RESUMO: A presente pesquisa tem como objetivo relatar a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal referente à Ação de Inconstitucionalidade n. 3.510, proposta pelo ex Procurador-Geral da República, Cláudio Fonteles, o qual impugnou o artigo 5º da Lei de Biossegurança – Lei n. 11.105/2005 – por entender que este inobservava os princípios constitucionais da inviolabilidade do direito à vida e da dignidade da pessoa humana. O trabalho descreve os diversos temas abordados no decorrer do julgamento, como a importância da utilização das células-tronco embrionárias ao invés das adultas e o momento em que ocorre o início da vida. Além disso, descreve os fundamentos utilizados pelos ministros, os cinco que fizeram recomendações com o objetivo de atuarem como legisladores positivos, e os seis ministros que decidiram pela improcedência do pedido inicial. Inclui-se nesse rol o posicionamento favorável e contrário das entidades religiosas. A pesquisa relata ainda como ocorreu a primeira audiência pública realizada pelo STF, incluindo os depoimentos esclarecedores ou equivocados dos diversos especialistas do ramo em discussão.
Palavras-chave: Supremo Tribunal Federal. Células-tronco. Vida. Lei de Biossegurança
INTRODUÇÃO
Com o advento do Projeto de Lein.2.401/2003 iniciou-se a busca pela regulamentação do estudo com células embrionárias, a qual tem a grande finalidade de curar doenças degenerativas.
No entanto, para muitos especialistas e religiosos, não era somente esta a finalidade da Lei de Biossegurança. A grande repercussão do tema perante a sociedade civil se deu em razão de duas dicotomias de visão sobre o tema: a primeira corrente acredita que o embrião é vida humana e consequentemente a legislação estaria violando seu direito à vida; já a segunda corrente visa a progressão das atividades científicas em curar pessoas que possuem patologias antes tidas como incuráveis.
O presente artigo abordará, além das divergências ora mencionadas, as questões irrompidas tanto no decorrer da aprovação da Lei como do julgamento da Ação Direita de Inconstitucionalidade n. 3.510.
Cumpre firmar que poucas vezes surgiram questões tão relevantes para a sociedade como esta debatida no âmbito da Suprema Corte, cuja principal tese de confronto era definir o momento inicial da vida humana. Justamente por causa da envergadura do tema, o ministro relator, responsável pelo referida ADIN, determinou a realização da primeira audiência pública realizada pelo STF, a qual contou com a participação de diversos especialistas do ramo em foco.
Nesse contexto, esta pesquisa tem como finalidade exaltar os principais aspectos inerentes ao referido julgamento.
DESENVOLVIMENTO
Por intermédio da Lei de Biossegurança n. 11.105/2005, o Poder Executivo regulamentou a pesquisa e terapia com células-tronco, seguidas de diversas recomendações de produção e manipulação dos embriões. Além das células-tronco embrionárias, a Lei normatiza o plantio, a comercialização e pesquisas com sementes transgênicas, estabelecendo normas de segurança e mecanismos de fiscalização em todas as atividades relacionadas aos Organismos Geneticamente Modificados (OGMS).
A lei prevê que somente embriões que sejam considerados inviáveis ou que já estejam congelados há três anos, poderão ser produzidos por fertilização in vitro, e, em qualquer situação, será necessário o consentimento dos pais e aprovação técnica por parte dos cientistas que realizarem as pesquisas.
No entanto, a Lei de Biossegurança não assentiu na utilização da engenharia genética em célula geminal humana, pesquisas com zigoto e embrião humano, clonagem reprodutiva e a destruição de embriões viáveis.
Em 30 de maio de 2005, o então Procurador-Geral da República, Cláudio Fonteneles, ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal, alegando que o artigo 5º da Lei aprovada seria inconstitucional, por violação ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e da inviolabilidade do direito à vida, já que, segundo ele, a vida começa no momento da fecundação. Estabelece o artigo 5º:
“É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados nos respectivos procedimentos, atendidas as seguintes condições:
I – sejam embriões inviáveis; ou
II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data de publicação desta Lei, ou que, já congelados na data de publicação desta Lei, depois de completarem 3 (três) anos, contados a partir da data de congelamento.
§ 1º Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores.
§ 2º Instituições de pesquisa e serviços de saúde que realizem pesquisas ou terapia com células-tronco embrionárias humanas deverão submeter seus projetos à apreciação e aprovação dos respectivos comitês de ética e pesquisa.
§ 3º É vedada a comercialização do material biológico a que se refere este artigo e sua prática implica o crime tipificado no artigo 15 da Lei n.º 9.434, de 4 de fevereiro de 1997”.
Importante transcrever trecho do voto do ministro do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio, na Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.510, que aduziu o seguinte:
1. Haver embriões humanos produzidos por fertilização in vitro não utilizados.
2. Tratar-se de embriões inviáveis ou estarem os embriões congelados há três anos ou mais na data da publicação da lei ou, se já congelados em tal data, após completarem três anos de congelamento.
3. Existir o consentimento daqueles que forneceram o material.
4. Submeterem as instituições de pesquisa e serviços de saúde os respectivos projetos, com vistas à aprovação, a comitês de ética em pesquisa.
5. Não ocorrer a comercialização do material biológico, configurado, no caso de inobservância da lei, tipo penal.
Ante tais requisitos, cabe indagar, simplesmente, onde reside a ofensa do citado artigo 5º à Carta Federal a ponto de levar à declaração de inconstitucionalidade. [1]
Além disso, na inicial, o então Procurador-Geral, solicitou que fosse realizada audiência pública com o depoimento de nove especialistas em embriologia, ginecologia e bioética, para defender a crença de que o embrião humano é vida.
A inicial fundamentou sua tese mencionando diversos especialistas que deram ênfase principalmente na questão da fase inicial da vida do embrião humano. É o caso do ginecologista Dr. Dernival da Silva Brandão, in verbis:
O embrião é o ser humano na fase inicial de sua vida. É um ser humano em virtude de sua constituição genética específica própria e de ser gerado por um casal humano através de gametas humanos – espermatozóide e óvulo. Compreende a fase de desenvolvimento que vai desde a concepção, com a formação do zigoto na união dos gametas, até completar a oitava semana de vida (...). Aceitar, portanto, que depois da fecundação existe um novo ser humano, independente, não é uma hipótese metafísica, mas uma evidência experimental. Nunca se poderá falar de embrião como de uma pessoa em potencial que está em processo de personalização e que nas primeiras semanas pode ser abortada. Porque? Poderíamos perguntar-nos: em que momento, em que dia, em que semana começa a ter a qualidade de um ser humano? Hoje não é; amanhã já é. Isto, obviamente, é cientificamente absurdo. [2]
A legislação brasileira permitiu a utilização de embriões humanos inviáveis, ou seja, pluripotentes, visão igualmente defendida pela legislação alemã ao proibir que aquelas sejam totipotentes, isto é, células embrionárias que se desenvolverão em embriões completos. A legislação brasileira igualmente proibiu a clonagem humana.
Importante ressaltar que o tema aqui tratado é de grande relevância, tanto é verdade que a decisão tomada pelo STF poderá ou contrariar a igreja católica, com a argumentação de que a vida começa com a fecundação, ou colocar um fim numa importante linha de pesquisa científica que cura novos tratamentos para doenças degenerativas[3].
A primeira audiência pública presidida pelo STF foi realizada dia 20 de abril de 2007, contando com diversos especialistas do ramo científico, com o objetivo de esclarecer aos ministros e aos amicicuriae – partes interessadas no processo – principalmente, quando é de fato o início da vida.
Em relação ao princípio da dignidade da pessoa humana, a Constituição Federal em momento algum se refere ao embrião ou feto, apenas menciona “dignidade da pessoa humana”. Estes não têm garantias, somente expectativas em possuí-las. Carlos Ayres Britto argumenta o momento em que o indivíduo passa a ter esse direito, in verbis:
Avanço no raciocínio para assentar que essa reserva de personalidade civil ou biográfica para o nativivo em nada se contrapõe aos comandos da Constituição. É que a nossa Magna Carta não diz quando começa a vida humana. Não dispõe sobre nenhuma das formas de vida humana pré-natal. Quando fala da “dignidade da pessoa humana” (inciso III do artigo 1º), é da pessoa humana naquele sentido ao mesmo tempo notarial, biográfico, moral e espiritual (o Estado é confessionalmente leigo, sem dúvida, mas há referência textual à figura de Deus no preâmbulo dela mesma, Constituição). E quando se reporta a “direitos da pessoa humana” (alínea b do inciso VII do artigo 34), “livre exercício dos direitos (...) individuais” (inciso III do artigo 85) e até dos “direitos e garantias individuais” como cláusula pétrea (inciso IV do § 4º do artigo 60), está falando de direitos e garantias do indivíduo-pessoa. Gente. Alguém. De nacionalidade brasileira ou então estrangeira, mas sempre um ser humano já nascido e que se faz destinatário dos direitos fundamentais “à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”, entre outros direitos e garantias igualmente distinguidos com o timbre da fundamentalidade (artigo 5º). Tanto é assim que ela mesma, Constituição, faz expresso uso do adjetivo “residentes” no País (não em útero materno e menos ainda em tubo de ensaio ou em “placa de Petri”), além de complementar a referência do seu artigo 5º “aos brasileiros” para dizer que eles se alocam em duas categorias: a dos brasileiros natos (na explícita acepção de “nascidos”, conforme as alíneas a, b e c do inciso I do artigo 12) e brasileiros naturalizados (a pressupor formal manifestação de vontade, a teor das alíneas a b do inciso II do mesmo artigo 12). [4]
Dessa forma, a legislação põe a salvo os direitos do nascituro, sem mencionar ainda o embrião, de acordo com entendimento do relator, que se segue:
(...) a dignidade da pessoa humana é princípio tão relevante para a nossa Constituição que admite transbordamento. Transcendência ou irradiação para alcançar, já no plano das leis infraconstitucionais, a proteção de tudo que se revele como o próprio início e continuidade de um processo que deságüe, justamente, no indivíduo-pessoa. Caso do embrião e do feto, segundo a humanitária diretriz de que a eminência da embocadura ou apogeu do ciclo biológico justifica a tutela das respectivas etapas. Razão porque o nosso Código Civil se reporta à lei para colocar a salvo, “desde a concepção, os direitos do nascituro” (do latim “nasciturus”); que são direitos de quem se encontre a caminho do nascimento. Se se prefere - considerado o fato de que o fenômeno da concepção já não é exclusivamente intra-corpóreo -, direitos para cujo desfrute se faz necessário um vínculo operacional entre a fertilização do óvulo feminino e a virtualidade para avançar na trilha do nascimento. Pois essa aptidão para avançar, concretamente, na trilha do nascimento é que vai corresponder ao conceito legal de “nascituro”. Categoria exclusivamente jurídica, porquanto não-versada pelas ciências médicas e biológicas, e assim conceituada pelo civilista Sílvio Rodrigues (in Direito Civil, ano de 2001, p. 36): “Nascituro é o ser já concebido, mas que ainda se encontra no ventre materno”. [5]
De fato, para defender os direitos dos embriões humanos, primeiramente, deverá ser questionado quando ocorre o início da vida. Assim sendo, o ministro Cezar Peluso explica perfeitamente seu pensamento quanto ao direito à vida e seu início, interpretando de forma inteligível a Constituição Federal, como se vê a seguir:
Antes de declinar o extenso rol de direitos fundamentais do artigo 5º, cujo caput assegura o direito à vida, a Constituição da República enuncia seus princípios fundantes no artigo 1º, fazendo constar do inc. III a dignidade da pessoa humana. Harmonizam-se todas estas disposições, pois o vocábulo vida, constante do artigo 5º, não pode dissociar-se do pressuposto de sua condição humana. Quando se refere a todos, brasileiros e estrangeiros aqui residentes, que são iguais perante a lei, a Constituição cuida, a toda a evidência, de seres humanos viventes. Desta indiscutível premissa, segundo a qual a vida objeto da larga e genérica tutela constitucional é apenas a vida da pessoa humana, derivam duas teóricas linhas de raciocínio, conducentes ambas ao reconhecimento de permissão constitucional para pesquisas com células-tronco embrionárias: a primeira baseia-se em que o embrião não é, ou não é ainda, pessoa; a outra concebe que no embrião, congelado ou inservível, não há vida atual. E tais posições não são contraditórias, pois basta seja admitida a consistência lógico-jurídica de uma delas para ter-se por legítima a conclusão de constitucionalidade da norma ora impugnada. Como, para efeito da ampla e integral tutela outorgada da Constituição da República, deve haver vida, e vida de pessoa humana, a falta de qualquer um dos componentes desta conjunção invalida o fundamento básico da demanda. Há argumentos respeitáveis na posição dos que sustentam que embriões isolados não se caracterizam nem definem como pessoas. É, por exemplo, a formulação da AGU, segundo a qual “a ofensa à dignidade da pessoa humana exige a existência da pessoa humana, hipótese que não se configura em relação ao embrião in vitro”, e, ainda, a do amicuscuriae MOVITAE, que, ao afirmar não ser “o embrião uma pessoa”, invoca esta lição do Prof. ANTONIO JUNQUEIRA AZEVEDO: “Do embrião pré-implantatório, resultante de processos de fecundação assistida, ou até mesmo de clonagem, constituído artificialmente e que ainda está fora do ventre materno, por não estar integrado no fluxo vital contínuo da natureza humana, é difícil dizer que se trata de ‘pessoa humana’. É verdade que, por se tratar da vida em geral e especialmente da vida humana potencial, nenhuma atividade gratuitamente destruidora é moralmente admissível, mas, no nosso entendimento, aí já não se trata do princípio da intangibilidade da vida humana; trata-se da proteção, menos forte, à vida em geral..”13 Na mesma direção, CLAUS ROXIN inclina-se a reconhecer certa forma de vida ao embrião, ao tempo em que lhe nega, porém, condição análoga à do homem nascido, por considerá-lo apenas uma forma prévia de pessoa: “É inquestionável que, com a união do óvulo e do espermatozóide, surge uma forma de vida que já carrega em si todas as disposições para tornar-se um homem futuro. Daí deduzo que um tal embrião tem de participar, em até certo grau, na proteção e na dignidade do homem já nascido. (...) Por outro lado, parece-me igualmente inquestionável que o embrião seja somente uma forma prévia, ainda muito pouco desenvolvida, do homem, que não pode gozar da mesma proteção que o homem nascido – ainda mais enquanto o embrião se encontrar fora do corpo da mãe.” De minha parte, estou convencido de que o atributo de humanidade já está presente tanto no embrião, quanto nas demais fases do desenvolvimento da criatura. Mais do que o caráter e o sentido elementar da identidade da matéria-prima de que um e outro se compõem, o embrião em si constitui, como depositário dos ainda misteriosos princípios da vida, mais que procriação, a re-produção ou a multiplicação enquanto prolongamento mesmo das pessoas que lhe dão origem e, como tal, não pode deixar de ter a mesma natureza biológica e de compartilhar da mesma suprema dignidade moral e jurídica do ser humano. Essa é, aliás, a razão por que não é lícito reservar-lhe tratamento menos respeitoso sequer no campo jurídico. As divergências toleráveis ao propósito, essas concernem e restringem-se ao problema de sua caracterização, em termos absolutos ou relativos, como pessoa, pois, a despeito de o código genético completo, enquanto conjunto das disposições suficientes para, sob certa condição externa, se desenvolver e transformar em ser humano autônomo, já estar inscrito no embrião, não se pode reduzir a complexidade da pessoa humana como organismo vivo e, sobretudo, como sujeito de direito, ao aspecto puramente biológico de sua mera completude ou perfeição genética, encravada na célebre “escada torcida em forma helicoidal.” Nesta sede, onde pretensas concepções científicas e posturas racionais se confundem, menos no enunciado das teses contrastantes do que na profundeza das motivações inconscientes, com a adesão apaixonada das crenças religiosas, é preciso renunciar a toda busca de consenso e de pontos de vista comuns, até porque, como verdadeiros atos de fé, não se acomodam a testes de refutabilidade, nem prometem conclusões seguras para a solução da causa. Menos discutível, ou, quem sabe, menos incerto parece-me a via da indagação dos critérios perante os quais se pode reconhecer, com o nível de certeza postulado pela respostajurídica, que embriões congelados não têm vida suscetível de tutela, na acepção do ordenamento constitucional (grifo nosso). [6]
Sendo assim, no entendimento do respeitado José Cretella Júnior, o direito à vida deve ser assegurado. De fato essa proteção é conferida pela Constituição Federal apenas para aqueles que têm vida, que nasçam com vida, e para que a protejam ao longo dela, até o decorrer natural com a morte, conforme se segue:
(...) O direito à vida é o primeiro dos direitos invioláveis, assegurados pela Constituição. Direito à vida é expressão que tem, no mínimo, dois sentidos, (a) o “direito a continuar vivo, embora se esteja com saúde” e (b) “o direito de subsistência”: o primeiro, ligado à segurança física da pessoa humana, quanto a agentes humanos ou não, que possam ameaçar-lhe a existência; o segundo, ligado ao “direito de prover à própria existência, mediante trabalho honesto”. [7]
Por último, cite-se a ministra Ellen Gracie que finalizou seu voto defendendo a constitucionalidade do dispositivo da Lei de Biossegurança por não considerar a utilização de embriões como violação do direito à vida, nos seguintes termos:
O aproveitamento, nas pesquisas científicas com células-tronco, dos embriões gerados no procedimento de reprodução humana assistida é infinitamente mais útil e nobre do que o descarte vão dos mesmos. A improbabilidade da utilização desses pré-embriões (absoluta no caso dos inviáveis e altamente previsível na hipótese dos congelados há mais de três anos) na geração de novos seres humanos também afasta a alegação de violação ao direito à vida. [8]
Por outro lado, os posicionamentos religiosos em geral são contrários à utilização das células-tronco para pesquisas e estudos científicos.
No entanto, a maior parte da ciência defende que as células-tronco embrionárias são as que realmente podem se transformam em qualquer tecido do corpo, de músculos e neurônios. O médico Dráuzio Varella se manifesta quanto à importância de serem utilizadas células embrionárias ao invés das adultas:
Nós temos milhares de óvulos já congelados nas clínicas de fertilização que não serão utilizados para mais nada, porque não servem mais para fertilização, mas servem para fazer trabalhos com células-tronco. A questão é jogar no lixo ou permitir que os cientistas usem isso para aliviar o sofrimento humano. [9]
Apesar das diversas frentes, não há comprovação cientifica de que as células adultas podem se transformar em neurônios. Desta forma, não há possibilidade da cura para doenças degenerativas, ao contrário das células-tronco embrionárias.
Somente as células-tronco embrionárias são capazes de se transformarem em mais de 216 tipos de tecido do corpo humano, especialmente em neurônios, o que significa que podem curar doenças graves como lesão cerebral, paraplegia, tetraplegia, mal de Alzheimer e Parkinson. Patologias antes incuráveis, agora pacientes e familiares, pela primeira vez, têm a esperança da cura, de obterem enfim, dignidade em suas vidas.
O ministro Cezar Peluso também se pronunciou a favor, defendendo que as pesquisas com células-tronco embrionárias esgotam as “potencialidades científico- terapêuticas”, e desse modo pode garantir que aqueles princípios constitucionais referidos na inicial como sendo violados sejam, de fato, amplamente amparados.
Destaca-se que, perante a decisão do STF, não houve violação do direito à vida por parte do artigo 5º da Lei de Biossegurança, sendo perfeitamente compatível com a Constituição Federal de 1988, sendo assim, declarou a improcedência do pedido inicial.
CONCLUSÃO
A ilação da presente tese é que a utilização, para pesquisas e terapia, das células-tronco embrionárias não caracteriza o aborto, tendo em vista que o embrião inviável não é pessoa humana e nunca será, pois mesmo que seja implantado no útero materno não seria possível o seu desenvolvimento. Esta visão é adotada pela maioria dos cientistas e acabou prevalecendo no julgamento. O ministro relator, Carlos Britto, foi argucioso ao demonstrar em seu voto a distinção entre feto e embrião humano.
Nesse sentido, veja-se que a Lei de Biossegurança admite a utilização somente dos embriões produzidos por fertilização in vitro, congelados há no mínimo três anos e inservíveis. Além disso, a Lei possui diversas cláusulas acauteladoras e até mesmo proibitivas.
Conclui-se, assim, que em momento algum existe a inviolabilidade do direito à vida, nem muito menos a dignidade da pessoa humana, porquanto a Constituição Federal assegura esses princípios somente às pessoas já nascidas e aos nascituros.
Fica, portanto, sobejamente demonstrada que a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, em declarar a improcedência do pedido inicial, foi indispensável e esperançosa para aqueles que pleiteiam o direito à saúde e à livre expressão da atividade científica.
A Lei de Biossegurança nada mais objetiva do que preservar o princípio da dignidade da pessoa humana, ao conceder às pessoas carentes de saúde – aqui incluídas as pessoas portadoras de necessidades especiais, acometidas de doenças neuroegenerativas,etc – uma vida menos severa. Ora, seria necessário retirar a esperança destes que vivem sem dignidade? Simplesmente por causa de entendimentos diversos da Constituição Federal e paixões de toda ordem? Definitivamente viver sem saúde é sinônimo de viver sem dignidade.
Diante de todo exposto, cabe apenas indagar se àqueles que passam por infortúnios causados por sérias patologias são merecedores daqueles princípios previstos na Carta Magna.
Por último, segue outro questionamento que surgiu no decorrer deste estudo, destinado aos que têm posicionamentos contrários ao dispositivo em comento: se as células embrionárias congeladas e inviáveis não fossem utilizadas para melhorar a vida daquelas pessoas, o que seria feito delas? Teriam como destinação o lixo?
Assim, nossa tese vai ao encontro do que definido na decisão final da ADIN n. 3.510.
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[1]BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Administrativo. Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.510. Requerente: Procurador-Geral da República. Requerido: Presidente da República e Congresso Nacional. Relator: Ministro Carlos Britto. Voto do Ministro Marco Aurélio. Brasília, DF. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADI3510MA.pdf>.Acesso em: 22 out. 2008.
[2]BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI/3510. Petição Inicial. Brasília, DF, 30 de maio de 2005. Disponível em:
<http://www.stf.jus.br/portal/geral/verPdfPaginado.asp?id=181379&tipo=TP&descricao=ADI%2F3510>
Acesso em 30 out. 2008.
[3] BRASIL. Senado Federal. Biblioteca virtual. STF julga pesquisa com célula de embrião humano é inconstitucional. São Paulo, SP, 03 de março de 2007, Disponível em: <http://www2.senado.gov.br/bdsf/bitstream/id/90940/1/noticia.htm>. Acessado em 22 out. 2008.
[4] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Administrativo. Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.510. Requerente: Procurador-Geral da República. Requerido: Presidente da República e Congresso Nacional. Relator: Ministro Carlos Britto. Brasília, DF. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/adi3510relator.pdf>.Acesso em: 22 nov. 2008.
[5] Ibid.
[6] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Administrativo. Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.510. Requerente: Procurador-Geral da República. Requerido: Presidente da República e Congresso Nacional. Relator: Ministro Carlos Britto. Brasília, DF, 28 de maio de 2008. STF, Brasília, 2008. Disponível em http://www.stf.gov.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADI3510CP.pdf. Acesso em: 24 out. 2008.
[7] CRETELLA JÚNIOR, José. Comentários à Constituição Brasileira de 1988. vol. I, artigo 1º a 5º, LXVII. Rio de Janeiro: Editora Forense Universitária, 1988. p. 182/183.
[8]BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Administrativo. Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 3.510. Requerente: Procurador-Geral da República. Requerido: Presidente da República e Congresso Nacional. Relator: Ministro Carlos Britto. Brasília, DF, 28 de maio de 2008. STF, Brasília, 2008. Disponível em:<http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/adi3510EG.pdf>. Acesso em: 24 out. 2008.
[9] BRASIL. Senado Federal. Biblioteca virtual. Impasse sobre a origem da vida no Supremo. São Paulo, SP, 21 de abril de 2007, Disponível em: <http://www2.senado.gov.br/bdsf/item/id/30272>. Acessado em 22 out. 2008.
PROCURADOR FEDERAL. GRADUADO EM DIREITO PELA PUC-RIO, POS GRADUADO EM DIREITO PUBLICO PELO IDP.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ARBACH, Mauricio Neves. A constitucionalidade do Artigo 5º da Lei de Biossegurança face ao princípio da dignidade da pessoa humana Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 14 jan 2015, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/42937/a-constitucionalidade-do-artigo-5o-da-lei-de-biosseguranca-face-ao-principio-da-dignidade-da-pessoa-humana. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Luccas Augusto Barbosa Dias
Por: Alex Jordan Soares Monteiro Mamede
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