código Eleitoral ao dispor que a interferência do poder econômico e o desvio ou abuso do poder de autoridade, em desfavor da liberdade de voto, serão coibidos e punidos.
A título de exemplo, o doutrinador Rui Stoco, demonstra algumas formas de abuso de poder econômico: a entrega de bens materiais em troca de voto, o recebimento de valores de origem vedada ou não declarada, o fornecimento de transportes a eleitor no dia do pleito e a utilização de órgãos de comunicação, buscando favorecer determinada candidatura em detrimento das demais.
É importante ficar claro que é natural que o poder econômico atue no processo eleitoral, haja vista ser necessário e inevitável que aquele que almeja conquistar um cargo eletivo, efetue gastos no financiamento de sua campanha. No entanto, quando há utilização desse montante, não como forma de viabilizar a campanha, mas como principal fonte de convencimento dos eleitores, fica caracterizado o abuso, levando ao eleitor, principalmente os considerados carentes, pacificamente, a trocarem seu voto por favores ou vendê-los por quantias ínfimas.
Já o abuso de poder político é caracterizado como sendo:
[...] o uso indevido de cargo ou função pública, com a finalidade de obter votos para determinado candidato. Sua gravidade consiste na utilização do múnus público para influenciar o eleitorado, com desvio de finalidade. Necessário que os fatos apontados como abusivos, entrementes, se encartem nas hipóteses legais de improbidade administrativa (Lei 8.429/92), de modo que o exercício de atividade pública possa se caracterizar como ilícita do ponto de vista eleitoral. (COSTA, 2002, p. 478)
A regra geral do ordenamento jurídico é pela exigência da absoluta neutralidade dos agentes públicos nas campanhas eleitorais. O uso da máquina administrativa deverá se pautar com finalidade pública, em decorrência do princípio constitucional da impessoalidade administrativa, vide art. 37, §1º da CF/88. Uma conduta singular em beneficio de um candidato ou em beneficio de outro, determina, por si só, o desvio de finalidade.
Eneida Desirre Salgado (p.204), afirma que a legislação eleitoral, conforme sua leitura pela jurisprudência, faz uma distinção entre a atuação vedada e o abuso. Sustenta que, para configuração do abuso (que tem como sanção a inelegibilidade - dentre outras), exige-se a potencialidade para alterar o resultado da eleição e, assim, comprometer a normalidade e legitimidade do pleito; Já, as condutas vedadas pelo artigo 73 da Lei das Eleições, presumem-se tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre os candidatos, ou seja, não há se perquirir a respeito da intenção do agente público (não se cogita de potencialidade para influir no resultado do pleito, sendo que a só prática da conduta vedada estabelece presunção objetiva da desigualdade – neste sentido o acórdão 24.826/2005 do TSE).
Destaca-se que, os agentes públicos, em período eleitoral, utilizam a máquina pública no intuito de alavancar sua candidatura ou a de seu sucessor, devido ao fato de estarem em posição de destaque perante os demais concorrentes. Empenham-se em mostrar eficiência administrativa em pleno período eleitoral, no intuito de convencer os eleitores da necessidade de continuidade daquela gestão. É muito comum nesse período a quantidade de obras inauguradas com finalidade eleitoreira. Estes fatos desequilibram o tratamento equânime que deve ser dado aos candidatos, baseado no principio da isonomia de oportunidades do pleito eleitoral que deve ser dado aos candidatos.
As principais condutas vedadas no combate ao abuso de poder político estão previstas no artigo 73 da lei 9.504/97 (Lei que estabelece normas para as eleições). Oportuno frisar que no seu caput não só ao chefe do Poder Executivo é vedada algumas condutas como também aos agentes públicos, servidores ou não. Portanto, todos aqueles que exercem função pública devem estar na mira do dispositivo.
Caso tipificada tal conduta e esta assumir potencial lesivo à normalidade do pleito, incorrerá também em causa de inelegibilidade, conforme artigo 1º, I, “d” da Lei Complementar 64/90; in verbis:
Art. 1º São inelegíveis:
I – para qualquer cargo:
...
d) os que tenham contra sua pessoa representação julgada procedente pela Justiça Eleitoral, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado, em processo de apuração de abuso do poder econômico ou político, para a eleição na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para as que se realizarem nos oito anos seguintes.
Ainda nesse tocante, importa frisar haver algumas condutas que se caracterizam como abuso de poder econômico e político e, no entanto, não há verificação da potencialidade. Como já exposto, quando tiver o potencial de atingir a normalidade e legitimidade das eleições gera inelegibilidade para o agente e a conseqüente cassação do registro, conduta esta denominada por alguns doutrinadores como abuso de poder qualificado. No entanto, quando o abuso de poder não tiver a potencialidade configurada, ou seja, a conduta abusiva não afetar a lisura da disputa, gerará a desconstituição do mandato do sujeito que praticou tal fato durante a campanha, utilizando-se para tanto a Ação de Impugnação de Mandato Eletivo, prevista no art. 14, §10 da Constituição Federal, denominada por alguns doutrinadores como abuso de poder simples. Importante frisar que se o objeto da AIME, além da desconstituição do mandato é também a inelegibilidade por mais oito anos contados da eleição em que se verificou o abuso, necessário será a demonstração da potencialidade.
Por fim, o abuso de poder é apurado conforme previsto no artigo 22 da Lei Complementar 64/90, mediante o procedimento da investigação judicial eleitoral, ao que há uma célere e ampla dilação probatória, servindo como prova pré-constituída para propositura do recurso contra expedição de diploma, caso julgada procedente, desde que ajuizada até a data da diplomação dos candidatos eleitos, sob pena de decadência.
5 CAPTAÇÃO ILEGAL DE SUFRÁGIO (ART. 41-A DA LEI 9.504/97)
Nascido da primeira lei de iniciativa popular depois da Carta Magna de 1988, este artigo foi previsto pela Lei nº 9.840/99, que alterou dispositivos da Lei 9.504/97, passando a incluí-lo com a seguinte redação, in verbis:
Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990.
Trata-se de dispositivo que criou ilícito civil-eleitoral, não se confundindo com o crime eleitoral de corrupção previsto no art. 299 do Código Eleitoral Brasileiro, de forma que podem ser aplicados concomitantemente, sem prejudicialidade, no tocante ao bis in idem, devido à natureza daquele ser proibitiva e sancionatória não contendo norma penal, pois se referem à diplomação e/ou registro do candidato.
Observa-se, pela letra fria da lei, que o sujeito ativo da conduta típica da compra de votos é exclusivamente o candidato, enquanto no crime previsto no artigo 299 do Código Eleitoral é qualquer cidadão. É neste sentido que a jurisprudência predominante do TSE vem entendendo, como verifica-se, por exemplo, do RESpe Eleitoral nº 3936458, de relatoria da Min. Carmem Lúcia, ao entender que apenas os candidatos são partes legítimas para responderem ao art. 41-A e não aos terceiros envolvidos em tal acusação, ou seja, caso uma terceira pessoa, em nome do candidato, pratique a compra de votos, poderá responder por abuso de poder econômico ou corrupção, mas não responderá por captação ilícita de sufrágio do art. 41-A da lei 9.504/97.
Apesar de tal entendimento ser controvertido na doutrina, o TSE abraça a posição do professor Adriano Soares da Costa, ao ensinar que:
Quem pode cometer o ilícito do art. 41-A da lei 9.504/97 é apenas o candidato, apenas ele. Se alguém em nome dele promete, doa, oferece ou entrega ao eleitor algum bem ou vantagem pessoal com a finalidade de obter-lhe o voto, pode cometer abuso de poder econômico ou corrupção, mas não captação de sufrágio.(2009, p)
Já o sujeito passivo da conduta seria qualquer eleitor, sendo, pois, desnecessária a sua identificação.
Outro aspecto importante é que essa conduta somente ocorrerá se praticada no período compreendido entre o registro da candidatura até a data das eleições, ou seja, o termo inicial se dá a partir do requerimento do registro da candidatura e o termo final será o dia da eleição.
Importante se ater que para configuração da captação ilícita de sufrágio, diferentemente do que ocorre com os abusos de poder econômico e político, não é necessária a verificação da potencialidade, ou seja, não importa se determinado fato influenciou ou não o resultado do pleito. Basta somente a comprovação da prática de captação vedada de votos, não havendo necessidade de averiguar sobre o numero de vezes que ocorreu a conduta ou se houve possibilidade de desequilíbrio no pleito. Este é o entendimento do Ministro Nelson Jobim no julgamento do Recurso Especial nº 19.553 datado de 21/03/2002, em que argumenta que no Art. 41-A o bem protegido não é o resultado da eleição, mas a vontade do eleitor, o que não autoriza que se fale em potencialidade.
Este dispositivo, criado com escopo de afastar imediatamente da disputa o candidato que praticar captação ilícita de sufrágio no curso da sua campanha eleitoral para que, com isso, seja preservada a liberdade de escolha do eleitor, foi abordado calorosamente pela doutrina e jurisprudência no tocante a sua inconstitucionalidade. Isso se deu pelo fato de ter sido criado, mediante lei ordinária, sanção de inelegibilidade, sendo que, somente por lei complementar é que se pode criar causa de inelegibilidade, conforme comando constitucional, ou seja, causas de inelegibilidades devem estar previstas na Carta Magna ou em lei complementar (e não em lei ordinária), pois trata-se de limitações aos direitos políticos, conforme artigo 14, § 9º da CF. Oportuno frisar que, com o advento da Lei da Ficha Limpa, tal discussão perdeu força, uma vez que a trouxe para o âmbito da lei das inelegibilidades (LC 64/90).
A sanção pela prática de tal infração é a multa pecuniária, de mil a cinquenta mil Ufir, cassação do registro ou do diploma, se o corruptor for candidato, além de inelegibilidade por oito anos.
Insta salientar, como bem frisou o professor Olivar Coneglian (2012, p. 291) que até o advento da LC 135/2010 (Lei da Ficha Limpa), a captação ilícita de sufrágio levava à cassação do registro ou do diploma e a multa, sem, contudo, haver declaração de inelegibilidade.
Com o advento da Lei da Ficha Limpa, alterou-se a Lei Complementar 64/90, de modo a, nesta hipótese, também, prevê a incidência de inelegibilidade, vide art. 1º, inciso I, alínea “j”, com a seguinte redação, in verbis:
Art. 1º São inelegíveis:
I – para qualquer cargo:
...
j) os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado da justiça Eleitoral, por corrupção eleitoral, por captação ilícita de sufrágio, por doação, captação ou gastos ilícitos de recursos de campanha ou por conduta vedada aos agente públicos em campanhas eleitorais que impliquem cassação, do registro ou do diploma, pelo prazo de oito anos a contar da eleição.
Ocorre que, o STF, ao enfrentar a constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa, no julgamento conjunto da ADC 29, ADC 30 e ADI 4578, aplicou o instituto da modulação dos efeitos da decisão, na medida em que, entendeu que após a sua entrada em vigência, tal lei somente será aplicada para as eleições futuras, mas atingirá fatos passados em razão de sua retroatividade, o que atualmente vem dando ensejo a inúmeras discussões em âmbito acadêmico, doutrinário e jurisprudencial.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Estado exerce seu poder soberano (democracia) através de representantes do povo, por meio de concessão de mandatos. No entanto o legislador constitucional previu institutos que materializam a prática de pronunciamento direto do povo, quais sejam, referendo, plebiscito e iniciativa popular.
Nesse enfoque se dá a importância do voto, conforme a Constituição Federal, como o principal exercício de sufrágio, por se tratar de ato político que viabiliza o direito público subjetivo que tem o cidadão de eleger, ser eleito e de participar da organização e da atividade do poder estatal.
Dessa forma, a intenção ao escrever o presente artigo foi, sinteticamente, delinear a importância que o ordenamento jurídico brasileiro dá a este tema, verificando as condutas tipificadoras do abuso do poder econômico e político, além da captação ilícita de sufrágio, no intuito de evitar que os cidadãos que possuem capacidade eleitoral ativa venham fazer, no caso concreto, escolhas que posteriormente o desapontem e/ou decepcionem, além da tentativa de conscientização do povo da importância do seu voto, reprimindo condutas ilegais e ilegítimas dos candidatos, visando uma conscientização do voto justo e incorruptível e, ainda, que seja exercido a partir da satisfação do eleitor no candidato e nas possibilidades de melhoria que este apresentar e não como troca de favores.
Para tanto, é de suma importância averiguar se determinado cidadão tem realmente condições de ocupar um cargo político. Os eleitores devem perceber se determinado candidato tem realmente potencial eleitoral, ou seja, devem avaliar concretamente se tem idéias boas, projetos/programas políticos que irão beneficiar a coletividade, avaliar o seu passado político e pessoal, tudo isso com escopo de concretizar o Princípio Constitucional da Autenticidade Eleitoral.
O eleitor também deverá perceber se determinado partido político angariou pessoas com potencial eleitoral e que estejam em sintonia e harmonização com o Estatuto do Partido e também com o Programa Partidário, isso porque deverá o eleito cumprir fielmente o que reza em ambos.
Por fim, deve-se evitar escolher pessoas que se expõem na mídia, seja na TV ou no Rádio (comunicadores e apresentadores de programa), haja vista que, majoritariamente, passam a sua trajetória profissional somente efetuando críticas aos gestores públicos sem nunca ter contribuído efetivamente para a melhoria do social.
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Bacharel em Direito pela UCSal; Advogado - OAB/BA 31.400; Pós-Graduado em Direito Imobiliário pela UNIFACS; Pós-Graduado em Direito Eleitoral pela Fundação César Montes; Pós-Graduando em Direito Público pela Universidade Cândido Mendes.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: HAGGE, Luiz Antonio da Silva. A importância do voto: suas implicações frente ao abuso de poder econômico e político Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 maio 2014, 06:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/39414/a-importancia-do-voto-suas-implicacoes-frente-ao-abuso-de-poder-economico-e-politico. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: SABRINA GONÇALVES RODRIGUES
Por: DANIELA ALAÍNE SILVA NOGUEIRA
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