INTRODUÇÃO
O Decreto nº 4.050/2001[i] dispõe sobre a cessão de servidores públicos federais da administração direta e indireta, conceituando a requisição como ato irrecusável, que implica a transferência do exercício do servidor ou empregado, sem alteração da lotação no órgão de origem e sem prejuízo da remuneração ou salário permanentes.
Devido a insuficiência do quadro funcional da Justiça Eleitoral para a realização de determinadas funções institucionais, sobretudo, em época das eleições, há décadas a Justiça Eleitoral vem se valendo de mão-de-obra requisitada de outros órgãos públicos e de diversas esferas de poder.
Apesar da edição da Lei nº 10.842/2004[ii], que criou cargos e funções nos Quadros de Pessoal dos Tribunais Regionais Eleitorais, destinados às Zonas Eleitorais, ainda esta prática se manteve, com requisições que chegam a durar por mais de 10 (dez) anos.
As requisições para a Justiça Eleitoral estão previstas na Lei 6.999/82[iii], da seguinte forma:
Art . 1º - O afastamento de servidores públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios, dos Municípios e das autarquias, para prestar serviços à Justiça Eleitoral, dar-se-á na forma estabelecias por esta Lei.
Art . 2º - As requisições para os Cartórios Eleitorais deverão recair em servidor lotado na área de jurisdição do respectivo Juízo Eleitoral, salvo em casos especiais, a critério do Tribunal Superior Eleitoral.
§ 1º - As requisições serão feitas pelo prazo de 1 (um) ano, prorrogável, e não excederão a 1 (um) servidor por 10.000 (dez mil) ou fração superior a 5.000 (cinco mil) eleitores inscritos na Zona Eleitoral.
§ 2º - Independentemente da proporção prevista no, parágrafo anterior, admitir-se-á a requisição de 1 (um) servidor.
Art . 3º - No caso de acúmulo ocasional de serviço na Zona Eleitoral e observado o disposto no art. 2º e seus parágrafos desta Lei, poderão ser requisitados outros servidores pelo prazo máximo e improrrogável de 6 (seis) meses.
§ 1º - Os limites estabelecidos nos parágrafos do artigo anterior só poderão ser excedidos em casos excepcionais, a juízo do Tribunal Superior Eleitoral.
§ 2º - Esgotado o prazo de 6 (seis) meses, o servidor será desligado automaticamente da Justiça Eleitoral, retomando a sua repartição de origem.
§ 3º - Na hipótese prevista neste artigo, somente após decorrido 1 (um) ano poderá haver nova requisição do mesmo servidor.
Art . 4º - Exceto no caso de nomeação para cargo em comissão, as requisições para as Secretarias dos Tribunais Eleitorais, serão feitas por prazo certo, não excedente de 1 (um) ano.
Parágrafo único - Esgotado o prazo fixado neste artigo, proceder-se-á na forma dos §§ 2º e 3º do artigo anterior
A Lei 6.999/82 revogou expressamente a Lei 6.678/79[iv], que disciplinava as requisições até aquela data. A lei anterior previa expressamente que a requisição para os Cartórios Eleitorais seria pelo prazo de 1 (um) ano, prorrogável pelo período máximo de seis meses, enquanto que as requisições para as Secretarias dos Tribunais seria por até 9 (nove) meses.
A nova lei aumentou o prazo para 1 (um) ano das requisições para as Secretarias dos Tribunais e em relação aos Cartórios Eleitorais deixou de prever um limite para tais requisições.
De acordo com o atual texto legal, as requisições para os cartórios eleitorais são feitas pelo prazo de 1 (um) ano, prorrogável, sem mencionar expressamente um limite para por fim à estas requisições.
O NOVO ENTENDIMENTO SOBRE O PRAZO DAS PRORROGAÇÕES
Por muitos anos o Tribunal Superior Eleitoral entendeu que a Lei 6.999/82 estabelecia que o prazo das requisições para os cartórios eleitorais seria de -1 (ano) prorrogável por mais um, considerando que o termo prorrogável se encontra no singular, conforme se verificam dos julgados abaixo:
“Pedido. Prorrogação. Requisição. Servidor. Lotação. Secretaria. Tribunal Regional Eleitoral. Impossibilidade. 1. Este Tribunal tem entendimento que a prorrogação de requisição somente é admitida, uma única vez, quando se tratar de requisição para cartório eleitoral. 2. No caso de requisição para Secretaria de Tribunal Regional Eleitoral não é admitida a prorrogação. Pedido indeferido.”
(Decisão sem número de 10.8.2006 no PA nº 19.044, rel. Min. Caputo Bastos.)[v]
“Processo administrativo. Requisição de servidor. Sucessivas prorrogações. Prestação de serviço. Cartório eleitoral. A teor do que dispõe o art. 2º, § 1º, da Lei nº 6.999/82, as requisições para os cartórios eleitorais poderão ser feitas pelo prazo de 1 (um) ano, prorrogável uma única vez. Pedido indeferido.”
(Decisão sem número de 9.5.2006 no PA nº 18.949, rel. Min. Cesar Asfor Rocha.)[vi]
No entanto, no ano de 2009, por meio da Resolução nº 23.046[vii], em razão do Processo Administrativo 19.779, o TSE alterou o seu entendimento quanto ao prazo para prorrogações de requisições para os cartórios eleitorais e deixou a critério dos tribunais regionais eleitorais, na área de sua jurisdição, decidir sobre tais prorrogações, mediante avaliação anual de necessidade.
Neste sentido foi emitida a Resolução nº 23.255/2010[viii], atualmente em vigor.
O novo entendimento defendido pela Justiça Eleitoral contraria perenemente o caráter excepcional e temporário das requisições.
Assim hoje vige o entendimento junto aos Tribunais Regionais Eleitorais – TRE's e junto ao TSE de que as requisições para os cartórios eleitorais não teria um limite estabelecido pela lei, sendo possíveis prorrogações sucessivas, entendimento este que tenta dar legitimidade a várias situações de servidores que se encontram requisitados na Justiça Eleitoral há muitos anos, sem retornar ao seu órgão de origem, muitas das vezes sem a anuência do órgão cedente.
Importante destacar que a requisição para a Justiça Eleitoral é um ato irrecusável[ix], que implica a transferência do exercício do servidor, sem alteração da lotação no órgão de origem e sem prejuízo dos seus direitos e vantagens, com ônus para o órgão de origem, pois o serviço eleitoral prefere a qualquer outro.
O ENTENDIMENTO DO TCU
O Tribunal de Contas da União - TCU, no Acórdão nº 199/2011[x], ao analisar a regularidade dos atos de requisição de pessoal no âmbito dos Tribunais Regionais Eleitorais, considerou como irregulares diversas situações encontradas e especialmente em relação ao prazo das prorrogações assim se manifestou:
20. Ressalte-se que o intuito do legislador foi delimitar prazo para a permanência tanto de servidores requisitados para os Cartórios Eleitorais quanto para as Secretarias dos Tribunais Regionais Eleitorais, sendo que para aqueles foi permitida a prorrogação de prazo e para esses foi dado tratamento mais rígido, não sendo possível qualquer dilação de tempo.
21. Considero, portanto, que dar total liberdade aos Tribunais Regionais Eleitorais sem definir os períodos máximos de requisição de cada servidor é desvirtuar a vontade do legislador.
22. Ademais, há que se considerar que a manutenção de requisições por prazos indeterminados pode ser interpretada como inobservância à realização de concursos públicos para preenchimento de cargos na justiça eleitoral, em comprometimento aos princípios constitucionais da moralidade e impessoalidade."
7. Pelo exposto, sobressai da norma de regência (Lei n. 6.999/1982) que as requisições referentes aos Cartórios Eleitorais, embora contemplem prazo delimitado de um ano, podem ser prorrogadas, e as das Secretarias dos Tribunais Eleitorais, com tempo de duração fixo, não podem ser ampliadas. Para uma e outra modalidade de requisição deve ocorrer um interstício de pelo menos um ano para um mesmo servidor retornar ao Tribunal Regional Eleitoral no qual já prestou serviços.
8. Especificamente sobre a requisição de servidores para cartório eleitoral, cuja legislação tem gerado interpretações divergentes, uma vez que é permitida pelo prazo de um ano e prorrogável, nos termos do art. 2º, § 1º, da Lei n. 6.999/1982, ainda que sem expressa indicação do limite temporal para a respectiva dilação, este Tribunal tem considerado inadmissível, por ter caráter restritivo, que tais prorrogações sejam promovidas indefinidamente ao longo do tempo, de forma a perpetuar o vínculo dos servidores requisitados com a Justiça Eleitoral.
9. O verdadeiro espírito da Lei n. 6.999/1982 é evitar que se eternize o vínculo dos servidores requisitados com a Justiça Eleitoral. Insistir nas prorrogações sem limites de tempo constitui prática inapropriada e que desconsidera os princípios constitucionais da legalidade e da impessoalidade, bem como a consagrada regra, também de estatura constitucional, da obrigatoriedade de prévio concurso público para preenchimento de cargos.
10. O caráter restritivo na interpretação das disposições do art. 2º, § 1º, da Lei n. 6.999/1982 não constitui inovação, tampouco se mostra desarrazoada a exegese de que a prorrogação da requisição de servidor para cartório eleitoral seja feita apenas por uma única vez e, obviamente, pelo prazo máximo de um ano, conforme precedente acima mencionado. Essa regra tem uma finalidade específica: evitar permanência ininterrupta do servidor requisitado nos tribunais regionais eleitorais.
Ao final foram expedidas as seguintes determinações:
Acórdão :
VISTOS, relatados, discutidos estes autos do Relatório da Auditoria da Conformidade realizada pela 3ª Secex no Acre, Alagoas, Amazonas, Amapá, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Rondônia, Roraima, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe e Tocantins.
ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão Plenária, ante as razões expostas pelo Relator, em:
9.1. determinar aos Tribunais Regionais Eleitorais do Acre, Alagoas, Amazonas, Amapá, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraná, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Rondônia, Roraima, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe e Tocantins que:
9.1.1. encaminhem a este TCU, no prazo máximo de 60 (sessenta) dias, plano de ação que contemple a devolução aos órgãos de origem dos servidores cujas requisições contrariem os arts. 2º, 3º, e 4º da Lei n. 6.999/1982, bem como a adequação do percentual de serventuários requisitados ou cedidos de outros órgãos às disposições do art. 3º da Resolução do Conselho Nacional de Justiça n. 88/2009;
9.1.2. façam constar dos processos de requisição de pessoal justificativa acerca das necessidades enfrentadas pelo cartório eleitoral, bem como a relação entre as atividades desenvolvidas pelo servidor no órgão de origem e aquelas a serem desempenhadas no serviço eleitoral, assim como o período necessário para realizar a atividade, caso ainda não o façam;
9.1.3. adotem medidas no sentido de que as requisições de servidores para atuarem nos cartórios eleitorais e nas secretarias dos Tribunais Regionais Eleitorais sejam feitas em caráter temporário, com prazo previamente determinado e sem identificação nominal do servidor, em observância aos princípios constitucionais da impessoalidade e da moralidade, deixando a cargo do órgão ou entidade cedente a escolha, entre aqueles que atendam os requisitos para o desempenho das atividades pretendidas pelo requisitante, do servidor a ser cedido à Justiça Eleitoral;
9.1.4. abstenham-se de designar servidores requisitados para ocupar a função de chefe de cartório eleitoral, seja na condição de efetivo ou substituto;
9.1.5. somente requisitem ou prorroguem a requisição de pessoas com vínculo efetivo com a administração pública, caso ainda não o façam;
9.2. determinar ao Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo - TRE/SP que se abstenha de requisitar servidores para a limpeza de zonas eleitorais do interior e da capital;
9.3. recomendar ao TSE que adote providências tendentes a suprir a Justiça Eleitoral de quadro de pessoal efetivo, de modo que o instituto da requisição passe a ser utilizado tão-somente no atendimento do interesse público específico e pontual que motivou a requisição, deixando de servir como forma de preenchimento permanente dos quadros funcionais do órgão requisitante, cujos cargos devem ser providos por meio de concurso público;
9.4. determinar às Secretarias de Controle Interno do TSE e dos TREs que façam constar do próximo relatório das contas anuais informações sobre o cumprimento das determinações resultantes deste relatório;
9.5. dar ciência deste Acórdão, acompanhado dos respectivos Relatório e Proposta de Deliberação, à Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados, ao Conselho Nacional de Justiça e ao Tribunal Superior Eleitoral
Assim naquele momento o Tribunal de Contas da União considerou que as requisições deste tipo não poderiam ser utilizadas de forma personalizada, solicitando-se nominalmente servidores específicos, pois acabaria por ferir o Princípio Constitucional da IMPESSOALIDADE, e entendeu que as requisições para cartórios Eleitorais deveriam ser feitas pelo prazo de 1 (um) ano, prorrogável uma única vez por igual período.
Infelizmente este entendimento do TCU não durou por muito tempo, pois diante de inúmeros pedidos de reconsideração apresentados pelos Tribunais Regionais Eleitorais, o Acórdão 199/2011 foi retificado pelo Acórdão nº 1551/2012[xi], por meio do qual a Corte de Contas alterou o seu entendimento e concluiu quanto à inexistência de prazo para as requisições para prestar serviços nos Cartórios Eleitorais, reconhecendo a lacuna da lei e alterando as conclusões do Acórdão TCU nº 199/2011, no entanto também ponderou que sucessivas prorrogações podem se caracterizar como fuga ao concurso público, assim como ato violador de inúmeros preceitos constitucionais, conforme transcrição abaixo:
9. Com efeito, a Lei nº 6.999, de 1982, no que diz respeito a requisições para cartórios eleitorais, não estabelece número máximo de prorrogações e expressamente dispõe que a requisição para laborar em cartórios está condicionada, apenas, ao limite de "1 (um) servidor por 10.000 (dez mil) ou fração superior a 5.000 (cinco mil) eleitores inscritos na Zona Eleitoral."
10. Além disso, é cediço que ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), nos termos do Código Eleitoral (art. 23, inciso IX, da Lei nº 4.737/1965), compete expedir normativos relacionados a requisições para cartórios eleitorais. Suas resoluções, em face dessa competência, possuem força de lei em sentido material.
11. E em cumprimento às suas atribuições, o TSE editou a Resolução/TSE nº 23.255/2010, que dispõe sobre a requisição de servidores públicos pela Justiça Eleitoral, de que trata a Lei nº 6.999, de 1982. Esse normativo, em seu artigo 6º, §2º, assevera que compete aos "tribunais regionais eleitorais requisitar servidores lotados no âmbito de sua jurisdição para auxiliarem os cartórios das zonas eleitorais,observada a correlação entre as atividades desenvolvidas pelo servidor no órgão de origem e aquelas a serem desenvolvidas no serviço eleitoral", podendo essas requisições ser prorrogadas mediante avaliação anual de necessidades, caso a caso.
12. Verifico, portanto, que os normativos aplicáveis à matéria não vedam, ao menos expressamente, prorrogações sucessivas, mas apenas as condicionam ao cumprimento de requisitos contidos na Lei 6.999, de 1982, à correlação entre as atividades a serem desenvolvidas pelo servidor e à avaliação anual de necessidades.
13. Por outro lado, a análise a ser realizada não deve estar adstrita aos referidos normativos, mas também deve abordar os princípios aplicáveis à administração pública e as regras contidas na constituição da república.
14. E nesse particular, comungo da preocupação externada pelo relator a quo, no sentido de que a Lei 6.999/1982 pretende que as requisições sejam precárias e que as prorrogações em apreço devem ser adequadamente avaliadas para que não sejam caracterizadas a fuga à regra do concurso público e a infração aos princípios constitucionais. Isso porque na fiscalização em exame foram identificados diversos casos nos quais servidores trabalham na condição de requisitados em cartórios eleitorais há mais de 10 (dez) anos.
15. Assim, assento que embora desejável a limitação das requisições, de forma a coibir situações graves como essas, a solução do problema não perpassa pela imposição, pelo TCU, de um limite do número máximo de prorrogações de requisições anuais. Tal limitação deve, em atenção às competências dos TREs e do TSE, decorrer da expedição de novas resoluções ou da análise pontual desses casos extremos pela corte máxima eleitoral.
16. Destaco que há Tribunais Regionais Eleitorais, verbi gratia o TRE/MT, que no âmbito de suas competências expediu a Resolução TRE/MT nº 611/2009, por meio da qual prevê que apenas poderão existir 2 (duas) prorrogações dos servidores requisitados pala laborar em cartórios eleitorais.
17. Entendo, em acréscimo, que para a dosimetria do número de prorrogações devem ser sopesados, caso a caso, além dos normativos aplicáveis, os princípios da economicidade e da eficácia, na medida em que uma única prorrogação poderia fomentar incremento nos custos de capacitação dos servidores requisitados, ou ainda, por outro lado, comprometer a qualidade de atendimento dos cartórios eleitorais.
Assim o TCU deixou para que o TSE e os TRE's expedissem Resoluções visando estabelecer limites ao número máximo de prorrogações possíveis, no entanto o TSE não os estabeleceu previamente e os TRE's vêm estabelecendo limites que violam claramente os princípios aplicáveis à administração pública e às regras contidas na Constituição da República.
DO ENTENDIMENTO DO MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO
A Consultoria Jurídica do Ministério do Planejamento já se manifestou mais de uma vez sobre este assunto e por último no PARECER Nº 0033 - 3.17/2011/JPA/CONJUR/MP[xii], concluindo pela impossibilidade de sucessivas prorrogações de cessão, por se tratar a requisição de instrumento de índole excepcional e transitória, sendo importante destacar o seguinte trecho da referida manifestação:
18. Com efeito, a requisição/cessão de servidores há de ser encarada como um procedimento de índole excepcional, já que não é, em si, uma forma de provimento (seja originário ou derivado) em cargo público. A requisição é instituto jurídico que se presta a atender situações emergenciais, marcadas pelo signo da excepcionalidade, sempre com o escopo de viabilizar a continuidade na prestação dos serviços públicos pelo órgão cessionário, que, por contingências inerentes ao próprio cotidiano da Administração Pública (v.g., acúmulo eventual de serviços), se vê privado de recursos humanos suficientes ao desenvolvimento regular de seu mister público (esse raciocínio foi bastante bem desenvolvido no PARECER/MP/CONJUR/PLS/Nº 1359 - 3.17/ 2009, anexo a esta manifestação).
Além do que destacou o entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre o tema:
Convém destacar ainda que as alterações promovidas nos arts. 9º e 10 da Resolução – TSE nº 20.753/2000 pela Resolução - TSE nº 22.993/2008 não tem o condão de alterar o entendimento que vigora no âmbito desta Consultoria Jurídica – CONJUR/MP.
20. Isso porque a Resolução do Tribunal Superior Eleitoral - TSE não é dotada de envergadura jurídica suficiente para revogar as disposições veiculadas na Lei nº 6.999/82, de modo que a nova redação emprestada aos dispositivos da Resolução não poderia contrariar ou desbordar dos limites normativos previstos na Lei nº 6.999/82. Há, inclusive, diversos precedentes do STF que advogam esse entendimento, além de reforçarem o caráter emergencial e transitório das requisições de servidores realizadas pela Justiça eleitoral (Tribunal Pleno, MS 25.198/DF, Rel. Min. Marco Aurelio, DJ 26.08.2005; Tribunal Pleno, Mandado de Segurança nº 25.195-6/DF, Rel. Min. Eros Grau, DJ 05.08.2005).
A POSIÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL:
Conforme bem mencionado pelo parecer acima citado, o STF, por diversas vezes, já se manifestou de forma contrária à eternização das requisições ocorridas na Justiça Eleitoral. A esse respeito, confira-se a ementa do Mandado de Segurança nº 25.195/DF[xiii]:
MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. INTERESSE PROCESSUAL DO IMPETRANTE. OFENSA AO PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. INOCORRÊNCIA. SERVIDORES REQUISITADOS. LIMITAÇÃO TEMPORAL. ART. 4º DA LEI N. 6.999/82. RESOLUÇÃO N. 21.413 DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. DIREITO ADQUIRIDO. INOCORRÊNCIA. HIERARQUIA ENTRE AS NORMAS. [...] 3. A requisição de servidores públicos para serventias eleitorais justifica-se pelo acúmulo ocasional de serviço verificado no órgão cujo quadro funcional não esteja totalmente estruturado ou em número suficiente. Trata-se de procedimento emergencial, que reclama utilização parcimoniosa, sem a finalidade de eternizar o vínculo dos requisitados com o órgão para o qual foram cedidos. Daí a limitação temporal prevista no caput do art. 4º da Lei n. 6.999/82. 4. Por força da hierarquia entre as normas, a Resolução do TSE que prorroga o prazo de requisição de servidores, em divergência com o art. 4º da Lei n. 6.999/82, não pode prevalecer. Não há falar-se, pois, em direito adquirido a permanência do servidor no órgão eleitoral. 5. Segurança denegada. (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança no 25.195/DF. Órgão julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Eros Grau. Brasília, DF, 09 de junho de 2005.)(grifo nosso)
A POSIÇÃO DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA:
Até mesmo o Conselho Nacional de Justiça – CNJ já se manifestou por meio de vários Pedidos de Providências decididos em que foi adotado o entendimento a seguir[xiv]:
“A utilização, em caráter permanente, de mão-de-obra cedida e requisitada junto a outros Poderes gera relação de dependência estrutural do Poder Judiciário, quase sempre malfazeja à boa prestação da jurisdição eleitoral, daí por que, para evitar que isso ocorra, a legislação eleitoral especial aplicável ao instituto da requisição de servidores é marcada pela estipulação de prazos para sua duração e pela presença do requisito da excepcionalidade do volume de serviço para sua formalização.”
CONCLUSÃO
Em razão do novo posicionamento do TCU, fruto do atendimento aos pedidos de reconsideração apresentados pelos diversos Tribunais Regionais Eleitorais do país, ao deixar que tais Tribunais regulamentassem internamente as requisições e suas prorrogações, permitiu a permanência de ilegalidade e de violação aos mais diversos princípios constitucionais que devem reger a Administração Pública.
Desde o final de 2012 os Tribunais Regionais Eleitorais vêm fixando prazos absurdos e que perpetuam as situações de requisição, retirando deste instituto a natureza excepcional e temporária.
Viola a razoabilidade a fixação de prazos como os fixados pelos Tribunais Regionais Eleitorais do Rio Grande do Sul e do Ceará que estabeleceram em suas normas o prazo de até 10 anos para as prorrogações de requisições para os cartórios eleitorais e, ainda, permitindo que após 1 (um) ano, o mesmo servidor possa ser requisitado novamente.
Trata-se de uma situação que deve ser combatida, não sendo possível aos órgãos da Administração Pública concordarem com afastamentos de seus servidores indefinidamente de suas funções, nos cargos para os quais ingressaram mediante concurso público, exigindo-se uma postura mais efetiva do Tribunal de Contas da União e até a reapreciação do tema pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Supremo Tribunal Federal mediante atuação da Advocacia-Geral da União e seus órgãos vinculados.
Notas:
[iii] Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6999.htm
[v] Disponível em http://temasselecionados.tse.jus.br/temas-selecionados/materia-administrativa/servidor-publico/requisicao-de-servidor
[vi] Disponível em http://temasselecionados.tse.jus.br/temas-selecionados/materia-administrativa/servidor-publico/requisicao-de-servidor
[vii] Disponível em http://temasselecionados.tse.jus.br/temas-selecionados/materia-administrativa/servidor-publico/requisicao-de-servidor
[viii] Disponível em http://www.tse.jus.br/legislacao/codigo-eleitoral/normas-editadas-pelo-tse/resolucao-nb0-23.255-de-29-de-abril-de-2010-brasilia-2013-df
[ix] Decreto nº 4050/2001.
[x] Disponível em https://contas.tcu.gov.br/juris/SvlHighLight?key=ACORDAO-LEGADO-89252&texto=2b2532384e554d41434f5244414f2533413139392b4f522b4e55
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[xi] Disponível em http://www.tcu.gov.br/Consultas/Juris/Docs/judoc/Acord/20120622/AC_1551_23_12_P.doc
[xii] Disponível em http://sisjur.planejamento.gov.br
Procurador Federal desde 2003. Graduado em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e Especialista em Direito Público pela Universidade de Brasília - UNB. Atualmente cursando Mestrado em Políticas Públicas pelo IPEA/ESAF. É o Chefe da Divisão de Pessoal da Procuradoria Federal Especializada junto ao INSS em Brasília, órgão da Advocacia Geral da União - AGU, com atuação na consultoria e assessoramento jurídicos do INSS em matéria de pessoal - servidor público.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ALEX DA COSTA GRAçANO, . A ilegalidade das prorrogações sucessivas nas requisições eleitorais para os Cartórios Eleitorais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 jun 2014, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/39652/a-ilegalidade-das-prorrogacoes-sucessivas-nas-requisicoes-eleitorais-para-os-cartorios-eleitorais. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: SABRINA GONÇALVES RODRIGUES
Por: DANIELA ALAÍNE SILVA NOGUEIRA
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