ANA CAROLINA CAMPOS OLIVEIRA [1]
(coautora)
Resumo: O tema a ser abordado no presente artigo busca analisar qual é o negócio jurídico existente entre o trabalhador e os aplicativos digitais, além de examinar a possibilidade de esta ser reconhecida como uma relação de emprego. Aprofundando na Reforma Trabalhista, serão analisadas as inovações e as lacunas da relação do trabalho intermitente, bem como a realidade diante da uberização devido à falta de regulamentação jurídica e estrutural para os trabalhadores subordinados aos aplicativos de entrega. Todavia, essa nova forma de prestação de serviço trouxe controvérsias quanto ao seu real enquadramento e suas consequências, vez que houve um aumento de trabalhadores informais sendo submetidos a situações precárias e quase desumanas, ficando desamparados pelos direitos trabalhistas. Com isso, este artigo tem como base uma análise jurídica infra e constitucional, pesquisas documentais e bibliográficas para adentrar sobre essa precarização dos trabalhos intermitentes que acabam mascarando o número real de desempregados no Brasil.
Palavra-chave: Direitos trabalhistas. Plataforma digital. Relação de Emprego. Trabalho intermitente. Uberização.
Abstract: The theme to be addressed in this article seeks to analyze what is the legal business exists between the worker and digital applications, in addition to examining the possibility of this being recognized as an employment relationship. Going deeper into the Labor Reform, innovations, and gaps in the relationship of intermittent work will be analyzed, as well as the reality in the face of uberization due to the lack of legal and structural regulations for workers subordinate to delivery applications. However, this new form of service provision has brought controversies regarding its real framework and its consequences, since there has been an increase in informal workers being subjected to precarious and almost inhumane situations, being helpless by labor rights. With this, this article is based on an infra and constitutional legal analysis, documentary and bibliographic research to get into the precariousness of the intermittent works that end up masking the real number of unemployed in Brazil.
Keywords: Labor rights. Digital platform. Employment Relationship. Intermittent work. Uberization.
Sumário: Introdução. 1. Direitos trabalhistas constitucionais. 2. Breve evolução histórica do direito do trabalho. 2.1. Noções conceituais dos neologismos: uberização e neo-escravismo. 2.2. A Lei 13.467/2017 e os direitos trabalhistas em relação a uberização. 3. A reforma trabalhista – lei n° 13.467/2017 – flexibilização x desregulamentação. 3.1. O desamparo legal aos motoristas de aplicativo em virtude da inovação digital. 3.2. Jornada móvel e variável no brasil sob a ótica do trabalho intermitente. 4. Conceitos e características do contrato de trabalho intermitente. 4.1. Meios de controle da jornada de trabalho e a subordinação perante o empregador. 4.2. A ressignificação do trabalho em tempos de uberização: uma censura ao neo-escravismo. Considerações finais. Referências.
1. INTRODUÇÃO
A Constituição da República de 1988, trata o valor social do trabalho como fundamental, passando a constar em rol taxativo neste diploma legal, estando na mesma esfera que a dignidade da pessoa humana e outros valores democráticos. Havendo assim, uma expectativa na melhoria das condições dos trabalhadores, tanto de vida, quanto no aspecto laboral, além da credibilidade na diminuição das desigualdades e na inclusão social da classe baixa e média, qual seja a parcela mais necessitada da população brasileira.
Com isso, os direitos trabalhistas passam a ser considerados direitos sociais, fazendo parte ainda, do rol dos direitos fundamentais, os quais garantem a dignidade e cidadania aos trabalhadores, incorporados nos valores da justiça social, como direitos prioritários no âmbito sociojurídico. Diante disso, a Lei n° 13.467 ao entrar em vigor em 2017, reformou diversos temas e direitos na Consolidação das Leis Trabalhistas, tanto positiva quanto negativamente, dentre elas inovou o ordenamento trazendo o instituto do trabalho intermitente, que foi incluído no artigo 443 da CLT, passando a prever a possibilidade de o contrato de trabalho ser caracterizado pela existência de períodos de atividade e períodos de inatividade, sendo o empregado remunerado somente pelo período efetivamente trabalhado.
Nesse aspecto, a Reforma Trabalhista aborda a situação do trabalhador que integra as novas plataformas digitais como entregadores de produtos, serviços e alimentos. Apesar de grande desenvolvimento dos aplicativos digitais os direitos destes trabalhadores não acompanharam tal crescimento, recebendo pouco ou nenhum amparo do ordenamento trabalhista.
Dessa forma, a problematização dessa pesquisa consiste em analisar a efetividade dos direitos fundamentais do trabalhador, previstos na CRFB/88 e na CLT/2017, bem como as dificuldades para sua concretização, principalmente após as alterações recentes da reforma trabalhista e seus reflexos para a preservação do direito social do trabalhador na atualidade. Além disso, o estudo analisa a fundo qual é o negócio jurídico existente entre o trabalhador e as plataformas digitais, quais sejam: uber, rappi, ifood, etc., se existe a possibilidade do reconhecimento desta relação como vínculo empregatício e se há direitos garantidos a esses trabalhadores.
Diante disso, designa-se como objetivo geral estudar, à luz dos princípios constitucionais, da legislação, doutrina e princípios processuais trabalhistas, através de pesquisa em decisões proferidas em processos vigentes na Justiça do Trabalho, apresentando o principal e mais atual entendimento doutrinário e jurisprudencial, comparando as correntes favoráveis e desfavoráveis acerca de sua aplicação no Direito do Trabalho.
Primeiramente, será abordado os direitos constitucionais trabalhistas, destacando-se a importância dos princípios gerais que estão dispostos na Constituição da República de 1988 à medida em que tratam do direito social ao trabalho. Em segundo momento, ao aprofundarmos na Reforma Trabalhista, serão analisadas as inovações e as lacunas da relação do trabalho intermitente, bem como eventuais rompimentos dos direitos trabalhistas e a realidade diante da uberização devido à falta de regulamentação jurídica e estrutural para os trabalhadores subordinados aos aplicativos de entrega.
Por fim, será analisado o controle que o empregador exerce sobre a jornada do trabalhador e como ele pode desenvolver sua autonomia diante da realidade do trabalho intermitente. Na mesma oportunidade, abordaremos a problematização das relações trabalhistas no meio digital, como a subordinação cibernética, analisando, de forma crítica, a precarização desse tipo de trabalho no cenário atual, que configura a chamada “escravidão” legalizada. Ao final, será abordado diretamente o Trabalho Intermitente, conceito, características e críticas às inovações e lacunas trazidas pela Reforma Trabalhista, além dos desafios futuros dessa geração que persiste nesta área para sustento.
Os direitos fundamentais são entendidos como o alicerce básico de um Estado, que informa a concepção ideológica com a afirmação de prerrogativas e institutos inerentes à convivência digna dos indivíduos em sociedade. Enquanto objetos do direito público, os direitos fundamentais constituem-se em um direito especial assegurado frente ao Estado, embora também produzam efeitos entre particulares, com mecanismos próprios de tutela constitucional (SOUZA, 1995, p. 584).
O direito ao trabalho como direito fundamental é importante ao desenvolvimento do homem de modo a assegurar a dignidade cabível a cada ser humano individual, e socialmente, seja na esfera da liberdade, seja no campo dos direitos sociais, ou ainda na convivência harmoniosa e fraterna. Eles exigem a atuação estatal e seus mecanismos asseguradores, para concretizar a dimensão subjetiva desses direitos, garantindo a execução e cumprimento das imposições constitucionais (FELIPE, 2014, p.1).
A Constituição da República Federativa do Brasil, trouxe avanços significativos para os direitos dos trabalhadores. Várias garantias já existentes na CLT receberam status constitucional, alguns direitos foram ampliados e outros incluídos (TST, 2020, p. 1). Ela resguarda a liberdade individual e defende os direitos do cidadão contra o Estado, quando este age contra as carências que atingem a sociedade. O constitucionalista Jorge Miranda (1993, p. 12) assevera:
Quanto fica dito demonstra que a Constituição, a despeito do seu caráter compromissório, confere uma unidade de sentido, de valor e de concordância prática ao sistema de direitos fundamentais. E ela repousa na dignidade da pessoa humana, proclamada no art. 1º, ou seja, na concepção que faz da pessoa fundamento da sociedade e do Estado.
Ademais, a mesma Constituição Federal de 1988 inseriu o trabalho como direito social fundamental, preocupando-se em incluí-los nas cláusulas pétreas para evitar retrocessos. Nessa perspectiva, Arnaldo Süssekind (2001, p.17) manifestou que:
Se os direitos e garantias individuais de índole social-trabalhista, afirmados na Lex Fundamentaes, não podem ser abolidos por emenda constitucional, certo é que não será defeso ao Congresso Nacional alterar a redação das respectivas normas, desde que não modifique a sua essência de forma a tonar inviável o exercício dos direitos subjetivos ou a preservação das garantias constitucionais estatuídos no dispositivo emendado. Permitir o retrocesso resultaria em retornar aos tempos do laisser faire.
O trabalho é uma das dimensões mais importantes da vida humana, sendo pedra fundamental na construção e na organização da sociedade, permitindo por meio de sua análise, desenvolver as complexas e, por vezes, invisíveis relações que tecem a malha social, uma vez que medeia a ação humana na realização do seu projeto de vir e ver. A partir dele, o sujeito tornou-se o ator e o autor de seu espaço tempo (CORTEZ, 2019, p. 9).
O Brasil está adstrito ao princípio do não-retrocesso social, consubstanciando o direito do cidadão frente ações contrárias às garantias sociais já estipuladas, bem como a condição sem a qual não se pode abordar o tema dos direitos trabalhistas. O cerne da Constituição é a valorização do homem em todas as suas dimensões, em que estão presentes, evidentemente, o trabalho e o emprego. Os direitos previstos na Constituição vigente são resultados de uma demanda social e democrática, expressos através de movimentos sociais em busca de uma sociedade justa, livre e solidária (FELIPE, 2014, p.1).
Os direitos sociais não deixam margem à dúvida de seu plano teórico do pensamento constitucional brasileiro, todavia, no plano pragmático, a efetividade dos direitos trabalhistas carece de melhor aplicação por aqueles que promovem o direito em sociedade, pois é observável que a evolução dos direitos sociais trabalhistas não teve a devida proteção de que necessita (SARLET, 2006, p. 40).
Para Felipe (2014, p. 1), o direito social funda-se como o conjunto de princípios, refletindo sobre as relações de trabalho, objetivando a valorização do mínimo existencial, em outras palavras, melhoria na condição social do trabalhador. O autor Cortez (2019, p. 11) corrobora com esse entendimento, para ele, “como corolário do princípio da dignidade da pessoa humana e da necessidade de um conteúdo mínimo essencial tem-se o princípio da proibição do retrocesso dos direitos fundamentais, em especial, o direito fundamental social ao trabalho digno”.
Ainda segundo Felipe (2014, p.1), a proteção é dada aos trabalhadores que dela necessitam para combater os vícios existentes nas relações de emprego. A Constituição é intolerante a preconceitos e proíbe atos discriminatórios no momento da admissão do trabalhador, previstos no inciso XXX do art. 7º CF, o qual determina a proibição de diferença de salários, de exercícios de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil e o inciso XXXI que proíbe a discriminação de salários e outros critérios de admissão aos deficientes físicos, veja-se:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
XXX - proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil;
XXXI - proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência;
[...]
Portanto, é inquestionável a consagração e significativa ampliação dos direitos fundamentais do trabalhador. Os pilares fincados ecoavam a esperança de melhoria das condições sociais, inclusão social e diminuição das desigualdades sociais. O apanhado normativo instituído desenhava um cenário de crescente progressividade social trabalhista, mormente porque a própria Constituição de 1988 fez questão de ressaltar no caput do art. 7º que os direitos apresentados não eram taxativos, utilizando-se para tanto da expressão “além de outros que visem à melhoria de sua condição social.” (QUARESMA, 2018, p. 7)
2.1 Breve evolução histórica do Direito do Trabalho
Para que o Direito do Trabalho alcançasse o nível em que hoje se encontra, foi necessário passar por diversos marcos importantes no Brasil, como por exemplo, a criação do instituto do acidente do trabalho (1919); a criação do Conselho Nacional do Trabalho que pode ser considerado como o embrião da Justiça do Trabalho no Brasil (1923); o direito às férias de 15 dias úteis para os trabalhadores de estabelecimentos comerciais, industriais e bancários (1925) e, a criação do Ministério do Trabalho pelo então Presidente Getúlio Vargas (1930).
Com o propósito de ascensão e desenvolvimento, houve um aumento significativo nas legislações sobre o tema a partir da promulgação da Carta Constitucional de 1934, sendo a primeira constituição a elevar os direitos trabalhistas ao patamar constitucional, tendo em vista sua elaboração influenciada pelas Constituições de Weimar e a Americana. Estas elencaram ainda normas como salário-mínimo, jornada de trabalho de 8 horas diárias, férias, repouso semanal, pluralidade sindical, indenização por despedida sem justa causa e a efetiva criação da Justiça do Trabalho, as quais asseguraram maior liberdade e autonomia.
Diante da necessidade de uma sistematização das leis sobre o Direito do Trabalho, surge em 1943, através do Decreto-lei nº 5.452/43 a CLT – Consolidação das Leis do Trabalho. Em 1988, é aprovada a nova Constituição, na qual o homem torna-se o objeto principal, abandonando o individualismo e valorizando o coletivo, resgatando-se a dignidade da pessoa humana.
A Constituição de 1988 destaca uma nova relação entre o sindicato e o Estado, baseada na organização e autonomia de administração sindical, evidencia também as modificações mais expressivas, como a redução da jornada semanal de trabalho de 48 para 44 horas; a generalização do regime do FGTS e a suspensão da estabilidade decenal; indenização nos casos de demissão sem justa causa; elevação do adicional de hora extra para no mínimo 50%; aumento da remuneração de férias em 1/3; garantia da licença gestante para 120 dias e a criação da licença paternidade; elevação para idade mínima para trabalhar em 14 anos; dentre outros.
Outra evolução trazida formalmente pela CR/1988, é a relação, no artigo 7º, dos direitos dos trabalhadores urbanos e rurais e outros que visam à melhoria de sua condição social. No parágrafo único, acrescentou os direitos assegurados à categoria dos trabalhadores domésticos. No artigo 8º, estabeleceu a liberdade sindical; e, no artigo 9º, o direito de greve. (TST, 2020, p. 1)
E então com a edição da Emenda Constitucional 45/2004, amplia-se a competência da justiça do trabalho, para que possam solucionar também lides oriundas de todas as demais relações de trabalho, bem como as últimas mudanças significativas ocorridas no cenário trabalhista brasileiro como a Emenda Constitucional nº 72 de 2013, onde ampliou o rol de direitos assegurados aos trabalhadores domésticos e a aprovação da Reforma Trabalhista em julho de 2017, pela Lei n° 13.467/17.
O arcabouço normativo apontado elucida as vigas mestras para a construção do Estado Democrático de Direito que, ao olhar o homem como um fim em si mesmo e, consequentemente, combater o uso de sua força de trabalho como mero instrumento, reforça a importância concedida ao valor trabalho para a inclusão social e redução das desigualdades sociais. Nesse sentido, Delgado (2018, p. 65) pontua que:
O Estado Democrático de Direito concebido pela nova Constituição funda-se em um inquebrável tripé conceitual: a pessoa humana, com sua dignidade; a sociedade política, concebida como democrática e inclusiva; e a sociedade civil, também concebida como democrática e inclusiva. Ora, na conformação de todos os elementos desse tripé, em especial a garantia de efetiva dignidade à pessoa humana, além da garantia de efetivação das ideias de democratização e do caráter inclusivo da sociedade política e da sociedade civil, ostenta papel imprescindível o Direito do Trabalho.
2.2 Noções conceituais dos neologismos: Uberização e Neo-escravismo
Com a tecnologia cada vez mais presente no trabalho surge o neologismo "uberização”, que diz respeito a uma nova forma de relação entre empresa e trabalhador, em contrapartida, também se trata de uma nova forma de controle. Essa tendência surgiu como alternativa para o grande índice de desempregados, contudo, precarizou os direitos trabalhistas.
A Uber, empresa que dá origem ao termo “uberização”, foi fundada em 2009, na Califórnia, com a proposta inicial de oferecer caronas, tendo grande repercussão e resultando em sucesso, expandiu-se para diversos outros países, inclusive no Brasil, se fazendo presente em quase todas as grandes cidades, oferecendo um baixo preço pelas corridas, se comparado aos convencionais táxis. Diante disso, esse método foi reproduzido por diversas outras empresas, como o Ifood e Rappi, aplicativos de entrega sob demanda.
Contudo, apesar da facilidade em tornar essa forma de trabalho como subsistência diante do alto índice de desemprego, qual seja de 14,1% em 2020, segundo a agência de notícias IBGE, os motoristas de aplicativos não possuem nenhum vínculo trabalhista com a empresa, são autônomos, e por isso, assumem diversos riscos para finalizar a entrega do serviço solicitado, já que os restaurantes fornecem tão somente a comercialização de seus produtos e a plataforma digital apenas medeiam o vínculo entre vendedores e entregadores.
De antemão, é necessário explicitar que o vínculo empregatício no Brasil se dá pelos requisitos: pessoa física, pessoalidade, não eventualidade, subordinação e remuneração, dispostos nos artigos 2° e 3° da CLT. Tradicionalmente, o empregado é contratado para prestar serviços para o empregador, tendo uma carga horária definida mediante pagamento de salário. Em contrapartida, o fenômeno da uberização se entende pela ausência de vínculo direto com o trabalhador, onde os motoristas, motociclistas e ciclistas assumem toda a responsabilidade dos meios de produção.
Dentre os neologismos que serão abordados nesse artigo, está o Neo-escravismo, e para compreender o conceito deste novo termo, é importante entender a origem da palavra escravidão.
A escravidão surgiu com a chegada e colonização dos Portugueses no Brasil, Nessa perspectiva, pontuou Sérgio Buarque de Holanda (1983, p. 22):
Neste caso, o Brasil não foi teatro de nenhuma grande novidade. A mistura com gente de cor tinha começado amplamente na própria metrópole. Já antes de 1500, graças ao trabalho de pretos trazidos das possessões ultramarinas, fora possível, no reino, estender a porção do solo cultivado, desbravar matos, dessangrar pântanos e transformar charnecas em lavouras, com o que se abriu passo à fundação de povoados novos. Os benefícios imediatos que de seu trabalho decorriam, fizeram com que aumentasse incessantemente a procura desses instrumentos de progresso material, em uma nação onde se menoscabavam cada vez mais os ofícios servis.
Os Portugueses, portanto, já se favoreciam da proximidade geográfica com a África para se valer da mão de obra barata dos negros e deles se aproveitavam para que fizessem o que não estavam dispostos a fazer – trabalhar na agricultura, usufruir da terra, produzir e servir subjugados à autoridade da dominação estrangeira. (COSTA, 2018, p.35)
Ainda segundo Costa (2018, p.35), os Portugueses buscavam um enriquecimento fácil, baseado no que se pode fazer para conquistar o poder sem grandes esforços. Buscavam o usufruto à ética do trabalho, e para isso não importava ter gosto pelo trabalho e sim receber benefício antes de precisar trabalhar.
A passagem do escravismo para o trabalho livre e assalariado é demarcado e delineado por um movimento econômico de transição da agricultura para uma modernização tardia, onde a exploração de mão de obra patrocinou toda essa mutação social. Os novos escravos estão trabalhando em jornadas extenuantes, sem a preservação de sua saúde e dignidade a baixos salários (COSTA, 2018, p.42). A forma de trabalho livre conquistado com o fim do escravismo e o respaldo do capitalismo que auxilia cada vez mais a exploração dos trabalhadores é criticado pelo Professor Gaspar Andrade (2014, p. 112):
Sem querer entrar na polêmica desencadeada pelos marxistas – ortodoxos e não ortodoxos – entre o trabalho vivo e trabalho morto; trabalho produtivo e improdutivo; trabalho material e trabalho imaterial; entre classe proletária ou classe assalariada – o fato é que, para todos eles, no sistema capitalista, a força de trabalho aparece como uma mercadoria, controlada e disciplinada de maneira militar.
Dessa forma, as transformações sociais movidas pelos impulsos da burguesia em uma fase pós-industrial de trabalho trazem consequências diretas ao mundo do trabalho, como precarização das relações de trabalho, exploração, ofensa há direitos trabalhistas. A abertura ao mercado internacional que acelera cada vez mais a globalização, favorece a modificação do ethos do trabalho (ESTEVES, 2015, p. 174).
Nesse contexto, à medida que a sociedade evolui, o mundo do trabalho se transforma. Nos dias de hoje, há uma complexidade de relações de trabalho: trabalhador celetista, autônomo, intermitente, teletrabalho, prestador de serviços, terceirizado, empreendedor individual, etc. Sobre a transição no mundo do trabalho, reflete o doutrinador Gaspar Andrade (2014, p. 65), em artigo:
Em apenas um século de sua dominação de classe, a burguesia criou forças de produção mais imponentes e mais colossais que todas as gerações precedentes reunidas. O domínio das forças naturais, o maquinismo, as aplicações da química à indústria e a agricultura, a navegação a vapor, as ferrovias, o telégrafo, o desbravamento de continentes inteiros, a canalização de rios, o aparecimento súbito de populações – em que século anterior se poderia prever que tais forças produtivas cochilavam no seio do trabalho social?
Assim, se justifica a criação do conceito de Neo-escravismo, ou escravidão contemporânea, sobretudo para evidenciar os diversos abusos e violações dos direitos trabalhistas.
Para Antunes (2002, p. 189), o trabalhador tornou-se “polivalente e multifuncional”, exercendo diversas atividades dentro de um mesmo cargo, sendo obrigado a cumprir uma carga horária cada vez mais exaustiva, tanto no ambiente físico do trabalho, como de forma remota, sendo certo que a possibilidade deste tipo de jornada, somado a jornada ordinária já imposta, representa um retrocesso social. Esse movimento atinge sobremaneira, os trabalhadores, que presos a subordinação aos seus empregadores, se submetem a formas de trabalho atentatórias à dignidade, que em razão de sua reincidência, ficaram conhecidas como formas contemporâneas de trabalho escravo.
Assim, a forma do Neo-escravismo traz traços e características diferentes da escravidão nos tempos de colônia. Naquela, a mão de obra é economicamente vantajosa e farta e está presente tanto na zona urbana como na rural, vinculada sempre a vantagem econômica, considerado o regime de trabalho no qual homens e mulheres são forçados a executar tarefas sem receber qualquer tipo de remuneração. Além disso, as pessoas escravizadas têm suas liberdades tolhidas, pois são consideradas propriedades de seus senhores, podendo ser vendidas ou trocadas como mercadorias.
No momento atual, alguns empregados se submetem a uma entrega extraordinária aos empregos, onde toda sua produtividade é explorada, sujeitando a condições de trabalho desumanas, sendo mantidos em trabalhos forçados, jornadas exaustivas, além de condições degradantes. Essas práticas são consideradas análogas à escravidão contemporânea, sendo apenas uma dessas situações suficientes para configurar a exploração de trabalho escravo.
3 A LEI 13.467/2017 E OS DIREITOS TRABALHISTAS EM RELAÇÃO A UBERIZAÇÃO
3.1 A Reforma Trabalhista – Lei n° 13.467/2017 – flexibilização x desregulamentação
A Lei n° 13.467 ao ser sancionada em 2017, trouxe uma série de mudanças na legislação trabalhista brasileira, as quais 40 foram denominadas de Reforma Trabalhista. A legislação foi apresentada em meio à crise econômica e política pela qual o Brasil vinha passando, com níveis de desemprego atingindo a casa dos 12,7% no ano de 2017, devido a isso, o projeto de lei tramitou em regime de urgência e foi rapidamente aprovado como forma de garantia dos atuais postos de trabalho e um impulso na criação de novos empregos, tratando-se, pois, de verdadeira modernização exigida pelas novas relações de trabalho (ROSSI, 2018, p. 40).
A tramitação acelerada e sem uma efetiva participação popular são algumas das críticas sofridas pela novidade legislativa, que teria sido aprovada com o intuito de favorecer os empresários, suprimir ou reduzir direitos dos trabalhadores e autorizar a flexibilização ampla e irrestrita de direitos por norma coletiva. É esta a crítica de autores como Vólia Bomfim Cassar (2018, p. 1):
O conteúdo da Lei 13.467/2017 desconstrói o direito do trabalho como conhecemos, contraria alguns de seus princípios básicos, suprime regras favoráveis ao trabalhador, prioriza a norma menos favorável ao empregado, autoriza a livre autonomia da vontade individual; permite que o negociado individualmente e coletivamente prevaleça sobre o legislado (para reduzir direitos trabalhistas), valoriza a imprevisibilidade do trabalho intermitente, exclui regras protetoras de direito civil e de processo civil ao direito e processo do trabalho.
Por outro lado, o autor Rossi (2018, p. 38) diz que, a legislação foi saudada pela classe empresarial, para quem o Direito do Trabalho brasileiro é um dos mais custosos do mundo, pois encarece em muito os custos produtivos com um elevado número de encargos sociais a serem recolhidos para pagamento do trabalhador. Outro ponto frequentemente noticiado pelos apoiadores da Reforma é o que chamam de protecionismo exacerbado da Justiça do Trabalho em favor dos trabalhadores, ressaltando que a figura do operário pensado pela CLT, nos anos 40, não mais existe diante de um mundo moderno e globalizado. Esta ideia é sintetizada pelo ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho (2017, p. 3):
A reforma, sob tal prisma, veio para colocar limites ao ativismo judiciário trabalhista, não muito diferente daquele praticado por outros ramos do Judiciário, mas vincado pela unilateralidade e excesso, tornando insuportável o seu peso sobre o empresariado nacional, que tem perdido competitividade internacional e capacidade de geração e manutenção de empregos.
Como pode-se observar pelo entendimento acima, é a polarização a respeito da Reforma Trabalhista que está vinculada a concepções político-ideológicas, sobretudo quanto ao papel do Estado na regulação da economia e das relações de trabalho. Porém, ressalta-se que o presente artigo não busca posicionamentos políticos e ideológicos, tão somente analisar os impactos trazidos por tal mudança no ordenamento jurídico nacional, partindo-se de uma análise constitucional.
No contexto de modificações trazidas pela reforma trabalhista, a flexibilização do Direito do Trabalho surge como uma opção. Para Sérgio Pinto Martins (2000, p. 25), essa se caracteriza por ser o “conjunto de regras que tem por objetivo instituir mecanismos tendentes a compatibilizar as mudanças de ordem econômica, tecnológica, política ou social existentes na relação entre o capital e o trabalho”.
A flexibilização, por outro lado, não se confunde com a desregulamentação: para grande parte da doutrina, esta consistiria na ausência total de intervenção do Estado nas relações de trabalho, cuja regulação competiria à autonomia privada, individual ou coletiva. A flexibilização, no entanto, manteria um padrão mínimo de direitos impostos pela norma estatal a ser respeitado, relegando um maior espaço de adaptação aos indivíduos (CUNHA, 2004, p. 119).
Deve-se observar, entretanto, a advertência trazida por alguns autores no sentido de que a flexibilização trabalhista pode ser utilizada como um meio de desregulamentação dos direitos dos trabalhadores. No mesmo caminho, é a ressalva bem colocada por Carlos Roberto Cunha (2004, p. 118), para quem a flexibilização “tende a reduzir agressivamente a rede de proteção da tutela do trabalho, quando deveria significar tão-somente arrefecer, sem desnaturar, o princípio da proteção, princípio-mor que governa o Direito do Trabalho”.
Vale ressaltar que, de acordo com o autor Felipe (2014, p. 1), o direito ao trabalho resulta de toda uma construção principiológica e doutrinária, reconhecendo o homem como ser universal que deve participar da construção da sociedade em cujo pacto social está inserido. Entretanto, não basta o simples acesso ao trabalho, o trabalhador ao prestar seus serviços para o empregador terá direito a uma contraprestação, que lhe proporcionará uma condição de suprir suas necessidades vitais básicas. Tais direitos subsistentes da relação laboral estão consagrados no art. 7º da CF/88.
3.2 O desamparo legal aos motoristas de aplicativo em virtude da inovação digital
No século XX, a relação empregatícia se caracteriza ao ter de um lado a presença do empregado – considerado a parte hipossuficiente, que precisa oferecer mão de obra para receber subsistência, e do outro lado, o empregador – possuidor dos meios de produção. Para que seja regulado esse desequilíbrio e resguardado os direitos de ambos, há a aplicação das normas pela Consolidação das Leis Trabalhistas.
Ao analisar que esses meios empregatícios têm sido o grande gerador de renda e que ainda, conseguiu fomentar a economia proporcionando subsistência a várias famílias brasileiras, há que se considerar, que este serviço é disponibilizado de uma forma informal, sem amparo, proteção e segurança. Em contrapartida, apesar da grande relevância para a economia e para muitas famílias brasileiras que tiram seu sustento do trabalho vinculado aos aplicativos, o processo de desregulamentação e informalidade trabalhista tem crescido junto da precariedade, da insalubridade e da falta de amparo social a esses trabalhadores.
Ante o exposto, esta inovação contratual ainda permite que acordos coletivos e convenções coletivas tenham prevalência sobre o disposto em lei (611-A CLT), o que nos faz pensar que diante das lacunas existente quanto ao tipo contratual necessária se faz a regulamentação em sede de acordos ou convenções quanto à jornada mínima semanal, para que assim o trabalhador possa garantir um mínimo mensal, assim como estipular as classes de trabalhadores que possam laborar de maneira intermitente, classificando os a depender da função do qual exerçam, ou mesmo a faixa etária de idade permitida para o tipo contratual. Diversas são as lacunas que podem ser regulamentadas através de convenções coletivas ou acordos, considerando que a medida provisória perdeu sua vigência, podemos pensar nessa regulamentação em um futuro mais próximo por meio dos direitos coletivos.
No âmbito do trabalho, atualmente encontram-se diversas plataformas digitais, alcançando setores da economia de transportes, serviços, profissionais liberais, entre outros. Essas plataformas criam um mercado de pessoas conectado com os consumidores, que necessitam de serviços específicos oferecidos por outras pessoas. A virtualidade da interconexão promove o encontro do trabalhador prestador com o consumidor, sujeitos que dificilmente se encontrariam por meios físicos ou presenciais. (OLIVEIRA, 2020, p. 158)
Os restaurantes vinculados aos aplicativos de comida, em tese, são empreendedores ou donos de “empresas independentes”, em vez de empregados tradicionais. Isto permite às empresas minimizar os custos de mão de obra, na linha de custo marginal zero, bem como transferir riscos ou mesmo se blindar contra eventuais ações judiciais. Todavia, defender essa suposta autonomia significa não poder obrigar os motoristas e ciclistas a comparecerem em um local e horário específicos. E essa incerteza quanto à disponibilidade poderia causar estragos em um serviço cujo objetivo é transportar passageiros e alimentos sem interrupções, quando e onde quiserem os usuários. (LEME, 2020, p.141)
Ainda de acordo com Oliveira (2020, p. 162), nessas plataformas digitais de trabalho, vários riscos do negócio são repassados ao trabalhador, a exemplo do cancelamento das chamadas, do tempo de espera não remunerado aos motoristas e ciclistas e do risco social de doença ou acidente, além das despesas com equipamentos ou veículos.
Assim, apesar de alcançarem um meio de subsistência, esses trabalhadores deixam de receber garantias e proteções, pois, além de arcar com seus próprios recursos e meios de produção, têm de custear com os riscos dessa atividade. Desse modo, antes da legislação priorizar o preenchimento dos cinco requisitos jurídicos para caracterizar a existência do vínculo empregatício, há de se perceber, em contrapartida, quais são as consequências negativas e os eventuais problemas ocasionados em decorrência dessa desregulamentação.
Não obstante, na circunstância atual desses funcionários que dependem do sustento familiar das plataformas digitais, acabam aceitando a subordinação da prestação de serviço mesmo sem o respaldo legal e o amparo dos direitos. A faixa salarial desses trabalhadores, a partir de um tempo de vivência de trabalho via plataforma, é bastante diminuta e, logicamente, inversa às propagandas que as plataformas fazem. Surge, assim, o discurso em que o lema é que esta remuneração é melhor que nada. (OLIVEIRA, 2020, p. 158)
Em suma, os trabalhadores das plataformas digitais são colocados na relação contratual formal, na posição jurídica de parceiros autônomos. São livres para trabalhar ou não no horário que escolher, porém, por não ganharem o suficiente, são compelidos a trabalhar uma jornada exacerbada fisicamente e mentalmente possível. É imprescindível destacar que apesar de estarem em uma condição de autônomos, não as tem para fixar o preço do próprio trabalho nem mesmo para rejeitar clientes ou avaliar o vínculo de parceria na plataforma digital.
A Corte de Cassação francesa, no caso Take Eat Easy de 2018, qualificou como contrato de emprego a relação existente entre a referida plataforma digital e seus entregadores ciclistas. Após essa decisão, a maioria desses trabalhadores deve ser qualificada como empregados na França, o que permitirá que se beneficiem da proteção do Direito do Trabalho e da Seguridade Social. (DOCKÈS, 2020, p.172)
O interesse por essas proteções garantidas pelo reconhecimento da relação de emprego, como ocorreu na França, parece óbvio, já que elas evitam que esses trabalhadores se tornem uma espécie de subempregados, mal pagos e superexplorados. No Brasil, enquanto não ocorre tal reconhecimento, aplica-se, no âmbito das relações de trabalho, inclusive em plataformas digitais, a norma mais benéfica ao trabalhador, num eventual desamparo legal. A condição mais benéfica ao trabalhador deve entender-se por: vantagens já conquistadas e não podendo ser modificadas para prejudicá-los.
Para Chaves Júnior (2019, p. 24), o Direito do Trabalho deve atentar para a circunstância de o capitalismo tecnológico não efetuar a disciplina dos corpos, mas sim o controle da mente e da criatividade do trabalhador, o que dificulta a identificação dos elementos caracterizadores da relação de emprego.
Esse é o desafio atual de todos os operadores do direito na área do Trabalho: apreender os fenômenos gerados pelas novas tecnologias, analisando caso a caso as relações de trabalho estabelecidas, incumbindo-lhes verificar a presença ou não dos pressupostos do vínculo empregatício, tal como disciplinados no art. 3º da CLT. Só assim será possível averiguar a condição de empregado por parte de trabalhador, estendendo-lhe a proteção jurídica outorgada pela legislação trabalhista, em toda a sua extensão, inclusive no que diz respeito à jornada de trabalho, patamar mínimo remuneratório, recolhimento de contribuição previdenciária e outros (ALVES PINTO, 2017, p.199)
4 JORNADA MÓVEL E VARIÁVEL NO BRASIL SOB A ÓTICA DO TRABALHO INTERMITENTE
4.1 Conceitos e características do contrato de trabalho intermitente
O contrato de trabalho intermitente é uma exceção ao contrato de trabalho comum e jornada fixa de oito horas diárias e 44 semanais, tendo em vista que a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços, não havendo previsão de jornada fixa nem de quantidade de horas a serem trabalhadas. Portanto, o trabalhador não possui uma previsão de dias a serem trabalhados nem horário de entrada e saída, conforme se infere do §3º do art. 443 da CLT:
Considera-se como intermitente o contrato de trabalho no qual a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas, regidos por legislação própria.
No trabalho intermitente, o empregado é regularmente contratado, com registro em carteira, com todos os direitos garantidos, mas em um sistema mais flexível de trabalho, conforme dizeres PAPEL; DUTRA; MAGNO (2017, p.44)
Embora seja um contrato atípico, não há qualquer limitação quanto ao seu uso, de modo que poderia até se expandir de forma sistemática tanto no mercado de trabalho e quanto aos trabalhadores subordinados à uberização.
Nesse sentido, algumas das características e exceções nesse modelo contratual, é a inexistência de horário ou carga horária predefinida; como o empregado é contratado sem jornada prefixada o pagamento é apenas das horas efetivamente trabalhadas, sem o cômputo das horas à disposição do empregador. Essas condições representavam expressiva insegurança do salário mensal, que poderia chegar a ser inferior ao piso salarial da categoria, nos termos do §5º do art. 452-A da CLT.
Nesse sentido, há de se reconhecer que essa situação gera além da insegurança, instabilidade à parte hipossuficiente, pois, a garantia de que o valor horário do salário-mínimo deva ser respeitado não significa, por si só, a garantia da contraprestação mensal.
Ainda no sentido de buscar uma melhor alternativa para resguardar os direitos e a qualidade de vida dos motoristas e ciclistas de aplicativos digitais, apesar de não se reconhecer o vínculo laboral formalmente nas relações entre os entregadores e as empresas de aplicativos, o que se observa, na realidade, é a instabilidade jurídica e, por vezes, a imposição de óbices infundadas sobre a execução de tais atividades, os quais sobressaltam, inclusive, aos interesses previamente firmados entre as partes.
Na modalidade do trabalho intermitente há direitos reconhecidos que a eles não são destinados, como: previsão de pagamento de décimo terceiro salário e férias acrescidas de 1/3 proporcionais, além das parcelas ordinárias (remuneração, repouso semanal remunerado e adicionais legais), conforme § 6º, art. 452-A da CLT
§ 6o Ao final de cada período de prestação de serviço, o empregado receberá o pagamento imediato das seguintes parcelas: I - remuneração; II - férias proporcionais com acréscimo de um terço; III - décimo terceiro salário proporcional; IV - repouso semanal remunerado; e V - adicionais legais.
Nesse sentido, considerando que há exceção no reconhecimento do vínculo empregatício dos trabalhadores intermitentes apesar de não, necessariamente, cumprir todos os requisitos determinantes, há de se buscar e alcançar a legitimação da relação trabalhista entre entregadores e estabelecimentos de plataformas digitais.
4.2 Meios de controle da jornada de trabalho e a subordinação perante o empregador
Nos aplicativos digitais, a exemplo da “Uber”, a vigilância sobre o motorista é ininterrupta, pois sabe-se o seu local exato em tempo real e até se programa a sua próxima viagem. Quando o motorista indica que encerrará sua jornada, a Uber lhe envia mensagens de estímulos e até com oferta de premiações para a continuidade de disposição ao trabalho.
Por outro lado, não há escolha do motorista quanto às viagens demandadas, aliás o trabalhador sequer sabe qual itinerário irá percorrer com o cliente demandante. Caso o motorista tente burlar o sistema da Uber recusando corridas curtas, o poder punitivo se manifesta severamente: “A rejeição de viagens não rentáveis coloca em risco a continuidade do motorista no aplicativo, uma vez que a empresa pode suspendê-lo ou excluí-lo” (OITAVEN; CASAGRANDE; CARELLI, 2018, p. 19).
As empresas de delivery elaboram termos de uso para que os entregadores assinem e concordem, ficando claro que as empresas não têm responsabilidade por qualquer prejuízo ou danos decorrentes ou relativos a atividades de entrega, apesar dessa situação há uma possibilidade de comprovar a existência de dois requisitos pilares para o reconhecimento do vínculo empregatício, a pessoalidade, quando o entregador não pode fazer o serviço, não o faz substituir por outro e a pessoa física, vez que aceitam entregadores de pessoa jurídica.
Trabalham de segunda-feira a domingo sem qualquer contrato, em jornadas que podem ultrapassar as 24 horas seguidas, há afirmação da não eventualidade, arriscando-se entre carros e ônibus, sem garantias ou proteções legais e, muitas vezes, por menos de um salário-mínimo, reconhecendo a existência da onerosidade a partir da contraprestação.
Por fim, comprovando mais uma vez a existência da subordinação às plataformas digitais, estas disponibilizam, aos entregadores, um contrato constituído de forma unilateral, conforme a vontades das empresas, não sendo possível discutir as cláusulas. Os “Termos e Condições” de uso das plataformas exigem que os trabalhadores se cadastrem na condição de autônomo, afastando, com isso, qualquer obrigação empregatícia.
Nesse sentido, é de bom alvitre regular essa relação, pois existe um nível de subordinação entre os entregadores e as empresas por aplicativos. Aquele, por exemplo investe na compra de um veículo e essa pode desligá-lo sem maiores explicações, estando sem proteção nenhuma quanto aos seus direitos trabalhistas.
Na prática, os entregadores após serem devidamente cadastrados, recebem notificações de pedidos de entrega nas proximidades em que ele se encontra, ou seja, suas entregas/viagens só serão abertas para cumprimento somente para estabelecimentos em que ele se encontre a um determinado raio de distância, caso contrário seu acesso não fica sequer liberado para aceitar tal diligência. Ao aceitar uma entrega, o parceiro deve retirar o pedido no restaurante e seguir até o consumidor, independente das condições; após tantas entregas, o “colaborador” pode optar entre receber pagamentos a cada 7 dias na conta bancária ou quando desejar por outro aplicativo de pagamento.
Assim, apesar de não ter uma legislação específica, já existem decisões que reconhecem o vínculo trabalhista entre as empresas de aplicativos e os entregadores, por preencherem todos os requisitos presentes no art. 3º da CLT. Em 2019, as empresas de aplicativos já eram os maiores empregadores do Brasil, com 3,8 milhões de pessoas vivendo do trabalho dessas plataformas, mesmo não tendo o reconhecimento de qualquer vínculo ou relação trabalhista.
Entretanto, as condições fáticas, às quais os entregadores são submetidos, nem sempre atendem às características que revestem o trabalho autônomo, ou seja, dentre outras, a liberdade e independência de desenvolverem suas atividades e a fixação livre do preço do serviço por parte do prestador. A grande discussão na Justiça do Trabalho, entretanto, é identificar qual o vínculo entre as duas partes e, para solucionar o impasse, especialistas apontam a necessidade de uma regulamentação própria, sendo urgente que o legislador o faça.
Todavia, o vínculo entre os entregadores e as empresas dos aplicativos já existem, atendem todos os cinco requisitos necessários para o reconhecimento do vínculo empregatício, estando pendente tão somente o reconhecimento legislativo. Nesse viés, o Recurso Ordinário Trabalhista 0011710-15.2019.5.15.0032 do TRT-15 em Campinas (SP), reconheceu o vínculo trabalhista entre um motorista e a empresa Uber, conforme decisão divulgada em 26 de abril de 2021, conforme:
O RECONHECIMENTO DO VÍNCULO DE EMPREGO COMO SUPOSTO INVIABILIZADOR DO NEGÓCIO (DO AVANÇO DA "MODERNIDADE E DA TECNOLOGIA"). 1. O Procurador Regional do Trabalho Dr. Cássio Casagrande, no artigo "Com motoristas empregados, o Uber acaba? Os saltos tecnológicos do capitalismo e a regulação da economia digital" , de 1.3.2021, afirma que: "Tudo isso apenas está se repetindo agora na" quarta "revolução industrial. O trabalho com a intermediação de aplicativos gerou uma massa de trabalhadores precários, destituídos de qualquer proteção. Cedo ou tarde, pelo legislativo ou pelo judiciário, a regulação virá. Se o Uber não conseguir manter certos direitos sociais para seus motoristas, a empresa pode, sim, desaparecer. E isso não é ruim, pelo contrário. Será substituída por outras mais eficientes. O mais provável é que ela puramente se adapte (já o está fazendo em estados como Nova Iorque e Califórnia, onde é obrigada por lei a pagar salário-mínimo e limitar a jornada de motoristas). Mas as corridas e entregas vão ficar mais caras para os consumidores se direitos forem reconhecidos aos motoristas? Provavelmente sim, porque hoje elas estão artificialmente baratas, pois o" modelo de negócios "destas empresas inclui superexplorar trabalhadores e sonegar contribuições fiscais e previdenciárias (e na verdade somos nós contribuintes que estamos subsidiando a empresa). O aumento no preço dos bens de consumo e serviço em razão da criação de direitos sociais é inevitável, e é um progresso. Do contrário, vamos defender que nossas roupas sejam feitas por crianças trabalhando em regime de servidão ou que se restabeleça o transporte urbano por tração humana. Creio que não queremos voltar aos tempos do" King Cotton "no Sul dos EUA, nem ao Brasil Império do palanquim e da liteira." O artigo do Dr. Cássio Casagrande mostra que a tecnologia sempre será bem-vinda, porém não pode ser utilizada como forma de subtrair os direitos dos trabalhadores. O baixo custo do serviço prestado por meio da plataforma não pode ser suportado pelos motoristas, pois quem desenvolve a atividade econômica tem a obrigação de respeitar os direitos fundamentais dos trabalhadores, sob pena de prática de concorrência desleal com os serviços até então estabelecidos, provocando uma erosão social com o aniquilamento dos direitos fundamentais dos trabalhadores. 2. Diante do exposto, dou provimento ao recurso ordinário do trabalhador para reconhecer o vínculo de emprego.
(TRT-15 - ROT: 00117101520195150032 0011710-15.2019.5.15.0032, Relator: JOAO BATISTA MARTINS CESAR, 11ª Câmara, Data de Publicação: 26/04/2021)
5 A RESSIGNIFICAÇÃO DO TRABALHO EM TEMPOS DE UBERIZAÇÃO: UMA CENSURA AO NEO-ESCRAVISMO.
O avanço das forças produtivas apropriadas pelo capital, aliado ao contexto de transformação das relações socioculturais que abarcam as esferas da produção e do consumo, tem possibilitado a ascensão do fenômeno da uberização do trabalho, termo derivado da forma de organização da empresa Uber. (FRANCO, FERRAZ, 2019, p. 01)
Para Abílio (2019, p. 02), a definição de uberização do trabalho se refere a uma nova forma de gestão, organização e controle do trabalho que se firma como tendência global no mundo do trabalho. Nesta definição, o uberização se concretiza em uma multidão de trabalhadores subordinados a uma única empresa. Tal processo atualmente consolida o trabalhador como um auto gerente-subordinado que já não é contratado, mas se engaja no trabalho via a adesão às plataformas.
Nessa condição de quem adere e não mais é contratado, o trabalhador uberizado encontra-se inteiramente desprovido de garantias, direitos ou segurança associados ao trabalho; arca com riscos e custos de sua atividade; está disponível ao trabalho e é recrutado e remunerado sob novas lógicas. (ABÍLIO, 2019)
Como destaca Antunes (2000), sob o sistema do capital, o trabalho é esvaziado de sentido, uma vez que se torna uma atividade mediada para a produção de valor ao capitalista. Enquanto manifestação de fenômenos político-econômicos e culturais, os modelos de organização do trabalho se transmutam continuamente para dar conta das mudanças que ocorrem no “sistema de socio metabolismo do capital”, cuja tendência é sempre de expansão (MÉSZÁROS, 2011). Nesse sentido, as estratégias de controle do trabalho, para além das inovações tecnológicas, invariavelmente abarcam diferentes formas para a exploração da força de trabalho.
Para Fontes (2017), Quanto mais se expande o capitalismo, mais o trabalho assume múltiplas configurações, recobertas por contraditórias aparências, disseminadas, enfatizadas pela propaganda e pela atuação empresarial e estatal. Duas aparências assumem a frente na atualidade: o trabalho reduzir-se-ia a emprego, e seria superável, eliminável da vida social.
O desenvolvimento de forças produtivas para determinar o valor dá origem através dos fenômenos de proporções globais como a relativamente recente “uberização” do trabalho. Sem qualquer vínculo empregatício, os motoristas da Uber trabalham como profissionais autônomos e assumem diversos riscos para oferecer o serviço, detendo quase a totalidade dos meios de produção necessários à execução da atividade e por eles integralmente se responsabilizando. Levando em conta que o Direito do Trabalho brasileiro recalcitra em classificar o motorista como empregado – esse trabalhador está, além de impelido a investir nos instrumentos de trabalho, desprotegido nessa relação de trabalho. (FRANCO, FERRAZ, 2019, p. 02)
A uberização do trabalho representa um modo particular de acumulação capitalista, ao produzir uma nova forma de mediação da subsunção do trabalhador, o qual assume a responsabilidade pelos principais meios de produção da atividade produtiva. A subsunção virtual do trabalho ao capital indica que o trabalhador está subordinado na relação de trabalho sob os moldes da uberização, ainda que a aparência imediata seja de autonomia e liberdade sobre a forma produtiva. A determinação sobre como executar o trabalho, sobre os padrões e as metas produtivas se centra na empresa detentora da plataforma de intermediação, enquanto o trabalhador, em vez de submetido diretamente a um contrato de trabalho formal, submete-se às imposições estabelecidas sob o risco de desligamento da ocupação. O cenário de subordinação estrutural reforça sua necessidade de venda da força de trabalho para a autossubsistência. (FRANCO, FERRAZ, 2019, p. 02)
Corroborando com Franco e Ferraz (2019), o autor Abílio (2019) reafirma que a uberização traz um tipo de utilização da força de trabalho que conta com a disponibilidade do trabalhador mas o utiliza apenas quando necessário, de forma automatizada e controlada. A empresa-aplicativo detém o controle e a possibilidade de mapear e gerenciar a oferta de trabalho e sua demanda, a qual também está mediada pelo aplicativo e subordinada a ele. Como dito, o trabalhador está disponível, mas não tem qualquer possibilidade de negociação ou influência na determinação da distribuição de seu próprio trabalho nem sobre o valor do mesmo. As próprias regras sobre a distribuição do trabalho, bonificações, determinação do valor do trabalho e suas variações não são claras ou pré-definidas.
Nesse viés, vale a pena explorar alguns elementos da relação entre trabalho e emprego. Em primeiro lugar, a profunda contradição entre o que é apresentado socialmente como “liberdade” do ser social, a sua vocação, em contraste com sua sujeição cotidiana aos empregadores. Essa contradição é vivida no cotidiano dos empregados, tensos pelo temor do desemprego, pelo bloqueio que o emprego impõe aos inúmeros outros afazeres e possibilidades da existência (o acompanhamento dos filhos, o esporte, a cultura, o lazer, as viagens etc.). A existência real estaria fora do emprego, mas este ocupa quase todo o tempo, introduzindo uma profunda e dolorosa fissura entre o tempo de trabalho e a vida. Em segundo lugar, o resultado do processo de trabalho não faz sentido para o empregado, que integra uma espécie de grande “sistema” coletivo, subordinado a um patronato que, em muitos casos na atualidade, sequer é visível ou incorporado em pessoas concretas (tal como os “acionistas”). (FONTES, 2017, p.05)
Ainda para Fontes (2017), a necessidade vital, de subsistência (que é sempre socialmente realizada, e não apenas singular), torna-se um imperativo maior, avassalador, apresentado como se fosse um “valor” máximo e urgente. Necessidade travestida – dramaticamente – em seu contrário, como se fosse liberdade. Marx realizou profunda crítica da Economia Política e permitiu compreender que, em todas as sociedades historicamente existentes, somente o trabalho produziu riqueza, embora ele tenha assumido formas as mais diversas.
O autor Abílio (2019) diz que, o empreendedorismo prometido pelo Uber, assume uma forma obscura sobre os processos de informalização do trabalho e transferência de riscos para o trabalhador, o qual segue subordinado como trabalhador, mas passa a ser apresentado como empreendedor. Fundamentalmente, trata-se de um embaralhamento entre a figura do trabalhador e a do empresário. Essa indistinção opera de forma poderosa, por exemplo, no discurso da empresa Uber, que convoca o motorista a ser “seu próprio chefe”. O empreendedorismo torna-se genericamente sinônimo de assumir riscos da própria atividade.
Opera aí um importante deslocamento do desemprego enquanto questão social para uma atribuição ao indivíduo da responsabilização por sua sobrevivência em um contexto de incerteza e precariedade. No que concerne à uberização, vê-se que tal discurso empreendedor é veículo para o obscurecimento das relações entre capital e trabalho, na medida em que trabalhadores aparecem como “chefes de si mesmos”, ou seja, desaparece a relação de subordinação, aparece uma multidão de empreendedores de si próprios. (ABÍLIO, 2019)
Diante de todo o exposto, podemos associar essa falsa impressão de empreendedorismo ao trabalho precário. Isso quer dizer que o trabalho precário faz com que os trabalhadores assumam o risco por suas atividades laborais no lugar das empresas, além de perder os benefícios sociais do trabalho regulamentado, bem como as proteções sociais.
Conforme, Kalleberg (2009), por trabalho precário já o entendia como um tipo de emprego incerto, com alto nível de imprevisibilidade e com considerável grau de risco do ponto de vista do trabalhador. Na esteira do processo de globalização econômica e do desenvolvimento tecnológico, sem desconsiderar as políticas neoliberais, implementadas nos anos 1970/1980 em diversos países centrais e periféricos, houve um enfraquecimento dos sindicatos que, até então, serviram como uma fonte tradicional de proteção institucional aos trabalhadores. Além disso, a desregulamentação do mercado de trabalho acirrou ainda mais a contradição da relação capital-trabalho ao favorecer o primeiro em detrimento do segundo, em termos de redução das forças compensatórias que permitiram ganhos e proteção aos trabalhadores.
De acordo com Robert Castel (1998, p. 415-436), ao longo das transformações do modo de produção capitalista os trabalhadores vivenciaram algumas formas de integração, dentre elas a condição proletária e a condição operária. Hoje, vive-se em uma sociedade salarial, considerando que grande parte da população vive em detrimento de algum tipo de remuneração, seja oriunda do trabalho subordinado, do autônomo ou de novas formas que exista a contraprestação em virtude do labor humano.
Importante ressaltar que, a baixa remuneração converte-se em importante mecanismo para a imposição de longas jornadas, uma vez que para sobreviverem, são obrigados a arcar com o conjunto dos custos de manutenção, comprando ou alugando carros e motos e assim contraem dívidas que dependem dos salários percebidos para serem quitadas. De fato, quanto menor a tarifa paga, mais horas de trabalho serão necessárias para garantir a sobrevivência daquele indivíduo. (ANTUNES, FILGUEIRAS, 2020)
Como a precarização não é algo estático, mas um processo que tanto se amplia como se reduz, a capacidade de resistência, revolta e organização deste novo proletariado digital será um elemento decisivo para a conquista de formas protetivas de trabalho, capazes de obstar sua escravidão digital.
Dessa forma, de acordo com Moçouçah (2016, p. 32), é impossível estabelecer uma leitura linear do trabalho no Brasil, como se a escravidão se desse por finda, de forma peremptória, pela abolição paulatina que se tentava promover e se tornou absoluta (em termos formais) com a promulgação da Lei 3.353, de 13 de maio de 1888 (Lei Áurea). É válida, assim, a observação de Manuel Alonso Olea (2009, p. 78-79): o direito do trabalho forma-se a partir da existência de sujeitos livres e capazes, mas não se nega, em absoluto, que ainda exista o trabalho forçado, tal como já existiu na Antiguidade ou no medievo (escravidão, servidão, etc.). Por isso, o trabalho forçado é uma prática antijurídica, não sendo tratado como direito, e sim – o que é correto – como grave violação do sistema jurídico-normativo.
Como bem explica José de Souza Martins (2014, p. 203-204), todavia, essa “terceira escravidão” hoje existente no Brasil possui ainda laços com o capitalismo, embora possa parecer paradoxal a afirmação. O mundo moderno fundou-se na extrema acumulação primitiva de capital, quando nada era ou deveria ser repartido: o sistema escravagista é próprio dessa fase primária do capitalismo e, portanto, teve grande importância no curso da História. Já no atual estágio da humanidade, em que o capital assenta suas bases no sistema financeiro e na especulação, só se pode conceber o trabalho como livre, igualitário e contratual, sem relações de sujeição.
O neo-escravismo, portanto, não é uma continuidade do sistema escravocrata existente no Brasil de séculos atrás, mas é a reprodução pontual de aspectos ainda primários na exploração da força de trabalho. O conceito de trabalho escravo surge quando se fala em jornada exaustiva ou condições degradantes de trabalho, porque nesses casos nem sempre há a intencionalidade do empregador delinquente em coagir diretamente quem lhe presta serviços; a coerção, nesses casos, pode ser indireta. Os trabalhadores podem submeter-se a tais condições até mesmo de forma livre, quando a liberdade de contratar é utilizada pelo empregador, que não estabelece limites qualitativos à força de trabalho (FILGUEIRAS; ALVES, 2014, p. 314-317).
Como exemplo, temos a jornada exaustiva que é aquela em que, mesmo dentro de parâmetros legais, pode levar – de maneira facilmente detectável e previsível – o trabalhador a ter sérios problemas de saúde, exaurindo todas as suas forças físicas e/ou psíquicas, a um ponto tal que sua própria vida é colocada em risco. Se o trabalhador for levado à exaustão, ou seja, à perda de sua força física, isso não será considerado como mera fadiga decorrente do exercício laboral: trata-se, em suma, do esgotamento completo do obreiro. (MUÇOUÇAH, 2016, p. 128)
Por fim, Moçouçah (2016), diz que é importante frisar que a discussão em âmbito trabalhista também se dá em relação à restrição da liberdade de ir e vir como premissa para caracterização do trabalho escravo, mas paulatinamente o Ministério Público do Trabalho tem fundamentado tal caracterização também no desrespeito absoluto e grosseiro da dignidade da pessoa humana do trabalhador. O sistema jurídico trabalhista pode e deve dar respostas à sociedade quanto à tutela de quem se submete ao neo-escravismo: para além de a interpretação justrabalhista ser mais flexível que a penal, em se tratando de crimes há uma questão principiológica: na dúvida, favorece-se o réu, que será o latifundiário. No Direito do Trabalho, o princípio existente é o de que, na dúvida, favorece-se a parte hipossuficiente da relação, ou seja, o trabalhador (escravizado, in casu).
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ante todo exposto, conclui-se que apesar de a tecnologia facilitar e encurtar distâncias, no presente cenário da uberização, esta se tornou um meio para dinamizar as relações de trabalho, sendo o objeto principal para a alteração nos modelos tradicionais nas relações de emprego, além de o crescente uso dos aplicativos digitais, incrementada pela ascensão da inteligência artificial.
De forma precária, essa relação trabalhista vem sendo a maior fonte de renda de grande parte da população desempregada do Brasil, além de renda complementar de trabalhadores celetistas, por isso, diante da falta de regulamentação desses direitos, esses trabalhadores se submetem a uma espécie de “escravidão” legalizada, onde os ciclistas/motociclistas/motoristas, reconhecidos pelas plataformas como simples colaboradores, trabalham de forma degradante, com jornadas exaustivas, sem amparo contra eventuais acidentes e danos, para, na maioria das vezes, adquirir sequer um salário mínimo.
Ainda que nessa relação estes colaboradores sejam considerados autônomos, é importante frisar que estes não estipulam o valor laboral e não há um trabalho por conta própria, mas sim por conta alheia, validando que não há o preenchimento dessas mínimas condições para serem considerados profissionais autônomos. Nesse sentido, os colaboradores são submetidos a constantes avaliações quanto à qualidade da prestação de serviço e ainda sofrem penalizações podendo ser descadastrados do aplicativo em situações que se mantenham desconectados por determinado tempo.
Destaca-se que essa relação de trabalho sem regulamentação fere os preceitos constitucionais, principalmente após as alterações recentes da reforma trabalhista e seus reflexos, além de ela não ter acompanhado tal crescimento, recebeu pouco ou nenhum amparo do ordenamento para preservar o direito social do trabalhador. Dessa forma, entende-se que essa relação sem amparo legal e constitucional fere diversos direitos sociais, como por exemplo o direito à remuneração básica do salário-mínimo, férias, remuneração pelo trabalho noturno, 13º etc., os quais devem ser analisados à luz da valorização da pessoa humana e da sua dignidade, saúde e segurança.
Diante disso, é incontroverso a existência dos requisitos elencados na CLT em seu art. 3º, tendo em vista que os trabalhadores estão sob as condições que a plataforma unilateralmente estipula já que o motorista não tem ingerência. Assim, frisa-se que há Pessoalidade, em razão de o serviço executado ser por uma pessoa física, onde a substituição de um trabalhador por outro, de forma indistinta, é vedada, pois, o cadastro do motorista no aplicativo é feito intuitu personae, tanto com foto quanto identificação. É explícita também a Onerosidade com o recebimento da remuneração pelos serviços prestados.
Além disso, é impossível negar a existência da Subordinação nessa relação, vez que as plataformas digitais controlam as chamadas dos clientes e exige, que o motorista se mantenha conectado no aplicativo, sob pena de ser descredenciado da plataforma digital. Por conseguinte, é indubitável a Não eventualidade do labor do motorista, eis que não há traço de transitoriedade na prestação de serviços, instado a destacar que a escolha do horário de trabalho é algo que está cada vez mais flexibilizado, sobretudo após a previsão do teletrabalho na CLT, não havendo, necessariamente, rigidez de horários praticados nos moldes tradicionalmente concebidos.
Por fim, conclui-se que a relação existente é exclusiva de o consumidor com o aplicativo, nada tendo a ver o colaborador, tendo em vista que este é tão somente um viés facilitador nessa relação, sendo assim, imprescindível o reconhecimento do vínculo empregatício entre a plataforma digital e os motoristas por se tratar de um fator fundamental para proporcionar dignidade a esses trabalhadores nos termos da Constituição Federal de 1988.
7 REFERÊNCIAS
ABILIO, Ludmila Costhek. Uberização: A era do nanoempreendedor de si? Anais do 43º encontro da ANPOCS. Caxambu. 2019.
ALLAN, Nasser Ahmad. "Reforma" trabalhista: ataque à sustentação financeira das organizações sindicais profissionais. In: SEVERO, Valdete Souto et al (Coord.). Comentários à Lei 13.467/17: contribuições para um enfrentamento crítico. Porto Alegre: HS, 2017. p. 151-157.
ALONSO OLEA, Manuel. Derecho del Trabajo. Atualiz. Maria Emilia Casas Baamonde. 26. ed. Madrid: Civitas, 2009.
ALVES PINTO, Maria Cecília. As novas ferramentas tecnológicas de gestão de mão de obra e a necessária releitura do elemento fático-jurídico da não eventualidade na relação de emprego. In: LEME, Ana Carolina Reis Paes; RODRIGUES, Bruno Alves; CHAVES JÚNIOR, José Eduardo de Resende (coord.). Tecnologias disruptivas e a exploração do trabalho humano. São Paulo: LTr, 2017.
ANDRADE, Everaldo Gaspar Lopes de. O direito do trabalho na filosofia e na teoria social crítica. São Paulo. LTr, 2014.
ANTUNES, Ricardo. Os sentidos do trabalho: Ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo. Boi tempo. Coleção Mundo do Trabalho. 6ª Edição, 2002.
ANTUNES, Ricardo. Os sentidos do trabalho. 3. ed. São Paulo: Boi tempo, 2000.
ANTUNES, Ricardo; FILGUEIRAS, Vitor. Plataformas digitais, Uberização do trabalho e regulação no Capitalismo contemporâneo. Contracampo. Niterói, v. 39, n. 1, p. 27-43, abr./jul. 2020.
BIAVASCHI, Magda Barros; TEIXEIRA, Marilane Oliveira. A reforma trabalhista brasileira na dinâmica da economia e seus impactos na regulação pública do trabalho: em diálogo comparado com a reforma em andamento na Argentina. Século XXI: Revista de Ciências Sociais, [S.l.], v. 8, n. 2, p. 477-518, dez. 2018. ISSN 2236-6725. Disponível em: <https://periodicos.ufsm.br/seculoxxi/article/view/36152>. Acesso em: 28 set. 2019. doi:http://dx.doi.org/10.5902/2236672536152.
BRASIL tem a maior taxa de desemprego dos últimos anos. Terra. Diamantina, abril/2021, Disponível em: <https://www.terra.com.br/noticias/dino/brasil-tem-a-maior-taxa-de-desemprego-dos-ultimos-anos,e73858ddae0de8a907431b5e667ad9c0iq82sci7.html>. Acesso em: 23 mar. 2021.
CONSTITUIÇÃO de 1988 consolidou direitos dos trabalhadores. TST.jus. 2020. Disponível em: <https://www.tst.jus.br/noticias/-/asset_publisher/89Dk/content/constituicao-de-1988-consolidou-direitos-dos-trabalhadores>. Acesso em: 24 nov. 2020.
CARELLI, Rodrigo de Lacerda. CAVALCANTI, Tiago Muniz. FONSECA, Vanessa Patriota da. FUTURO DO TRABALHO: Os efeitos da Revolução Digital na sociedade. Escola Superior do Ministério Público da União. Brasília–DF. 2020.
CASSAR, Vólia Bomfim. Flexibilização dos direitos trabalhistas: prevalência do negociado coletivamente sobre o legislado. Revista de Direito do Trabalho. v. 187. p. 1-2. São Paulo. 2018.
CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do trabalho. 7. ed. São Paulo: Método, 2012.
CASTEL, Robert. As metamorfoses da questão social: uma crônica do salário. Trad. Iraci D. Poleti. 6. ed. Petrópolis: Vozes, 1998.
CASTRO, Brunna Rafaely Lotife. A Evolução histórica do Direito do Trabalho no Mundo e no Brasil. Jus Brasil, Diamantina, abril/2021. Disponível em: <https://brunnalotife.jusbrasil.com.br/artigos/111925458/a-evolucao-historica-do-direito-do-trabalho-no-mundo-e-no-brasil>
COSTA, Flora Oliveira da. A lógica da dominação presente no trabalho escravo colonial e no trabalho escravo contemporâneo. In: Trabalho escravo contemporâneo: conceituação, desafios e perspectivas. Editora Lumen Juris. Rio de Janeiro. 2018.
COSTA, Helcio Mendes. A evolução histórica do direito do trabalho, geral e no Brasil. Juris Way, Belo Horizonte, out/2010. Disponível em: ˂http:// http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=4553˃. Acesso em: 13 ago. 2013.
DELGADO, Gabriela Neves. A reforma trabalhista no Brasil: reflexões de estudantes da graduação do curso de Direito da Universidade de Brasília. Brasília: Universidade de Brasília, Faculdade de Direito, 2018.
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho.17ª edição. São Paulo: Ltr, 2018.
DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 13. ed. São Paulo, LTR, 2013.
DOCKÈS, Emmanuel. Os empregados das plataformas. IN: Futuro do trabalho: os efeitos da revolução digital na sociedade. Brasília: ESMPU, 2020.
ESCRAVIDÃO. Só História. Virtuous Tecnologia da Informação. 2009-2021. Disponível em: <http://www.sohistoria.com.br/ef2/culturaafro/p1.php>. Acesso em: 21 abr. 2021.
ESTEVES, Juliana Teixeira. O Direito da Seguridade Social. A Renda Universal Garantida, a Taxação dos fluxos financeiros internacionais e a nova proteção social. Recife, Editora da UFPE, 2015.
FILGUEIRAS, Vítor Araújo; ALVES, Jeane Sales. Trabalho análogo ao escravo no Brasil: regulação em disputa e recentes resgates no Estado da Bahia. Revista do Tribunal Superior do Trabalho. Rio de Janeiro, v. 80, n. 1, p. 303-328. jan./mar. 2014.
FONTES, Virgínia. Capitalismo em tempos de uberização: do emprego ao trabalho. Colóquio Marx e o Marxismo. v.5, n.8, jan/jun 2017.
FRANCO, David Silva; FERRAZ, Deise Luiza da Silva. Uberização do trabalho e acumulação capitalista. Cad. EBAPE.BR, v. 17, Edição Especial, Rio de Janeiro, Nov. 2019.
HISTÓRIA: A criação da CLT, Jus.com. Disponível em: <https://trt-24.jusbrasil.com.br/noticias/100474551/historia-a-criacao-da-clt>. Acesso em: 09 de abril de 2021.
HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. Editora José Olympio. Rio de Janeiro. 1983.
LACAZ, Francisco Antônio de Castro. A (Contra) Reforma Trabalhista: lei 13.467/2017, um descalabro para a Saúde dos Trabalhadores. Ciência e Saúde coletiva. Março. 2019.
KALLEBERG, Arne L. Precarious work, insecure workers: employment relations in transition. American Sociological Review, v. 74, p. 1-22, 2009.
LEME, Ana Carolina Reis Paes. Neuromarketing e sedução dos trabalhadores: o caso Uber. IN: Futuro do trabalho: os efeitos da revolução digital na sociedade. Brasília: ESMPU, 2020.
LEITE, Márcia de Paula. Processo e relações do trabalho no Brasil, 2° edição. São Paulo, SP. 1987. Acesso em: 03 de outubro de 2019.
MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. A reforma trabalhista no Brasil. Revista de Direito do Trabalho. v. 181. p. 3. São Paulo. 2017.
MARTINS, José de Souza. Uma sociologia da vida cotidiana. São Paulo: Contexto. 2014.
MARTINS, Sérgio Pinto. Flexibilização das condições de trabalho. Editora Atlas. p. 25. São Paulo. 2000.
MÉSZÁROS, I. Para além do capital: rumo a uma teoria da transição. São Paulo: Boitempo, 2011.
MIRAGLIA, Lívia Mendes Moreira, HERNANDEZ, Julianna do Nascimento. OLIVEIRA, Rayhanna Fernandes de Souza. Trabalho Escravo Contemporâneo: Conceituação, desafios e perspectivas. Editora Lúmen Juris. Rio de Janeiro. 2018
MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. 2ª Ed., Coimbra, 1993.
MUÇOUÇAH, Renato de Almeida Oliveira. A Efetividade da Tutela Trabalhista na Repressão ao Trabalho Escravo Contemporâneo. Revista Direitos Humanos E Democracia. Editora Unijuí. ano 4. n. 7. jan./jun. 2016.
NACIF, Cynthia Mara Lacerda. SOUZA, Miriam Parreiras de. Reflexões sobre a aplicação do trabalho intermitente no trabalho doméstico. Revista do Tribunal Regional do Trabalho - 3ª Região. Belo Horizonte. v. 64. n. 97. p. 251-268. Jan. /jun. 2018.
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito do trabalho. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
O TRABALHO Intermitente Consoante a Reforma Trabalhista no Brasil à Luz do Direito Comparado. out. 2019. Revista Âmbito Jurídico. Disponível em: <https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-do-trabalho/o-trabalho-intermitente-consoante-a-reforma-trabalhista-no-brasil-a-luz-do-direito-comparado/>. Acesso em: 30 nov. 2020.
OLIVEIRA, A., DA SILVA, E., COZERO, P. Reforma trabalhista: O que mudou? Anais do EVINCI – UniBrasil. feb. 2018.
OITAVEN, Juliana; CARELLI, Rodrigo; CASAGRANDE, Cássio Luís. Empresas de transporte, plataformas digitais e a relação de emprego: um estudo do trabalho subordinado sob aplicativos. Brasília: Ministério Público do Trabalho, 2018.
PIPEK; DUTRA; MAGANO, Reforma Trabalhista. São Paulo: Blucher, 2017.
RENAUX, Pedro. Desemprego cai para 11,8% com informalidade atingindo maior nível da série histórica. Agência de notícias. IBGE. Editoria: Estatísticas Sociais. Disponível em: < https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/25534-desemprego-cai-para-11-8-com-informalidade-atingindo-maior-nivel-da-serie-historica>. Acesso em: 30 de setembro de 2020.
SARAIVA, Adriana. Desemprego cai para 11,8%, mas 12,6 milhões ainda buscam trabalho. Agência de notícias. IBGE. Editoria: Estatísticas Sociais. Disponível em: < https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/25314-desemprego-cai-para-11-8-mas-12-6-milhoes-ainda-buscam-trabalho>. Última Atualização: 03/09/2019 11h31. Acesso em: 30 de setembro de 2019.
SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006.
SILVA, Diana Cezar da. Trabalho Intermitente: Violação aos princípios e garantias fundamentais. UNIJUÍ – Universidade do Rio Grande do Sul. 2018.
SOUSA, Rabindranath V. A. Capelo de. O direito geral de personalidade. Coimbra Editora, 1995.
SUPIOT, Alain. Como Transformar as Leis do Trabalho, no Século 21. Disponível em: 15 de junho de 2018. Acesso em: 03 de outubro de 2019.
SUSSEKIND, Arnaldo. As cláusulas pétreas e a pretendida revisão dos direitos constitucionais do trabalhador. Revista Tribunal Superior do Trabalho. Brasília. v. 67, n.2, abr/jun. 2001.
TRT reconhece vínculo de emprego entre entregador e aplicativo em SP. BLOG G1. Disponível em: <https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2020/03/11/trt-reconhece-vinculo-de-emprego-entre-entregador-e-aplicativo-em-sp.ghtml>. Acesso em: 16 nov. 2020.
VÍNCULO empregatício dos entregadores de aplicativo, Jus.com. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/89891/vinculo-empregaticio-dos-entregadores-de-aplicativo>. Acesso em: 04 jun. 2021.
[1] Aluna do curso de graduação em Direito pelo Centro Universitário UNA de Belo Horizonte/MG - E-mail: [email protected]
Bacharelanda em Direito pelo Centro Universitário UNA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: COUTINHO, Jennifer Antunes. Neo-escravismo: a ressignificação do trabalho em tempos de uberização Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 ago 2021, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/57068/neo-escravismo-a-ressignificao-do-trabalho-em-tempos-de-uberizao. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: KLEBER PEREIRA DE ARAÚJO E SILVA
Por: KLEBER PEREIRA DE ARAÚJO E SILVA
Por: KLEBER PEREIRA DE ARAÚJO E SILVA
Por: PATRICIA GONZAGA DE SIQUEIRA
Precisa estar logado para fazer comentários.