Resumo: O presente artigo irá abordar dois dos métodos mais relevantes de solução pacífica das controvérsias previstos na legislação brasileira, quais sejam, a conciliação e a mediação. Nesse sentido, tais institutos serão inicialmente confrontados com a arbitragem e posteriormente estudados à luz do atual Código de Processo Civil e da legislação específica, sendo que tais diplomas em conjunto compõem o microssistema brasileiro de conciliação e mediação. A importância do estudo em tela é manifesta, uma vez que o atual Código de Processo Civil, eminentemente principiológico, relaciona a conciliação e a mediação com os princípios constitucionais da inafastabilidade do controle jurisdicional, da eficiência e da celeridade, com prevalência da solução consensual dos conflitos.
SUMÁRIO. 1. Introdução. 2. Diferenças e semelhanças entre conciliação, mediação e arbitragem. 3. O microssistema brasileiro da conciliação e da mediação. 4. Conciliação e mediação no Código de Processo Civil. 4.1 – Dos conciliadores e mediadores judiciais: arts. 165 a 175 do CPC. 4.2. Da ausência de conciliação ou mediação: art. 334 do Código de Processo Civil. 5. Conclusão. 6. Referências.
1. Introdução
O CPC de 2015 foi fruto de um trabalho árduo da comissão de
juristas responsáveis pela sua elaboração, no sentido de atender aos anseios
da população, privilegiando a simplicidade, a celeridade e efetividade do
processo e da ação processual, além do estímulo à inovação e à modernização de procedimentos, respeitando e aperfeiçoando, contudo, os direitos básicos das partes ao contraditório, à ampla defesa e ao devido processo legal.
Dentre os objetivos expressamente listados na exposição de motivos do CPC de 2015, podemos destacar o estabelecimento de uma sintonia fina entre o Código de Processo Civil e a Constituição Federal, com a simplificação dos procedimentos, trazendo maior organização ao sistema como um todo e conferindo-lhe maior coesão.
Nesse sentido, o art. 3º e parágrafos do novo CPC consagra o princípio constitucional da inafastabilidade do controle jurisdicional e ressalta a importância da arbitragem, da conciliação e da mediação como formas alternativas e preferíveis para a solução das controvérsias, ao prescrever que, “Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito”, “é permitida a arbitragem, na forma da lei”, “o Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos” e “a conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial”.
2. Diferenças e semelhanças entre conciliação, mediação e arbitragem
Inicialmente, para fins didáticos, podemos assim diferenciar os institutos da conciliação, da mediação e da arbitragem: na conciliação, há a solução do conflito por autocomposição, mediante atuação de conciliador, sendo que, em geral, não há vínculo anterior entre as partes e o conciliador apresenta propostas e sugere soluções (mais proativo), analisando aspectos objetivos do conflito.
O acordo obtido na conciliação gera título executivo extrajudicial, sendo necessária a homologação do juiz para transformar o título em judicial (arts. 515, II e III, c/c o 784, IV, do CPC de 2015).
Na mediação, também há a solução do conflito por autocomposição, porém, mediante a atuação do mediador, havendo, em geral, vínculo anterior entre as partes (exemplo: ações de família). O mediador analisa aspectos subjetivos (emoções) no conflito e estimula as partes a elas próprias encontrarem a melhor solução. O acordo gera título executivo extrajudicial, sendo necessária a homologação do juiz para transformar o título em judicial (arts. 515, II e III, c/c o 784, IV, do CPC de 2015).
Tanto a conciliação quanto a mediação possuem por objeto direitos disponíveis ou direitos indisponíveis que admitam transação, valendo ressaltar, no entanto, que o consenso das partes envolvendo direitos indisponíveis, mas transigíveis, deve ser homologado em juízo, exigida a oitiva do Ministério Público (§ 2º do art. 3º da Lei 13.140/2015 – Lei da Mediação).
Na arbitragem, por seu turno, ocorre a solução do conflito por heterocomposição e a decisão do litígio é atribuída pelas partes a pessoa neutra e imparcial, chamada árbitro (Lei 9.307, de 23.09.1996, alterada pela Lei 13.129, de 26 de maio de 2015). Há título executivo judicial (art. 515, VII, do CPC) e independe de homologação judicial.
Ainda no tocante à arbitragem, veja-se que a legislação do novo CPC passou a utilizar a expressão “convenção de arbitragem” no sentido abrangente de “cláusula arbitral” e de “compromisso arbitral”, aplicando o mesmo regime jurídico a ambos, desaparecendo, na prática, a sua clássica diferenciação doutrinária (art. 260, § 3º, e 485, VII).
3. O microssistema brasileiro da conciliação e da mediação
O estudo da conciliação e da mediação não pode ser feito isoladamente, uma vez que há um verdadeiro microssistema jurídico envolvido, composto pela Resolução 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça, pela Lei 13.140/2015 (Lei de Mediação) e pelo atual Código de Processo Civil. Frise-se que, no caso de conflito entre o Código de Processo Civil e a Lei de Mediação, prevalece esta última, por ser norma posterior e especial.
No tocante à Resolução 125, de 29.11.2010, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), com alterações pelas Emendas 1, de 31.01.2013 e 2, de 08.03.2016, podemos citar as suas principais características e inovações:
I – Foi inspirada no direito de acesso à Justiça, previsto no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal;
II - Instituiu a política judiciária nacional de tratamento de conflitos de interesse, incumbindo os órgãos judiciários de oferecerem mecanismos consensuais de soluções de controvérsias (mediação e conciliação), bem como de prestarem atendimento e orientação ao cidadão (art. 1º, caput e parágrafo único);
III - Atribuiu ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça) a organização do programa, mediante a formulação de diretrizes gerais de implementa- ção do sistema de conciliação e mediação (arts. 4º a 6º);
IV - Determinou, no âmbito dos Tribunais, a criação de Núcleos Permanentes de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos, com diversas atribuições (art. 7º e incisos);
V - Determinou aos Tribunais a criação dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSCs), para realizarem sessões de conciliação e mediação pré-processuais ou processuais (art. 8º);
VI - Delegou aos Juízos, Juizados e Varas, excepcionalmente, a realização das sessões de conciliação e mediação processuais, com participação obrigatória de profissionais cadastrados no Tribunal e supervisionados por Juiz Coordenador do Centro (art. 8º, § 1º);
VII - Fixou a obrigatoriedade de atuação nos Centros e demais órgãos judiciários de mediadores e conciliadores devidamente capacitados pelos Tribunais (art. 12);
VIII - Previu a criação de Fóruns de Coordenadores de Núcleos (art. 12-A e 12-B), para estabelecerem diretrizes específicas aos seus seguimentos;
IX - Regulamentou as Câmaras Privadas de Conciliação e Mediação, obrigando-as ao cadastramento e à avaliação periódica pelos Tribunais (art. 12-C a 12-F);
X - Obrigou os Tribunais e o CNJ a manterem dados estatísticos sobre as atividades dos Centros (arts. 13 e 14);
XI - Criou o “portal da conciliação”, com informações disponibilizadas pela internet (site do CNJ) sobre conciliação e mediação (art. 15);
XII - No Anexo I, estabeleceu diretrizes curriculares dos cursos de capacitação dos conciliadores de mediadores;
XIII - No Anexo III, há previsão de um “Código de Ética” para os conciliadores e mediadores judiciais. Já a Lei de Mediação (Lei 13.140, de 26.06.2015), criou tratamento específico para o instituto, prevendo em seu texto disposições gerais sobre a mediação, princípios aplicáveis, mediação judicial e extrajudicial, requisitos e atribuições dos mediadores extrajudiciais e judiciais, procedimento da mediação judicial e extrajudicial, confidencialidade da mediação e suas exceções e também o inovador procedimento da autocomposição de conflitos envolvendo pessoa jurídica de direito público.
O tratamento da conciliação e da mediação no atual Código de Processo Civil será a seguir estudado.
4. Conciliação e mediação no Código de Processo Civil
No Código de Processo Civil de 2015, as disposições sobre mediação e conciliação são encontradas nos seguintes dispositivos:
I - Art. 3º, §§ 2º e 3º: Das normas fundamentais do processo civil, com estímulo à conciliação, mediação e solução consensual dos conflitos, nos âmbitos judicial e extrajudicial, pelos juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público.
II - Arts. 165 a 175: Dos conciliadores e mediadores judiciais.
III - Art. 334: Da audiência de conciliação ou de mediação.
O estudo do art. 3º e parágrafos do atual CPC já foi realizado no início desse trabalho, sendo desnecessária a sua repetição.
Assim sendo, passemos à análise dos arts. 165 a 175 do atual CPC, que preveem a figura dos conciliadores e dos mediadores judiciais.
4.1 – Dos conciliadores e mediadores judiciais: arts. 165 a 175 do CPC
O caput do art. 165 do atual CPC determina aos Tribunais a criação dos Centros judiciários de solução consensual de conflitos, sendo que tal disposição segue os ditames da Resolução 125/2010 do CNJ, que determina a criação dos CEJUSCs com setores processual, pré-processual e de atendimento ao cidadão; no mesmo sentido, ainda, o art. 24, caput, da Lei de Mediação.
O § 1º do art. 165 do CPC delega aos Tribunais a composição e a organização dos Centros de conciliação e mediação, estando o dispositivo no mesmo sentido do art. 24, parágrafo único, da Lei de Mediação e das regras específicas da Res. 125/2010 do CNJ (art. 8º e parágrafos).
Os §§ 2º e 3º do art. 165 preveem, respectivamente, as figuras do conciliador, que atua preferencialmente nas causas onde não houver vínculo anterior entre as partes, podendo sugerir soluções, sem uso de constrangimento ou intimidações, e do mediador, que atua preferencialmente nas causas onde houver vínculo anterior entre as partes, auxiliando as partes no restabelecimento da comunicação e identificação das soluções.
O art. 166, caput, do CPC, lista os princípios da conciliação e da mediação, devendo tal dispositivo ser analisado conjuntamente com o “Código de Ética de Conciliadores e Mediadores Judiciais”, consistente no Anexo III à Resolução 125/CNJ e também com o art. 2º da Lei de Mediação.
A partir da interpretação conjunta das normas supra, podemos elencar os seguintes princípios aplicáveis à conciliação e à mediação:
I. Independência: dever do profissional da conciliação ou mediação atuar com liberdade, sem sofrer qualquer pressão interna ou externa.
II. Imparcialidade: dever do profissional de agir com ausência de favoritismo, preferência ou preconceito.
III. Autonomia da vontade: livre autonomia dos interessados, inclusive no tocante às regras procedimentais. Entretanto, há certos princípios e regras que devem ser observados no procedimento, conforme especificado Anexo III da Res. 125/2010;
IV. Confidencialidade: inclui todas as informações produzidas no curso do procedimento, que não podem ser utilizadas para fim diverso daquele previsto por expressa deliberação das partes; nesse sentido, os conciliadores ou mediadores não poderão divulgar ou depor acerca de fatos ou elementos oriundos da conciliação ou da mediação.
V. Oralidade e informalidade: na solução de um conflito, admite-se a aplicação de técnicas negociais para facilitar a auto--composição;
VI. Decisão Informada: dever de manter o jurisdicionado plenamente informado quanto aos seus direitos e ao contexto fático no qual está inserido.
VII. Isonomia entre as partes, busca do consenso e boa-fé (conforme previsão do art. 2° da Lei de Mediação);
VIII. Competência: dever do profissional de possuir qualificação que o habilite à atuação judicial, com capacitação na forma da Resolução 125/CNJ, observada a reciclagem periódica obrigatória para formação continuada;
IX. Empoderamento: dever do profissional de estimular os interessados a aprenderem a melhor resolverem seus conflitos futuros em função da experiência de justiça vivenciada na auto- -composição;
X. Validação: dever de estimular os interessados perceberem-se reciprocamente como seres humanos merecedores de atenção e respeito.
Prosseguindo no estudo do tema, o art. 167, caput, do CPC exige a inscrição dos conciliadores, mediadores e câmaras privadas de conciliação e mediação em cadastros nacionais (no CNJ – Conselho Nacional de Justiça) e regionais (nos Tribunais de Justiça estaduais e Tribunais Regionais Federais), que manterão registros de profissionais habilitados com indicação da área profissional.
O § 1º do art. 167 do CPC exige a capacitação mínima para cadastro dos conciliadores e mediadores, que deverão fazer cursos em entidades credenciadas, com parâmetro curricular definido pelo CNJ em conjunto com o Ministério da Justiça.
A Lei de Mediação, por sua vez, exige ainda que o mediador judicial seja graduado há pelo menos 2 (dois) anos em curso de ensino superior reconhecido pelo MEC – Ministério da Educação e Cultura (art. 11 da Lei 13.140/2015).
O art. 167, § 2º, do CPC, prevê que o registro do profissional da conciliação ou mediação pode ser precedido de concurso público, havendo posterior envio de lista dos registrados ao chefe de cartório, com escolha aleatória, alternada, e igualitária dentro da mesma área de atuação do profissional.
Os §§ 3º e 4º do art. 167 estabelecem que o credenciamento conterá todos os dados relevantes sobre a atuação do conciliador ou mediador (área de atuação, número de processos em que atuou etc.), com publicação, ao menos anual, para conhecimento da população.
O § 5º do art. 167 prevê uma regra prejudicial aos advogados: os conciliadores e mediadores judiciais, se advogados, estão impedidos de exercerem a advocacia perante o Juízo que atuarem.
Na verdade, tal dispositivo merece críticas, uma vez que estabelece uma verdadeira presunção absoluta de má-fé do advogado mediador/conciliador, não havendo sequer previsão nesse sentido na Lei de Mediação e no Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
O § 6º do art. 167 reza que o Tribunal poderá optar por criar quadro próprio de mediadores e conciliadores, preenchido mediante concurso público.
Nos termos do caput do art. 168 do CPC, as partes poderão escolher de comum acordo o conciliador, o mediador ou a câmara privada de conciliação e mediação.
Já o art. 25 da Lei de Mediação prevê que, na mediação judicial, os mediadores não estarão sujeitos à prévia aceitação das partes. Entendemos que, ante a divergência entre as referidas disposições, no ponto, deve prevalecer a regra da lei de mediação, que é especial e posterior ao atual CPC.
O § 1º do art. 168 do CPC prescreve que o conciliador ou mediador escolhido de comum acordo poderá ou não estar cadastrado; já o § 2º do mesmo art. reza que, não havendo comum acordo quanto à escolha, haverá a distribuição do feito entre os cadastrados no registro do Tribunal; por seu turno, o § 3º prevê a “comediação” ou conciliação conjunta, na qual poderá haver a designação de mais de um conciliador ou mediador (em geral questões mais complexas, envolvendo direito de família, conflitos agrários, dentre outros) para a solução da lide.
O art. 169, caput, do CPC, estabelece que o conciliador ou o mediador receberá remuneração, conforme tabela fixada pelo Tribunal e parâmetros do CNJ, estando tal regra no mesmo sentido do art. 12, § 5º, da Resolução 125/CNJ; complementando a disposição do art. 169, caput, temos que, nos termos da Lei de Mediação, o custeio da remuneração será arcado pelas partes, ressalvada a gratuidade de justiça (cf. art. 13 c/c art. 4º, § 2º).
O § 1º do art. 169 reza que a conciliação ou mediação poderá consistir em trabalho voluntário (e nesse caso não haverá remuneração, ex: conciliação comunitária); já o § 2º do mesmo dispositivo prevê que as câmaras privadas de conciliação e mediação deverão atuar em determinado percentual de audiências não-remuneradas, em prol dos necessitados, como retribuição ao seu credenciamento nos Tribunais.
No ponto, ressalte-se que o art. 12-D da Resolução 125/CNJ prevê incumbir aos Tribunais o estabelecimento do percentual das audiências não-remuneradas.
Conforme o art. 170 do CPC, havendo impedimento, o conciliador ou o mediador deve comunicá-lo imediatamente e de preferência eletronicamente ao juiz do processo (no caso de mediação judicial) ou ao coordenador do centro judiciário de solução de conflitos (no caso de mediação extrajudicial), ensejando a escolha de outro profissional.
Em complemento à regra acima, temos que, segundo o art. 5º da Lei de Mediação, “aplicam-se ao mediador as mesmas hipóteses legais de impedimento e suspeição do juiz”.
A regra do art. 171 do CPC é no sentido de que, no caso de impossibilidade temporária de exercício, o conciliador ou mediador também devem comunicar o fato, suspendendo-se a distribuição de feitos.
Como a Lei de Mediação é omissa nesse sentido, aplica-se integralmente esse dispositivo da lei processual civil.
O art. 172 do CPC prevê a ocorrência de impedimento do conciliador ou do mediador em assessorar, representar ou patrocinar qualquer das partes, no prazo mínimo de 1 ano, a contar da última audiência.
No mesmo sentido é a Lei de Mediação (art. 6º), que ainda prevê outros impedimentos ao mediador, como o de atuar como árbitro ou funcionar como testemunha em processos judiciais ou arbitrais pertinentes a conflito em que tenha atuado como mediador (art. 7º); o mediador e seus assessores, quando no exercício de suas funções, são equiparados a servidores públicos para fins penais (art. 8º).
O art. 173 do CPC estabelece a exclusão do cadastro nos Tribunais do mediador ou conciliador que atuar indevidamente (estando impedido ou agir com dolo ou culpa e violar seus deveres), devendo esse art. ser interpretado em conjunto com o Código de Ética do Anexo III da Res. 125/2010 do CNJ.
O § 1º do art. 173 do CPC impõe que a apuração de responsabilidades e a fixação de sanções se darão mediante processo administrativo, o que se coaduna com o disposto no art. 5º, LV, da Constituição Federal de 1988 – princípios do contraditório e da ampla defesa.
O § 2º do art. 173 do CPC prevê o afastamento temporário por até 180 (cento e oitenta) dias, mediante decisão fundamentada do juiz, no caso de suspeita de conduta irregular do mediador ou conciliador, com imediata comunicação do Tribunal para instauração de processo administrativo.
Segundo o art. 174 do CPC, todos os entes públicos deverão criar câmaras de conciliação e mediação para solucionar administrativamente conflitos envolvendo a Administração Pública ou promover assinatura de termo de ajustamento de conduta, havendo, na Lei de Mediação, uma disciplina mais completa do tema nos arts. 32 a 40.
O art. 175, caput, do CPC diz que não são excluídas outras formas de mediação e conciliação extrajudiciais, que podem ser feitas por profissionais independentes, nos termos de lei específica, sendo tais disposições aplicáveis às Câmaras de conciliação e mediação, de acordo com o parágrafo único do mesmo dispositivo.
4.2. Da ausência de conciliação ou mediação: art. 334 do Código de Processo Civil
Uma importante inovação contida no novo Código de Processo Civil refere-se à inclusão do processo no contexto social que o circunda, dando-se ênfase à possibilidade das partes de colocarem fim ao conflito por meio da mediação ou da conciliação. Nesse sentido, o legislador entendeu que a satisfação efetiva das partes ocorre por meio da solução criada por elas mesmas, e não pela decisão imposta pelo juiz.
Por exemplo, na realização da audiência inicial, o juiz tentará fazer com que as partes cheguem a um acordo, e somente no caso de negativa de acordo terá início o prazo para a apresentação da contestação.
Assim, nos termos do art. 334, incisos e parágrafos, do novo CPC, se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz obrigatoriamente designará audiência de conciliação ou mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo o réu ser citado com 20 (vinte) dias de antecedência, no mínimo.
O conciliador ou mediador, onde houver, atuará necessariamente na audiência de conciliação, podendo haver mais de uma sessão destinada à mediação e à conciliação, não excedentes a 02 (dois) meses da primeira, desde que necessária à composição das partes, sendo a intimação do autor para a audiência feita na pessoa do seu advogado.
Ressalte-se que, segundo a doutrina, o prazo referido acima tem natureza dilatória, ou seja, as partes, de comum acordo, poderão pedir a dilação do prazo, com base no princípio da autonomia da vontade, que rege a justiça conciliativa (art. 166, § 4º, do CPC). Veja-se, outrossim, que a Lei 13.140/2015 (Lei da Mediação) prevê o prazo de 60 (sessenta) dias para a conclusão final do procedimento de mediação judicial, salvo pedido de prorrogação das partes, de comum acordo (conforme o seu art. 28).
Segundo a mesma Lei da Mediação, referido procedimento pode versar sobre todo conflito ou parte dele (art. 3º, § 1º, da Lei 13.140/2015).
A audiência de conciliação ou mediação não será marcada se as partes previamente manifestarem desinteresse, ou se o processo, por sua natureza, não admitir a autocomposição (art. 334, § 4º, do CPC).
O § 5º do art. 334, por sua vez, prescreve o momento de manifestação de desinteresse na audiência: pelo autor, na petição inicial, ou pelo réu, mediante petição nos autos com ao menos 10 (dez) dias de antecedência da data da audiência.
Segundo o art. 334, § 6º, do CPC, no caso de litisconsórcio, o desinteresse pela audiência deverá ser manifestado por todos os litisconsortes; segundo a doutrina, essa previsão abrange qualquer espécie de litisconsórcio previsto na legislação processual civil.
No ponto, vislumbramos um conflito normativo entre o atual CPC e a Lei de Mediação, pois esta última, no seu art. 27, prescreve que: “se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de mediação”.
Temos, assim, o seguinte questionamento: é obrigatória a realização da audiência de conciliação ou mediação mesmo que o autor opte pela sua não realização e/ou as partes manifestarem expressamente desinteresse na composição consensual (conflito entre os arts. 319, VII e 334, § 4º, I, e §§ 5º e 6º, do novo CPC)?
Segundo o nosso entendimento, prevalece a Lei de Mediação, logo, a audiência inaugural de mediação será obrigatória se a petição inicial preencher os requisitos iniciais e não for caso de improcedência liminar do pedido.
Prosseguindo, vemos que, segundo prescreve o § 7º do art. 334 do CPC, a audiência poderá se dar por meio eletrônico, nos termos da lei; em complemento, ressaltamos, na espécie, que o art. 46 da Lei de Mediação admite a realização da audiência pela internet ou outro meio eletrônico de comunicação equivalente.
Temos ainda que o não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência de conciliação será considerado ato atentatório à dignidade da justiça, sancionado com multa de até 2% do valor da causa ou da vantagem econômica objetivada, revertida em favor da União ou do Estado (art. 334, § 8º, do CPC).
Entretanto, embora o comparecimento à audiência seja obrigatório, ninguém é obrigado a permanecer no procedimento de mediação (art. 2º, § 2º, da Lei de Mediação).
Segundo o § 9º do art. 334 do CPC, as partes devem estar obrigatoriamente acompanhadas por advogado ou defensor público na audiência de conciliação/mediação.
Todavia, no caso da mediação judicial, a Lei de Mediação não obriga a presença de advogado ou defensor nos Juizados Especiais (Leis 9.099/1995 e 10.259/2001); já no caso de mediação extrajudicial, a Lei de Mediação faculta a presença de advogado ou defensor (conforme o seu art. 10).
Reza o § 10 do art. 334 do CPC que a parte poderá constituir procurador para a audiência, sempre com poderes específicos, podendo negociar ou transigir; e o § 11 do mesmo dispositivo prevê que a autocomposição será reduzida a termo e homologada por sentença (é título executivo judicial).
Já a lei de mediação não obriga a homologação do título pelo juiz, mas, nesse caso, o título executivo será extrajudicial (art. 20, parágrafo único, da Lei 13.140/2015).
O art. 29 da Lei de Mediação estabelece que: “solucionado o conflito pela mediação antes da citação do réu, não serão devidas custas judiciais finais”.
Por fim, o art. 334, § 12º, do CPC, prevê a organização pelos Tribunais de pauta das audiências com intervalo mínimo de 20 (vinte) minutos entre o início de uma e o início da seguinte.
5. Conclusão
O Código de Processo Civil atual preconiza e privilegia a solução consensual dos conflitos, prevendo, a todo momento, a utilização da conciliação e da mediação, em atendimento aos princípios constitucionais da eficiência e da celeridade.
Na conciliação, há a solução do conflito por autocomposição, mediante atuação de conciliador, sendo que, em geral, não há vínculo anterior entre as partes e o conciliador apresenta propostas e sugere soluções, analisando aspectos objetivos do conflito.
Na mediação, também há a solução do conflito por autocomposição, porém, mediante a atuação do mediador, havendo, em geral, vínculo anterior entre as partes. O mediador analisa aspectos subjetivos no conflito e estimula as partes a elas próprias encontrarem a melhor solução. O acordo gera título executivo extrajudicial, sendo necessária a homologação do juiz para transformar o título em judicial.
Na arbitragem, por seu turno, ocorre a solução do conflito por heterocomposição e a decisão do litígio é atribuída pelas partes a pessoa neutra e imparcial, chamada árbitro, havendo título executivo judicial, que independe de homologação judicial.
O estudo da conciliação e da mediação não pode ser feito isoladamente, uma vez que há um verdadeiro microssistema jurídico envolvido, composto pela Resolução 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça, pela Lei de Mediação e pelo atual Código de Processo Civil. Frise-se que, no caso de conflito entre o Código de Processo Civil e a Lei de Mediação, prevalece esta última, por ser norma posterior e especial.
A audiência de conciliação e mediação tem previsão no art. 334 do Código de Processo Civil, sendo obrigatória a realização mesmo que o autor opte pela sua não realização e/ou as partes manifestarem expressamente desinteresse na composição consensual, visto que, nesse ponto, prevalece a Lei de Mediação. Logo, a audiência inaugural de mediação será obrigatória se a petição inicial preencher os requisitos iniciais e não for caso de improcedência liminar do pedido.
6. Referências
BARBOSA DA SILVEIRA, Artur. Inovações no Processo Civil Brasileiro: Comentários Tópicos ao Novo Código de Processo Civil. Editora Juruá. 3º Edição. Curitiba: 2017.
BRASIL. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Resolução Nº 125, de 29/11/2010. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=2579. Acesso em 11/04/2017.
BRASIL. LEI Nº 13.140, DE 26 DE JUNHO DE 2015 (Lei de Mediação). Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/Lei/L13140.htm. Acesso em 12/04/2017.
BRASIL. Novo Código de Processo Civil. Lei 13.105, de 16.03.2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm>. Acesso em: 13.4.2017.
PROCURADOR DO ESTADO DE SÃO PAULO (PGE/SP). JUIZ TITULAR DO TRIBUNAL DE IMPOSTOS E TAXAS DE SÃO PAULO. EX-ADVOGADO DA UNIÃO. EX-ASSESSOR DE MINISTRO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PÓS GRADUADO EM DIREITO PÚBLICO, DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO TRIBUTÁRIO. PALESTRANTE DA OAB/SP. AUTOR DE LIVROS E DE ARTIGOS JURÍDICOS.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVEIRA, Artur Barbosa da. Da conciliação e da mediação no atual Código de Processo Civil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 maio 2017, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/50056/da-conciliacao-e-da-mediacao-no-atual-codigo-de-processo-civil. Acesso em: 06 nov 2024.
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