Resumo: O presente artigo busca analisar criticamente as principais inovações no tocante às modalidades de interveção de terceiros no Novo Código de Processo Civil.
Abstract: This article aims to criticize, under a principled perspective, the main innovations third party intervention by of the new Brazilian Civil Procedure Code.
Palavras-chave: Direito Processual Civil. Intervenção de terceiros. Novo CPC. Assistência. Denunciação à lide. Chamamento ao processo. Amicus curiae. Incidente de desconsideração da personalidade jurídica.
Sumário: Introdução. 1. Noção de terceiro 2.Assistência 3.Denunciação à lide. 4.Chamamento ao processo 5. Amicus curiae. 6.Incidente de desconsideração da personalidade jurídica. Conclusão. Referências.
A interferência processual de terceiro se justifica, além da economia processual, pelo desígnio de criar meios de evitar reflexos do processo sobre relações mantidas por alguma das partes com quem não esteja figurando na relação processual.
Assim, pode-se defender um direito à intervenção legitimidado pelo interesse e reconhecido ao extraneus, consistente em evitar efeitos reflexos da sentença sobre relações interdependentes, ou seja, relações que, embora não deduzidas no processo, dependam do resultado favorável do litígio em prol de um dos litigantes.
O Novo Código de Processo Civil – lei 13.105/15, dedica o Título III do Código inteiramente à regulação das espécies de intervenção de terceiros .
A opção da novel legislação em organizar as modalidades interventivas em título diverso do reservados às Partes Processuais fez com que a disciplina ganhasse maior rigor científico e clareza procedimental.
Embora nem todas as alterações previstas na Exposição de Motivos ao Ante Projeto[1] tenham efetivamente prevalecido ( à exemplo da unificação da denunciação à lide e o chamamento ao processo), claramente, o novo CPC, orientado pelos princípios da celeridade, da economia processual e da busca por um menor formalismo, simplificou a sistemática de intervenção de terceiro.
Com isso, extinguiu-se a nomeação à autoria e a oposição ( que transmudou-se em procedimento especial), inclusive, em prol da necessária coerência e unidade da codificação. Por não serem mais formas de intervenção não serão abordadas nesse trabalho.
Serão analisadas as modalidades espontâneas, iniciando-se com assistência, em suas modalidades simples e qualificada, o chamamento ao processo e a denunciação à lide.
Por fim, serão tercidas considerações acerca das figuras da desconsideração da personalidade jurídica e do amicus curiae, inovações, que, embora já tivessem bastante aplicação prátrica, careciam de regulação específica, o que ocasionava, não raro, casuímos e dúvidas quanto a sua natureza jurídica e forma de utilização.
A parte no processo pode ser entendida como aquele que demanda ou aquele que é demandado. Assim o conceito de parte envovle diretamente a relação jurídica estabelecida no bojo do processo, sendo o terceiro um extranho à essa relação.
Nesse sentido são as lições de Humberto Theodoro Junior[2]:
“Pode-se, portanto, distinguir dois conceitos de parte: como sujeito da lide, tem-se a parte em sentido material, e como sujeito do processo, a parte em sentido processual. Como nem sempre o sujeito da lide se identifica com o que promove o processo, como se dá, por exemplo, nos casos de substituição processual, pode-se definir a parte para o direito processual como a pessoa que pede ou perante a qual se pede, em nome próprio, a tutela jurisdicional.
A que invoca a tutela jurídica do Estado e toma a posição ativa de instaurar a relação processual recebe a denominação de autor. A que fica na posição passiva e se sujeita à relação processual instaurada pelo autor, chama-se réu ou demandado. Mas, para que o processo se desenvolva até a efetiva solução da lide, não basta a presença das duas partes interessadas, é necessário que os sujeitos processuais sejam partes legítimas.
Por outro lado, uma vez que não apenas autor e réu intervêm no contraditório, que constitui a essência da atividade processual à procura do provimento jurisdicional, é preciso buscar um conceito de parte processual de tal dimensão que possa abranger também os terceiros intervenientes, os quais, sem dúvida, exercem direitos processuais e se sujeitam a ônus e deveres no âmbito da relação dialética do processo.”
Aquele que intervém no processo de outrém, portanto, não é parte da relação jurídica processual, sua posição é de terceiro que tenta apenas auxiliar uma das partes a obter vitória processual.
O terceiro não objetiva com sua intervenção a tutela de direito próprio, mas de outrem, embora tenha um interesse próprio a proteger, ainda que indiretamente.
Por isso, não obstante se possa atribuir ao interveniente a qualidade de parte, no sentido puramente processual, o litígio pendente não será de sua titularidade, não lhe sendo facultado a alterar o objeto da demanda.
2. ASSISTÊNCIA
No novo Código de Processo Civil- Lei 13.105/15, a Assistência abre o capítulo das intervenções de terceiros. Trata-se de mudança (arts. 56 a 80 do CPC73) que veio a atender os reclames da doutrina e jurisprudência que não divergiam sobre a natureza jurídica do instituto como uma forma de intervenção, mesmo quando o assistente fosse considerado litisconsorte.
O assistente ingressa de ingressa espontaneamente em lide alheia para auxiliar uma das partes. O requisito autorizador da assistência é a demonstração de interesse jurídico, ou seja, pressupõe um vínculo jurídico entre uma das partes e o assistente, não se admitido o interesse moral econômico ou de qualquer outra natureza:
“Dessa forma, somente será admitido como assistente o terceiro que demonstrar estar sujeito a ser afetado juridicamente pela decisão a ser proferida em processo do qual não participa, sendo irrelevante a justificativa no sentido de que sofrerá eventual prejuízo de ordem econômica ou de qualquer outra natureza. A natureza desse interesse jurídico varia conforme a natureza da assistência – simples ou litisconsorcial –, sendo analisada em outro momento.”[3].
Todavia, Humberto Theodoro Junior[4] defende que as partes podem negociar quanto a admissão de assistência sem a demonstração do interesse jurídico com fundamento na maior amplitude dos negócios jurídicos processuais (art. 190):
“Em razão, pois, dessas regras, é possível que o juiz admita a intervenção de sujeitos, mesmo sem a comprovação do interesse como necessária para a assistência, se houver concordância das partes, concretizando “a ideia de participação democrática no processo civil”. É a denominada intervenção atípica ou negociada.
Nada impede, outrossim, que as partes disciplinem de forma diversa uma intervenção típica. Isto é, as partes podem prever formas diferenciadas de atuação do assistente simples (assistência atípica), a fim de conformar o processo às especificidades do caso concreto. Assim, os sujeitos da lide poderiam negociar a manifestação do assistente sobre atos anteriores ao seu ingresso; a ampliação ou restrição de seus poderes etc.”
Outro requisito, diz respeito à sorte que uma das partes terá na sentença tem consequências ou reflexos sobre outras relações jurídicas existentes entre a esta e o terceiro, por isso há interesse em que a solução seja no sentido que favoreça a posição jurídica da parte assistida, embora a relação parte-terceiro não sejam objeto de discussão no processo.
O cabimento da intervenção está disciplinado no CPC: “A assistência será admitida em qualquer procedimento e em todos os graus de jurisdição, recebendo o assistente o processo no estado em que se encontre” (art. 119, parágrafo único).
O limite temporal para o ingresso do assistente é a formação da coisa julgada.
Nas lições de Humberto Theodoro Júnior[5]:
“No processo de conhecimento, qualquer tipo de procedimento admite a assistência. Mas, no processo de execução propriamente dito, não há lugar para a assistência, porque a execução forçada não se destina a uma sentença, mas apenas à realização material do direito do credor. Assim, não haveria, na realidade, como coadjuvar a parte a obter sentença favorável (art. 119).
Quando, porém, a execução for embargada, pelo devedor ou por terceiro, aí, sim, será admissível a assistência, porque os embargos são ação incidental de cognição, que se desenvolve em busca de uma sentença.”
O procedimento da assistência vem disciplinado no art. 120 do CPC. A intervenção depende de pedido expresso do assistente (por isso, é modalidade de intervenção espontânea[6] – art. 119 do CPC) e, sobre o qual as partes se manifestaram no prazo de 15 dias, podendo impugnar, apenas, a falta de interesse jurídico do terceiro.
Havendo impugnação ocorre a formação de procedimento incidental que não suspender o andamento do processo principal. Diversamente do que previa o CPC73 que ordenava a formação de autos apartado que deveriam ser apensados aos principais, o que não foi repetido pelo novel diploma.
O incidente será provocado e decidido nos próprios autos da causa principal, sendo ainda franqueada a realização de provas necessárias ao julgamento. A decisão sobre este incidente configura decisão interlocutória, desafiando recurso de agravo de instrumento (CPC, art. 1.015, IX).
A classificação doutrinária mais hodierna da literatura jurídica é a divisão entre assistência simples e litisconsorcial:
“Na assistência sirnples, o terceiro ingressa no feito afirmando-se titular de relação jurídica conexa àquela que está sendo discutida. O interesse jurídico do terceiro reflete-se na circunstância de manter este, com o assistido, relação jurídica que poderá ser afetada a depender cio julgamento da causa.
(...)
A assistência litisconsorcial cabe quando o terceiro alegar a existência de um interesse jurídico imediato na causa. Diz-se que há esse tipo de interesse jurídico quando a decisão puder afetar relação jurídica de que seja o terceiro, também ou só ele, titular. Mantém, o terceiro, relação jurídica com a parte adversária daquela a quem pretende ajudar.[7]”
Na assistência simples os efeitos da decisão do processo são apenas indiretos ou reflexos sobre o direito do assistente, pois a relação material invocada pelo interveniente não será objeto de julgamento, por não integrar o objeto litigioso.
Quando, porém, o assistente defende diretamente direito próprio contra uma das partes (I- relação jurídica entre o interveniente e o adversário do assistido), devido à incidência imediata dos efeitos da decisão no direito próprio do terceiro (II- a relação (I) há de ser atingida pela sentença), tem-se a assistência litisconsorcial. O interveniente passa a ser litisconsorte (parte) e não mais de mero assistente (art. 124).
Assim, pode-se concluir que: o pressuposto da assistência litisconsorcial, via de regra, é a ocorrência da substituição processual[8], posto que se dá um litisconsórcio facultativo unitário, porquanto a relação jurídica material em disputa é una e incindível entre os vários titulares reunidos no polo do processo em que se inseriu incidentalmente o terceiro.[9]
A principal diferença entre o assistente coadjuvante (art. 119, NCP) e o litisconsorte (art. 124, NCPC,) sem olvidar que ambos gozam dos mesmos poderes processuais (art.121 do CPC), é que aquele não pode se comportar diversamente da posição do assistido, já o assistente litisconsorcial pode fazê-lo.
Devido à intervenção no processo, o assistente estará sujeito aos ônus ou encargos a que for condenado o assistido (art. 94).
Como a participação do assistente simples é acessória deve se coadunar com a do assistido, que é a principal, assim, a assistência não impede que as partes do litígio realizem autocomposição sobre o objeto da lide (art.121 e 122 do CPC)
Em relação à assistência litisconsorcial (art. 124), é lícito ao litisconsorte prosseguir na defesa de seu direito, ainda que haja transação com o outro litigante.
Quaisquer das formas de assistência está impedida de fazer pedido novo, pois recebe o processo nos limites objetivos da demanda propostos pela parte assistida, em virtude do Princípio da estabilização da demanda (art.329 do CPC).
No que tange a faculdade recursal, tanto o assistente simples quanto o litisconsorcial podem recorrer ainda que a parte principal não o faça. O Novo CPC solucionou a divergência teórica, albergando o entendimento jurisprudencial do STJ[10] no sentido de que, “segundo o entendimento mais condizente com o instituto da assistência simples, a legitimidade para recorrer do assistente não esbarra na inexistência de proposição recursal da parte assistida, mas na vontade contrária e expressa dessa no tocante ao direito de permitir a continuidade da relação processual”.
A relação da coisa julgada em face do assistente tem efeitos diversos a depender da modalidade dessa intervenção. Sendo ela litisconsorcial, por estar o assistente ligado à relação material discutida, há igual sujeição aos efeitos da decisão imutável, do mesmo modo que os litigantes.
O assistente simples, porém, fica sujeito “a justiça da decisão” (art. 123, caput). Significa dizer, que o Código lhe impõe uma restrição: vedação de rediscutir, em outros processos, os fundamentos da decisão (questões de fato que influíram na sentença). Mas há duas exceções que autorizam essa rediscussão fática: (a) pelo estado em que recebera o processo, ou pelas declarações e atos do assistido, foi impedido de produzir provas suscetíveis de influir na sentença (inciso I); (b) desconhecia a existência de alegações ou de provas das quais o assistido, por dolo ou culpa, não se valeu (inciso II).
3. DENUNCIAÇÃO À LIDE.
Um dos institutos que mais sofreu alterações no novo CPC foi a denunciação da lide. À guisa de exemplo: supressão de uma das circunstâncias de cabimento; facultatividade da denunciação; a inserção de uma claúsula geral de cabimento, dentre outras que serão melhor abordadas adiante.
A denunciação da lide é modo interventivo que chama o terceiro (denunciado), o qual possui vínculo de direito com a parte principal do processo (denunciante), afim de que responda pela garantia do negócio jurídico, se o denunciante for vencido no processo. O que resulta em uma “sentença formalmente una e materialmente dupla[11] (em uma única decisão o juiz resolve duas relações jurídicas distintas: (i) uma, entre o denunciante e a parte contrária; e (ii) a outra, entre aquele e o denunciado.”)
Segundo ASSUMPÇÃO[12] a denunciação é demanda incidente, regressiva, eventual e antecipada.
Nesse sentido, CÂMARA[13]:
“A denunciação da lide, modalidade de intervenção forçada de terceiro, pode ser provocada por qualquer das partes da demanda, e é admissível nos casos previstos no art. 125. Através da denunciação da lide, ajuíza-se uma demanda regressiva condicional, destinada a permitir que o denunciante exerça, perante o denunciado, no mesmo processo, um direito de regresso que tenha na eventualidade de vir a sucumbir na demanda principal.”
Na verdade, a denunciação promove um cúmulo de duas ações, pois faz surgir uma ação secundária e conexa entre denunciante e denunciado, que impõe julgamento simultâneo com a ação principal.
Importa ressaltar que não é mais legítima, ao contrário do anterior diploma, denunciações sucessivas ou em cascata. O interessado em exercer o direito regressivo em face do não imediatamente responsável, agora, deverá fazê-lo em ação autônoma[14].
Segundo o art. 125 do CPC[15], são hipóteses que autorizam[16] a denunciação a existência: de garantia da evicção (inciso I)- a convocação do alienante imediato ocorre para que o denunciante garanta, em face ao denunciado, o exercício dos direitos caso haja evicção, nos termos dos arts. 447 a 457 do Código Civil. Outra situação é o direito regressivo de indenização (inciso II) – que se refere àquele que estiver obrigado, por lei ou pelo contrato, a indenizar, em ação regressiva, o prejuízo do sucumbente.
Para ASSUMPÇÃO[17], o art. 125, II, do CPC dissipou antiga querela doutrinária e jurisprudencial sobre a interpretação restritiva do cabimento da denunciação em relação ao direito de regresso, prevalecendo uma concepção ampliativa que não distingue a garantia própria ou imprópria, abrangendo qualquer situação de direito regressivo: indenização, reembolso, sub-rogação, garantia, entre outras.
Com a adoção ampliativa de cabimento estaria então pacificada a possibilidade de denunciação da lide à seguradora, todavia Humberto Theodooro Junior[18] tem posição diversa na qual sustenta ser o caso, na hipótese, de chamamento ao processo.
Questão que não foi esclareida pelo Código, e ainda se apresenta tormentosa na doutrina, diz respeito a possibilidade de denunciação da lide pela Administração Pública ao funcionário público (sentido lato) que causou o dano. Há bons fundamentos para posições contra e a favor. Todavia, devido ao crescente número de vozes que sustentam a consagração de um cabimento ampliativo da denunciação (art.125, II, do CPC), com a possibilidade dde inserção de fundamento novo à lide, a tendência será de predominar a corrente favorável[19].
O Novo Código colocou uma pá de terra na discurssão, existente ao tempo do Código anterior (art.70), acerca da obrigatoriedade da denunciação da lide. O interesse nessa discurssão permannece apenas no âmbito histórico acadêmico, já que o atual Código de Processo, na esteira do entendimento dominante, retirou a obrigatoriedade da denunciação da lide, em todos os casos de sua aplicação, ao dispor, no caput do art. 125, ser ela apenas “admissível” não deixa qualquer dúvida acerca da facultatividade da denunciação. Inclusive, o art. 456 do CC foi revogado plo art. 1.072, II, do CPC, extirpando o argumento de direito material que justificava a obrigatoriedade da intervenção, conferindo coerência ao ordenamento jurídico.
Quanto ao procedimento[20] para a denunciação, se feita pelo autor, confunde-se com o início da demanda, já que a denunciação estará contida na incial , sendo pedida a citação do denunciado, juntamente com a do réu, resultando em um litisconsórcio eventual inicial entre o réu e o denunciado. O juiz dará prazo de resposta ao denunciado, que será de quinze dias (art. 335, caput). Importa lembrar que o denunciado deve ser citado antes do réu para ter oportunidade de assumir a posição de litisconsorte do autor.
O réu deverá fazer a denunciação da lide na própria contestação (art. 126). O denunciado será citado e terá o mesmo prazo de resposta já referido na denunciação feita pelo autor. Pode o denunciado assumir a postura de litisconsorte do denunciante; ser revel ou comparecer e confessar os fatos alegados pelo autor na inicial (art.128 do CPC).
A sentença que julgar a lide irá solucionar duas demandas, se o réu sucumbir o resultado do incidente irá sujeitar o denunciado aos efeitos da sentença da causa (art.129 do CPC). Mas se o denunciante sagrar-se vencedor na demanda principal, a denunciação restará prejudicada e não será analisada no mérito.
Na legislação anterior questionava-se sobre ser possível a condenação direta do denunciado, como autêntico litisconsorte. No regime do Código de Processo Civil novo, isso se tornou não só possível nos casos de seguro de responsabilidade civil- já albergados pela jurisprudência do STJ, mas também em todas as hipóteses em que a nova lei qualifica o denunciado como litisconsorte do denunciante (arts. 127 e 128).
O instituto não teve alterações substanciais[21], mas apenas de técnica legislativa com melhoras no aspecto redacional.
Dá leitura do art. 132 do CPC, percebe-se que o Chamamento ao processo é uma modalidade de intervenção provocada pelo réu, mas facultativa, que visa trazer ao processo os coobrigados pela dívida, de modo a fazê-los também responsáveis pelo resultado do feito.
Desse modo, a sentença irá condenar o réu e os chamados solidariamente, sendo que aquele que pagar a dívida toda poderá executar Com essa providência, o condenado que pagar dispõe de um título executivo em face dos demais coobrigado, podendo cobrar deles aquilo que pagar, inclusive nos mesmos autos[22].
É cabível nas hipóteses do art. 130 do CPC que podem ser resumidas aos casos de coobrigados que, pelo direito material, tenham um nexo obrigacional com o autor.
Conforme ensina THEODORO JUNIOR[23], tal intervenção é cabível, em qualquer espécie de procedimento, no processo de cognição, todavia não pode ser manejada na fase ou processo executivo, pois não existiria propriamente uma sentença condenatória a que refere o art. 132 do CPC, além do que poderia também ser sustentado a falta de interesse de agir, visto que existe regra especial em relação ao sub-rogado, legal ou convencional, (CPC, art. 778, § 1º, IV).
O réu deve chamar o coobrigado no bojo da contestação (art. 131), o qual estará sujeito aos efeito da sentença condenatória, independentemente da sua anunência, mesmo porque, embora seja facultativa, não cabe ao juiz negar a pretensão de chamamento.
Resolvendo grande celeuma doutrinária, o Novo CPC traz o amiscus curiea como uma das modalidades de intervenção de terceiros (art. 138 do CPC), albergando o papel que a jurisprudência havia designado de colaborador do juízo.
Assim, não há que se falar propriamente parte no processo (no sentido técnico de sujeito da lide objeto do processo), sua participação é, meramente opinativa a respeito da matéria objeto da demanda, a fim de aprimorar a tutela jurisdicional, por isso não implica em deslocamento de competência (art. 138, § 1º, primeira parte).
Não obstante a codificação do instituto, a sua natureza jurídica ainda permanece controvertida[24]: para uns é terceiro e para outros é um colaborador do juízo.
O cabimento da intervenção pode dar-se por iniciativa do juiz, de ofício ou a requerimento das partes ou do próprio amigo do tribunal. Somente será deferida se houver demonstração de pelo menos um dos requsitos referentes: a relevância da matéria discutida nos autos; especificidade do tema objeto da demanda; ou repercussão social. O que pode se dar, inclusive, no primeiro grau de jurisdição, posição que já era defendida pela doutrina.
Mas o magistrado é livre para decidir acerca da conveniência ou não da intervenção do amicus curiae, de modo que sua manifestação será por meio de decisão irrecorrível (NCPC, art. 138, caput).
Adotando o entendimento mais amplo do que a jurisprudência do STF, o novo Código traz como legitimidade para o amicus curiae: a pessoa natural ou jurídica, órgão ou entidade especializada, com representatividade adequada (art. 138). Desde de que tenha expertise sobre a matéria objeto da lide, de modo a propiciar ao juiz elementos e informações relevantes para bem solucionar a causa.
Consoante o art. 138 do CPC, o amicus curie terá o prazo de 15 dias para se manifestar, contudo o Código nada dispôs acerca do momento em que a intervenção deva ocorrer. As lições doutrinárias dizem que essa participação dar-se a qualquer momento, desde que assegurado o contraditório para as partes[25].
Apesar de poder opor embargos de declaração (art. 138, § 1º, in fine) e recorrer da decisão que julgar o incidente de resolução de demandas repetitivas (art. 138, § 3º), os poderes desse inteveniente não foram delimitados pelo Código, que deixou ao prudente arbítrio do juiz essa moldar essa autuação ( art. 138, § 2º, do CPC). Neste ponto, a figura do amicus curiae se distancia das modalidades de intervenção de terceiros que possuem papeis bem delimitados[26].
Buscando dar concreção a princípios constitucionais[27], e pacificar o dissensso doutrinário e jurisprudencial em torno da disregard doctrine, o legislador disciplinou o procedimento para a aplicação do referido instituto nos artigos 133 e 137 do novo código.
Tal inovação reavivou o interesse acadêmico por seu estudo[28].
A novel legislação não esqueceu da desconsideração inversa da personalidade jurídica, que atualmente encontra previsão no novo Código de Processo Civil, no art. 133, § 2º, o qual veio a suprimir lacuna do direito material, que era colmatada pela jurisprudência do STJ ao tempo do CPC de 1973.
A aplicação da desconsideração tanto da direta quanto da inversa pressupõe abuso de direito, consubstanciado pelo desvio de finalidade da pessoa jurídica ou pela confusão patrimonial.
A legitimidade para o pedido de desconsideração da personalidade jurídica é parte ou Ministério Público (quando este intervir no feito). Pode ser requerida com a inicial, nesse caso, deverá ser citado o sócio ou da pessoa jurídica para integrar a lide e contestar o pedido de desconsideração (art. 134,§ 2º), sem a instauração de um incidente ou suspensão do processo, já que a defesa com a contestação e provas eventualmente requeridas serão realizadas durante a instrução processual, sendo o pedido de desconsideração julgado na sentença.
Há também possibilidade do pedido ser realizado em petição autônoma (em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial - art. 134, caput), formando um incidente processual, por isso, haverá suspenção do processo (art. 134, §3º).
Igualmente, o sócio ou a pessoa jurídica serão citados para apresentar defesa e requerer as provas cabíveis no prazo de quinze dias (art. 135), em obediência a garantia fundamental do contraditório e da ampla defesa.
Logo em seguida, salvo necessidade de instrução, o incidente deverá ser juldado pelo juiz em decisão interlocutória, a qual desafia agravo de instrumento (arts. 136, caput, e 1.015, IV), salvo se o incidente se der em sede recursal, quando caberá agravo interno (art. 136, § 1º).
Por ser uma medida excepcional, no requerimento deve demonstrar o preenchimento dos pressupostos legais específicos, que, nos termos do art.50, do CC, são o desvio de finalidade da pessoa jurídica e a confusão patrimonial entre ela e os sócios (NCPC, arts. 133, § 1º, e 134, § 4º).
Na linha do entendimento firmado pelo STJ[29], o pedido pode ser feito a qualquer momento no processo, não se aplicando os prazos decadenciais para o ajuizamento das ações revocatória falencial e pauliana.
Pode-se ressaltar dois importantes efeitos da desconsideração. O principal é imputar responsabilidade pelos atos fraudulentos praticados em prejuízo de terceiros a pessoas que não teriam seu patrimônio atingido de modo primário.
O segundo é a presunção legal de fraude, gerando a ineficácia, em relação ao requerente, da alienação ou oneração de bens, havida em fraude de execução, do deferimento do processamento do pedido de desconsideração (art. 137 do CPC). Mas há um pressuposto para que haja a presunção legal, que o sujeito passivo da desconsideração da personalidade jurídica já tenha sido citado, ao tempo do ato de disposição (art. 792, § 3º).
O novo Código Processual Civil apresenta diversas alterações que buscam atender eficazmente os princípios constitucionais da celeridade e duração razoável do processo com um ânseio de simplificação do processo civil.
Nesse panorama de mudanças, as alterações havidas com o novo CPC sobre o tema foram profundas. No CPC/1973, eram cinco as modalidades típicas: a assistência (simples ou adesiva e a litisconsorcial, embora tratada no capítulo destinado ao litisconsórcio), oposição, nomeação à autoria, denunciação da lide e o chamamento ao processo.
A assistência restou praticamente intacta com o CPC/2015. Contudo, inova o legislador ao tratar do tema no Título da Intervenção de Terceiros, criando, ainda, uma seção intitulada "Das Disposições Comuns" que traz regras comuns às modalidades de assistência para na sequência tratar em seções distintas. a assistência simples e litisconsorcial, aprimorando, assim. a técnica utilizada no CPC/1973.
Por outro lado, o novo código retira do sistema a oposição instituto de rara aplicação prática no Direito brasileiro, e o transforma em ação autônoma de procedimento especial como substituto.
Igualmente a anacrônica nomeação à autoria deixou de existir.
A sistemática do chamamento foi praticamente mantida na nova Lei Processual Civil. Abandonou-se o vangardismo de unificação dos institutos da denunciação da lide e o chamamento, pois essa inovação contida no Projeto de Lei[30] não vingou no texto final.
A crítica surgue, pois a ideia de unificação dos instituos parece ter permanecido na Lei 13.0152015. Explico, na legislação anterior além da distinção nas hipóteses de cabimento da denunciação e do chamamento, haviam também efeitos diverso: no chamamento era possível ao autor executar tanto o réu principal como qualquer dos chamando, em virtude da solidariedade passiva entre esses coobrigado; o que não era possível na denunciação.
Essa diferença não mais existe no regime do Código novo. Tanto numa como noutra, passou-se a admitir ao credor a execução direta da condenação seja contra a parte primitiva, seja contra o interveniente denunciado ou chamado (arts. 128, parágrafo único, e 132). Assim, tanto faz, que se use a denunciação da lide como o chamamento ao processo, o resultado será o mesmo, já que na maior parte dos casos a condenação na ação regressiva é pelo total da condenação do denunciante.
Na denunciação da lide, houveram significativas mudanças no regramento material e procedimenetal, conforme foi demonstrado ao longo deste trabalho. Pode-se destacar três pontos que resumem a nova formatação desse instituto. A primeira importante novidade foi que o CPC/2015 deixa de prever a obrigatoriedade da denunciação, consagrando regra inédita no art.125, § 1°. A segunda alteração que dista do regramento anterior é a proibição de denunciação sucessivas. E por fim, a consagração e ampliação do entendimento do STJ, na determinação de responsabilidade solidária entre o denunciante e o denunciado perante o autor da ação primitiva ( parágrafo único do art. 128 do CPC).
O CPC/2015 traz um capítulo inédito dedicado à figura do amicus curiae,sem correspondência no CPC/1973, o que representa um avanço legislativo ao disciplinar o instituto, prestigiando o princípio democrático ( art. 138, do CPC/2015).
O amicus curiae permite uma maior democratização no que toca às decisões judiciais ao se permitir que diversos atores sociais se manifestem sobre a aplicação das leis e da Constituição em todos os graus de jurisdição.
Em relação à inovação da positivação da disregard doutrine, é de ser ressaltar, que andou bem o novo diploma legal quando positivou a necessidade de se assegurar o contraditório para a legítima decretação da desconsideração da personalidade jurídica, pois adotar entendimento diverso seria prestigiar retrocesso anterior à Carta Magna.
Ademais, a previsão legal de um procedimento simples e objetivo para a aplicação da teoria visa, antes de tudo, o fim da situação de incerteza e insegurança que imperava anteriormente, assumindo relevante destaque na concretização da segurança jurídica.
Sem ignorar que problemas vindouros existirão, a Lei 13.105/15 nos apresenta um Código do seu tempo, voltado à solução das controvérsias atuais, colocando termo em diversos embates jurídicos e aprimorando a sistemática processual civil.
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SANTOS, Ernane Fidelis dos. Manual de direito processual civil. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, v. I, n. 147
THEODORO Júnior, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Teoria geral do direito processual civil, processo de conhecimento e procedimento comum – vol. I . 56. ed. rev., atual. e ampl.– Rio de Janeiro: Forense, 2015
[1] BRASIL. Anteprojeto Do Novo Código De Processo Civil. Disponível em: https://www.senado.gov.br/senado/novocpc/pdf/Anteprojeto.pdf. Acesso em: 17/05/2017.
[2] THEODORO Júnior, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Teoria geral do direito processual civil, processo de conhecimento e procedimento comum – vol. I . 56. ed. rev., atual. e ampl., p.289 – Rio de Janeiro: Forense, 2015.
[3] NEVES, Daniel Amorim, Manual de Direito Processual Civil. 8 ed., p.412 , São Paulo: Método, 2016.
[4] Ob. Cit., p. 381.
[5]Ob. Cit., p. 375.
[6] Humberto Theodoro defende a existência da assistência provocada à semelhança do que ocorre com o litisconssórcio necessário (art.115 do CPC). Ob. Cit., p. 380.
[7] DIDIER, Fredier, Junior. Curso de Direito Processual Civil. V. 1. 15 ed. p. 389 e 393- Salvador: JusPodivm, 2013.
[8] Caso diverso, é a da assistência em favor do demandado revel ou omisso, quando “o assistente será considerado seu substituto processual” (art. 121, parágrafo único, do CPC), que veio a susbistituir a atécina expressão gestor de negócios” (CPC/1973, art. 52, parágrafo único).
[9] Em sentido contrário: SANTOS, Ernane Fidelis dos. Manual de direito processual civil. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, v. I, n. 147, p. 157.
[10] STJ, Corte Especial, ED no REsp 1.068.391/PR, Rel. p/ ac. Min. Maria Thereza de Assis Moura, ac. 29.08.2012, DJe 07.08.2013.
[13] CÂMARA, Alexandre Freitas. O Novo Processo Civil Brasileiro, p.90, São Paulo: Atlas, 2015.
[14] Nos moldes do parágrafo único do artigo 125 do CPC.
[15] No código anterior existia ainda outra hipótese de cabimento, CPC/1973, art. 70, que se referia a denunciação ao proprietário pelo possuidor direto. Na atual sistemática, o possuidor direto terá que propor ação autônoma em face do possuidor indireto para reparar danos ocorridos pela pertubarção da posse.
[16] Para um estudo sobre os casos de não cabimento da denunciação confira THEODORO JUNIOR, Ob. Cit., p. 391-392.
[17] Ob. Cit., p.428.
[18] Ob. Cit. , p. 386.
[19] Em sentido análogo, Daniel Assumpção Neves. Ob. Cit., p. 428-431. A jurisprudencia do STJ no CPC de 1973 era vacilante, a favor: REsp 782.834-MA; REsp 236.837-RS; contra: REsp 210.607-RJ. Sob a legislação atual, o STJ já admitiu a denunciação pelo ente público ao causador do dano, ainda que a matéria não tenha sido objeto principal do rescurso especial: REsp 1501216 / SC.
[20] O recurso cabível contra o indeferimento da denunciação é o agravo de instrumento ( art. 1.015, IX, do CPC). Mas se a areciação se der na sentença, caberá apelação (art. 1.009 do CPC)
[21] Fux, Luiz. e Neves, Daniel Amorim Assurnpção.Novo Código de Processo Civil : comparado — Lei 13.105/2015 — 2. ed. revista — Rio de Janeiro: Forense: São Paulo: MÉTODO, 2015, p.
[22] BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil : teoria geral do direito processual civil, vol. 1 – 8. ed. rev. e atual. – São Paulo : Saraiva, 2014, p.387.
[23] Ob. Cit., p. 401.
[24] Donizetti, Elpídio. Curso didático de direito processual civil – 20. ed. rev., atual.e ampl. – São Paulo: Atlas, 2017, p. 402-403.
[25] DONIZETE. Ob. Cit., p. 407 e 408.
[26] Parte da doutrina critica esse dispositivo. Afirmam alguns que o legislador deveria ter estabelecido um núcleo mínimo para o amigo da corte. Confira: FLEXA,Alexandre. Et. Al. Novo Código De Processo Civil. Salvador: Editora JusPodvim, 2015. P. 125
[27] BRASIL.Anteprojeto Do Novo Código De Processo Civil. Ob. Cit., p. 15.
[28] Por todos, consultar trabalho monográfico: COUTINHO NETO, Claudio. A Desconsideração Da Personalidade Jurídica e o Novo Código De Processo Civil. 2014-2015. Trabalho de Conclusão de Curso (Especialização)- Faculdade De Direito Professor Damásio De Jesus, 2014.2015.
[29] STJ, 4ª T., REsp 1.180.191/RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, ac. 05.04.2011, DJe 09.06.2011.
[30] BRASIL. Ob. Cit., p. 121.
Advogada. Bacharel em Ciências Contábeis (2010); Bacharel em Direito (2011); Especialista em Direito Constitucional e Administrativo (2014); Especialista em Dirieto Processual Civil (2015); Mestranda em Direito pela UFC.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: OLIVEIRA, Carmelita Angelica Lacerda Brito de. Principais inovações nas intervenções de terceiros no Novo CPC Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 jan 2018, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/51272/principais-inovacoes-nas-intervencoes-de-terceiros-no-novo-cpc. Acesso em: 31 out 2024.
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