RESUMO: A intenção do presente artigo é a de procurar demonstrar como é necessária a presença da boa-fé nos contratos, não somente na leitura do contrato, mas também, antes (período pré-contratual) e depois da formalização, ou seja, na sua execução (período pós-contratual). Assim como, mostrar a importância desse princípio no ordenamento jurídico vigente, fruto de um avanço legislativo no tocante a proteção dos sujeitos nas relações obrigacionais, tendo em vista a necessidade de intervir nas relações individuais dos sujeitos que compõem a relação contratual, para que se possa ter um pacto nivelado para ambas as partes contratantes.
Palavras-chave: boa-fé, contrato, princípios, partes contratantes e proteção.
1 INTRODUÇÃO
O contrato, instrumento necessário à circulação de riquezas, vem sofrendo, ao longo dos séculos, várias transformações, seja no modo de sua conclusão, interpretação, como também de sua execução.
Em decorrência das disparidades outrora vislumbradas, onde o princípio da autonomia da vontade imperava nas relações contratuais, tido como um super princípio o que dava ensejo às práticas desonestas, o Estado foi chamado a intervir, instituindo preceitos legais de ordem pública, que limitaram a liberdade contratar.
Daí o Direito adotou a boa-fé objetiva e função social do contrato como princípios a nortear as relações contratuais.
O presente estudo foi desenvolvido com o propósito de analisar este princípio e quais as consequências de sua aplicação aos contratos.
Na primeira parte do trabalho, examinar-se-á o contrato típico (nominados) regulamentada no ordenamento jurídico, seu conceito e pormenor idades. Na segunda parte, serão analisados os princípios norteadores, atinente aos contratos que constituíram o alicerce do sistema contratual, bem como, sua importância para a efetivação e formação do contrato justo, com o enfoque especial no princípio da boa-fé.
A fase seguinte, a última parte deste trabalho, será dedicada ao estudo do princípio da boa-fé objetiva, às consequências da sua não observância pelas partes na formação e execução do contrato.
A pesquisa foi desenvolvida pelo método bibliográfico, através de consultas doutrinárias, legislativas e em meio eletrônico.
2 CONTRATOS NOMINADOS
Contrato consiste em um acordo de vontades com a finalidade de produzir efeitos jurídicos, ou seja, criar, modificar ou extinguir direitos. São fontes de direito obrigacional, como também os atos ilícitos, declaração unilateral de vontade e lei os são. Gera obrigação para as partes. Diferentemente da lei que gera obrigações gerais.
As funções do contrato são: econômica, em que o contrato é um modelo jurídico de operações econômicas (de transferência de riquezas – sentido amplo), como interveniente da liberdade econômica; e, de elemento civilizador para evitar que as partes exerçam suas próprias razões ou interesses.
Esse é o entendimento de WALD, ao expor que:
A atual tendência do direito para maior interferência nos contratos visa a ampla proteção para o elemento economicamente fraco, não pretendendo, todavia, reduzir ou limitar o número de contratos inominados e a liberdade que os contratantes têm de criar novos tipos de contratos. Tal liberdade só encontra limitações quando a finalidade real das partes consiste em burlar a lei ou em locupletamento à custa de outrem. O que a lei pretende estabelecer são condições mínimas de ordem pública em relação a todos os contratos a fim de evitar o enriquecimento sem causa, a usura, a coação econômica (2010, p. 261).
Dizem-se contratos típicos ou nominados, os que, além de possuírem um nome próprio, que os distingue dos demais, constituem objeto de uma regulamentação legal específica. Segundo Maria Helena Diniz, em sua obra intitulada Curso de Direito Civil Brasileiro – teoria das Obrigações Contratuais e Extracontratuais, os contratos nominados “são aqueles que possuem uma determinação legal e própria, estando previstos e regulados por norma jurídica, formando espécies definidas” (2007, p. 94).
Os contratos típicos ou nominados, que a lei chama a si para discipliná-los juridicamente, correspondem às espécies negociais mais importantes no comércio jurídico. E a disciplina específica traçada na lei para cada um deles obedece, pelo menos, a um duplo objetivo do legislador. Por se encontrar regulamentados por meio de lei, é que tais contratos foram classificados pelos doutrinadores como típicos, uma vez que recebe da ordem jurídica uma regulamentação.
3 PRINCÍPIOS NORTEADORES DA RELAÇÃO CONTRATUAL
O Código Civil de 2002 traz em seu bojo muitas modificações por demais significativas para a seara jurídica, e nesse passo, traço interessante diz respeito à estrutura principiológica, que se difere do arcabouço do código anterior.
Os princípios na acepção clássica constituem mandamentos nucleares do sistema jurídico, irradiando seus efeitos sobre diferentes normas e servindo de balizamento para a interpretação e integração de todo o setor do ordenamento em que se irradiam.
Assim, entre os princípios que regem a relação obrigacional, destacam-se os princípios da autonomia de vontade, função social do contrato e boa-fé.
Entende-se hoje, não é a mera e simples autonomia da vontade que direciona a execução dos contratos. A vontade não mais vigora ampla e livremente.
É certo que o acordo de vontades continua sendo o elemento subjetivo essencial do contrato, pois, esse negócio jurídico só se origina da declaração de vontade. A liberdade individual e a iniciativa pessoal continuam sendo a razão de ser dos contratos. No entanto, a visão mais humanitária do Estado Democrático de Direito impõe uma certa intervenção estatal, por força da qual a autonomia não tem hoje a mesma plenitude.
O atual Código Civil, buscando dar maior segurança às relações contratuais instituiu novos princípios que assim como o princípio da autonomia de vontade regulam os contratos firmados entre partes. São eles, o princípio da função social do contrato e o princípio da boa-fé.
O primeiro desses novos princípios acima citados vem expressamente previsto no art. 421, do novo Código Civil, da seguinte forma: “A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social dos contratos”.
O que o princípio imperativo da “função social do contrato” estatui é que este não pode ser transformado em um instrumento para atividades abusivas, causando danos à parte contrária ou a terceiros, uma vez que, nos termos do Art. 187, “também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.
Para o ilustre THEODORO JÚNIOR, “a função social do contrato consiste em abordar a liberdade contratual em seus reflexos sobre a sociedade e não apenas no campo das relações entre partes que estipulam” (2004, p.31).
O princípio da função social do contrato é uma norma geral do ordenamento jurídico de ordem pública, pelo qual o contrato deve ser necessariamente visualizado e interpretado de acordo com o contexto da sociedade.
Dessa forma, para se analisar a função social do contrato, há de se partir da relação do contrato com o seu meio social externo. O direito contratual, abarcando como um dos seus alicerces o princípio da função social, significa dizer que o contrato deixou de ser somente coisa dos contratantes, e passou a interferir negativa e positivamente, também, em relação aos terceiros.
4 PRINCÍPIO DA BOA-FÉ
Este princípio reflete a ideia de que as relações negociais devem ser regidas por valores e condutas de modo a desenvolver-se da forma mais honesta e correta. Desse modo, quando um contrato prejudica uma das partes, estar-se-á ofendendo o princípio da boa-fé. A boa-fé pode ser entendida como o agir correto, leal e confiável conforme os padrões culturais de uma dada época e local.
O atual Código Civil preceitua em seu art. 422 que “os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios da probidade e boa-fé”.
A boa-fé objetiva exige das partes contratantes uma regra de conduta, pautada em padrões sociais de lisura, honestidade e correção. Traduz a ideia de confiança. A boa-fé objetiva é ela própria, uma norma jurídica.
A boa-fé objetiva produz uma série de efeitos, os chamados deveres laterais ou anexos: deveres de proteção, de cooperação e de informação.
Os deveres de proteção impõem a cada parte o respeito à pessoa, à família e ao patrimônio da outra. Os deveres de cooperação obrigam as partes a auxiliarem-se mutuamente, afastando as dificuldades que estiverem a seu alcance e minimizando os custos para a outra, na busca da realização do adimplemento. Os deveres de informação e esclarecimento obrigam as partes à informação mútua de todos os aspectos atinentes ao vínculo, de ocorrências que com ele tenha relação e, ainda, dos efeitos que da execução possam advir.
Arnoldo Wald ressalta a importância da boa-fé, como um super princípio das relações contratuais:
A partir da regra da boa-fé nascem deveres acessórios de proteção (informação e lealdade) que não derivam da vontade das partes contratantes. Nesse sentido, a boa-fé tem natureza supletiva e função instrumental, reduz a margem de autonomia privada, uma vez que a sua observância independe da vontade das partes. (2010, p. 214).
O art. 422 do Código Civil disciplina que o princípio da boa-fé deve ser aplicado tanto na conclusão, quanto na execução do contrato. Neste sentido vislumbra-se a sua importância, pois, obriga que as partes vinculadas ao contrato tipicamente previsto, atuem com lisura e honestidade. Objetiva-se dar maior segurança a relação contratual, e impedir um prejuízo futuro com atuações desonestas e ilícitas.
Desta forma, vislumbra-se que a previsão legal do princípio da boa-fé tem, como consequência imediata, a transparência na formação, conclusão e execução do contrato.
5 CONSEQÜÊNCIAS DA NÃO OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ NA FORMAÇÃO E EXECUÇÃO DO CONTRATO
Com o advento do atual Código Civil, o princípio da boa-fé tornou-se imperativo em toda e qualquer relação contratual, a sua inobservância implica em responsabilidades, uma vez que, feri dispositivo legal. Esse princípio positivado, de larga aplicação em obrigações e contratos, impõem às partes um dever de lealdade, respeito, probidade, que deve acompanhar todas as fases contratuais.
Sabe-se que o descumprimento ou não observância do disposto no artigo 422 do Código Civil/02, levara a nulidade do que fora pactuado, com consequências patrimoniais ao transgressor, que deverá suportar as consequências, inclusive com indenização por perdas e danos a parte lesada, uma vez que, houve má-fé por parte de um dos contratantes, visto que não agiu com lisura e hombridade.
Maria Helena Diniz prescreve que, “a nulidade é, uma sanção, por meio da qual a lei priva de efeitos jurídicos o contrato celebrado contra os preceitos disciplinadores dos pressupostos de validade do negócio jurídico” (2007, p. 158).
O contrato viciado, anulável, proveniente de irregularidades na sua constituição devido à má-fé, obriga o sujeito que agiu com fraude a restituir a parte prejudicada ao estado a quo, no teor do artigo 182 (primeira parte) do CC/02, “Anulado o negócio jurídico, restituir-se-á as partes ao estado em que antes dele se achavam, e, não sendo possível restituí-las, serão indenizadas com o equivalente”.
Desta forma, caso se verifique irregularidade na formação ou execução do contrato deve a parte lesada levar ao conhecimento do juiz a inobservância do que fora pactuado, assim como a transgressão da lei que regulamenta os contratos, em geral, para que o mesmo tome as medidas legais cabíveis. Caso fique comprovada a ilicitude, por meio de sentença judicial, o contrato será extinto, devendo o prejudicado ser ressarcido pelo prejuízo sofrido com o ato ilegal.
Afigure-se a hipótese de um dos contratantes faltar com o dever de informação, ocultando informação fundamental, que importaria na decisão da outra parte em contratar. É indiscutível que em tal hipótese caracterizada estará à má-fé do contratante, ensejando a rescisão do contrato.
6 CONCLUSÃO
Ao longo deste artigo, buscou-se sentir a real necessidade da presença da boa-fé nos contratos atuais, em virtude da massificação dos contratos, fazendo com que este instituto jurídico possa realmente atingir a sua finalidade, que nada mais é do que a formalização das vontades de ambas as partes contratantes, baseando-se no consensualismo, para que aquilo pactuada possa ter realmente a validade (fazer lei entre as partes).
É lógico que esse acordo deve possuir limites arraigados as suas raízes, na intenção de não sobrepor o interesse maior de todo o ordenamento jurídico, que é o bem-estar social em todas as esferas.
Em síntese, o princípio da boa-fé é um dever geral de conduta ativa, que impele certo comportamento aos contratantes, que limita a liberdade de contratar, impõem obrigações acessórias na formação, execução e mesmo após a extinção do contrato e ainda, funciona como regra de interpretação dos contratos. Devido a esse princípio os sujeitos vinculados ao contrato possuem deveres recíprocos como, o dever de informação e veracidade, o dever cooperação, o dever de cuidado, entre outros.
A violação de algum, desses deveres inerentes ao princípio da boa-fé objetiva, permite ao julgador adaptar ou modificar as cláusulas contratuais, ou ainda, rescindir o contrato, a fim de que se alcance a equidade contratual.
REFERÊNCIAS
BRASIL, Vade Mecum (Colaboração de Antônio Luiz de Toledo Pinto ET all.) 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Teoria Geral das Obrigações Contratuais e Extracontratuais. v. 3 . 23 ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
MIRANDA, Marcello Albuquerque de. O princípio da boa-fé objetiva como limite da liberdade contratual. Disponivel em www. JurisWay.com, acessado em 10. 03.11.
MELO, Lucinete Cardoso de. O princípio da boa-fé objetiva no Código Civil. Jus Disponível em: < http://jus.uol.com.br/revista/texto/6027>. Acesso em: 6 mar. 2011.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. O contrato e sua função social. Rio de Janeiro: Forense, 2004.
WALD, Arnaldo. Direito Civil – Direito das Obrigações e teoria Geral dos Contratos. 2 v. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
Advogada, Estudante de História, Curso de TTI, Registro de Jornalista nº 0080784/SP, Curso de Coaching, Especialização em Síndico Proficional e Gestão Condominial. Presidente da Comissão Jovem Advocacia da OAB Lapa, Ex-Presidente da Comissão de Cultura e Eventos da OAB Lapa, Ex-Presidente do CDC da OAB Lapa. Com especializações: MBA em Direito Imobiliário, Pós-Graduação em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho, Pós-Graduação em Direito Processual Civil, Pós-Graduação em Direito Empresarial. Estudando Pós-Graduação em Direito do Consumidor e Previdenciário. Autora do Livro: Tratamento Jurídico do Portador de Câncer. Participação na Elaboração da Cartilha de Perguntas e Respostas de Direito de Sucessões. Autora de Artigos Científicos Site e Bio Completa: instabio.cc/3111223sMbJe8
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, DANIELA ANDRADE. O princípio da boa-fé nos contratos nominados Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 fev 2023, 04:51. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/36140/o-princpio-da-boa-f-nos-contratos-nominados. Acesso em: 23 dez 2024.
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