Resumo: O livro de Fuller, “O Caso dos Exploradores de Cavernas” é um clássico no estudo do Direito e nos ajuda a entender várias classificações doutrinárias básicas do Direito. Com esse intuito foi feita uma análise de alguns conceitos que podem ser melhor entendidos a partir da leitura da obra.
1. Introdução
O livro analisado quase sempre é utilizado por estudantes iniciando o curso de direito. É possível reconhecer algumas das correntes de pensamento seguidas pelos juristas. Foi escrito por Fuller, cidadão americano, professor de "Jurisprudence" da Harvard Law School e autor de outros trabalhos muito importantes. Neste trabalho, serão analisadas as opiniões dos cinco personagens que compõe a corte do livro analisado e ao final algumas conclusões serão apresentadas.
2. Desenvolvimento
2.1. Presidente Truepenny, C.J.
Este personagem apresenta o caso, explicando que este ocorreu em 4299. As circunstâncias apresentadas foram: cinco exploradores de caverna acabaram presos no subterrâneo depois de um deslizamento, com o desaparecimento dos trabalhadores, forças para o resgate foram acionadas, porém o trabalho foi mais complicado do que o esperado, logo, mais demorado também. Depois de terem a confirmação médica de que não sobreviveriam com os alimentos levados, Roger Whetmore levantou a possibilidade de sacrificar algum dos exploradores presos para a sobrevivência dos outros, após a resistência da participação de qualquer médico, sacerdote ou autoridade, o contato com os isolados foi perdido. Somente com a libertação destes soube-se que Whetmore foi morto.
A partir dos depoimentos dos presentes, conclui-se que estes decidiram a partir da sorte quem deveria ser sacrificado, segundo o que Roger tinha proposto. Porém, antes do lançamento de dados (modo escolhido para determinar a sorte), Whetmore tentou rescindir o contrato. Contudo, os outros não aceitaram isto e na vez de Roger, sem nenhuma objeção do sujeito, os dados foram lançados por outra pessoa e então Whetmore foi considerado como quem deveria ser sacrificado. Houve um julgamento em primeira instância em que os indivíduos foram condenados, mas pediram recurso e clemência para o Executivo, que conta com opinião do tribunal composto, inclusive por este presidente, para determinar seu veredicto.
Truepenny pode ser considerado um positivista moderado (acredita que as leis devem ser seguidas, porém existem casos especiais) devido ao fato de citar a lei e considerar que os réus devem ser condenados, todavia à uma sentença menos brutal que a pena de morte. Então, assim, nem a lei, nem a situação atípica é desconsiderada.
2.2. Foster, J.
Este juiz segue a corrente jusnaturalista (tem como ideal a busca pela justiça, o que é justo prevalece), assim como Bobbio, e não concorda com a abordagem superficial do presidente sobre este caso. Foster afirma que a lei não se aplica à situação sob julgamento, logo os acusados devem ser julgados de modo diferenciado, utilizando para isto dois argumentos. Acrescenta que o Presidente foi muito superficial.
Primeiramente, afirma que os réus se encontravam em seu estado de natureza, logo não poderiam ser julgados pelas leis da sociedade civil. Agiram dessa maneira por falta de opções, quando a vivência conjunta já não era possível e se encontravam em um local desfavorável para tal convivência, logo podem não responder à abrangência desta lei. Houve um contrato aceito e que pode ser considerado válido por ter sido criado em uma situação difícil e diferenciada. A partir deste as regras naturais foram estabelecidas, então não houve uma quebra de regra, logo não teve um crime. Para estabelecer que seria injusta a condenação dos réus, afirma que existem sacrifícios vitais diariamente, tanto em construções como em julgamentos que podem levar à pena de morte.
Seu segundo fundamento é baseado que houve uma violação do que a lei expressa literalmente, porém não há uma quebra da lei, deixando de lado as considerações feitas anteriormente. O julgamento deve ser feito a partir do propósito da lei e há casos anteriores que foram julgados considerando isto. Não há precedente nas leis que poderia ser utilizado para julgamento deste caso. Afirma-se ainda, que a legítima defesa é uma exceção da regra que pode basear o julgamento dos sujeitos do caso como inocentes, porque, ainda, vai contra o papel preventivo da lei, assim como o estado em que os indivíduos se encontravam durante o caso sob julgamento.
Conclui sua argumentação confirmando que inocentar os réus não iria contra às leis, logo o tribunal não estaria deixando de exercer seu papel positivo, afinal nem tudo deve ser considerado literalmente, mas devem existir diferentes interpretações, principalmente quando relacionado ao direito. Conclui que os indiciados são, então, inocentes da acusação de homicídio contra Roger Whetmore.
2.3. Tatting, J.
Tatting encontra-se dividido entre razão e emoção, não sabe como basear seu voto. Então começa sua argumentação invalidando as razões do voto de Foster. Discorda que os réus estariam em seu estado de natureza, uma vez que é impossível determinar quando atingiram tal estado, acrescenta que deveriam ser julgados a partir da lei civil uma vez que conheciam as leis em que a sociedade estava subordinada e encontravam-se em território de abrangência de tal regra.
Alega também que o código natural é péssimo, uma vez que dá maior valor ao contrato do que à vida e que o julgamento anterior não considerou que Roger quis anular o contrato. Menciona que a conclusão apoiada na excludência da legítima defesa é irrelevante, já que é impossível saber o veredicto se Whetmore tivesse assassinado alguém ao se defender, quebrando o contrato firmado naquela situação. Além disso, a função da lei de prevenção não é considerada no caso de legítima defesa, todavia no caso em questão os outros objetivos da lei têm relevância.
A partir da interpretação literal da lei em que os indivíduos estão sendo julgados, eles deveriam sim ser condenados, devido ao fato que houve vontade de matar e discussão de como isto seria realizado. Levanta a questão relativa sobre a excessão da lei, se isto fosse aplicado, em quais outras situações esta lacuna existiria? Tatting diz que segundo a jurisprudência do tribunal retratado, fome não leva, necessariamente, ao estado de natureza, afinal existiram casos de furto por comida que tal alegação não foi considerada, para ele este é um caso único, sem precedentes e sem perspectiva de casos futuros similares.
Finaliza assegurando que os argumentos para decidir o veredicto deste caso levam a conclusões opostas, uma vez que para julgá-los inocentes os raciocínios são fracos e que para condená-los haveria mais mortes, o que desvalorizaria as vidas já perdidas no processo. Termina confirmando que prefere não participar deste julgamento, e, após o veredicto final de todos seus colegas, confirma, que prefere se abster.
2.4. Keen, J.
Keen propõe duas questões iniciais. Inicia seu discurso criticando o discurso do Truepenny, ao afirmar que não deveria tê-lo fundado requerendo a clemência do Executivo, acrescenta que pessoalmente, inocentaria os réus, entretanto deve seguir seu papel jurídico. Depois, acrescenta que somente a lei deve ser considerado neste tribunal, não o lado moral, acabando com a primeira declaração de Foster.
Seguindo a interpretação literal da regra, a primeira vista os sujeitos da ação do caso deveriam ser condenados. A complicação deste cenário seria, segundo este juiz, a parcialidade de seus colegas, que deixam de lado os seus papeis dentro desta corte e esquecem que a lei é a base fundamental para julgamentos. Então é impossível a aplicação de uma lei com inclinações pessoais, tal como posto por Tatting.
Defende que a revisão de uma lei passa por três momentos. Primeiro é necessário definir o motivo da existência de tal regra. O segundo conta com o legislador para descobrir se há alguma lacuna na lei criada. Este processo é finalizado com o preenchimento da lacuna. Critica, novamente, Foster, explicitando que este procura lacunas sempre que possível. Concorda com Tatting no ponto em que o propósito da lei não pode ser utilizado na argumentação, visto que o objetivo da lei é desconhecido, por isso é impossível determinar as lacunas desta.
Afirma que este caso não está na abrangência da exceção da legítima defesa, uma vez que esta só é válida devido ao fato que o assassinado colocara em risco a vida do sujeito da ação, diferente de Whetmore, que nunca pôs em risco a vida de ninguém. Adiciona que se este caso for considerado uma excessão à lei, trará consequências posteriores, assim, um julgamento mais rígido poderia ser melhor em um longo período de tempo e que se isto sempre fosse seguido, o sistema jurídico poderia ser mais eficaz. Finaliza condenando os réus, isto é justificado pelo fato que Keen é considerado um positivista, assim como Kelsen.
2.5. Handy, J.
Este personagem considera fundamental que seja determinado se o contrato feito na caverna é de caráter unilateral. Para ele, a sociedade deve ser regida não só por regras e burocracia, mas também sentimento, acredita na abstração e flexibilidade das leis e formalidades e que devem funcionar como instrumentos, somente. Nem a corrente positivista, nem a jusnaturalista conseguem suprir as necessidades do povo.
Coloca que o caso sub judice teve grande repercussão fora da corte e pesquisas mostraram que a maioria esmagadora da população apoiava a liberdade dos réus e quem torcia pela condenação era um grupo muito específico, fato que deveria guiar os votos dos juízes. Afinal, neste cenário extraordinário não houve quebra da lei, então uma interpretação diferenciada é desnecessária.
Com a finalidade de sustentar sua argumentação, explicita que um acusado pode ser inocentado de quatro maneiras: decisão judicial; o Representante do Ministério Público não inicia o processo; há uma absolvição pelo júri ou o Poder Executivo interfere. Estes casos demonstram que os sentimentos e quereres são considerados dentro do Direito. Para Handy, o júri não inocentou os acusados devido, somente, ao seu porta-voz.
Discorda do Presidente ao complementar que nenhuma parcela da população acreditava que o tribunal deveria condenar os sujeitos, contudo o Executivo deveria perdoá-los, conclui-se que este estaria tentando salvar sua moral pessoal. Acrescenta que se a decisão for para o outro poder, os réus serão condenados, visto que é de conhecimento geral a rigidez e conservadorismo do chefe deste. Tenta convencer que o senso comum é o fator determinante para este júri.
Conclui citando um caso anterior em que o consenso geral foi considerado e teve um grande sucesso. Finaliza afirmando que os exploradores devem ser inocentados e que a sentença deve ser reformulada, isto é justificado por Handy ser realista.
3. Conclusão
A partir da minha análise pessoal do texto, considero que este livro seja de extrema importância para estudantes de direito, já que expõe, de modo interessante, as diversas correntes jurídicas e ainda que podem haver diferentes interpretações da lei. Ao meu ver, o caso é de difícil julgamento e acabei concordando com o voto do Presidente, uma vez que existe uma lei que os condena, porém sua coerção é muito drástica.
Acredito que há falhas nas argumentações de todos que compõe este tribunal. A presidencial é muito superficial, o que faz com que esta cative um pequeno número de fiéis. Foster dá pouco valor a vida e um grande peso ao contrato que pode, inclusive, ser considerado inválido. Tatting não exerce seu papel de juiz, deixa a representatividade social desamparada. Keen não acredita nem nas diferenciadas interpretações nem na abertura das leis. Handy desconsidera demais as leis existentes.
Apesar destas ressalvas, afirmo que todas as sustentações feitas na corte fictícia são válidas e baseadas em argumentos convincentes, que consideram várias noções de direito, tais como: a lei; o contrato; a validade; excludência de ilicitude; querer popular; moral, entre outros. Isto justifica as diferentes opiniões formadas pelos leitores desta obra. Contudo, acho que a gravidade da punição desta lei deveria ter sido mais abordada, uma vez que pena de morte é um assunto muito polêmico e de grande divergência de opiniões no cenário mundial
Referências
"O Caso dos Exploradores de Cavernas" FULLER, Lon L., Porto Alegre, 199
Acadêmica do Curso de Direito da Universidade de Brasília .
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Isabela Maria Rosal. O Caso dos Exploradores de Cavernas e a Introdução ao Estudo do Direito Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 mar 2016, 04:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46201/o-caso-dos-exploradores-de-cavernas-e-a-introducao-ao-estudo-do-direito. Acesso em: 23 dez 2024.
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