RESUMO: O presente artigo disserta acerca da remuneração dos serviços públicos. Diferencia os serviços gratuitos dos onerosos e as taxas das tarifas. Busca-se também analisar os aspectos jurisprudenciais relativos ao tema.
PALAVRAS-CHAVE: Prestação de Serviços Públicos. Remuneração. Taxa. Tarifa.
SUMÁRIO: 1. Introdução 2. Desenvolvimento 3. Conclusão 4. Referências Bibliográficas.
1. Introdução
A remuneração do serviço público é imprescindível para a manutenção e prestação dos serviços públicos não gratuitos. Ressalta-se que serviços sociais básicos do Estado são mantidos, em regra, por recursos derivados dos impostos.
Entretanto, nos demais serviços os usuários pagam uma contraprestação pecuniária de acordo com a utilização. Esta contraprestação ocorre por meio da taxa ou da tarifa.
2. Desenvolvimento
Manuel Maria Diez, afirma que prestação “é uma atividade pessoal que um sujeito deve efetuar em benefício de outro sujeito a quem se proporciona uma utilidade concreta e em virtude de uma relação jurídica de natureza obrigatória entre as duas partes”.[1]
Destaca-se que os serviços podem ser gratuitos ou remunerados. Os primeiros são basicamente sociais, tendo como principais exemplos, os serviços de assistência médica e educação. Por sua vez, os serviços remunerados são aqueles em os usuários tem que pagar uma contraprestação pecuniária ao serviço prestado. Tal forma de remuneração é que varia entre as taxas e as tarifas.
De acordo com o artigo 145, inciso II, da CRFB de 88, transcrito abaixo, serão cobradas taxas em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição. Quando o serviço é imposto aos usuários, ou dito de outra maneira, é obrigatório, será este remunerado por taxa.
Art. 145 - A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:
II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição;
III - contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas.
Para ilustrar, vale transcrever os artigos 77, que determina o fato gerador das taxas, e 79 do CTN, que traz os conceitos dos serviços prestados efetivamente ou potencialmente e de serviços específicos e divisíveis:
Art. 77. As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.
Parágrafo único. A taxa não pode ter base de cálculo ou fato gerador idênticos aos que correspondam a imposto nem ser calculada em função do capital das empresas.
Art. 79. Os serviços públicos a que se refere o artigo 77 consideram-se:
I - utilizados pelo contribuinte:
a) efetivamente, quando por ele usufruídos a qualquer título;
b) potencialmente, quando, sendo de utilização compulsória, sejam postos à sua disposição mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento;
II - específicos, quando possam ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de unidade, ou de necessidades públicas;
III - divisíveis, quando suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários.
Estas peculiaridades das taxas geram diversas divergências. Segundo Irapuã Beltrão:
Os tribunais várias vezes são chamados para verificar a validade de taxas instituídas pelo Poder Público, seja analisando a validade do fato gerador estipulado pelo legislador, seja verificando a dimensão econômica daqueles tributos em relação aos outros conceitos jurídicos especialmente para não inviabilizar os direitos fundamentais.[2]
Em síntese, taxa é modalidade de tributo, compulsório, regulado pelo direito público, que nasce por meio de lei, que incidem sobre serviços públicos de caráter essencial.
Já a tarifa não se configura uma espécie de tributo, não se subordinando as regras de direito público. É regulada pelo direito privado na celebração de um ajuste e não por lei.
As tarifas são, desse modo, voluntárias, pois existe liberdade para contratar e não incidem sobre os serviços públicos essenciais, mas sim sobre os serviços públicos de caráter não-essencial. Assim, a tarifa nasce como uma contraprestação pecuniária paga à Administração ou aos seus delegados, pelo usuário em decorrência da utilização ou da prestação de um determinado serviço público. As tarifas, portanto, são o preço público referentes à utilização de serviços não compulsórios que os delegados da Administração Pública, ou mesmo esta, oferecem aos cidadãos.
Ressalta-se o disposto na súmula 545 do STF: “preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas, diferentemente daqueles, são compulsórios e têm sua cobrança condicionada à prévia autorização orçamentária, em relação à lei que as instituiu”.
Neste sentido, vale lembrar a lição de Hugo de Brito Machado:
A título de exemplo, imaginemos a necessidade que se tem de energia elétrica. Se o ordenamento jurídico nos permite atender a esta necessidade com a instalação de um grupo gerador em nossa residência, ou estabelecimento industrial ou comercial então a remuneração que o Estado nos cobra pelo fornecimento de energia é um preço público, pois não somos juridicamente obrigados a utilizar o serviço público para a satisfação de nossa necessidade. Embora nos seja mais conveniente a utilização do serviço público do ponto de vista econômico ou por outra razão qualquer, do ponto de vista rigorosamente jurídico nada nos impede de, por outro meio, atender à necessidade de energia elétrica. A remuneração que pagamos pelo fornecimento de energia elétrica, portanto, não é compulsória. Por outro lado, se há norma jurídica proibindo a instalação do grupo gerador ou unidade de captação de energia solar em residências ou estabelecimentos comerciais ou industriais, de sorte que o atendimento da necessidade de energia elétrica, por qualquer outro meio que não seja o serviço público torna-se impossível sem violação da ordem jurídica, tem-se que a utilização do serviço e por isto mesmo, o pagamento da remuneração correspondente é compulsória. Neste caso, esta remuneração correspondente é taxa.[3]
O STF decidiu no RE 201.630, que a remuneração do serviço de água se caracteriza como preço público (da qual tarifa é uma das modalidades) e assim, não tem natureza tributária.[4]
Ainda sobre o serviço de distribuição de água, foi editada a súmula 407 do STJ, que afirma ser legítima a cobrança de tarifa de água fixada de acordo com as categorias dos usuários e as faixas de consumo. Estes parâmetros diferenciados de cobrança entre as categorias dos usuários e as faixas de consumo se justificam por uma política de justiça social, visando diminuir a desigualdade social, onde os que possuem menos recursos pagam menos.
Quanto ao serviço de iluminação pública, em razão de sua indivisibilidade e de sua generalidade, não podem, conforme previsto pelo artigo 145, inciso II, da CRFB, ser remunerados por taxas. A súmula 670 do STF, neste sentido, dispõe que o serviço de iluminação pública não pode ser remunerado mediante taxa.
Destaca-se ainda o disposto na Súmula Vinculante 19, que prescreve o seguinte: “a taxa cobrada exclusivamente em razão dos serviços públicos de coleta, remoção e tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis não viola o art. 145, ii, da constituição federal”.
Cabe citar que a doutrina considera que, por outro lado, os serviços de lavagem e capinação de vias e logradouros, bem como o desentupimento de bueiros, constituem atividades voltadas para toda a coletividade e assim devem ser cobertos pelos recursos advindos do pagamento de impostos em geral. O STF decidiu que não é constitucional a lei municipal que institua taxa para remunerar serviços de limpeza pública não mensuráveis, inespecíficos e indivisíveis para contribuinte determinado, sendo, ainda, vedado tomar por base de cálculo elemento que sirva de fato gerador para o cálculo do IPTU, como é o caso da área do imóvel.[5]
Nesta seara, cabe também a súmula 665 e 667, ambas do STF. A primeira determina ser constitucional a Taxa de Fiscalização do Mercado de Títulos de Valores Mobiliários instituída pela Lei 7.490/89. Já a segunda afirma violar a garantia constitucional de acesso à jurisdição (art. 98, parágrafo 2º da CRFB) a taxa judiciária calculada sem limite sobre o valor da causa.
Em síntese, quanto a remuneração dos serviços público cabe transcrever a seguinte passagem escrita por José dos Santos Carvalho Filho:
Os serviços facultativos são remunerados por tarifa, que é caracterizada como preço público. Aqui o pagamento é devido pela efetiva utilização do serviço, e dele poderá o particular não mais se utilizar se o quiser, considera-se que nesta hipótese o Estado, ou seus delegados, executem serviços econômicos (industriais ou comerciais), o que dá lugar à contraprestação. Exemplos deste tipo de serviço é o de energia elétrica e de transportes urbanos. Sendo tais serviços de livre utilização pelos usuários, já que inexiste qualquer cunho de obrigatoriedade, tem-se entendido, a nosso ver com toda a coerência, que podem ser suspensos pelo prestador se o usuário não cumprir seu dever de não remunerar a prestação. Contudo, quitando seu débito o usuário tem direito ao fim da suspensão e, em conseqüência, à nova fruição do serviço. O débito tarifário, contudo, não pode ser transferido a um novo usuário do serviço essencial, e isso porque não é deste último a inadimplência para com o concedente.[6]
Conclusão
Conclui-se que a Administração Pública tem o dever de fornecer serviços públicos adequados (de forma direta ou indireta), tanto os gratuitos quanto os remunerados. Quanto aos remunerados, é imperiosa a observância dos ditames constitucionais e infraconstitucionais acerca da remuneração devida, eis que esta é necessária para a manutenção e prestação adequada dos serviços públicos, que é imprescindível para a concretização dos direitos fundamentais.
4. Referências Bibliográficas
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 23ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.
DIEZ, Manuel Maria. Manual de Derecho Administrativo, tomo II. 1ª ed. Buenos Aires: Plus Ultra, 1980.
BELTRÃO, Irapuã. Resumo de Direito Tributário. 3ª ed. Niterói: Impetus, 2010.
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 30ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009.
Supremo Tribunal Federal, RE (Agr) 201.630-DF, Rel. Min. ELEN GRACIE, publ. DJ de 2/8/2002
___. RE 204.827, Pleno, maioria, Rel. Min. ILMAR GALVÃO, publ. DJ de 25/4/1997, p. 15.213.
[1] DIEZ, Manuel Maria. Manual de Derecho Administrativo, tomo II. 1ª ed. Buenos Aires: Plus Ultra, 1980. p.17.
[2] BELTRÃO, Irapuã. Resumo de Direito Tributário. 3ª ed. Niterói: Impetus, 2010. p.16.
[3] MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 30ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p.436.
[4] STF, RE (Agr) 201.630-DF, Rel. Min. ELEN GRACIE, publ. DJ de 2/8/2002
[5] STF, RE 204.827, Pleno, maioria, Rel. Min. ILMAR GALVÃO, publ. DJ de 25/4/1997, p. 15.213.
[6] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 23ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p.368.
Graduado em Direito pela PUC-RJ. Especialista em Direito Público pela UCP-RJ. Servidor público federal.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, José Felippe Rangel da. A remuneração dos serviços públicos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 maio 2018, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/51625/a-remuneracao-dos-servicos-publicos. Acesso em: 02 nov 2024.
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