Resumo: Esta publicação tem como objetivo tecer características da questão polêmica da pena de morte. Sendo aplicada em alguns países como fator de correção da criminalidade, a pena de morte é muito adotada por esses países mais como fator histórico. Com a avanço da sociedade, surgiram os ideais de proteção à pessoa humana, daí, talvez esses países receberem diversas críticas por adotarem esse tipo de sanção extrema.
Palavras-chave: Pena de morte. Criminalidade. Proteção à pessoa humana.
Abstract: This publication aims to make features of the controversial issue of the death penalty. Being applied in some countries as a correction factor of the crime, the death penalty is widely adopted by these countries as a historical factor. With the advancement of society, appeared the ideal protection for the human person, then perhaps these countries receive some criticism for taking such extreme punishment.
Keywords: Death Penalty. Crime. Protection of the human person.
Sumário: Introdução. 1. Da finalidade das penas. 1.1 Evolução histórica das finalidades da pena. 1.2 Principais Teorias. 1.2.1 Teoria Retribucionista. 1.2.2 Teorias Preventivas. 1.2.3 Teoria Mista1.2.4 Teoria Ressocializadora2. Histórico da pena de morte.2.1 Histórico Mundial. 2.2 Histórico no Brasil. 3. Métodos de execução. 4. Constituição e sistema punitivo. 4.1 Constituição e pena de morte. 5. Perspectiva da pena de morte na Convenção Americana de Direitos Humanos e do Tribunal Militar Internacional do Nuremberg.. Conclusão. Referências.
Introdução
O Direito Penal é o segmento do direito quem tem por finalidade última defender e proteger os bens fundamentais, tão caros à vida em sociedade. Para tanto, o Estado é o ente incumbido de impor coercitivamente sanções àqueles que descumprirem os preceitos legais, preconizadores do equilíbrio social. Essas sanções, a que chamamos de penas, tem recebido, historicamente, diferentes interpretações e justificativas que, a despeito dos esforços de seus defensores, não respondem integralmente às inquietações intrínsecas ao tema.
A pena de morte, em especial, apesar de haver sido aplicada em diversas sociedades ao longo da História, e ainda sê-lo atualmente, traz em seu bojo muitas contradições, ensejando intensas discussões sobre a finalidade e eficácia das penas, os limites do jus puniendi do Estado, e, sobretudo, as garantias e direitos fundamentais.
Neste trabalho, a pena de morte será analisada abrangendo, em linhas gerais, o périplo que esse instituto de direito penal percorreu ao longo da história das sociedades, encarando, para tanto, a questão das finalidades das penas, tema discutido desde a mais tenra Antiguidade Clássica. Em seguida, um panorama geral sobre o instituto será delineado, em vista de este ser ainda vigente em algumas sociedades. Serão apontados alguns casos e elementos jurisprudenciais pertinentes observáveis em países praticantes da pena capital.
Detida atenção também será prestada ao tratamento dado pelos tratados internacionais ao instituto da pena de morte, bem como o tratamento deferido pelo direito constitucional brasileiro ao tema. Longe de intentar esgotar o tema, será feito breve cotejo de alguns argumentos favoráveis e contrários utilizados para justificar a prática da pena capital.
1. Da finalidade das penas
1.1 Evolução histórica das finalidades da pena
Se hodiernamente a aplicação das penas, na seara do Direito Penal, compete ao Estado, um breve lampejo pela História mostra que diversas foram as práticas punitivas que antecederam essa praxe. A autotutela permeava as práticas das sociedades arcaicas, e as características de proporcionalidade e pessoalidade das penas, por exemplo, ainda não estavam delineadas. Tratava-se da chamada vingança privada, prática caracterizada pela aplicação de punições ao infrator sem a ingerência do Estado, mas pelo próprio ofendido, que poderia, portanto, fazê-lo de forma desmedida.
Com o Código de Hamurábi, uma das primeiras codificações de que se tem notícia, é institucionalizada a Lei de Talião, traduzida na máxima “olho por olho, dente por dente”. A partir de então, quando a lei era transgredida, em especial na esfera privada, as reações do ofendido ficavam limitadas à ofensa sofrida. Essa perspectiva continuou presente em codificações implementadas posteriormente, como na Lei da XII Tábuas, no direito romano.
Aos poucos, a aplicação das penas ganhou novas feições. As punições passaram a ter um caráter público, cabendo ao Estado geri-las, em atenção ao seu papel de zelador dos bens e direitos mais caros à sociedade. No atual Estado de Direito, todos estão submetidos à lei penal, cabendo ao Estado-Juiz o ato de processar, julgar e aplicar as penas cabíveis aos que infringirem a legislação vigente.
Um longo caminho foi percorrido para que o Direito Penal construísse a visão atual sobre a finalidade das penas. Nesse trajeto, decerto, foi preponderante a evolução legislativa. Contudo, a doutrina e a jurisprudência foram também decisivas para a reflexão sobre o papel das penas no Direito Penal.
Nas civilizações mais primitivas, a finalidade da pena não ultrapassava a finalidade retributiva, ou seja, a de castigar o infrator. Mesmo na Antiguidade, os jusfilósofos defendiam esse caráter intimidatório: o rigor da pena deveria inibir a prática de novos crimes. Somente com o Iluminismo, a ideia de que a pena deve considerar as circunstâncias particulares de cada crime e ser proporcional à lesão ganhou vigor.
É com Beccaria, em Dos Delitos e das Penas, que a pena passa a ser encarada sob uma ótica reformadora, sendo que a certeza da punição o real caminho para a prevenção dos crimes, e não o terror das próprias penas. Segundo ele, in verbis:
A finalidade das penas não é atormentar e afligir um ser sensível (...). O seu fim (...) é apenas impedir que o réu cause novos danos aos seus concidadãos e dissuadir os outros de fazer o mesmo (BECCARIA, p. 29, 2008).
Decerto que as penas primeiramente visavam a castigar os indivíduos por meio de flagelos ao corpo, seja com finalidade corretiva ou intimidatória, conforme previa Platão. Nos parágrafos que se seguem, breve cotejo das principais teorias acerca da finalidade da pena.
1.2 Principais Teorias
1.2.1 Teoria Retribucionista
Também intitulada Absoluta, e defendida por teóricos como Kant e Hegel, essa teoria crê que a exigência da pena se baseia no ideal de justiça. A aplicação da pena surge como retribuição da lesão causada pelo infrator, sem maior atenção à figura do delinquente. Nesse raciocínio, raramente partilhado por teóricos contemporâneos, a utilidade do castigo seria sua mera função de sanção moral pela infração cometida.
Em vertente mais subjetiva dessa teoria, a pena seria nada além de uma forma de expiação a que o condenado deveria ser submetido, a fim de purgar seu ato injusto e culpável. É uma doutrina dita social negativa, em vista de não englobar qualquer tentativa de restauração da paz social afetada pelos atos criminosos, o que lhe granjeia poucos adeptos, posto não agir eficazmente sobre o fenômeno da criminalidade.
1.2.2 Teorias Preventivas
Ao defender posicionamento contrário à teoria anterior, as também chamadas Teorias Relativas preconizam que a pena, em essência, resumir-se a um mal para quem a sofre, destituída totalmente de um ideal social positivo. Aqui, a pena se justificaria por sua finalidade preventiva, de profilaxia criminal. Tendo como principal idealizador Beccaria, essa teoria dá origem a duas vertentes: a prevenção geral e a especial.
Pela chamada prevenção geral, uma sanção é aplicada ao criminoso de forma que outras pessoas sejam dissuadidas de delinquir (prevenção geral negativa). Pela prevenção especial, os que já delinquiram serão punidos pelo crime de tal forma que se sintam tendentes a não mais reincidir na criminalidade.
Assim, pela prevenção geral, a ação educativa ocorre por meio da intimidação gerada pela ameaça da pena, que leva o sujeito a não transgredir. Contudo, nessa teoria, há um fator psicológico a enfraquece, pois muitas vezes o infrator crê que permanecerá ileso e impune, não se intimidando com a perspectiva da pena. Outro ponto fraco desse raciocínio é necessidade de que o infrator tenha conhecimento acerca das punições, de forma a se verem desestimulados das práticas criminosas; assim, nos casos de delinquentes desconhecedores da lei e das sanções a ela pertinentes, essa teoria não lograria atingir seus objetivos, posto que eles incidiriam nas práticas delituosas.
A ideia da prevenção específica atribui à pena a finalidade de prevenir novos crimes por parte de quem já os cometeu. Focada no delinquente em concreto, a penalidade tem a função de demonstrar a eficácia do Estado em punir, de modo a desestimular a novos crimes (prevenção da reincidência). Contudo, um dos pontos frágeis dessa teoria seria o fato de que, para que a pena alcance o efeito colimado, é necessária a prática de um primeiro delito e sua consequente punição, de forma a coibir novas práticas.
Nessa vereda, teóricos costumam subdividir a prevenção especial conforme suas formas de atuação e o perfil do delinquente. Desta forma, a subdivisão é a seguinte: prevenção positiva, também dita ressocializadora, e prevenção negativa, em outras literaturas denominada de inocuizadora.
A primeira vê a pena como um tratamento ao delinquente, agindo sobre sua personalidade, afastando-o da criminalidade e ressocializando-o, e merecerá atenção mais detida em tópico adiante. A prevenção negativa visa tanto a intimidação quanto a proteção da sociedade por meio da privação de liberdade do infrator, evitando a reincidência.
Na lição de GUIMARÃES (2007, p. 154), in litteris:
Em síntese, a teoria da prevenção especial negativa pode ser traduzida por uma palavra: neutralização. A teoria da prevenção especial positiva, por sua vez, expressa, preponderantemente, a idéia de ressocialização. Eis o ápice teórico das teorias da defesa social.
É bastante questionada em vista de suas técnicas neutralizadoras (como o isolamento), além de modalidades como a pena de morte, alvo específico do presente trabalho.
O mesmo autor explica com mais detalhes a perspectiva da neutralização, que poderia ser subdividida em duas vertentes. Conforme a seguir:
(...) Em um primeiro momento, no caso de possibilidade de correção ou emenda teríamos as penas de caráter semi-eliminatório (detenção e reclusão), em caso contrário, verificando a total impossibilidade de ressocialização do infrator ou, ainda, a temibilidade social representada por este e diagnosticada quando da prática do delito, deve-se aplicar a pena de caráter eliminatório (prisão perpétua ou pena de morte). (Guimarães, 2007, p. 156)
A neutralização do infrator, destarte, principal objetivo da prevenção especial negativa, deixa de pensar na punição para o ato passado, bem como na sua modificação moral. Apenas finca os olhos no futuro, punindo o agente para que não mais incorra em práticas criminosas. Daí se depreende que a prevenção especial negativa possui antinomia intrínseca própria, pelo fato de atender mais prontamente aos anseios populares de justiça e segurança, mas ser de difícil legitimação no atual Estado Democrático de Direito.
1.2.3 Teoria Mista
Sugerindo uma finalidade tripla para a pena, as teorias mistas ou unificadoras criticam as teorias da pena absolutas e relativas, já apresentadas. Conforme dicção de Quintero Olivares, “a retribuição em suas bases, seja através da culpabilidade ou da proporcionalidade desempenha um papel limitador das exigências da prevenção” (OLIVARES apud BITENCOURT, 2007). Essa teoria angariou muitos adeptos, por reunir aspectos positivos de teorias anteriores, elogiando o caráter plural da penas, tanto em seu caráter pedagógico, intimidatório e de retribuição, sem hierarquia entre eles.
1.2.4 Teoria Ressocializadora
A despeito de as teorias mistas haverem sido amplamente difundidas e defendidas no cenário penal brasileiro, novos desafios sociais impuseram a necessidade de que a pena fosse pensada em novas perspectivas. As finalidades de retribuição e prevenção não se mostravam suficientes para inibir o descumprimento da lei.
A Teoria Ressocializadora surge como proposta à problemática da criminalidade. Seus defensores vêem no retorno ao convívio social como a finalidade última da pena, de forma a recompensar toda a sociedade. Contudo, essa ideia de pena requer muitas outras posições por parte do Estado e da sociedade. Além de excluir definitivamente o caráter retributivo da pena, o que lhe rendeu muitas críticas, a implementação dessa teoria requer a atuação do Estado na criação de programas e mecanismos que impeçam o retorno à marginalidade.
Essa visão é fortemente voltada para a figura do infrator, que tem a oportunidade de se reinserir socialmente, afastando-se de práticas infracionais. Contudo, a prática efetiva dessa teoria requer a cooperação da sociedade em geral, de modo que o infrator possa ser reinserido no seio social como alguém que compreende seu papel e sua submissão às normas.
2. Histórico da pena de morte
2.1 Histórico Mundial
A evolução da pena está ligada a uma gradual redução no rigor de sua aplicação, mormente a partir do período iluminista, com a influência do princípio da dignidade da pessoa humana.
A pena de morte vem sendo praticada desde os tempos mais remotos da humanidade. O Código de Hamurabi e o Código Draconiano da Grécia Antiga comprovam que tal pratica era comum na Idade Antiga. Com o passar dos anos a pena capital foi sendo difundida, passando a ser adotada pela maioria das nações.
Até o séc. XVIII, a execução poderia ser lenta, como nas crucificações, fogueiras, apedrejamento, forca, esquartejamentos e empalações – ou rápida, como nas decapitações.
A execução era em geral precedida de um processo sigiloso, que utilizava a tortura para obtenção da confissão do delito supostamente cometido. Assistido por todos, possuía o caráter de espetáculo público, com a intenção de demonstrar o poder do Estado e da Igreja.
Em caso de flagrante, poderia ocorrer a execução por apedrejamento, pauladas ou o acusado poderia ser jogado do alto da acrópole. No sec. 7 a.C., com as leis de Dracon, a morte era a única pena para todos os crimes.
A Idade Média foi pródiga em execuções: delinquentes comuns eram executados na roda ou por enforcamento, hereges queimados vivos, nobres e militares decapitados e criminosos políticos esquartejados. O absolutismo e a inquisição, dois movimentos fortes da época, utilizavam a pena capital para punir os que ousavam infringir as regras por eles postas.
Durante a Idade Média, o Absolutismo estatal e a Inquisição atingiram seu ápice, difundindo seus valores e suas praticas em toda sociedade feudal, dentre elas a utilização da pena de morte como forma de punir aqueles que atentavam contra o Estado e a Igreja Católica. A Inquisição tinha como objetivo frear o enfraquecimento da religião e suprimir as heresias no seio da Igreja Católica. A utilização de fogueiras como maneira de aplicar a pena de morte aos condenados pela Inquisição era o método mais famoso de aplicação da pena capital, embora existissem outros. Seu significado era basicamente religioso uma vez que o fogo simbolizava a purificação, configurando a ideia de pecado e ilustrando a imagem do inferno. Por sua vez, o absolutismo justificava a imposição da pena de morte na teoria de que a autoridade e legitimidade do monarca advinha de mandamento Divino, sendo aquele enviado por Deus para governar os outros homens. Assim, aquele que atentasse contra o Estado e seu monarca estaria atentando contra Deus, devendo ser punido com a perda da própria vida.
Na Idade Média, a influência da Igreja culminou no surgimento das “ordálias ou juízos de Deus” e os acusados eram submetidos à diversas torturas, como simulação de afogamentos e a utilização do ferro candente. A prisão possuía natureza processual, apenas para aguardar a aplicação da pena aflitiva.
Na Grécia o julgamento era realizado na Àgora e a pena poderia ser de multa, escravidão, exílio e execução. Para os mais abastados, a execução era feita por meio do suco de uma planta venenosa; para os menos abastados, ocorria a fixação dos braços e pernas em placas de madeira, onde os acusados morriam de fome e sede.
Em Roma, com a Lei das XII Tábuas, dentre outras penas, a pena de morte também era adotada.
No Egito, os crimes com penas mais graves eram os contra o Rei, o Estado ou por violação das tumbas. Neste caso as penas variavam de o acusado ser entregue aos leões, crocodilos, animais peçonhentos ou serem queimados vivos. Quando o acusado mentia ao tribunal, a pena de morte poderia se estender também a sua família.
Na Babilônia, com o Código de Hamurábi, as penas variavam de multas até o talião (olho por olho, dente por dente,). A pena de morte vigorava para cerca de vinte e cinco tipos diferentes de crimes. Na Índia, com o Código de Manu vigorava a expulsão da casta e a pena de morte.
Na Idade Média e na Idade Moderna, de forma geral, as penas mais utilizadas eram enforcamento; empalação (uma vara pontiaguda é introduzida no ânus do condenado, atravessando-o por inteiro e saindo pela boca); fogueira e a roda (utilizados na Inquisição); enfossamento (utilizado na França, na Idade Média, era destinado às mulheres, que não poderiam ser submetidas ao enforcamento).
A Grã-Bretanha, que influenciou os Estados Unidos, também utilizava a pena de morte. No séc. X, o enforcamento se tornou o método de execução mais usual. O método voltou a ser utilizado no séc. XVI, no reinado de Henrique VIII, juntamente com outras formas de execução como a fervura e o esquartejamento.
Com o enfraquecimento da Estado Absolutista e do fim da inquisição a legitimidade da pena de morte passou a ser questionada. Com o avançar da civilização e evolução da doutrina penal a esfera da aplicação dessa pena tornou-se cada vez mais restringida. Na sua famosa obra “Dos Delitos e Das Penas”, publicada em 1764, o penalista italiano, Beccaria, formulou a teoria da interdição da pena de morte. Segundo ele:
Se assim fosse, como conciliar esse princípio com a máxima que proíbe o suicídio? Ou o homem tem o direito de se matar, ou não pode ceder esse direito a outrem nem à sociedade inteira. A pena de morte não se apoia, assim, em nenhum direito. É uma guerra declarada a um cidadão pela nação, que julga a destruição desse cidadão necessária ou útil. Se eu provar, porém, que a morte não é útil nem necessária, terei ganho a causa da humanidade.
A morte de um cidadão só pode ser encarada como necessária por dois motivos: nos momentos de confusão em que uma nação fica na alternativa de recuperar ou de perder sua liberdade, nas épocas de confusão, em que as leis são substituídas pela desordem, e quando um cidadão, embora privado de sua liberdade, pode ainda, por suas relações e seu crédito, atentar contra a segurança pública, podendo sua existência produzir uma revolução perigosa no governo estabelecido.
Desse modo, até o período iluminista, as penas possuíam um caráter aflitivo, que recaía sobre o corpo do condenado, sem, no entanto, lhe causar a morte. As mais utilizadas eram os castigos corporais, a pena de morte, as penas infamantes e as de natureza pecuniária.
O século XVIII foi o marco fundamental para a substituição das penas corporais pelas privativas de liberdade e para modificações no processo penal, principalmente em razão da influência do princípio da dignidade da pessoa humana. Nas palavras de Greco (2011):
O período iluminista teve fundamental importância no pensamento punitivo, uma vez que, com o apoio na razão, o que outrora era praticado despoticamente, agora necessitava de provas para ser realizado. (...) O ser humano passou a ser encarado como tal, e não mais como mero objeto sobre o qual recaía a fúria do Estado.
A partir daí iniciou-se um processo de abolição da pena de morte. A primeira grande nação a abolir a pena de morte foi Portugal. Antes de 1867 essa pena foi sendo retirada do ordenamento jurídico de forma gradual para vários tipos de crimes, no entanto apenas com a reforma penal ocorrida neste ano, que retirou a previsão da pena morte para todos os crimes, a reforma penal portuguesa aboliu de vez o uso da pena de morte no país, previsão também expressa na Constituição portuguesa da época.
Atualmente, nenhum Estado-membro da União Europeia faz uso dessas praticas. Grande parte dessa realidade ocorreu em função da recomendação exarada durante Convenção Europeia dos Direitos Humanos, em vigor desde 1953. Em seu prolocolo n º 6 traz expressa vedação a pena de morte, com exceção aquelas aplicadas em tempo de guerra.
2.2 Histórico no Brasil
No Brasil, a última execução oficial foi a de um escravo chamado Francisco, em 1876, no Estado de Alagoas. Durante a maior parte do Império esta prática foi recorrente. Consta nos arquivos dos tribunais do Júri diversas condenações posteriores a esta data, não obstante as condenações não há registro que estas tenham sido executadas, pois Dom Pedro II, imperador na época, adotou a prática de converter as penas capitais em outras penas. No entanto, apenas com a proclamação da República, em 1889, foi oficialmente abolida a pena de morte para crimes civis no Brasil. Todavia, continua sendo permitida nas mais graves infrações militares em tempo de guerra.
Durante o desenvolvimento do Estado democrático brasileiro houve alguns atentados a este direito o que de forma oficial nunca chegou a se concretizar. Durante o Estado Novo, a Constituição de 1937 outorgada por Getúlio Vargas autorizou que a pena de morte poderia ser cominada a outros crimes, senão os militares, através de lei, o que não foi efetivado. Em 1969, durante o regime militar, novamente excetuada a regra de aplicação da pena capital apenas para crimes militares em tempo de guerra. A Lei de Segurança Nacional estendeu a possibilidade de aplicação desta pena a diversos crimes políticos. Assim como nos outros casos de extensão da aplicabilidade da pena de morte, ninguém foi executado, apesar de alguns terem sido condenados, pois o Supremo Tribunal Militar converteu tal pena em pena de prisão perpétua.
Com a promulgação da Constituição de 1988 essa possibilidade definitivamente proibida para crimes não-militares. Tal garantia é direito fundamental previsto no inciso XLVII, do artigo 5º da CF[1], com isso tendo status de cláusula pétrea.
Pelo fato de o Brasil ser um país pacífico, não se envolvendo em nenhum conflito armado desde a Segunda Guerra Mundial, a pena de morte não é efetivamente aplicada nem em crimes militares. No entanto, vale ressaltar que ele é o único país de língua portuguesa que prever na sua Constituição uma possibilidade de aplicação da pena de morte.
3. Métodos de execução
Os métodos de execução na pena de morte são os mais diversos possíveis. Na antiguidade buscava os métodos mais cruéis com o objetivo de penalizar o prisioneiro, de acordo com o crime cometido. Atualmente, por conta da reprovação social na infligência dos direitos humanos busca-se métodos de execução mais eficazes e instantâneos, com o menor sofrimento possível aos condenados. Existem diversos métodos de excussão do criminoso, entre eles destacam-se os seguintes:
· Afogamento - O condenado é afogado;
· Apedrejamento - Lançam-se pedras sobre o condenado, até à sua morte;
· Arrancamento - Os quatro membros são arrancados do corpo;
· Cadeira elétrica - O condenado é imobilizado numa cadeira, sofrendo depois tensões elétricas de 2.000 volts;
· Câmara de Gás - O condenado é colocado numa câmara, no qual se liberta um gás mortífero;
· Decapitação - A cabeça do executado é decepada;
· Degola - Corta-se a garganta ao condenado;
· Empalação - Um pau pontiagudo penetra pelo orifício anal do condenado, até à boca, peito ou costas;
· Enforcamento - A vítima é pendurada por uma corda à volta do pescoço, cuja pressão provoca asfixia;
· Enfossamento - O condenado é lançado para um buraco e tapado com terra;
· Esfolamento - Mata-se a vítima tirando-lhe a pele;
· Esmagamento - O corpo é total ou parcialmente sujeito a uma forte pressão, quebrando os ossos e esmagando órgãos;
· Flechas - Arqueiros atingem o condenado com flechas;
· Fogueira - O condenado é queimado vivo;
· Fuzilamento - Um pelotão dispara sobre o condenado;
· Inanição - O condenado é deixado, de alguma forma, ao abandono e sem alimentos;
· Injeção letal - Administra-se no condenado uma mistura fatal de produtos químicos, por via intravenosa;
· Perfuração do ventre - Consiste em furar o ventre;
· Precipitação - O corpo é lançado de um monte;
· Retalhamento - Cortam-se partes do corpo do condenado, até o matar;
· Roda - Depois de atado a uma roda nu, o condenado é vítima de golpes;
· Vergastação - O condenado é chicoteado até à morte;
A lapidação, morte por apedrejamento, está entre as mais antigas e usadas entre alguns países islâmicos, como a Arábia Saudita, o Sudão e o Irã, em casos de incesto ou adultério, apesar de não estar cominada expressamente no Alcorão. Como uma pessoa pode suportar golpes fortes sem perder a consciência, a lapidação geralmente produz uma morte muito lenta.
A injeção letal surgiu em 1977 como uma tentativa para limitar o sofrimento e não afetar a sensibilidade dos espectadores. Esse método de execução é o mais utilizado atualmente nos Estados Unidos. O condenado é amarrado a uma maca e é introduzido na sua veia três substâncias: um tranquilizante bem forte, um relaxante muscular, que paralisa o diafragma, interrompendo a respiração, e uma dose de cloreto de potássio, que cessa os batimentos cardíacos. Quase todos os Estados americanos utilizam a injeção letal como principal forma de execução.
Em 1997, a China tornou-se o segundo país a usar a injeção letal para fazer uma execução, 15 anos após a primeira execução deste tipo nos Estados unidos. Outros países, incluindo a Guatemala e Taiwan, também determinam a execução por injeção letal.
O fuzilamento, câmara de gás, cadeira elétrica também já tiveram grande utilização, mas estão sendo abandados devido a sua crueldade.
Na China, também é praticado o fuzilamento. Neste método o condenado morre com um tiro na nuca. Vale ressaltar que a família paga ao estado o valor da bala utilizada. Com os fuzilamentos, realizados por um pelotão de execução, por várias vezes não se consegue garantir uma morte instantânea. Se quem dispara não acerta no coração do condenado, este pode agonizar durante muitos minutos, enquanto sangra.
A cadeira elétrica é um instrumento de aplicação da pena de morte por eletrocução inventado e utilizado essencialmente nos Estados Unidos, onde o condenado é imobilizado numa cadeira, sofrendo depois tensões elétricas de 2.000 volts. Em 2008, o Tribunal Superior de Nebraska (EUA) considerou inconstitucional da Cadeira Elétrica por ser cruel e desumana. Entretanto, isso não significou o fim das execuções no Estado, que passaram a ser realizadas por injeção letal. Além dos Estados Unidos, a cadeira elétrica foi também utilizada nas Filipinas.
A câmara de gás é ainda uma forma de aplicação da pena de morte legalmente permitida em alguns estados dos Estados Unidos, embora também esteja sendo substituída, pela injeção letal.
Por fim, percebe-se que apesar de estarem sendo buscadas formas menos cruéis de execução da pena de morte, quaisquer das formas de execuções são ultrajantes e desumanas, ferindo mortalmente os direitos inerentes a condição humana.
4. Constituição e sistema punitivo
Neste tópico, abordar-se-á a relação da Constituição brasileira e o direito penal, fazendo-se, de maneira breve, porém, aprofundada, a discussão acerca do tema.
De acordo com os ensinamentos de Rogério Greco (2010, p. 8):
num sistema em que há rigidez constitucional, a Constituição, de acordo com a visão piramidal proposta por Kelsen, é a “mãe” de todas as normas. Todas as normas consideradas inferiores nela vão buscar sua fonte de validade. Não podem, portanto, contrariá-la, sob pena de serem expurgadas de nosso ordenamento jurídico, em face do vício de inconstitucionalidade.
Refere André Copetti (2000, p. 137-138):
É nos meandros da Constituição Federal, documento onde estão plasmados os princípios fundamentais de nosso Estado, que deve transitar o legislador penal para definir legislativamente os delitos, se não quer violar a coerência de todo o sistema político-jurídico, pois é inconcebível compreender-se o direito penal, manifestação estatal mais violenta e repressora do Estado, distanciado dos pressupostos éticos, sociais, econômicos e políticos constituintes de nossa sociedade.
O autor destaca que o direito penal deve ser estudado sob a égide do direito constitucional, de modo que este deve ser a pedra fundamental onde o sistema punitivo deve se apoiar e formar o seu alicerce.
No mesmo sentido é a lição de Greco (2010, p. 8):
A Constituição nos garante uma série de direitos, tidos como fundamentais, que não poderão ser atacados pelas normas que lhe são hierarquicamente inferiores. Dessa forma, não poderá o legislador infraconstitucional proibir ou impor determinados comportamentos, sob a ameaça de uma sanção penal, se o fundamento de validade de todas as leis, que é a Constituição, não nos impedir de praticar ou, mesmo, não nos obrigas a fazer aquilo que o legislador nos está impondo. Pelo contrário, a Constituição nos protege da arrogância e da prepotência do Estado, garantindo-nos contra qualquer ameaça a nossos direitos fundamentais.
Portanto, o referido autor destaca que tais direitos, princípios e garantias constitucionais são fundamentais para limitar o poder punitivo estatal, de forma a proteger a sociedade e efetivar os direitos fundamentais tutelados na Constituição.
De acordo com Mougenot Bonfim (2007, p. 10):
A constitucionalização do processo penal, característica do Estado Democrático – ou Constitucional- de Direito, deu-se no Brasil efetivamente com a promulgação da Constituição Federal de 1988. Assim, regras e princípios do processo penal clássico (antes de 1988) foram erigidos à categoria de regras e princípios constitucionais – normas constitucionais-, aperfeiçoados em face de antigas disposições, e, dessa forma, a Constituição Federal albergou preceitos jurídicos que, na seara do processo penal, se configuram nas garantias processuais e de jurisdição e refletem o caráter de fonte secundária do processo penal.
Em síntese, Luciano Feldens (2005, p.40) destaca a importância da Constituição como limite formal e material do direito penal:
Ao enforcarmos a Constituição como um limite (formal e material) ao Direito Penal, desejamos não exatamente revisitar conceitualmente os postulados iluministas (...) que fundamentam sua operacionalização dogmática, senão que pretendemos reavivar, a partir do modelo de Estado Social e Democrático de Direito, as fronteiras dentro das quais tal atividade haverá de legitimamente desenvolver-se.
Luciano Feldens (2005, p. 43) conclui que:
Em um modelo de Estado constitucional de Direito a exemplo do nosso (Estado Social e Democrático de Direito), a ciência jurídico-penal (aqui entendidas, essencialmente, a política criminal e a dogmática jurídico-penal) não desfruta de existência autônoma em face da Constituição, senão que tem por ela definidos tanto os limites quanto os fundamentos de sua estruturação. A dogmática jurídica e a política criminal não podem estruturar-se de forma divorciada da Constituição, a qual predispõe-se a definir os marcos no interior dos quais haverão de desenvolver-se tais atividades político-intelectivas.
Nas palavras de Salo de Carvalho e Amilton Bueno de Carvalho (2001, p.17):
Os direitos fundamentais adquirem, pois, status de intangibilidade, estabelecendo o que Elias Diaz e Ferrajoli denominam de esfera do não-decidível, núcleo sobre o qual sequer a totalidade pode decidir. Em realidade, conforma uma esfera do inegociável, cujo sacrifício não pode ser legitimado sequer sob a justificativa da manutenção do ‘bem comum’. Os direitos fundamentais – direitos humanos constitucionalizados- adquirem, portanto, a função de estabelecer o objeto e os limites do direito penal nas sociedades democráticas.
Cabe notar a consideração de Luciano Feldens (2005, p. 211):
A Constituição e o Direito Penal empreendem, entre si, uma relação axiológico-normativa; o epicentro dessa zona de interseção compartida pela ordem constitucional e a disciplina jurídico-penal é marcado pela tutela dos direitos fundamentais. (...) Nessa perspectiva, importa ressaltar que as relações entre Constituição e Direito Penal não se reduzem ao estabelecimento, por aquela, de limitações ao direito de punir. Para além de estabelecer-se como limite ao jus puniendi, a Constituição figura como fonte material e mesmo como fundamento normativo do Direito Penal incriminador; é dizer, funciona não apenas para proibir, senão que também para legitimar, e eventualmente impor, em situações determinadas ou determináveis, a proteção jurídico-penal de bens jurídicos conectados à categoria dos bens ou valores investigados na nota da fundamentalidade.
Portanto, nota-se que a Constituição tem uma relação intrínseca com o sistema punitivo, pois, além de limitar a atuação do Estado no que concerne ao sistema punitivo, garante os direitos humanos fundamentais.
4.1 Constituição e pena de morte
No que tange à pena de morte, a Constituição é clara ao dispor em seu artigo 5º, XLVII, “a”, que:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
XLVII - não haverá penas:
a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX
Assim, segundo Gilmar Mendes (2009, p. 650): “Quanto à pena de morte, a Constituição admite tão-somente a sua aplicação nos casos de guerra declarada nos termos do art. 84, XIX. Em razão do aumento da criminalidade, tem surgido proposta de emenda constitucional com o objetivo de introduzi-la entre nós para aplicação aos crimes comuns.”
Tal procedimento ocorrerá tomando-se por observância os seguintes artigos da Constituição Federal de 1988:
Art. 21. Compete à União:
II - declarar a guerra e celebrar a paz;
Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:
II - autorizar o Presidente da República a declarar guerra, a celebrar a paz, a permitir que forças estrangeiras transitem pelo território nacional ou nele permaneçam temporariamente, ressalvados os casos previstos em lei complementar;
Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:
De acordo com Gilmar Mendes (2009, p. 650), “Está-se diante de postulado que não poderá ser flexibilizado ou relativizado em face da proibição constante da referida cláusula pétrea.”
Em situações tais, José Afonso da silva (2009, p. 201) afirma não haver muitas dúvidas de que:
ao direito à vida contrapõe-se a pena de morte. Uma Constituição que assegure o direito à vida incidirá em irremediável incoerência se admitir a pena de morte. É da tradição do Direito Constitucional brasileiro vedá-la, admitida só no caso de guerra externa declarada, nos termos do art. 84, XIX (art. 5º, XLVII, a), porque, aí, a Constituição tem que a sobrevivência da nacionalidade é um valor mais importante do que a vida individual de quem porventura venha a trair a pátria em momento cruciante.
Conforme os ensinamentos de Gilmar Mendes (2009, p. 393)
A existência humana é o pressuposto elementar de todos os demais direitos e liberdades dispostos na Constituição. Esses direitos têm nos marcos da vida de cada indivíduo os limites máximos de sua extensão concreta. O direito à vida é a premissa dos direitos proclamados pelo constituinte; não faria sentido declarar qualquer outro se, antes, não fosse assegurado o próprio direito de estar vivo para usufruí-lo. O seu peso abstrato, inerente à sua capital relevância, é superior a todo outro interesse.
Nesse sentido, Pedro Lenza (2008, p. 595):
O direito à vida, previsto de forma genérica no art. 5º, caput, abrange tanto o direito de não ser morto, privado da vida, portanto, o direito de continuar vivo, como também o direito de ter uma vida digna. Em decorrência do seu primeiro desdobramento (direito de não ser privado da vida de modo artificial), encontramos a proibição da pena de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX. Assim, mesmo por emenda constitucional é vedada a instituição da pena de morte no Brasil, sob pena de ferir a cláusula pétrea do art. 60, § 4º, IV.
Bobbio (2004, p. 191) anota que: “Considerando do ponto de vista do direito à vida, o problema da pena de morte insere-se no debate geral sobre o direito à vida em sentido estrito e, por conseguinte, sobre o fundamento de validade, e eventualmente, sobre os limites da norma “não matarás”.
Salienta José Afonso da Silva (2009, p. 197):
Não intentaremos dar uma definição disto que se chama vida, porque é aqui que se corre o grave risco de ingressar no campo da metafísica supra-real, que não nos levará a nada. Mas alguma palavra há de ser dita sobre esse ser que é objeto de direito fundamental. Vida , no texto constitucional (art. 5º, caput), não será considerada apenas no seu sentido biológico de incessante auto-atividade funcional, peculiar à matéria orgânica, mas na sua acepção biográfica mais compreensiva. Sua riqueza significativa é de difícil apreensão porque é algo dinâmico, que se transforma incessantemente sem perder sua própria identidade. É mais um processo (processo vital), que se instaura com a concepção (ou germinação vegetal), transforma-se, progride, mantendo sua identidade, até que muda de qualidade, deixando, então, de ser vida para ser morte. Tudo que interfere em prejuízo deste fluir espontâneo e incessante contraria a vida.
José Afonso da Silva (2008, p. 149) é brilhante ao comentar que:
Vê-se que a norma constitucional abre exceção à proibição da pena de morte, para admiti-la “em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX”. Essa remissão é uma limitação, pois a exceção só vale quando o presidente da República declarar guerra, “no caso de agressão estrangeira”, devidamente autorizado pelo Congresso Nacional ou referendado por ele. Se faltar um desses requisitos – ou seja, se não houver agressão estrangeira, ou o Congresso não autorizar a declaração, ou não a tiver referendado, se feita sem prévia autorização – a pena de morte não poderá ser aplicada, ainda que o fato típico seja configurado. Compostos esses requisitos, a pena de morte é admissível nos termos do Código Penal Militas (arts. 355 e SS.), que prevê, como pena em grau máximo, em relação aos crimes de traição, favorecimento a inimigo, tentativa contra a soberania do Brasil, coação a comandantes, informação ou auxílio ao inimigo, aliciação militar, ato prejudicial à eficiência da tropa, cobardia qualificada, fuga em presença do inimigo, rendição ou capitulação, dano comum, recusa de obediência em operação, violência contra superior ou militar em serviço, abandono de posto, deserção em presença de inimigo, libertação de prisioneiro, evasão e amotinamento de prisioneiros, homicídio qualificado, genocídio. É uma lista enorme. A justificação da exceção está em superpor o valor da “Pátria em perigo” ao valor individual da pessoa responsável e sujeita ao compromisso de sua defesa. Assim mesmo, a aplicação da pena de morte em tais casos deve ser devidamente ponderada, pois há uma faixa razoável para apenar o imputado com reclusão satisfatória.
O Código Penal Militar prevê, inclusive, em seu artigo 56, que a pena de morte será executada por fuzilamento.
5. Perspectiva da pena de morte na Convenção Americana de Direitos Humanos e do Tribunal Militar Internacional do Nuremberg.
Em busca de uma análise histórica e jurídica, de âmbito internacional, sobre a pena de morte, dois fatos que, apesar de serem, sob um viés ideológico, antagônicos, merecem destaque por serem consequências de mundo pós 2ª Guerra Mundial.
Seguindo uma linha histórica, percebe-se que o Tribunal Militar de Nuremberg, que significou um poderoso impulso ao movimento de internacionalização dos direitos humanos, foi criado, por meio do Acordo de Londres (1945/46), pelos governos da França, Estados Unidos da América, Grã-Bretanha e da antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, em reação direta às violências e barbáries do Holocausto, para processar e julgar os “grandes criminosos de guerra” do Eixo Europeu, acusados de colaboração direta para com o regime nazista.
O art. 6º desse Acordo tipificou os crimes de competência do Tribunal, a saber:
· Crimes contra a paz
· Crimes de guerra
· Crimes contra a humanidade
Sendo assim, como os “grandes criminosos de guerra” tinham incorrido em tais crimes, o Tribunal aplicou, dentre outras penas, a pena de morte por enforcamento.
Abordando um pouco sobre os Tratados que tratam sobre a pena de morte, mercê destaque a Convenção Americana de Direitos Humanos, mais conhecido como Pacto de São José da Costa Rica. Tal convenção é i instrumento fundamental do sistema interamericano de direitos humanos. Foi assinada em 1969, tendo entrado em vigor internacional em julho de 1978. O Brasil a ratificou somente no ano de 1992, tendo a mesma sido promulgada internamente pelo Decreto nº 678, de 6 de novembro desse mesmo ano.
Em 1990, houve o Protocolo à Convenção Americana sobre Direito Humanos referente à abolição da Pena de Morte. Nesse momento, o Brasil, ao assinar tal Protocolo, faz a ressalva de que, devidos aos imperativos constitucionais, reservasse o direito de aplicar a pena de morte em tempo de guerra, de acordo com o Direito Internacional, por delitos sumamente graves de caráter militar.
Conclusão
Discutidos alguns dos conceitos e críticas centrais referentes às principais teorias da pena, deve-se ressaltar que o direito brasileiro tende a adotar a teoria mista, com a coexistência tanto da retribuição como da prevenção. Percebe-se que as leis brasileiras apresentam finalidades diferentes. A Lei dos Crimes Hediondos, a título de exemplo, soa ter como valor preponderante a prevenção geral negativa. Já a Lei de Execução Penal, valoriza a ressocialização, em sua finalidade preventiva especial positiva. A finalidade retributiva pode ser claramente identificada na Lei dos juizados Especiais Criminais, com finalidade de reparação do dano sofrido pela vítima.
A Constituição Federal de 1988, alicerce de todas as normas presentes em nosso ordenamento jurídico, proíbe a pena de morte, só a admitindo excepcionalmente, em situação de guerra declarada.
Contudo, frise-se que o Estado deve optar pela aplicação das penas apenas quando outras formas de manutenção da ordem jurídica não se apresentarem eficientes. E, ao serem as penas aplicadas, elas devem perseguir um fim condizente com a democracia e os ditames constitucionais.
Ao longo do trabalho tentou-se demonstrar como a pena de morte é uma sanção injusta e inútil, restando cristalino que a sua adoção se caracteriza como sendo uma retribuição desmedida e sem fundamentos racionais. Por fim, buscou-se expor a fragilidade da fundamentação intelectual dos defensores da pena capital, pois, após a análise do tema, percebemos que a adoção da pena capital apenas se baseia na tentativa da sociedade de esconder os reais problemas do aumento da criminalidade, ou seja, a ausência de políticas públicas sociais básicas.
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[1] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes.
XLVII - não haverá penas:
a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;
b) de caráter perpétuo;
c) de trabalhos forçados;
d) de banimento;
e) cruéis;
Acadêmico do Curso de Direito da Universidade Federal do Maranhão.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: JUNIOR, Antonio Augusto Costa Everton. A pena de morte e sua repercussão Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 27 jun 2012, 08:42. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/29765/a-pena-de-morte-e-sua-repercussao. Acesso em: 06 nov 2024.
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