RESUMO: O presente artigo tem como objetivo realizar uma análise do regramento constitucional e infraconstitucional do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), positivado no artigo 155, I, da Constituição da República de 1988. A análise proposta perpassa pelos dispositivos normativos pertinentes à referida exação compulsados ao entendimento correlato no âmbito dos Tribunais Superiores e da melhor doutrina.
PALAVRAS-CHAVE: Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação. ITCMD. Impostos Estaduais. Direito Tributário.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Aspectos do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD). 2.1. Aspecto material e aspecto temporal. 2.2. Aspecto espacial e subjetivo. 2.3. Aspecto territorial. 3. Imunidades e isenções pertinentes ao Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD). 4. Procedimento de cobrança do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD). 4.1. Lançamento e decadência do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD). 5. Conclusão. 6. Referências Bibliográficas.
1 INTRODUÇÃO
O Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) encontra-se positivados no artigo 155, I, da Constituição da República de 1988. Trata-se de imposto, espécie do gênero tributo, cuja competência para instituição e cobrança foi conferida pelo constituinte originário aos Estados-membros, correspondendo a importante fonte de arrecadação estadual, ao lado do Imposto sobreoperações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (ICMS) e do Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA).
2 ASPECTOS DO IMPOSTO SOBRE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS E DOAÇÃO (ITCMD)
A partir do advento da CF/88, houve a cisão da competência para a instituição do oImposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), cuja competência constitucional para instituição foi conferida aos Estados-membros, e Imposto sobre a Transmissão Inter Vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição (ITBI), cuja competência constitucional para instituição foi conferida aos Municípios, nos termos do artigo 156, II, da Constituição da República.
Ademais, na forma apregoada pela CF/88, a transmissão de bens móveis, exceto as transmissões onerosas por ato inter vivos, passaram a integrar o aspecto material do ITCMD. Desta feita, pode-se afirmar que o ITCMD incide sobre transmissões causa mortis e doações de bens móveis e imóveis.
Tendo em vista as alterações provocadas pela CF/88 na sistemática do ITCMD, tem-se que a legislação infraconstitucional disciplinadora da matéria apresenta ora dispositivos que foram recepcionados pela Carta Magna ora que foram revogados por não recepção, ante a incompatibilidade com o novo regramento constitucional.
Cite-se, ainda, que inexiste, no Código Tributário Nacional, tratamento das transmissões gratuitas de bens móveis, de modo que os Estados possuem competência legislativa plena quanto à matéria. Isso porque, nos termos do artigo 24, da Constituição da República de 1988, as normas de Direito Tributário submetem-se à competência legislativa concorrente, ao passo que o §3º do referido dispositivo autoriza que os Estados exerçam competência legislativa plena na hipótese de ausência de norma federal sobre o tema.
De uma forma geral, pode-se afirmar que o ITCMD Causa Mortis, quando apurado em inventário, submete-se à sistemática do lançamento por declaração. De outro giro, as demais hipóteses de incidência do ITCMD submetem-se à sistemática do lançamento por homologação. Registre-se, entretanto, que esta matéria é relegada à livre conformação do legislador ordinário estadual, podendo a matéria ser disciplinada em diferente sentido. Ademais, tem-se que, não raro, é feito o lançamento de ofício pelas autoridades fiscais.
Em síntese, pode-se afirmar que o ITCMD é um imposto estadual, privativo, não vinculado, de arrecadação não vinculada, real, direto, ordinário e de função precipuamente fiscal[1].
2.1 Aspecto material e aspecto temporal
Nos termos do artigo 155, I, da CF/88, duas são as condutas que dão ensejo à obrigação de pagar o ITCMD: a transmissão causa mortis de bens móveis e imóveis e a doação de bens móveis e imóveis.
Destaca-se que a CF/88, ao se referir a “quaisquer bens e direitos”, faz alusão aos bens móveis e imóveis, corpóreos e incorpóreos, suscetíveis de apropriação pelo homem e dotados de valor econômico.
A transmissão causa mortis é também conhecida como sucessão, nos termos do art. 1.784, do CC/02. O referido dispositivo consagra o princípio da saisine, segundo o qual, com a morte, todo o patrimônio do de cujus transmite-se, automaticamente, aos herdeiros e legatários, até que se faça a partilha dos bens.
Por oportuno, salienta-se que nos termos do Enunciado nº 331 da Súmula do Supremo Tribunal Federal, “é legítima a incidência do imposto de transmissão causa mortis no inventário por morte presumida”.
A doação é disciplinada pelo art. 538, do CC/02, consistindo no contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere bens ou vantagens para outra.
Nesse ponto, é importante fazer uma análise mais profunda quanto à incidência do ITCMD nas renúncias de herança. É que a renúncia de herança pode-se dar em duas modalidades: renúncia translativa, em que o bem renunciado é destinado a uma pessoa específica, e renúncia abdicativa, em que o bem renunciado é revertido ao monte partilhável. A renúncia translativa, por sua vez, pode ser onerosa ou gratuita.
Na hipótese de renúncia translativa gratuita, haverá a incidência de ITCMD em dois momentos, qual seja no momento da sucessão, ocasião em que incidirá ITCMD – Causa Mortis, e no momento da renúncia translativa gratuita, efetivamente, ocasião em que incidirá ITCMD – Doação.
Em havendo renúncia translativa onerosa, após a incidência de ITCMD – Causa Mortis, quando da sucessão, haverá incidência de ITBI, caso estejam sendo transmitidos bens imóveis. Nesse ponto, destaca-se que apenas haverá incidência de ITBI caso seja demonstrado o caráter oneroso da operação, o que se verifica mediante a compensação financeira para equilibrar os quinhões distribuídos de forma desproporcional.
Por último, tem-se que não haverá incidência tributária na hipótese de renúncia abdicativa.
Pertinente atentar ao leitor quanto à hipótese de incidência de ITCMD no âmbito da partilha de bens em separações, divórcios e processos de inventário. Nessas ocasiões, a desproporcionalidade na repartição dos bens pode dar ensejo à incidência de ITCMD ou ITBI. Na partilha desigual de bens, um herdeiro ou cônjuge é contemplado com quota maior que a dos demais. Caso o beneficiário da partilha desigual não apresente qualquer tipo de contrapartida, haverá incidência do ITCMD. Destaca-se, ainda, que nos termos do Enunciado nº 116 do Supremo Tribunal Federal, “em desquite ou inventário, é legítima a cobrança do chamado imposto de reposição, quando houver desigualdade nos valores partilhados”.
Nesse ponto, é preciso diferenciar as hipóteses de separação ou divórcio e as hipóteses de processo de inventário. No processo de inventário, haverá a incidência do ITCMD em dois momentos: no da sucessão e no da doação. Na separação ou divórcio, haverá incidência do ITCMD apenas uma única vez: quando da doação.
De outro giro, salienta-se que, caso o beneficiário da divisão desproporcional faça algum tipo de compensação ou reposição, haverá uma transmissão onerosa, e nas operações envolvendo bens imóveis, haverá incidência de ITBI.
Pertinente abordar a possibilidade de incidência de ITCMD por ocasião da constituição de usufruto, hipótese em que há a transmissão de alguns dos poderes inerentes à propriedade a terceiro, que passa a ter o direito de usar e fruir da coisa, nos termos do art. 1.394 do CC/02.
O usufruto é direito real sobre imóvel, de modo que sua transmissão gratuita submete-se a incidência do ITCMD. Trata-se do chamado usufruto simples. Por exemplo, na hipótese em que um filho concede usufruto vitalício a sua mãe idosa, haverá incidência de ITCMD.
Diferente é a hipótese de doação com reserva de usufruto. Por exemplo, na hipótese em que um pai doa imóvel ao filho, mas reserva a si o direito de usufruto enquanto viver. Com a morte do pai, a propriedade do imóvel se consolidará com o filho. De acordo com a doutrina majoritária, deve haver incidência do ITCMD apenas uma única vez: no momento da instituição do usufruto (ITCMD -Doação) ou no momento da morte do doador/usufrutuário (ITCMD –Causa Mortis).
Curial também é abordar a incidência do ITCMD quando da instituição de fideicomisso que, segundo Sílvio Rodrigues Venosa, é o instituto mediante o qual o testador impõe a um herdeiro ou legatário, denominado fiduciário, a obrigação de, por sua morte, a certo tempo ou sob certa condição, transmitir a outro, chamado fideicomissário, a herança ou legado.
De acordo com o Superior Tribunal de Justiça[2], quando da instituição do fideicomisso, haverá incidência do ITCMD. Contudo, quando da extinção do fideicomisso (pela morte do fiduciário ou do fideicomissário), não haverá incidência do ITCMD, sob pena de haver bitributação.
Nas transmissões causa mortis, a obrigação tributária nasce quando da abertura da sucessão, ou seja, no momento da morte. Destaca-se que, quanto ao ITCMD Causa Mortis, o aspecto temporal não coincide com o aspecto material. O aspecto material está relacionado com a transmissão dos bens decorrente da morte. O aspecto temporal é o próprio momento da morte.
Nos casos de morte presumida, tem-se como aspecto temporal o momento a partir do qual a lei civil considera ocorrida a morte.
Nesse ponto, destaca-se que no ITCMD Causa Mortis, aplicar-se-á a alíquota vigente ao tempo da morte, nos termos do Enunciado nº 112 da Súmula do Supremo Tribunal Federal.
É preciso destacar que o direito da Fazenda Pública lançar o tributo não decairá antes de existir ciência inequívoca da existência do fato gerador da obrigação. Desta feita, antes da ciência da morte, operada por ocasião do processo de inventário, ainda que este só venha a ser levado a efeito dez anos após o óbito, por exemplo, não há que se falar em decadência.
Nas doações, a obrigação tributária nasce no momento em que estiver caracterizada a transmissão do bem. Quanto aos bens móveis, a transmissão ocorre com a tradição. Quanto aos bens imóveis, a transmissão ocorre com o registro no Cartório de Registro de Imóveis.
2.2 Aspecto espacial e subjetivo
No que tange ao aspecto espacial e subjetivo ativo, o tributo caberá ao Estado em que ocorrer o fato gerador da obrigação tributária. No caso do ITCMD, trata-se de matéria disciplinada pelo art. 155, §1º, da CF/88. Nesse sentido, nas transmissões de bens imóveis, o ITCMD será instituído pelo Estado da situação do bem ou pelo Distrito Federal. Por outro lado, nas transmissões causa mortis de bens móveis, o ITCMD caberá ao Estado em que processado o inventário ou arrolamento, ao passo que nas doações, o ITCMD caberá ao Estado em que domiciliado o doador.
Esclarece-se, por oportuno, que nas hipóteses em que o doador tiver domicilio ou residência no exterior ou se se o de cujus possuía bens, era residente ou domiciliado ou teve o seu inventário processado no exterior, o sujeito ativo do ITCMD há de ser definido em lei complementar.
Como a referida lei complementar ainda não foi editada, permanecem os Estados com competência legislativa plena quanto à matéria (art. 24, §3º, da CF/88). Isso pode levar a conflitos de interesse entre diferentes Estados a serem dirimidos pelo STF (art. 102, I, “f” da CF/88)[3].
Quanto ao sujeito passivo do ITCMD, nos termos do art. 42 do Código Tributário Nacional, este é qualquer das partes na operação tributada, na forma da lei. Portanto, fica a matéria em comento a cargo da legislação estadual do ente competente para a instituição do tributo.
2.3 Aspecto quantitativo
Nos termos do art. 38, do CTN, a base de cálculo do ITCMD é o valor venal dos bens ou direitos transmitidos ou doados, apurados mediante avaliação feita pela fazenda pública estadual. Cite-se, ainda, que o sujeito passivo do imposto possui a prerrogativa de impugnar a avaliação feita pela fazenda pública.
Nesse ponto, importante destacar resta superado o Enunciado nº 113 da Súmula do Supremo Tribunal Federal que dispõe que "o imposto de transmissão 'causa mortis' é calculado sobre o valor dos bens na data da avaliação". Isso porque tal enunciado é anterior à Lei da Correção Monetária (1964), pelo que o objetivo a que visava, de evitar distorções prejudiciais ao Fisco, se encontra atendido com a aplicação da correção monetária[4].
É comum que a legislação estadual disponha que, nos casos de doação com reserva de usufruto e usufruto simples, a base de cálculo corresponda à metade do valor venal do bem, a fim de evitar que um mesmo bem seja tributado duas vezes.
Nos casos de promessas de compra e venda ainda não quitadas ao tempo da abertura da sucessão do promitente vendedor, a base de cálculo será o saldo credor da obrigação. Isto é, o ITCMD incidirá apenas sobre o que ainda resta a pagar, e não sobre o valor total da operação. Nesse sentido, tem-se que o Enunciado nº 590 do Supremo Tribunal Federal dispõe que “calcula-se o imposto de transmissão causa mortis sobre o saldo credor da promessa de compra e venda de imóvel, no momento da abertura da sucessão do promitente vendedor”.
De acordo com o art. 155, §1º, IV, da CF/88, o Senado Federal fixará as alíquotas máximas do ITCMD. A Resolução n° 09/92, do Senado Federal, fixou a alíquota limite do ITCMD em 8%.
Destaca-se que é inconstitucional a vinculação entre a alíquota estadual e a alíquota máxima fixada pelo Senado Federal. Isto é, não pode a legislação estadual dispor que a alíquota do ITCMD acompanhará, automaticamente, a alíquota máxima definida pelo Senado Federal. A alíquota do ITCMD deve ser definida em lei específica, em nome do princípio da legalidade (art. 150, I, da CF/88).
Pertinente salientar que o Supremo Tribunal Federal alterou sua jurisprudência para admitir a previsão de alíquotas progressivas para o ITCMD[5]. O pretório excelso admitiu que todos os impostos estariam sujeitos ao princípio da capacidade contributiva, incluindo os impostos de caráter real. Desta feita, o art. 145, §1º, da CF/88, apenas estabeleceria que os impostos, sempre que possível, teriam caráter pessoal, mas que, independentemente disso, sempre deveriam ser norteados pelo princípio da capacidade contributiva.
3 IMUNIDADES E ISENÇÕES PERTINENTES AO IMPOSTO SOBRE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS E DOAÇÃO (ITCMD)
Não há nenhuma imunidade específica ao ITCMD prevista no texto constitucional. Contudo, destaca-se que a exação se submete à imunidade tributária recíproca (art. 150, VI, “a”, da CF/88). Desta feita, não incidirá ITCMD, por exemplo, sobre doações feitas a pessoas jurídicas de direito público, incluindo as integrantes da administração pública indireta, desde que os bens estejam atrelados às suas finalidades essenciais (art. 150, §2º, da CF/88). Também nos casos de herança vacante não haverá incidência do ITCMD Causa Mortis.
4 PROCEDIMENTO DE COBRANÇA DO IMPOSTO SOBRE TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS E DOAÇÃO (ITCMD)
Nas transmissões inter vivos de bens imóveis, costuma-se exigir o pagamento do tributo incidente sobre a operação antes da lavratura do instrumento responsável por provocar a transferência da propriedade imobiliária. Em que pese, em tese, haver exigência de tributo antes da ocorrência efetiva do fato gerador, o Superior Tribunal de Justiça tem chancelado esse tipo de cobrança.
Nas transmissões inter vivos realizadas por instrumento particular, geralmente, a legislação local estabelece um prazo para apresentação do referido instrumento à repartição fiscal e recolhimento do tributo.
Nas transmissões causa mortis de bens e direitos, o recolhimento do tributo ocorrerá no curso do processo, administrativo ou judicial, de inventário ou arrolamento sumário.
Nos processos de inventário, a Fazenda Pública deverá ser ouvida em dois momentos. Em primeiro lugar, o fisco será intimado para se manifestar sobre o valor dos bens inventariados. Trata-se de verdadeira avaliação feita pelo fisco dos bens descritos nas primeiras declarações. Com base no valor indicado pelo fisco, deverá ser feito o recolhimento do ITCMD.
Após o pagamento do tributo, o Fisco será novamente intimado, momento em que poderá impugnar o cálculo realizado pelas partes interessadas (cálculo para pagamento do tributo, e não o valor atribuído aos bens). Apenas após a homologação dos cálculos pelo juiz e o pagamento do ITCMD, poderá ser realizada a partilha.
Sob a égide do CPC/73, a existência de dívidas com a Fazenda Pública impedia peremptoriamente a prolação de sentença que julgasse a partilha. Com o advento do CPC/15, passou-se a admitir a sentença, contanto que a dívida esteja garantida, nos termos do artigo 654, do diploma processual.
O arrolamento sumário é utilizado em partilhas amigáveis que envolvam exclusivamente partes capazes e nos casos em que o valor dos bens do espólio não supere 1.000 salários mínimos. Trata-se de rito simplificado que não demanda a dupla participação da Fazenda Pública.
Destaca-se, contudo, que nos termos do artigo 662, do CPC/15, no "arrolamento, não serão conhecidas ou apreciadas questões relativas ao lançamento, ao pagamento ou à quitação de taxas judiciárias e de tributos incidentes sobre a transmissão da propriedade dos bens do espólio".
No entanto, mesmo no arrolamento sumário, o pagamento do ITCMD é pré-requisito para a expedição do formal de partilha. Nesse ponto, de acordo com o Superior Tribunal de Justiça[6], para que haja a homologação da partilha, basta que haja o pagamento do ITCMD, ainda que a menor, devendo eventuais diferenças ser discutidas administrativamente. Importante perceber a diferença em relação ao inventário, onde a Fazenda Pública pode impugnar o cálculo das partes nos próprios autos.
Em virtude da ausência de dupla participação da Fazenda Pública no arrolamento sumário, não se admite o reconhecimento judicial de isenção do ITCMD. Diferentemente, no processo de inventário, é possível o reconhecimento judicial de isenção do ITCMD, a despeito da competência administrativa privativamente atribuída à autoridade fiscal pelo art. 179, do CTN. É que a prévia oitiva da Fazenda Pública, antes da homologação do cálculo das partes, torna despiciendo procedimento administrativo para o reconhecimento de isenção.
4.1 Lançamento e decadência do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) nos processos de inventário
No processo de inventário, o ITCMD submete-se a lançamento por declaração: a apuração do tributo pelo fisco depende de informações prestadas pelo sujeito passivo. Isso não significa que o fato gerador ocorra no momento em que são prestadas as informações.
De acordo com o Superior Tribunal de Justiça[7], embora a herança seja transmitida com a abertura da sucessão (fato gerador do ITCMD Causa Mortis), a exigibilidade do imposto fica a depender da identificação precisa do patrimônio transferido e dos herdeiros ou legatários, o que apenas ocorre com a prolação da sentença de homologação de partilha, tornando possível a realização do lançamento.
Para lançar eventuais diferenças não pagas no curso do processo de inventário, o Estado deve obedecer ao prazo decadencial de 5 anos, contados do primeiro dia do exercício financeiro seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido feito (art. 173, I do CTN). Caso a homologação tenha ocorrido, por exemplo, em 27/06/2008, o prazo decadencial apenas ocorrerá após 31/12/2013.
5 CONCLUSÃO
O estudo acerca do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) é complexo e repleto de nuances, sobretudo em razão da mencionada cisão entre a exação estadual e o municipal Imposto sobre a Transmissão Inter Vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição (ITBI), provocada pela Constituição da República de 1988. Nesse ponto, o regramento jurídico do ITCMD é repleto de normas não recepcionadas pela Carta Constitucional, ao passo que boa parte da disciplina legal é relegada ao legislador ordinário estadual. Entretanto, espera-se que o presente artigo tenha ajudado o leitor a realizar uma compreensão inicial acerca do ITCMD.
6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DE CASTRO, E.M.L.R., LUSTOZA, H.K., GOUVÊA, M.F. Tributos em espécie. São Paulo: Editora Juspodivm, 2016
TORRES, Ricardo Lobo. Curso de direito financeiro e tributário. 18. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2011
ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015
PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário: completo. 4. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012
BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010
COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012
HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2009
AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 12. ed.São Paulo: Saraiva, 2012
SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2016
ROCHA, Sérgio André (Coord). Curso de Direito Tributário. São Paulo: QuartierLatin, 2011
PAULSEN, Leandro. Direito tributário: Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da jurisprudência. 16. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2014
[1] DE CASTRO, E.M.L.R., LUSTOZA, H.K., GOUVÊA, M.F. Tributos em espécie. São Paulo: Editora Juspodivm, 2016.
[2] REsp 1004707/RJ, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27/05/2008, DJe 23/06/2008.
[3]DE CASTRO, E.M.L.R., LUSTOZA, H.K., GOUVÊA, M.F. Op cit.
[4] RE 98589, Relator Ministro Aldir Passarinho, Segunda Turma, julgamento em 23.9.1983, DJ de 11.11.1983.
[5] RE 562045, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Relator(a) p/ Acórdão: Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 06/02/2013, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-233 DIVULG 26-11-2013 PUBLIC 27-11-2013 EMENT VOL-02712-01 PP-00001.
[6] REsp 1373317/SP, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/04/2014, DJe 22/04/2014.
[7] REsp 1660491/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/05/2017, DJe 16/06/2017.
Graduado em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Analista Judiciário - Área Judiciária do Tribunal Regional Federal da 2ª Região.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RAMOS, Caio César Alves Ferreira. Notas sobre o imposto sobre transmissão causa mortis e doação (ITCMD) Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 abr 2018, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/51606/notas-sobre-o-imposto-sobre-transmissao-causa-mortis-e-doacao-itcmd. Acesso em: 05 nov 2024.
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