Resumo: O presente artigo pretende analisar a constitucionalidade do novel artigo celetista que trata da tarifação do dano moral individual nas relações de emprego, inserido pela reforma trabalhista (Lei n. 13. 647/17), partindo da evolução da reparação dos danos morais no Direito Brasileiro, analisando sua caracterização e seu conceito.
Palavras-chaves: danos morais; relações de emprego; tarifação dos danos morais; reforma trabalhista.
Sumário: 1. Introdução. 2. Evolução da reparação dos danos morais no Direito Brasileiro. 3. Caracterização e conceito de danos morais. 4. Danos morais nas relações de emprego e a reforma trabalhista. 5. Conclusão. 6. Referências bibliográficas
1 Introdução
A dignidade é valor inerente à espécie humana e deve ser considerada na defesa e salvaguarda da pessoa. Condições de trabalho ofensivas a dignidade do trabalhador como pessoa humana, hábeis a gerar sofrimento íntimo com repercussão em direitos de personalidade, pela ofensa, por exemplo, à honra, à intimidade e à imagem, podem acarretar danos morais, com amparo nos arts. 5º, V e X, da CRFB, bem como arts. 186, 187 e 927 do CC.
A reforma trabalhista (Lei n. 13. 647/17) promoveu alterações na CLT (art. 223-A a 223-G), distinguindo a aplicação do instituto civilista do dano moral em relação aos trabalhadores.
É preciso analisar se referidas alterações estão em consonância com ordenamento jurídico pátrio.
2 Evolução da reparação dos danos morais no Direito Brasileiro
No Brasil Colônia, época da vigência das ordenações do Reino de Portugal, inexistiam regras acerca da reparação do dano moral. Os primeiros sinais legislativos referentes à questão ocorreram com o Código Civil de 1916, o qual, no art. 159, dispunha: “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.”
A generalização do dispositivo com a abordagem do vocábulo “prejuízo” pode ser significativa da não limitação da tutela a danos de natureza material, englobando também os estritamente morais.
Ainda segundo o Código Civil de 1916, art. 76, “o interesse moral quando afeta diretamente o autor ou a sua família é requisito suficiente para motivar a propositura da ação de dano moral”.
Todavia, a ausência de expressa disposição normativa que dispusesse sobre a natureza jurídica do dano impediu a consolidação do instituto no âmbito jurídico brasileiro. A doutrina insistentemente afirmou que o art. 76 se tratava de uma regra meramente processual e, portanto, insuficiente para a consolidação da reparação do dano moral.
Com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988, os direitos da personalidade foram elevados ao status de Direitos e Garantias Fundamentais e o dano moral e sua reparação definitivamente consagrados no direito positivo brasileiro:
A Constituição de 1988 veio por uma pá de cal na resistência à reparação do dano moral. (...) Destarte, o argumento baseado na ausência de um princípio geral desaparece. E assim, a reparação do dano moral integra-se definitivamente em nosso direito positivo. (...) Com as duas disposições contidas na Constituição de 1988 o princípio da reparação do dano moral encontrou o batismo que a inseriu em a canonicidade de nosso direito positivo. Agora, pela palavra mais firme e mais alta da norma constitucional, tornou-se princípio de natureza cogente o que estabelece a reparação por dano moral em nosso direito. Obrigatório para o legislador e para o juiz (PEREIRA et al., 2004, p. 58).
O Código Civil Brasileiro de 2002 reconheceu o dano moral e a sua reparação, consagrando o princípio neminem laedere (a ninguém é dado causar prejuízo a outrem, mesmo que somente moral), base fundamental da responsabilidade civil.
De acordo com o artigo 186 do CC/02, “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito” (grifo nosso). E a possibilidade de se reparar o prejuízo no art. 927, caput: “aquele que, por ato ilícito causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”.
Portanto, para a responsabilização civil é necessária a existência da conduta antijurídica, do dano e do nexo causal associando-os.
Para a teoria clássica da responsabilidade civilista, o elemento subjetivo, a culpa, caracteriza a conduta antijurídica e é o seu principal pressuposto. Porém, atualmente, em determinados casos, reconhece-se a aplicação da responsabilidade objetiva, alicerçada na mesma estruturação dogmática da responsabilidade subjetiva, diferenciando-se desta apenas pela ausência do elemento culpa. Exemplo disso é a responsabilidade civil por dano ao meio ambiente, preconizada no artigo 14, parágrafo 1º, da Lei 6.938/1981, e na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (art. 225, parágrafo 3º), considerada como “Constituição verde” (MILARÉ, 2007, p. 147).
O nexo causal, por sua vez, consiste na respectiva relação de causa e efeito, visando a precisar se o dano é ou não decorrente da conduta. Dano que pode ser compreendido como lesão a um bem jurídico material ou imaterial, patrimonial ou não.
O dano, pressuposto da responsabilidade civil clássica, é, portanto, uma lesão a um bem jurídico que acarreta num prejuízo ao lesado, uma diminuição do seu patrimônio. Tendo em vista que bem jurídico é tudo o que pode ser objeto de relação jurídica, o patrimônio pessoal deve ser analisado não somente em seu aspecto material, mas também em seu aspecto moral.
Registra-se que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) sedimentou a controvérsia do acúmulo do dano moral com o dano material por meio da edição da Súmula 37.
3 Caracterização e conceito de danos morais
Diante das mudanças da sociedade, o ordenamento jurídico evolui ao longo dos tempos e o instituto do dano moral não permanece incólume a tais mudanças, as quais foram antecedidas, acompanhadas ou mesmo sucedidas por alterações dos posicionamentos dos doutrinadores.
Não obstante serem, muitas vezes, os posicionamentos concomitantes no tempo frente às cizânias sobre o tema, eles guardam, de certo modo, relação de continuidade, ou mesmo evolução, pois é comum se conferir maior amplitude à caracterização e ao conceito de determinado instituto jurídico, o que pode ser observado com o dano moral.
Costa (2009, p. 47-48) aponta quatro correntes nesse teor.
De acordo com a primeira, o dano moral corresponderia a toda repercussão despida de caráter patrimonial, ou seja, “tudo aquilo que está fora da esfera material”, conforme Nunes (1999, p. 01).
Para uma segunda visão, o dano moral estaria associado à dor e à opressão à alma do lesado, compreendendo os sofrimentos físicos e os morais propriamente ditos como elementos característicos do dano.
Diferentemente, num terceiro aspecto, o dano estaria inserido na esfera da subjetividade como uma violação aos bens jurídicos integrantes da personalidade, a exemplo da integridade física, moral e psíquica, da imagem, da honra, da vida, implicando sentimentos que afetam a vítima psicologicamente e em suas relações com a sociedade, ou seja, em seu patrimônio moral.
Nessa visão, o dano moral associa-se, pois, aos direitos inerentes “à pessoa humana tomada em si mesma e em suas projeções na sociedade”, cuja proteção e reconhecimento encontram-se no ordenamento jurídico, em direitos subjetivos favoráveis aos beneficiários: os direitos da personalidade. Estes implicam desfrute dos bens protegidos juridicamente, como a vida, a higidez física, a intimidade, a honra e a intelectualidade (NUNES, 1999, p. 01), e dever de respeito a eles (RÍO, 1996, p. 206).
Normas contrárias aos valores que fundamentam a pessoa e, consequentemente, a personalidade, atentam contra a própria pessoa humana.
Para Diniz (1982, p. 81), “A personalidade não é exatamente um direito, é um conceito básico sobre o qual se apoiam os direitos”, cujo conteúdo econômico é indireto e mediato. A personalidade, por conseguinte, não é um direito e sim um pressuposto dos direitos, ou seja, “dela irradiam-se direitos” (PEREIRA et al., 2004, p. 237).
Vislumbra-se, portanto, que, para esta terceira corrente, o dano moral associa-se à lesão aos direitos da personalidade.
Costa (2009, p. 48) esclarece, entretanto, que, ainda que tal interpretação mostre-se parcialmente correta, ela não pode ser sustentada. Isso ocorre porque não abarca os casos de lesões que ultrapassam a esfera do indivíduo e atingem o âmbito coletivo.
Assim, no presente momento histórico, de reconhecimento dos direitos coletivos, uma quarta propositura - vinculativa do dano moral à dignidade da pessoa humana -, deve preponderar na visão do autor (COSTA, 2009, p. 48). Tal proposta vincula-se diretamente à noção de dignidade da pessoa humana.
De acordo com Cavalieri (2005, p. 94), “foi justamente por considerar a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem corolário do direito à dignidade que a Constituição inseriu em seu art. 5º, V e X, a plena reparação do dano moral”.
Para mencionado autor, a análise do dano moral à luz da Constituição brasileira revela que o dano moral é a violação do direito à dignidade da pessoa humana, princípio fundamental da República Federativa do Brasil (art. 1º, III).
A dignidade da pessoa humana é um valor absoluto e critério integrador e unificador do sistema de direitos fundamentais a serviço da personalidade que encontra proteção e reconhecimento no mundo jurídico, especialmente por meio da constitucionalização:
De la dignidad humana se deduce la existência de um derecho al libre desenvovimiento de la personalidad, que sua vez há de considerarse como la matriz generadora de los derechos de la personalidad. Éstos son derechos del actuar de la persona, que, (...), merecen y obtienen (en mayor o menor medida, y prescindiendo ahora de su eficacia real) reconocimiento y protección del mundo jurídico, en particular a través de su constitucionalización (MARTÍNEZ , 2006, p. 187).
A dignidade da pessoa humana é impõe um dever de respeito e intocabilidade que abrange, inclusive, o Poder Público.
A dignidade é valor inerente à espécie humana e deve ser considerada na defesa e salvaguarda da pessoa, tomada não somente em sua individualidade, mas também em sua universalidade, compreendidas a presente e as futuras gerações.
À clássica visão kantiana ontológica de dignidade da pessoa, substanciada na natureza racional do ser humano, mais especificamente, em sua capacidade de autodeterminação, soma-se a dimensão coletiva referendada pela obrigação geral de respeito ao gênero humano e à coexistência entre os homens, que encontra respaldo no ordenamento jurídico pátrio.
Isso se deve, em primeiro lugar, pelo reconhecimento dos direitos e interesses coletivos lato sensu, compreendendo os difusos, os coletivos em sentido estrito e os individuais homogêneos, consoante art. 81 da Lei n. 8.078/1990.
E, em segundo plano, pela ratificação do programa de solidarismo esculpido na Constituição da República Federativa do Brasil no art. 3º, incisos I e III, os quais dispõem como objetivos da República: a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, e a erradicação da pobreza e da marginalização social e a redução das desigualdades sociais e regionais (COSTA, 2009, p. 26-33).
A perspectiva coletiva da dignidade da pessoa humana corrobora a concepção de dano moral desvinculada da aferição subjetivista da dor, do sofrimento e da emoção, aspectos eventuais da lesão, o que é ainda mais reforçado pela pacífica admissão do dano moral à pessoa jurídica, conforme art. 52 do Código Civil/2002 e Súmula 227 do Superior Tribunal de Justiça (COSTA, 2009, p. 34-35).
O reconhecimento da aplicabilidade dos direitos da personalidade para as pessoas jurídicas, quando pertinente (art. 52 do CC/02), implicou a admissão da tutela da honra objetiva e, por outro lado, significou a possibilidade de um ente criado por lei ser vítima de dano moral, uma vez que dotado da titularidade de direitos imateriais, dos quais são expressão o nome e a reputação.
4 Danos morais nas relações de emprego e a reforma trabalhista
O dano moral individual é aquele que atinge a honra, a dignidade, a intimidade, a imagem, a reputação da pessoa do trabalhador, sendo decorrente de ato abusivo ou ilícito do empregador, no âmbito da relação empregatícia, tendo como pressupostos a dor moral, a angústia, a humilhação, o constrangimento, entre outros fatores.
Assim, o dano moral configura-se diante de condições de trabalho ofensivas a dignidade do trabalhador como pessoa humana, a ponto de gerar sofrimento íntimo com repercussão em seus direitos de personalidade, pela ofensa à honra, à intimidade e à imagem, de forma a autorizar a reparação por danos morais, com amparo nos arts. 5º, V e X, da CRFB, bem como arts. 186, 187 e 927 do CC.
A Emenda Constitucional 45/2004 atribuiu à Justiça do Trabalho a competência para o julgamento das ações de compensação de danos morais decorrentes da relação de trabalho.
A reforma trabalhista (Lei n. 13. 647/17) promoveu alterações na CLT (art. 223-A a 223-G), distinguindo a aplicação do instituto civilista do dano moral em relação aos trabalhadores em comparação com os demais seres humanos, com significativas restrições da possibilidade e efetividade da busca pela reparação por danos morais.
Especificamente em relação à tarifação do dano moral, o art. 223-G da CLT dispõe que:
Art. 223-G. Ao apreciar o pedido, o juízo considerará: (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
I - a natureza do bem jurídico tutelado; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
II - a intensidade do sofrimento ou da humilhação; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
III - a possibilidade de superação física ou psicológica; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
IV - os reflexos pessoais e sociais da ação ou da omissão; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
V - a extensão e a duração dos efeitos da ofensa; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
VI - as condições em que ocorreu a ofensa ou o prejuízo moral; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
VII - o grau de dolo ou culpa; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
VIII - a ocorrência de retratação espontânea; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
IX - o esforço efetivo para minimizar a ofensa; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
X - o perdão, tácito ou expresso; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
XI - a situação social e econômica das partes envolvidas; (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
XII - o grau de publicidade da ofensa. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
§ 1º Ao julgar procedente o pedido, o juízo fixará a reparação a ser paga, a cada um dos ofendidos, em um dos seguintes parâmetros, vedada a acumulação: (Redação dada pela Medida Provisória nº 808, de 2017)
I - para ofensa de natureza leve - até três vezes o valor do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social; (Redação dada pela Medida Provisória nº 808, de 2017)
II - para ofensa de natureza média - até cinco vezes o valor do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social; (Redação dada pela Medida Provisória nº 808, de 2017)
III - para ofensa de natureza grave - até vinte vezes o valor do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social; ou (Redação dada pela Medida Provisória nº 808, de 2017)
IV - para ofensa de natureza gravíssima - até cinquenta vezes o valor do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. (Redação dada pela Medida Provisória nº 808, de 2017)
§ 2o Se o ofendido for pessoa jurídica, a indenização será fixada com observância dos mesmos parâmetros estabelecidos no § 1o deste artigo, mas em relação ao salário contratual do ofensor. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
§ 3º Na reincidência de quaisquer das partes, o juízo poderá elevar ao dobro o valor da indenização. (Redação dada pela Medida Provisória nº 808, de 2017)
§ 4º Para fins do disposto no § 3º, a reincidência ocorrerá se ofensa idêntica ocorrer no prazo de até dois anos, contado do trânsito em julgado da decisão condenatória. (Incluído pela Medida Provisória nº 808, de 2017)
§ 5º Os parâmetros estabelecidos no § 1º não se aplicam aos danos extrapatrimoniais decorrentes de morte. (Incluído pela Medida Provisória nº 808, de 2017)
Trata-se, assim, de uma desequiparação injusta em relação aos demais cidadãos, em razão da limitação do valor do dano moral considerando o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), conforme alteração promovida pela Medida Provisória 808/2017, a qual excepcionou ainda os parâmetros estabelecidos nos casos de danos extrapatrimoniais decorrentes de morte.
No que tange à tarifação do dano moral, verifica-se a inconstitucionalidade do art. 223-G da CLT, por violar o inciso V, que traz regra de proporcionalidade entre o dano e a lesão, bem como o inciso X, ambos do art. 5º, CF/88 e o princípio da reparação integral consagrado no art. 944 do CC, bem como o princípio da isonomia, consagrado no caput do art. 5º da CR/88 e, em consequência, a dignidade da pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1º, III, da CF/88).
Assim, é necessária uma leitura lógico-racional, sistemática e teleológica das alterações promovidas pela Reforma Trabalhista, em consonância com o ordenamento jurídico, pois a Constituição da República e o Código Civil não limitam a indenização por danos morais.
O princípio da reparação integral impõe a necessidade de individualização de cada caso concreto, de forma que qualquer tentativa prévia de delimitar valores pode acarretar, por conseguinte, em proteção insuficiente e afronta aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
Dessa forma, atenta-se contra a própria finalidade dos danos morais individuais, que possui natureza dupla - indenizatória (compensatória) e punitivo-pedagógica -, uma vez que não restitui, integralmente, o dano causado ao trabalhador.
A criação de distinção entre seres humanos, conferindo tratamentos distintos aos trabalhadores em comparação com os demais cidadãos é nítida violação ao princípio da isonomia (art. 5º, caput, da CR/88) e à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CR/88).
Nesse teor, o Supremo Tribunal Federal (STF) já se posicionou pela impossibilidade de tarifação do dano moral ao analisar a Lei n. 5.250/1967 (Lei de Imprensa) e a Lei n. 4.117/1962 (Lei de Telecomunicações), entendendo inconstitucionais os parâmetros adotados para quantificação dos danos morais, ao fundamento de que o art. 5º da CFRB/88, V e X, assegura a indenização por dano moral e por dano material, não sendo constitucional parâmetros fixados para apuração do valor, pois a indenização decorrente deve ser a mais ampla possível, sem sujeições a limites pré-estabelecidos.
Assim, como afirmado no voto do Ministro Ricardo Lewandowski, proferido no julgamento da ADPF 130/DF, examinada em 30/04/2009 pelo Tribunal Pleno, em que foi relator o Ministro Carlos Britto:
Esta Suprema Corte, no tocante à indenização por dano moral, de longa data, cristalizou jurisprudência no sentido de que o art. 52 e 56 da Lei de Imprensa não foram recepcionados pela Constituição, com o que afastou a possibilidade do estabelecimento de qualquer tarifação, confirmando, nesse aspecto, a Súmula 281 do Superior Tribunal de Justiça. Cito, nessa linha, dentre outras seguintes decisões: o RE 396.386-4/SP, Rel. Min. Carlos Velloso; RE 447.484/SP, Rel. Min. Cezar Peluso; RE 240.450/RJ, Rel. Min. Joaquim Barbosa; e AI 496.406/SP, Rel. Min. Celso de Mello.
No mesmo sentido, o Superior Tribunal de Justiça (STF) editou a Súmula 281, de acordo com a qual “indenização por dano moral não está sujeita à tarifação prevista na Lei de Imprensa”.
Dessa forma, as alterações promovidas pela Reforma significam um verdadeiro retrocesso social, em afronta ao princípio da implementação progressiva dos direitos sociais, conforme arts. 1º e 5, II, do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC), no art. 26 da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto San Jose da Costa Rica) e, na seara dos direitos trabalhistas, no art. 7º, caput, da Constituição da República.
Diante das alterações promovidas pela Reforma Trabalhista, é necessária uma interpretação lógico-racional, sistemática e teleológica do texto celetista em consonância com o ordenamento jurídico, especialmente em relação a Constituição da República e os Tratados Internacionais de Direitos Humanos, dotados de força, ao menos, supralegal, como reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 466.343/SP.
Os direitos fundamentais são fruto de um processo histórico de reconhecimento, de forma que as restrições aos direitos fundamentais não podem atingir o núcleo ineliminável desses direitos.
Portanto, a tarifação por danos morais nas relações de emprego não passa pelo crivo do controle de constitucionalidade e de convencionalidade, razão pela qual deve ser afastada sua aplicação, nos casos concreto, pelo intérprete do Direito.
5 Conclusão
As alterações promovidas pela Reforma Trabalhista são, em grande parte, inconstitucionais, pois criam situação jurídica diferenciada para os trabalhadores em detrimento de qualquer outro cidadão, como no caso da tarifação dos danos morais individuais nas relações de emprego, em violação aos arts. 1º, III, e 5º, caput, V e X, da CR/88, bem como ao art. 944 do CC.
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Analista Judiciária do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. Pós Graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Universidade Cândido Mendes.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: AMORMINO, Tatiana Costa de Figueiredo. Inconstitucionalidade da Tarifação do Dano Moral Promovida pela Reforma Trabalhista Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 jan 2018, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/51268/inconstitucionalidade-da-tarifacao-do-dano-moral-promovida-pela-reforma-trabalhista. Acesso em: 06 nov 2024.
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