INTRODUÇÃO
É frequente, nos dias atuais, a execução indireta pela Administração Pública de diversos serviços considerados essenciais ao regular cumprimento das missões institucionais dos órgãos e entidades administrativos (vigilância, limpeza, copeiragem, manutenção predial, de veículos e demais equipamentos, reprografia, dentre outros), por meio da contratação de empresas especializadas, após regular processo licitatório.
É dever da Administração, de acordo com a Lei n.º 8.666/1993, acompanhar e fiscalizar a execução desses contratos administrativos, o que, decerto, implica na necessidade de aferir a regularidade e a qualidade dos serviços prestados pelas contratadas.
Nesse contexto, em decorrência da Lei de Licitações e Contratos Administrativos e do Decreto n.º 2.271/1997, foi estabelecida pela Instrução Normativa n.º 02, de 30 de abril de 2008, da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, a possibilidade de adoção do chamado Acordo de Nível de Serviço pela Administração Pública, com vistas a auxiliar o gestor no desempenho de suas atribuições legais quanto ao contrato administrativos, por meio da formalização e previsão de critérios objetivos de mensuração de resultados e do nível de qualidade dos serviços contratados.
O presente trabalho tem por objetivo tecer breves considerações sobre a adoção do Acordo de Nível de Serviço pela Administração Pública Federal, diante do panorama legal e normativo a ele subjacente.
DESENVOLVIMENTO
O Decreto nº 2.271, de 07 de julho de 1997, trata da contratação de serviços pela Administração Pública Federal direta, indireta, autárquica e fundacional e estabelece que podem ser objeto de execução indireta as atividades materiais acessórias, instrumentais ou complementares aos assuntos que constituem área de competência legal de cada órgão ou entidade.
Em seu art. 3º, § 1º, o Decreto n.º 2.271/1997 dispõe que “Sempre que a prestação do serviço objeto da contratação puder ser avaliada por determinada unidade quantitativa de serviço prestado, esta deverá estar prevista no edital e no respectivo contrato, e será utilizada como um dos parâmetros de aferição de resultados”.
Regulamentando o referido dispositivo, a Instrução Normativa n.º 02, de 30 de abril de 2008, editada pela Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, estabeleceu que os critérios para aferição de resultados na contratação de serviços pela Administração devem ser dispostos, preferencialmente, nos moldes de Acordo de Nível de Serviço (ANS).
Consoante o Anexo I da Instrução Normativa SLTI/MP n.º 02/2008, Acordo de Nível de Serviço (ANS) “é o ajuste escrito, anexo ao contrato, entre o provedor de serviços e o órgão contratante, que define, em bases compreensíveis, tangíveis, objetivamente observáveis e comprováveis, os níveis esperados de qualidade da prestação do serviço e respectivas adequações de pagamento”.
Referida Instrução Normativa trata sobre o Acordo de Nível de Serviço em diversos dispositivos, a seguir transcritos:
Art. 11. A contratação de serviços continuados deverá adotar unidade de medida que permita a mensuração dos resultados para o pagamento da contratada, e que elimine a possibilidade de remunerar as empresas com base na quantidade de horas de serviço ou por postos de trabalho.
§ 1º Excepcionalmente poderá ser adotado critério de remuneração da contratada por postos de trabalho ou quantidade de horas de serviço quando houver inviabilidade da adoção do critério de aferição dos resultados.
§ 2º Quando da adoção da unidade de medida por postos de trabalho ou horas de serviço, admite-se a flexibilização da execução da atividade ao longo do horário de expediente, vedando-se a realização de horas extras ou pagamento de adicionais não previstos nem estimados originariamente no instrumento convocatório.
§ 3º Os critérios de aferição de resultados deverão ser preferencialmente dispostos na forma de Acordos de Nível de Serviços, conforme dispõe esta Instrução Normativa e que deverá ser adaptado às metodologias de construção de ANS disponíveis em modelos técnicos especializados de contratação de serviços, quando houver.
§ 4º Para a adoção do Acordo de Nível de Serviço é preciso que exista critério objetivo de mensuração de resultados, preferencialmente pela utilização de ferramenta informatizada, que possibilite à Administração verificar se os resultados contratados foram realizados nas quantidades e qualidades exigidas, e adequar o pagamento aos resultados efetivamente obtidos. (Incluído pela Instrução Normativa nº 3, de 16 de outubro de 2009.)
.......................................................................................
Art. 15 O Projeto Básico ou Termo de Referência deverá conter: (...)
X - a unidade de medida utilizada para o tipo de serviço a ser contratado, incluindo as métricas, metas e formas de mensuração adotadas, dispostas, sempre que possível, na forma de Acordo de Níveis de Serviços, conforme estabelece o inciso XVII deste artigo; (...)
XVII - o Acordo de Níveis de Serviços, sempre que possível, conforme modelo previsto no anexo II, deverá conter:
a) os procedimentos de fiscalização e de gestão da qualidade do serviço, especificando-se os indicadores e instrumentos de medição que serão adotados pelo órgão ou entidade contratante;
b) os registros, controles e informações que deverão ser prestados pela contratada; e
c) as respectivas adequações de pagamento pelo não atendimento das metas estabelecidas.
.....................................................................................
Art. 17. Quando for adotado o Acordo de Níveis de Serviços, este deverá ser elaborado com base nas seguintes diretrizes:
I - antes da construção dos indicadores, os serviços e resultados esperados já deverão estar claramente definidos e identificados, diferenciando-se as atividades consideradas críticas das secundárias;
II - os indicadores e metas devem ser construídos de forma sistemática, de modo que possam contribuir cumulativamente para o resultado global do serviço e não interfiram negativamente uns nos outros;
III - os indicadores devem refletir fatores que estão sob controle do prestador do serviço;
IV - previsão de fatores, fora do controle do prestador, que possam interferir no atendimento das metas;
V - os indicadores deverão ser objetivamente mensuráveis, de preferência facilmente coletáveis, relevantes e adequados à natureza e características do serviço e compreensíveis.
VI - evitar indicadores complexos ou sobrepostos;
VII - as metas devem ser realistas e definidas com base em uma comparação apropriada;
VIII - os pagamentos deverão ser proporcionais ao atendimento das metas estabelecidas no ANS, observando-se o seguinte:
a) as adequações nos pagamentos estarão limitadas a uma faixa específica de tolerância, abaixo da qual o fornecedor se sujeitará às sanções legais; e
b) na determinação da faixa de tolerância de que trata a alínea anterior, considerar-se-á a relevância da atividade, com menor ou nenhuma margem de tolerância para as atividades consideradas críticas.
IX - o não atendimento das metas, por ínfima ou pequena diferença, em indicadores não críticos, poderá ser objeto apenas de notificação nas primeiras ocorrências, de modo a não comprometer a continuidade da contratação.
..............................................................................
Art. 19. Os instrumentos convocatórios devem o conter o disposto no art. 40 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, indicando ainda, quando couber:
(...)
XII - a necessidade de adequação dos pagamentos ao atendimento das metas na execução do serviço, com base no Acordo de Níveis de Serviço e nos instrumentos de fiscalização e medição da qualidade definidos no Projeto Básico ou Termo de Referência;
Da leitura e interpretação das normas acima transcritas, percebe-se que os níveis de serviço são critérios de aferição dos resultados da atuação da contratada, com base em indicadores e metas objetivamente mensuráveis, o que permite à Administração verificar se os resultados esperados nos contratos administrativos que tenham por objeto a execução de serviços de natureza continuada foram efetivamente atingidos, nas quantidades e qualidades exigidas, e adequar proporcionalmente o pagamento ao atendimento das metas na execução do serviço, na forma consignada no ANS. O ANS ou Service Level Agreement (SLA)[1], portanto, deve integrar o projeto básico ou termo de referência da licitação, configurando, empós, como um anexo ao termo do contrato administrativo.
Trata-se de evidente corolário do princípio da eficiência, da boa gestão administrativa em busca da otimização e da regular aplicação dos recursos públicos, visando, em ultima análise, à obtenção dos melhores resultados e da máxima qualidade na prestação dos serviços à Administração. Conforme bem definido por Alexandre de Moraes[2]:
Princípio da eficiência é o que impõe à administração pública direta e indireta e a seus agentes a persecução do bem comum, por meio do exercício de suas competências de forma imparcial, neutra, transparente, participativa, eficaz, sem burocracia e sempre em busca da qualidade, primando pela adoção dos critérios legais e morais necessários para melhor utilização possível dos recursos públicos, de maneira a evitarem-se desperdícios e garantir-se maior rentabilidade social.
Nesse sentido, consoante as precisas lições de Benjamim Zymler, Ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), “a prestação de um bom serviço para os cidadãos é, em última instância, o negócio de toda instituição pública. A definição do que é um ‘bom serviço’, sintonizado as expectativas dos clientes com a oferta, é exatamente o que constitui um acordo de nível de serviço.”[3]
O art. 17 da Instrução Normativa SLTI/MP n.º 02/2008, já transcrito, apresenta as diretrizes para a elaboração do Acordo de Nível de Serviço pela Administração, deixando transparecer a preocupação com a necessidade de precisão e objetividade na construção dos indicadores, bem assim da prévia identificação e definição, pelo gestor, dos serviços a serem contratados e dos respectivos resultados esperados. Em síntese, infere-se da norma que a atividade de elaboração do ANS requer um planejamento prévio e adequado por parte da Administração, a fim de evitar, ao máximo possível, a previsão de indicadores e metas dissociados do objeto da contratação e de suas especificidades e da realidade da futura execução contratual.
Nesse sentido, é de se ter em mente que:
Para atingir a finalidade pretendida na IN 02/2008, portanto, a Administração Pública, deve preceder suas contratações de planejamento, isto é, fazer uma análise detalhada do resultado que pretende alcançar com o serviço a ser contratado, verificar se a melhor forma de alcançar este resultado é por meio do referido serviço, definir quais são os indicadores que auxiliarão no monitoramento do desempenho dos serviços prestados e qual a melhor métrica a ser utilizada.
Elaborar um ANS sem ter ciência sobre a real necessidade da unidade administrativa pode trazer a ela um custo elevado e desnecessário. Por exemplo, um ANS de disponibilidade de infraestrutura em 90% do tempo tem um determinado preço, ao passo que um de 99% tem outro. Portanto, coletar as informações necessárias, estudar e avaliar as necessidades que deverão ser supridas para então definir o tipo de serviço e o nível de atendimento a ser contratado não significa perder tempo, mas sim ter certeza que a unidade administrativa estará pagando por um serviço que de fato precisa.
Ademais, não basta ter um ANS e não fazer valer o que nele estiver escrito. Destarte, caberá à unidade administrativa contratante monitorar constantemente o nível de qualidade do serviço para evitar a sua degeneração, bem como intervir nos casos de desconformidade da prestação do serviço com o que foi acordado[4].
Sobre o teor do ANS, o art. 15, inciso XVII, da IN SLTI/MP n.º 02/2008, dispõe que o Acordo de Nível de Serviço, a ser elaborado conforme modelo previsto no Anexo II da referida instrução, sempre que possível, deverá conter:
a) os procedimentos de fiscalização e de gestão da qualidade do serviço, especificando-se os indicadores e instrumentos de medição que serão adotados pelo órgão ou entidade contratante;
b) os registros, controles e informações que deverão ser prestados pela contratada; e
c) as respectivas adequações de pagamento pelo não atendimento das metas estabelecidas.
Mais especificamente, estabelece o art. 17, inciso VIII, da IN SLTI/MP n.º 02/2008, que deverá ser observada, na contratação de serviços continuados, a diretriz de que os pagamentos deverão ser proporcionais ao atendimento das metas estabelecidas no ANS, atendendo-se ao seguinte:
a) as adequações nos pagamentos estarão limitadas a uma faixa específica de tolerância, abaixo da qual o fornecedor se sujeitará às sanções legais; e
b) na determinação da faixa de tolerância de que trata a alínea anterior, considerar-se-á a relevância da atividade, com menor ou nenhuma margem de tolerância para as atividades consideradas críticas.
Verifica-se, assim, que, em regra, deve a Administração estabelecer, em relação a cada indicador previsto no ANS, uma faixa de tolerância dentro da qual serão promovidas as sobreditas adequações de pagamento, e abaixo da qual a empresa estará sujeita às sanções previstas em lei e contrato, salvo em se tratando de indicadores críticos, relativos a aspectos relevantes da prestação do serviço, nos quais a IN SLTI/MP n.º 02/2008 admite que não seja prevista aludida margem de tolerância.
Como já salientado, os níveis de serviço são critérios de aferição dos resultados da atuação da contratada, ou seja, eles servem de estímulo para a parte prestadora do serviço melhorar a sua atuação, o que não significa dizer que o fato de eles não serem alcançados caracterizam descumprimento contratual.
Com efeito, a aplicação de penalidades é decorrente de descumprimento contratual (art. 87, da Lei nº 8.666/1993, ou art. 7º, da Lei nº 10.520/2002), o que não ocorre necessariamente quando a contratada não atinge os níveis de serviço. Outro não foi o posicionamento do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre o assunto, constante no Acórdão nº 717/2010 – Plenário, in verbis:
9.4. recomendar ao Ministério do Trabalho e Emprego que, em suas futuras licitações, em atenção ao art. 19, inciso XII, da IN/SLTI/MP nº 02/2008, observe que as reduções de pagamento decorrentes do descumprimento de Acordos de Nível de Serviço não devem ser interpretadas como penalidades, e sim como adequações pelo não atendimento das metas estabelecidas, em complemento à mensuração dos serviços efetivamente prestados;
Em outras palavras, se a contratada não atinge em específico o nível de serviço previsto no ANS, mas se mantém dentro da faixa de tolerância nele estabelecida, “o desconto no pagamento ocorrerá não como sanção, mas como ajuste da meta definida de forma mais rigorosa”[5].
Ainda sobre a prestação dos serviços com nível de conformidade inferior ao exigido no ANS, dispõe a Instrução Normativa SLTI/MP n.º 02/2008, em seu art. 33, que:
Art. 33. A verificação da adequação da prestação do serviço deverá ser realizada com base no Acordo de Níveis de Serviço, quando houver, previamente definido no ato convocatório e pactuado pelas partes.
§ 1º O prestador do serviço poderá apresentar justificativa para a prestação do serviço com menor nível de conformidade, que poderá ser aceita pelo órgão ou entidade, desde que comprovada a excepcionalidade da ocorrência, resultante exclusivamente de fatores imprevisíveis e alheios ao controle do prestador.
§ 2º O órgão contratante deverá monitorar constantemente o nível de qualidade dos serviços para evitar a sua degeneração, devendo intervir para corrigir ou aplicar sanções quando verificar um viés contínuo de desconformidade da prestação do serviço à qualidade exigida.
Muito embora uma leitura apressada da norma leve à conclusão de que se teria permitido a alteração concreta e definitiva do nível de serviço anteriormente previsto no instrumento convocatório, verifica-se, na verdade, que os dispositivos conferiram ao gestor a possibilidade excepcional de autorizar, em hipóteses específicas e pontuais, e em virtude de fatores imprevisíveis e alheios ao controle da contratada, a prestação do serviço com menor nível de conformidade daquele previsto no ANS. Tanto assim o é que o próprio dispositivo, em complemento, determina que o contratante fiscalize o nível de qualidade dos serviços prestados, a fim de evitar a sua “degeneração”, e corrija ou aplique sanções à contratada quando verificar “um viés contínuo de desconformidade da prestação do serviço à qualidade exigida”.
A despeito disso, entretanto, a alteração dos Acordos de Níveis de Serviço não deixou de ser suscitada pelas empresas e pela própria Administração em determinadas situações concretas, havendo a matéria chegado ao exame e apreciação do Tribunal de Contas da União. Acerca do tema, considera-se oportuno, para melhor compreensão do posicionamento da Corte de Contas, transcrever os seguintes excertos da análise da unidade técnica e do voto do Ministro Relator do Acórdão n.º 717/2010 – Plenário (TC-009.511/2009-6, rel. Min-Subst. Augusto Sherman Cavalcanti, 07.04.2010), in verbis:
Análise (...)
84. Inicialmente, cabe registrar que o lote 2 (Assessoria Técnica) prevê quatro indicadores de serviço e um outro no acordo de nível de serviço (anexo 1, fls. 57/58). O lote 6 (Suporte Técnico às Superintendências Regionais do Trabalho), por sua vez, prevê 18 indicadores de serviço e cinco outros no acordo de nível de serviço (anexo 1, fls. 97/98 e 101/102). Assim, não restava claro como se daria a vinculação entre tais indicadores e a redução do pagamento a ser efetuada à contratada.
85. Constata-se que o Ministério buscou esclarecer a vinculação dos ANS à aplicação de redutor nas faturas, descrevendo os demais indicadores como acessórios para o acompanhamento da execução dos serviços, e que esses indicadores encontram-se relacionados aos ANS. Enfatizou, também, que a metodologia a ser utilizada para a validação dos indicadores faz parte das obrigações da empresa vencedora do lote 1.
86. Dessa forma, consideram-se suficientes as explicações contidas na resposta do MTE quanto a este item da oitiva.
87. Contudo, entende-se que é necessário esclarecer outras informações trazidas nesta resposta, relativas à previsão de estabelecimento de novos ANS e à interpretação de que os redutores de pagamento, vinculados ao descumprimento dos ANS, compõem penalidades.
87.1 Em sua resposta, o Ministério ressaltou a possibilidade de elaboração de novos ANS, de comum acordo entre as parte, além dos já previstos, durante a execução das ordens de serviço.
87.2 Primeiro, convém registrar a diferença entra a utilização de ANS no âmbito de contratos privados e públicos. Ressalte-se, nesse sentido, o posicionamento adotado no relatório do Acórdão 1.480/2007 - TCU - Plenário:
"68. A expressão Acordo de Nível de Serviço (originalmente, Service Level Agreement - SLA) tem um significado muito próprio na literatura amplamente aceita, particularmente na biblioteca de melhores práticas ITIL (Information Technology Infrastructure Library). Refere-se aos ajustes feitos, em tempo de negociação e durante a gestão do contrato, entre contratante e contratado, sobre a forma de realização do objeto em questão.
69. Na Administração Pública, porém, em virtude da exigência de clareza do objeto para fins de isonomia licitatória, não é possível negociar Acordos de Nível de Serviço, na acepção mundialmente aceita. Assim, fica mais coerente com a legislação de licitações e contratos a expressão Nível Mínimo de Serviço Exigido, que decorrerá dos requisitos obrigatórios do edital (ou da proposta vencedora, quando esta superar os requisitos obrigatórios) e, quando for o caso, da pontuação obtida nos requisitos pontuáveis" (Acórdão 1.480/2007 - TCU - Plenário, relatório adotado pelo Relator, grifamos).
87.3 Ou seja, não se considera possível a alteração ou a renegociação dos níveis de serviço definidos anteriormente no edital que dará origem a contratação. Além de possível quebra da isonomia, destaca-se também a obrigatoriedade de vinculação ao instrumento convocatório, pelo qual a Administração não pode descumprir as normas e condições do edital ao qual se acha estritamente vinculada (caput dos arts. 3º e 41, e art. 54, § 1º, da Lei 8.666/1993).
87.4 Ademais, a possibilidade de alteração do ANS, após a assinatura do contrato, poderia ensejar a alteração do próprio objeto contratado. Esse entendimento baseou determinação, no caso concreto, à entidade para que se abstivesse de alterar os níveis de serviço acordados (item 9.3.1.2 do Acórdão 1.125/2009 - TCU - Plenário).
87.5 Contudo, vedada a alteração ou a renegociação, nos contratos públicos, dos níveis de serviços já pré-estabelecidos nos editais, há que se destacar a possibilidade de estabelecimento de novos ANS, conforme descrito no Acórdão 1.480/2007 - TCU - Plenário, aplicando-se nesse caso o real sentido de acordo entre as partes, desde que isto seja previsto no edital:
"80. Por outro lado, no contexto da gestão contratual, desde que previsto no edital, pode surgir um Acordo de Nível de Serviço para tratar de aspectos que não possam ou não devam ser fixados antecipadamente. Vamos considerar o exemplo de uma contratação que resulte no desenvolvimento e implantação de um determinado sistema. Ao longo do desenvolvimento do sistema pode-se detalhar as funcionalidades que serão construídas e os níveis de serviço do sistema. Neste caso, a definição dos níveis de serviço ocorre durante o desenvolvimento do sistema e é feita mediante interação entre as duas partes (contratante e contratada), com base nas funcionalidades que foram detalhadas e na infra-estrutura disponível no órgão ou entidade (e.g. ambiente de rede e de banco de dados). Neste caso se aplica a expressão Acordo de Nível de Serviço, pois de fato há um acordo entre as duas partes sobre os níveis de serviço" (Acórdão 1480/2007 - TCU - Plenário, relatório adotado pelo Relator, grifamos).
87.6 Naturalmente, a motivação para tal previsão deve constar do respectivo processo licitatório.
87.7 No caso em análise, não foram identificados, nem no edital, nem no termo de referência e nem na minuta do contrato, qualquer previsão de estabelecimento de novos ANS, além dos já descritos no termo de referência. Esse fato gera dúvidas na declaração do MTE sobre a viabilidade de criação de novos ANS.
87.8 Quanto aos atuais ANS, descritos no edital e no termo de referência do pregão em tela, nota-se que o MTE induz à interpretação de que esses serão utilizados para a aplicação de penalidade de redução da fatura (anexo 1, fl. 35, item 18.2.3).
87.9 Contudo, as reduções de pagamento decorrentes do descumprimento de ANS não devem ser interpretadas como penalidades, e sim como adequações pelo não atendimento das metas estabelecidas (art. 19, inciso XII, da IN 2/2008 - SLTI). Assim, o objetivo dos ANS é vincular o pagamento dos serviços aos resultados alcançados, em complemento à mensuração dos serviços efetivamente prestados, não devendo as reduções de pagamento, originadas pelo descumprimento dos ANS, ser interpretadas como penalidades ou multas, as quais exigem a abertura do regular processo administrativo e do contraditório.
Conclusão
88. Consideram-se suficientes as explicações fornecidas pelo Ministério quanto a este item da oitiva (parágrafos 85/86), relacionado às contratações dos serviços relativos aos lotes 2 e 6. Ressalte-se que existe proposta para não se permitir a prorrogação desses contratos (parágrafo 82).
89. As demais divergências levantadas (previsão de estabelecimento de novos ANS e interpretação de que os redutores de pagamento compõem penalidades) não impedem a conclusão do certame, apesar de motivarem as propostas de recomendação, apresentadas a seguir, para aperfeiçoamento das futuras licitações do MTE.
Proposta de encaminhamento
90. Recomendar ao MTE que observe os seguintes aspectos nas suas próximas licitações:
a) em atenção ao caput dos arts. 3º e 41, e art. 54, § 1º, da Lei 8.666/1993, referente ao princípio da isonomia e à vinculação do contrato ao instrumento convocatório, apesar de ser possível a inclusão de novos Acordos de Nível de Serviço no termo contratual, desde que tenham sido devidamente motivados e previstos no processo licitatório, é vedada a alteração ou a renegociação, nos contratos públicos, dos níveis de serviços já pré-estabelecidos nos editais;
b) em atenção ao art. 19, inciso XII, da IN 2/2008 – SLTI, as reduções de pagamento decorrentes do descumprimento de Acordos de Nível de Serviço não devem ser interpretadas como penalidades, e sim como adequações pelo não atendimento das metas estabelecidas, em complemento à mensuração dos serviços efetivamente prestados.
Voto (...)
15. Com relação às inconsistências entre indicadores e acordo de nível de serviço, a Sefti considerou suficientes as explicações do MTE quanto a esse item da oitiva. Dessa forma, propôs a prolação de recomendação tendente a aprimorar as futuras licitações promovidas pelo ministério, nos seguintes termos:
"em atenção ao caput dos arts. 3º e 41, e art. 54, § 1º, da Lei 8.666/1993, referente ao princípio da isonomia e à vinculação do contrato ao instrumento convocatório, apesar de ser possível a inclusão de novos Acordos de Nível de Serviço no termo contratual, desde que tenham sido devidamente motivados e previstos no processo licitatório, é vedada a alteração ou a renegociação, nos contratos públicos, dos níveis de serviços já pré-estabelecidos nos editais;"
16. Deixo de acolher, em parte, a proposta da unidade técnica. Em primeiro lugar, penso não caber a ressalva sugerida para a redação da recomendação, no sentido de se considerar possível a inclusão de novos acordos de nível de serviço no termo contratual, desde que tenham sido devidamente motivados e previstos no processo licitatório.
17 Verifico que a mencionada proposta foi fundada em considerações da equipe deste Tribunal que propôs recomendações para elaboração de novo modelo de licitação e contratação de serviços de tecnologia da informação para a Administração Pública Federal, conforme consta do relatório do Acórdão 1480/2007-TCU - Plenário. Contudo, as instruções normativas da SLTI 02/2008 e 04/2008, que materializam esse novo modelo de contratação, não contemplam tal possibilidade.
18. Em segundo lugar, penso que a vedação contida na proposta merece análise mais criteriosa. É fato que este Tribunal já se manifestou no sentido de não se admitir a alteração dos acordos de nível de serviço contratados, a exemplo do que foi decidido no Acórdão 1125/2009-TCU - Plenário. Todavia, ao analisar a questão sob a perspectiva da realidade enfrentada pelos gestores de TI dos órgãos e entidades da Administração Pública, é forçoso reconhecer que essa restrição pode configurar um engessamento indevido neste momento. Há que ser considerado que, na prática, isso equivaleria a se exigir do gestor que ele acertasse, sem qualquer margem de erro, o nível de serviço que efetivamente vai atender às necessidades do órgão/entidade no momento da elaboração do edital. Contudo, sabemos que após a implantação das soluções de TI podem surgir fatores não previstos que podem afetar os resultados esperados, obrigando o gestor a se ajustar aos mesmos. Não permitir que os níveis de serviços contratados possam ser revistos poderia então se mostrar antieconômico, caso se viesse a constatar, na prática, que os níveis exigidos em edital estão acima das reais demandas e, portanto, custando mais do que o mínimo necessário. Por outro lado, caso os níveis especificados não sejam suficientes, não permitir a sua elevação poderia comprometer a qualidade dos serviços implantados.
19. Necessário, entretanto, deixar bem claro que a possibilidade de ajustes dos níveis de serviços contratados não deve ser entendida como permissão para que o gestor não especifique criteriosamente esse parâmetro em edital, deixando para ajustá-lo a seu bel-prazer após a implantação dos sistemas contratados. Pelo contrário, esses ajustes devem ser entendidos apenas como ajustes finos necessários ao melhor atendimento das necessidades da Administração. Para que possam ser admitidas as revisões nos acordos de níveis de serviço, alguns critérios devem ser observados, tais como, (1) previsão no edital e no contrato; (2) ser tecnicamente justificadas; (3) não demandar alterações no valor contratual do serviço fora dos 25% para mais ou menos, permitidos pela Lei de Licitações; e (4) não descaracterizar o objeto licitado. (...)
9. Acórdão:
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de representação interposta pela empresa Cast Informática S.A., apontando supostas irregularidades no edital do Pregão Eletrônico 13/2009, promovido pelo Ministério do Trabalho e do Emprego (MTE), objetivando a contratação de serviços especializados na área de Tecnologia da Informação e Comunicação para prover a Coordenação-Geral de Informática de capacidade organizacional para operacionalizar os referidos serviços e atender às necessidades tecnológicas das unidades do ministério,
ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão de Plenário, ante as razões expostas pelo Relator, em: (...)
9.3. determinar ao Ministério do Trabalho e Emprego que: (...)
9.3.5. em atenção ao caput dos arts. 3º e 41, e art. 54, §1º, da Lei nº 8.666/1993, referente ao princípio da isonomia e à vinculação do contrato ao instrumento convocatório, abstenha-se de prever no edital a adoção de novos Acordos de Nível de Serviço durante a execução contratual, sendo possível, entretanto, a alteração ou a renegociação para ajuste fino dos níveis de serviços pré-estabelecidos nos editais, desde que essa alteração ou renegociação:
9.3.5.1. esteja prevista no edital e no contrato;
9.3.5.2. seja tecnicamente justificada;
9.3.5.3. não implique acréscimo ou redução do valor contratual do serviço além dos limites de 25% permitidos pelo art. 65, § 1º, da Lei 8.666/1993;
9.3.5.4. não configure descaracterização do objeto licitado;
Os níveis de serviço, repita-se, são critérios de aferição dos resultados da atuação da contratada. Justamente por isso, a manutenção desses níveis em situação inadequada pode se apresentar antieconômica para Administração, quando eles deveriam ser diminuídos para que o Poder Público pudesse lucrar com índices capazes de alcançar melhores resultados; ou prejudicial à qualidade do serviço, na medida em que eles deveriam ser aumentados, sob pena de o contratado prestar um serviço de má qualidade, com o intuito de atingir a meta prevista no nível de serviço. Em suma, impedir, em qualquer caso, a alteração ou renegociação dos níveis de serviço poder-se-ia se mostrar, em última análise, prejudicial à própria satisfação do interesse público perseguido pela Administração.
Ademais, como bem registrou o TCU, essa restrição indiscriminada pode configurar um engessamento indevido da Administração, tendo em vista as peculiaridades de cada contratação e a possibilidade de que fatores diversos e supervenientes à celebração do contrato venham a afetar os resultados esperados e estimados pela Administração.
A Corte de Contas, portanto, foi sensível às dificuldades da Administração nessa seara, concluindo pela possibilidade de alteração ou renegociação para ajuste fino dos níveis de serviços pré-estabelecidos nos editais, desde que essa alteração ou renegociação, cumulativamente:
a. esteja prevista no edital e no contrato;
b. seja tecnicamente justificada;
c. não implique acréscimo ou redução do valor contratual do serviço além dos limites de 25% permitidos pelo art. 65, § 1º, da Lei 8.666/1993;
d. não configure descaracterização do objeto licitado.
A possibilidade de alterações ou renegociações pontuais acerca dos níveis de serviço previamente estabelecidos pela Administração encontra respaldo, inclusive, no princípio da autotutela; deveras, como bem salienta José dos Santos Carvalho Filho[6], “A Administração Pública comete equívocos no exercício de sua atividade, o que não é nem um pouco estranhável em vista das múltiplas tarefas a seu cargo. Defrontando-se com esses erros, no entanto, pode ela mesma revê-los para restaurar a situação de regularidade (...) Na verdade, só restaurando a situação de regularidade é que a Administração observa o princípio da legalidade, do qual a autotutela é um dos mais importantes corolários”.
Assim, deve ser conferida à Administração a possibilidade de reexaminar e corrigir, se for o caso, possíveis desvios na estimativa inicialmente promovida quanto aos níveis de serviço, a fim de melhor adequá-los à realidade de cada contratação, tudo em observância à satisfação do interesse público (tanto primário quanto secundário), e desde que observados os requisitos indicados pelo TCU no Acórdão 717/2010 – Plenário.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, é possível concluir que o Acordo de Nível de Serviço, por definir objetivamente os níveis esperados de qualidade da prestação do serviço continuado e as respectivas adequações de pagamento, constitui importante instrumento de gestão e eficiência em favor da Administração Pública, a fim de se evitar contratações administrativas infrutíferas e que não alcancem os resultados esperados, bem como, em última análise, o dispêndio irregular ou aleatório de recursos públicos.
Nesse sentido, os descontos ou glosas nos pagamentos devidos à contratada em decorrência do não cumprimento dos níveis de qualidade exigidos não se confundem com a aplicação de penalidades por descumprimento contratual, tratando-se, ao revés, como bem salientado pelo TCU, de adequações pelo não atendimento das metas estabelecidas, em complemento à mensuração dos serviços efetivamente prestados.
Sem embargo disso, a Instrução Normativa SLTI/MP n.º 02/2008 conferiu ao gestor a possibilidade excepcional de autorizar, em hipóteses específicas e pontuais, e em virtude de fatores imprevisíveis e alheios ao controle da contratada, a prestação do serviço com menor nível de conformidade daquele previsto no ANS, determinando que o contratante fiscalize o nível de qualidade dos serviços prestados, a fim de evitar a sua degeneração, e corrija ou aplique sanções à contratada quando verificar um viés contínuo de desconformidade da prestação do serviço à qualidade exigida.
O TCU, no Acórdão n.º 717/2010 – Plenário, inclusive, admitiu a possibilidade de alteração ou renegociação para ajuste fino dos níveis de serviços pré-estabelecidos nos editais, desde que essa alteração ou renegociação, cumulativamente, esteja prevista no edital e no contrato, seja tecnicamente justificada, não implique acréscimo ou redução do valor contratual do serviço além dos limites de 25% permitidos pelo art. 65, § 1º, da Lei 8.666/1993 e não configure descaracterização do objeto licitado.
Deve a Administração, portanto, em atenção à Lei n.º 8.666/1993, ao Decreto n.º 2.271/1997 e à Instrução Normativa SLTI/MP n.º 02/2008, diligenciar a devida elaboração do Acordo de Nível de Serviço ao promover o planejamento das respectivas contratações de serviço continuado, bem como, num segundo momento, monitorar o cumprimento pela contratada das metas e indicadores nele previstos, vinculando-se o pagamento dos serviços pactuados aos resultados efetivamente alcançados pelo particular.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 26 ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Atlas, 2013.
GIRON, Amanda Sant'Anna Caetano Romano. Divagações acerca da aplicação da metodologia de acordo de nível de serviços pela administração pública: um viés da estatística no direito público. Jus Navigandi, Teresina, ano 19, n. 3837, 2 jan. 2014. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/26308>. Acesso em: 28 nov. 2014.
ZYMLER, Benjamim. Levantamento acerca da Governança de Tecnologia da Informação na Administração Pública Federal. Tribunal de Contas da União. Brasília: TCU, Secretaria da Fiscalização de Tecnologia da Informação, 2008.
[2] MORAES, Alexandre de. Reforma Administrativa: Emenda Constitucional nº 19/98. 3. ed., São Paulo Atlas, 1999, p. 30.
[3] ZYMLER, Benjamim. Levantamento acerca da Governança de Tecnologia da Informação na Administração Pública Federal. Tribunal de Contas da União. Brasília: TCU, Secretaria da Fiscalização de Tecnologia da Informação, 2008, p.23.
[5] GIRON, Amanda Sant'Anna Caetano Romano. Divagações acerca da aplicação da metodologia de acordo de nível de serviços pela administração pública: um viés da estatística no direito público. Jus Navigandi, Teresina, ano 19, n. 3837, 2 jan. 2014. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/26308>. Acesso em: 28 nov. 2014.
[6] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 26 ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Atlas, 2013. p. 34.
Procuradora Federal. Graduada em Direito pela Universidade Federal da Bahia. Especialista em Direito do Estado pela Faculdade Baiana de Direito.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Caroline Marinho Boaventura. Breves considerações sobre o acordo de nível de serviço nos contratos administrativos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 dez 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/42133/breves-consideracoes-sobre-o-acordo-de-nivel-de-servico-nos-contratos-administrativos. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Francisco de Salles Almeida Mafra Filho
Por: BRUNO SERAFIM DE SOUZA
Por: Fábio Gouveia Carneiro
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
Precisa estar logado para fazer comentários.