Resumo: O presente artigo trata, de forma sintética, sobre os direitos políticos no Brasil, sendo de inegável importância o conhecimento desses instrumentos por meio dos quais a Constituição Federal assegura aos cidadãos o exercício da soberania e a possibilidade de interferir na condução da coisa pública. A mídia e a população vem discutindo cada vez mais sobre política, existindo uma efervescência democrática no Brasil que realça a relevância na análise do sistema político disposto em nosso país, mormente em nossa Constitução.
Palavras-chave: Direitos Políticos. Soberania Popular. Sufrágio. Capacidade Eleitoral. Elegibilidade. Inelegibilidade. Cassação, suspensão e perda.
1 Introdução
A Constituição de 1988, em seu Título II, trata dos "Direitos e Garantias Fundamentais", e traz em seu Capítulo IV, disposições relativas aos direitos políticos. Temas distintos, como o exercício da soberania popular pelo sufrágio e pelo voto, alistabilidade eleitoral, elegibilidade e impugnação de mandato eletivo são tratados pelo constituinte, fornecendo uma variedade de princípios e regras que traçam o panorama dos direitos políticos em nosso ordenamento.
Esses direitos políticos são frutos da chamada primeira “geração” ou “dimensão” dos direitos fundamentais, construída em 1789 com a revolução francesa, onde buscava-se impor limites à atuação do Estado e à criação de um Estado liberal.
Esses direitos, todavia, são uma conquista tardia da sociedade. É certo que os Estados e reinos sempre foram governados por alguém, mas nem todos podiam decidir ou opinar sobre quem seria a liderança. Até a Idade Moderna, inclusive, o problema do voto e sua amplitude perante o povo era evidente, visto que tratava-se de uma representação da estratificação da sociedade. Foi justamente a Revolução Francesa que questionou a igualdade dos homens e a possibilidade de cada indivíduo dar sua opinião e participar da vida pública.
2 Desenvolvimento
2.1 Conceito
Os direitos políticos são a base do regime democrático. Segundo Gilmar Mendes (2014, p.690), a expressão ampla refere-se ao direito de participar no processo político como um todo, ao direito ao sufrágio universal e também ao voto periódico, livre, direto, secreto e igual, à autonomia de organização do sistema partidário e a igualdade de oportunidade dos partidos.
Rodrigo Padilha (2014, p.352) afirma que eles são entendidos como direitos públicos subjetivos que concedem ao cidadão o direito fundamental de participar na formação da vontade nacional.
Essa participação do cidadão na vida pública pode ocorrer de três formas distintas: a) diretamente, através da democracia direta, onde o cidadão vai exercer os poderes políticos e conduzir seu país por si, sem intermediários ou representantes; b) indiretamente, na democracia representativa, onde o cidadão se faz representar, elegendo representantes para , em seu nome, exercecer o poder soberano; e c) misto, na democracia semidireta ou participativa, onde o poder será exercido tanto diretamente como por meio de representantes.
O Brasil adota a democracia semidireta ou participativa, ficando clara essa opção com a análise da Constituição Federal (art.1°, parágrafo único, e 14). Assim, existe um grupo de indivíduos eleitos pelo povo para conduzir a vida política do país e também há instrumentos para a manifestação direta por meio de diversos institutos, como o direito de petição, plebiscito, referendo, iniciativa popular, ação popular e direito de participação. Dentre o rol elencado, três estão previstos no capítulo referente aos direitos políticos: plebiscito, referendo e iniciativa popular.
Enquanto o plebiscito é um instrumento de consulta prévia do povo, o referendo é um instrumento de consulta posterior. Sobre as diferenças, afirma Gilmar Mendes (2014, p.708)
A diferença entre plebiscito e referendo concentra-se no momento de sua realização. Enquanto o plebiscito configura consulta realizada aos cidadãos sobre matéria a ser posteriormente discutida no âmbito do Congresso Nacional, o referendo é uma consulta posterior sobre determinado ato ou decisão governamental, seja para atribuir-lhe eficácia que ainda não foi reconhecida (condição suspensiva), seja para retirar a eficácia que lhe foi provisoriamente conferida (condição resolutiva).
O art. 49, XV, da CRFB, concede ao Congresso Nacional competência para autorizar referendo e convocar plebiscito, sendo completado pelo art. 3.º da Lei 9.709/1998, que estipula que, nas questões de relevância nacional, de competência do Poder Legislativo ou do Poder Executivo, e no caso de incorporação, desmembramento ou subdivisão de Estados e Territórios, o plebiscito e o referendo são convocados mediante decreto legislativo, por proposta de um terço, no mínimo, dos membros que compõem qualquer das Casas do Congresso Nacional.
A iniciativa popular está prevista no art. 61, § 2º, da Constituição, e poderá ser exercida, no âmbito federal, pela apresentação à Câmara dos Deputados de projeto de lei subscrito por, no mínimo, 1% do eleitorado nacional, distribuído em pelo menos cinco Estados, com não menos de 3/10 por cento em cada um deles. No âmbito estadual cabe às Constituições Estaduais estabelecer o quorum de iniciativa. Já nos Municípios, essa iniciativa, conforme art.29, XIII da CRFB, é feita pela manifestação de pelo menos 5% do eleitorado.
2.2 Sufrágio, voto e escrutínio
O art. 14 da CRFB afirma que a soberania popular será exercida pelo sufrágio e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos. Conforme José Afonso da Silva (2003, p.348), o sufrágio é originário do latim (sufragium) e significa aprovação. É o direito público subjetivo de natureza política que tem o cidadão de eleger, ser eleito e participar da organização e da atividade do poder estatal.
Uadi Lammêgo Bulos (2015, p.863-864) alerta que sufrágio não é o mesmo que voto e escrutíneo. O voto seria uma instrumentalização do direito do eleitor, uma expressão restrita que retrata o direito de votar ou de manifestar a vontade em eleições, plebiscitos e referendos. O voto direto, secreto, universal e periódico constitue cláusula pétrea da Constituição brasileira, não podendo ser objeto de emenda (art. 60, § 4°, II e IV) .
Já escrutíneo, em sentido restrito, é o ato de contagem de votos, sendo em sentido amplo uma das fase do procedimento eleitoral, com a apuração, a abertura, o depósito, o recolhimento e a contagem dos votos. Há quem entenda também escrutíneo como o modo do exercício do voto, como o voto secreto ou voto aberto.
A doutrina classifica o sufrágio, em virtude de sua abrangência, em universal, adotado atualmente no Brasil, ou restrito, adotado em Constituições passadas. O sufrágio é universal quando o direito de votar é concedido a todos os nacionais independentemente de fixação de condições de nascimento, econômicas, culturais ou outras condições especiais.
O sufrágio, por outro lado, será restrito quando o direito de voto é concedido em virtude da presença de determinadas condições especiais possuídas por alguns nacionais. O sufrágio restrito poderá ser censitário, quando o nacional tiver que preencher qualificação econômica (renda, bens etc.), ou capacitário, quando necessitar apresentar alguma característica especial (natureza intelectual, por exemplo).
2.3 Espécies de direitos políticos
Do ponto de vista de participação no processo eleitoral, os direitos políticos se classificam em dois grandes grupos: direitos políticos positivos e direitos políticos negativos.
Os direitos políticos positivos são o conjunto de normas jurídicas que asseguram a participação do povo no cenário eleitoral do Estado. Admitem uma subdivisão em direitos políticos ativos, que correspondem o direito de votar (jus sufragio), e direito políticos passivos, onde estuda-se a elegibilidade, o direito de ser votado (jus honorum).
Os direitos políticos negativos são o conjunto de normas que impedem a participação da pessoa no processo eleitoral, como as regras de inelegibilidade.
Para se adquirir a capacidade de votar é necessário o alistamento eleitoral, que conforme Rodrigo Padilha (2014, p.355), consiste em um procedimento administrativo, instaurado perante os órgãos competentes da Justiça Eleitoral, visando à verificação do cumprimento dos requisitos constitucionais e das condições legais necessárias à inscrição como eleitor.
De acordo com o art. 14, §§ 1.º e 2.º, alistamento e voto são obrigatórios para os brasileiros alfabetizados e não conscritos,7 maiores de 18 anos e menores de 70 anos de idade. Já para os analfabetos, maiores de 70 anos e pessoas que possuam entre 16 e 18 anos de idade o voto é facultativo.
As condições de elegibilidade, ao seu turno, estão previstas no art.14, § 3°. São requisitos a nacionalidade brasileira, o pleno exercício dos direitos políticos, o alistamento eleitoral, o domicílio eleitoral na circunscrição, a filiação partidária e idades mínimas que variam conforme a complexidade do cargo e o necessário grau de amadurecimento.
O STF já afirmou que a fixação por lei estadual de condições de elegibilidade em relação aos candidatos a juiz de paz, além das constitucionalmente previstas no art. 14, § 3º, invade a competência da União para legislar sobre direito eleitoral, definida no art. 22, I, da CB." (ADI 2.938, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 9-6-2005, Plenário, DJ de 9-12-2005).
Além disso, o Pretório Excelso decidiu que o domicílio eleitoral na circunscrição e a filiação partidária, constituindo condições de elegibilidade (CF, art. 14, § 3º), revelam-se passíveis de válida disciplinação mediante simples lei ordinária. Os requisitos de elegibilidade não se confundem, no plano jurídico-conceitual, com as hipóteses de inelegibilidade, cuja definição – além das situações já previstas diretamente pelo próprio texto constitucional (CF, art. 14, § 5º a § 8º) – só pode derivar de norma inscrita em lei complementar (CF, art. 14, § 9º)." (ADI 1.063-MC, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 18-5-1994, Plenário, DJ de 27-4-2001.)
A chamada inelegibilidade consiste no impedimento em relação à capacidade eleitoral passiva. A doutrina afirma que esse impedimento poderá ser absoluto, quando o impedimento irá alcançar qualquer cargo eletivo. Como medida excepcional que é, só o constituinte irá definir essas hipóteses. São os casos de inalistáveis e analfabetos. Trata-se de características das pessoas, e não do cargo ou eleição.
Já o impedimento relativo está ligado a certos tipos de cargos ou funções eletivas. O cidadão ainda terá uma elegibilidade genérica, mas não poderá pleitear certos mandatos em virtude de uma situação específica. Tais hipóteses poderão ser regulamentadas por lei complementar, em razão do previsto no art.14, §9° da CRFB.
Sobre o assunto, a partir da edição LC nº 135/2010, conhecida como “Lei da Ficha Limpa”, não se exige mais a presença da preclusão máxima para a configuração da hipótese de inelegibilidade, bastando para tanto que a decisão tenha sido proferida por órgão colegiado.
2.4 Cassação, suspensão e perda dos direitos políticos
Finalmente, a Constituição veda a cassação de direitos políticos, possibilitando-se, todavia, que, em determinados casos concretos, haja a perda ou a suspensão desses direitos. Enquanto a perda sugere definitividade da decisão, a suspensão remete à temporariedade.
Tais hipóteses estão previstas no art.15 da CRFB, não existindo uma explicitação de quais casos seriam perda e quais seriam suspensão. Todavia, sem embargos de entendimentos doutrinários contrários, o cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado (art. 15, I) e a incapacidade civil absoluta (art. 15, II), quando é situação definitiva, remetem à noção de perda dos direitos políticos.
Já a condenação criminal transitada em julgado (art. 15, III), recusa a cumprir obrigação a todos imposta, bem como a prestação alternativa (art. 15, IV), conforme entendimento do TSE e do art. 4.º, § 2.º, da Lei 8.239/1991, e a prática de atos de improbidade administrativa nos termos do art. 37, § 4 (art.15, V), trazem a ideia de suspensão dos direitos políticos.
3 Conclusão
Os direitos políticos são esse conjunto de regras legais e constitucionais fixadas, todas referentes à participação popular no processo político. Essas prerrogativas jurídico-constitucionais servem para traduzir o grau de participação dos cidadãos no cenário governamental do Estado.
Na ordem jurídica brasileira, o alicerce de todos os direitos políticos pode ser identificada no parágrafo único do art. 1° da CF/88, pois todo poder emana do povo, seja por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos da Constituição.
Uma das finalidades mais importantes da democracia é a participação do povo, seja por meio do voto, elegendo os representantes da nação, seja concorrendo a cargos públicos e conduzindo diretamente os rumos políticos do país. É de suma importância, dessa forma, conhecer os institutos que consagram os nossos direitos políticos, visto que apenas com a concreta participação do povo na condução da coisa pública será possível uma mudança no cenário político de forma contundente.
4 Referências
JUNIOR, Antônio Gasparetto. Direitos Políticos Disponível em: <http://www.infoescola.com/direito/direitos-politicos/ >. Acesso em 08 abr 2016.
MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; COELHO, Inocência Mártires. Curso de direito constitucional. 9ª ed. São Paulo: Saraiva. 2014.
PADILHA, Rodrigo. Direito Constitucional. 4 ed. São Paulo: Método, 2014.
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 22 ed. São Paulo: Malheiros, 2003.
BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional. 9 ed.São Paulo: Saraiva, 2015
Advogado. Graduado em Direito pela Universidade de Fortaleza.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: GOMES, Diego André Varjão Costa. Breves considerações sobre os direitos políticos na ordem jurídica brasileira Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 16 maio 2016, 04:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46678/breves-consideracoes-sobre-os-direitos-politicos-na-ordem-juridica-brasileira. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: SABRINA GONÇALVES RODRIGUES
Por: DANIELA ALAÍNE SILVA NOGUEIRA
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