ANTÔNIO CÉSAR MELLO[1]
RESUMO: O presente artigo traz uma breve critica sobre a supremacia antropocêntrica frente o direito dos animais, desde como o homem coloca-se em situação de superioridade, explorando o animal de todas as formas, bem como o surgimento de uma legislação teoricamente voltada para amparar os animais. Observa-se a ineficiência da lei, e o conflito entre o capitalismo e o direito dos animais, sendo mais uma vez o interesse do homem superior. Por fim, o crescimento, mesmo que ainda pouco, da conscientização acerca do protecionismo animal e uma alusão de um direito preocupado com o bem estar também dos animais.
Palavras chaves: Direito. Animais. Exploração.
INTRODUÇAO
Sempre houve uma relação entre o homem e os animais, apesar de que há muito tempo existem outras formas de subsistência, o homem continua colocando os animais em situações cruéis. O ser humano vem se colocando acima dos animais, e passando por cima de seus direitos, ignorando completamente que se trata de seres vivos, apenas para explorá-los.
Nos tempos atuais, a cultura de exploração animal está enraizada, e até mesmo a legislação que deveria resguarda os animais ainda é pouco eficaz, e insuficiente. Os animais não nasceram para servir ao homem, eles são dotados de sentimentos muito parecidos com os nossos.
O Brasil aos poucos foi introduzindo algumas leis que protegem os animais, muito longe do que se espera para que de fato os resguardem. A nossa Carta Magna impõe a obrigação de cuidado, respeito e penalidades para aqueles que praticam as condutas descritas como crimes ambientais, porem de forma muito branda. Os Estados também possuem suas próprias legislações ambientais.
Pode-se concluir que grande parte do que acontece com os animais é devido a uma cultura antropocêntrica que ainda vê a exploração animais como forma primordial para subsistência. E a falta de normas mais duras só encoraja que essa situação prospere afinal as penalidades ainda são brandas, prevalecendo assim os interesses econômicos e não a preservação dos animais.
Ao desenvolvimento deste trabalho, buscar-se-á analisar brevemente como o homem mantém uma relação de domínio e exploração sobre os animais. Tratando-se de um ser vivo, porém não humano, acarretando assim certa atenuação em relação aos seus direitos, que são raramente levados em consideração, afinal, a cultura atual é de que o animal serve para a subsistência humana.
Mesmo com a legislação que rege e assegura os direitos aos animais, ainda existe uma grande deficiência quando se trata de protegê-los. A uma grande diferenciação, sobre os animais que são portadores de direitos e os que são praticamente ignorados. Os animais domésticos, por exemplo, cachorros e gatos, são assegurados enquanto os demais animais como vacas, porcos e aves que são explorados e mortos de forma banal e extremamente cruel, e muito pouco se faz para resguardá-los.
Este trabalho busca ressaltar como a discriminação entre espécies que a sociedade projeta afinal nenhuma vida vale mais do que a outra, então necessário se faz que a justiça proteja todos os tipos de animais, sendo eles domésticos, selvagens, aquáticos ou quaisquer tipos. A legislação brasileira ainda precisa desenvolver meios jurídicos que resguardem de forma eficiente todas as espécies, e por mais de tais mudanças batam de frente com um grande mercado, a inércia não deve ser aceita.
O presente trabalho é desenvolvido a partir de observações e análises de conteúdos publicados em livros, artigos e teses, com o intuito de identificar e demonstrar os objetivos desta pesquisa.
Sendo assim, valer-se-á do método dedutivo, a fim de apresentar neste contexto os conhecimentos já consolidados, através de uma pesquisa bibliográfica e análise legislativa para alcançar os fins desejados.
1. EXPLORAÇÃO ANIMAL AO LONGO DA HISTÓRIA
Ao longo da evolução humana é possível observar como sempre estivemos ligados com a sociedade animal, afinal o ser humano sempre usou da natureza como matéria primordial para sua subsistência. Existem registros desde os tempos pré-históricos de como os animais eram integrantes dos meios em que o homem habitava, como por exemplo, as pinturas rupestres que foram umas das primeiras formas de representação, que registravam grandes animais como bisões, cavalos, cervos, entre outros, que muitas vezes sugeriam através destas, lutas e caças.
As primeiras atividades humanas voltadas à subsistência foram à coleta, a caça e a pesca, seguidas da agricultura e do pastoreio. Mas não se pode precisar em que época e como isso aconteceu. Nem existe uma ordem cronologia identificável, tendo ocorrido o desenvolvimento dessas atividades de forma independente em cada região. (PEDRO; COULON, 1989)
Nos tempos mais antigos, as atividades como essas eram a forma que os seres humanos encontravam para sobreviver. As condições naturais iam além do que estava em suas mãos, então eles usavam as peles para se aquecerem, por exemplo, e cada região se desenvolveu conforme estava os recursos que estava à sua disposição.
[...] a vida nômade baseada na caça, na pesca e na coleta de alimentos da era Paleolítica - dez mil anos foi a.C foi aos poucos sendo substituída por uma nova sociedade em que o homem praticava a agricultura, domesticava os animais, desenvolvia a cerâmica e a tecelagem, usava ferramentas especializadas de pedra afiada e polida e vivia em aldeias era Neolítica - oito mil anos a.C.) (PEDRO; COULON, 1989).
Com o homem passando a domesticar os animais, sua exploração não era apenas para saciar sua fome e aquecer seu corpo, mas também os usavam para garantir mantimentos, ajudar no transporte, tração, montaria, entre outros.
[...] a domesticação de animais, surgida em certas áreas, permitiria enriquecer a dieta humana com uma provisão regular de carne e também de leite e peles. Mais tarde, alguns dos animais domesticados proporcionariam uma nova fonte de energia muscular, além da humana, como montaria ou força de tração de arados e carros, multiplicando, dessa forma, a capacidade produtiva do homem e sua mobilidade espacial. (RIBEIRO, 1983, p. 67).
Mesmo com o homem passando a usar em outros tipos de atividades de subsistência, conforme o tempo foi passando, a exploração animal só aumentava.
[...] os primeiros animais que o homem domesticou foram os que podiam contribuir para lhe aumentar os meios de subsistência. O cão, pelo olfato, tem sido sempre grande auxiliar na caça. Vacas, ovelhas, cabras e porcos, fornecem-lhe carne e também leite, mas as aves, além da carne, fornecem-lhe ovos. Acredita-se que o ganso haja sido a primeira das aves de quintal domesticadas. É possível que o pato haja sido domesticado ao mesmo tempo, pois ambos eram comuns no antigo Egito. Parece que as primeiras aves foram domesticadas na região da Birmânia. Os romanos conheciam as galinhas d’Angola, e os habitantes pré-históricos da América do Norte possuíam perus domesticados. É possível também que se tenha domesticado o coelho como fonte de alimento. Os animais que servem ao homem somente como bestas de carga também foram domesticados em épocas muito remotas, mas não tanto quanto os animais produtores de carne e leite. O burro e o camelo foram, provavelmente, os primeiros. Supõe-se que o cavalo tenha sido domesticado depois. A mula é utilizada há milhares de anos. O elefante, se bem que não seja propriamente animal doméstico, porque raras vezes se reproduz em cativeiro, é domesticado há séculos. A Ihama é animal de carga, em certas regiões andinas, desde tempos imemoriais (BARSA, 1969, p. 416).
Conforme a domesticação dos animais o homem passou a cada vez mais explorá-los, um grande exemplo disso são os circos, zoológicos e aquários. Além de privarem os animais que vivera em seus habitats naturais, os deixam suscetíveis a um grande estresse, sendo maltratados, torturados, agredidos como forma de punição e castigos para um grande um show.
(...) isso faz com que os animais obedeçam ao comando do domador, que se anuncia pelo estalo da chibata. Assim, tigres saltam em meio a argolas de fogo, ursos pedalam bicicletas, chimpanzés dançam com roupas femininas, elefantes sentam em banquetas, leões se curvam resignados. Tamanho abuso não se limita aos picadeiros ou aos treinos, mas envolve as contínuas viagens das companhias itinerantes, sob chuva e sol, calor e frio, atravessando estradas adversas e desconhecidas. Privados de liberdade e de respeito, os animais mantidos no circo formam um triste comboio de resignados prisioneiros. O aplauso do público, ao fim de cada apresentação deles, representa – na realidade – um inconsciente estímulo à insensibilidade humana. Necessário convencer as pessoas de que circo com animais escravizados não é sinônimo de alegria ou de pureza infantil. É preciso, enfim, mostrar a dolorosa verdade desses espetáculos, afastando o véu que encobre a miserável condição dos animais que nele atuam.” (LEVAI, 2011. p. 54.)
Esses animais vivem uma vida de escravidão, em situação deplorável, servindo apenas como entretenimento, e como forma de lucro. Sem quaisquer tipos de tutela para protegê-los. Muitos deles passam a vida em cativeiro, solitários, são presidiários de uma prisão insalubre.
(…) de nada serve preservar alguns poucos exemplares vivendo em cativeiro se esses animais jamais serão reintroduzidos em seus antigos ambientes, até porque, com frequência, sua extinção advém da supressão desses mesmos ambientes. Além disso, a recuperação da espécie com base em alguns poucos exemplares representaria um afunilamento genético. Se há realmente uma preocupação com a preservação das espécies, deveriam ser preservados seus ambientes naturais.” (HOFFMANN, 2009. Disponível em: https://www.anda.jor.br/2009/06/zoologicos-crueldade-travestida-de-diversao/).
A sobreposição dos interesses humanos sobre os animais foi aumentando conforme iam surgindo mecanismos tecnológicos. Eles não serviam apenas como comida, entretenimento, proteção, força, mas começaram também a servi de cobaias para experiências. Ekaterina Rivera diz que “as experiências com animais são práticas muito antigas, tanto que não se sabe ao certo quando foi o marco inicial dessa atividade” e que essas práticas podem ter começado a ser realizado pelo médico grego Galeno (130 – 200 d.C).
Os laboratórios se utilizam de diversos animais para diversas funções, ratos (utilizados, na maioria das vezes, para investigação do sistema imunológico), coelhos (submetidos a testes cutâneos e oculares, entre outros procedimentos), gatos (usados principalmente para a realização de experiências cerebrais), cães (geralmente destinados ao treinamento de cirurgias), rãs (que são designadas para teste de reação muscular e, principalmente, na observação didática), macacos (usados para análises comportamentais, entre outras funções), porcos (cuja pele rotineiramente serve de modelo para o estudo da cicatrização), cavalos (bastante utilizados no campo da sorologia), pombos e peixes (destinados, principalmente, aos estudos toxicológicos), e muitas outras espécies que também servem como cobaia para as experimentações realizadas pelo homem. (LEVAI, Laerte Fernando, 2011).
É importante ressaltar que os animais, inclusive os utilizados em pesquisas, são seres sencientes, ou seja, têm capacidade emocional para sentir dor, medo, prazer, alegria e estresse, além de terem memória e serem suscetíveis a sentir saudades.
No Brasil, milhares de animais vêm a óbito em decorrência dos inúmeros testes cruéis a que são submetidos, como testes cirúrgicos, toxicológicos, comportamentais, neurológicos, oculares, cutâneos, etc., sem que haja limites éticos, ou mesmo relevância cientifica, em tais atividades. Registros de experiências terríveis praticadas com animais nas salas de aula, laboratórios, nas fazendas industriais ou até mesmo na clandestinidade, demonstram os infinitos graus da estupidez humana. (LEVAI, Laerte Fernando, 2011).
Atualmente existem várias alternativas que substituem essa crueldade, não é mais necessário que continuem com essas atrocidades, sendo que a tecnologia atua de forma satisfatória sem precisar que quaisquer animais sejam torturados, ressaltando que na maioria dos casos esses testes são ineficientes.
A pesquisa com base em experimentação animal falha repetidamente, 92% das potenciais drogas farmacêuticas que são consideradas efetivas por testes em animais, sendo tidas como eficazes e seguras, não passam em ensaios clínicos, quer por causa da eficácia insuficiente ou de efeitos secundários indesejáveis. Dos 8% das substâncias que são aprovadas, metade são posteriormente retiradas do mercado porque os efeitos colaterais mesmo letais nos seres humanos tornam-se evidentes. (TAI, Patrícia, 2013. Disponível em: https://www.anda.jor.br/2013/11/experimentos-animais-nao-sao-necessarios/ )
Mesmo com teste ineficazes, ainda assim são mantidas essas experiências cruéis, é questionável onde está a lei que deveria tutelar os animais sendo que nem mesmo são testes eficientes. Trata-se apenas de uma protelação de sofrimento e tortura sem conclusão eficaz.
Há muito tempo existe oposição à experimentação em animais. Essa oposição alcançou poucos resultados porque os experimentadores, apoiados por empresas comerciais que lucram com o suprimento de animais de laboratório e equipamentos, têm conseguido convencer os legisladores e o público de que a oposição é feita por fanáticos desinformados, que consideram os interesses dos animais mais importantes que os interesses dos seres humanos. Mas, para se opor ao que acontece hoje, não é preciso insistir em que cessem imediatamente todos os experimentos em animais. Tudo o que precisamos dizer é que os experimentos que não servem a objetivos diretos e urgentes devem cessar imediatamente e, nos demais campos de pesquisa, devemos buscar, sempre que possível, a substituição dos experimentos que envolvam animais por métodos alternativos, que não os utilizem. (SINGER, Peter, 2004, p. 45.)
Tendo o homem controle dos meios a sua volta, é necessário que se tenha uma visão menos antropocêntrica, para equilibrar o homem e o meio ambiente. A forma mais eficiente de controlar as ações humanas é através da legislação que vem de forma coercitiva podar esses atos que estão cada vez mais nocivos.
Sabemos que os seres naturais não-humanos não são capazes de assumir deveres e reivindicar direitos de maneira direta, explícita e formal, embora sejam constituintes do ecossistema planetário, tanto quando o é a espécie humana. A Ciência não tem força impositiva ou de coação; por isso exige que o Direito tutele o ecossistema planetário. Tal exigência baseia-se no fato de que o mundo natural tem seu valor próprio, intrínseco e inalienável, uma vez que ele é muito anterior ao aparecimento do Homem sobre a Terra. As leis do Direito Positivo não podem ignorar as leis do Direito Natural (MILARÉ, Édis, 2011, s. p.).
2. DIREITO DOS ANIMAIS
Na legislação brasileira, a própria Constituição e algumas leis que tutelam sobre os animais, como: Código de Pesca (Lei n. 221, de 28 fevereiro de 1967), Lei de Proteção a Fauna (Lei n. 5.197, de 3 de janeiro de 1967, alterada e pela Lei n. 7.653, de 12 de fevereiro 1988), Lei da Vivissecção (Lei n. 6.638, de 8 de maio de 1979), Lei dos zoológicos (Lei n. 7.173, de 14 de dezembro de 1983), Lei dos Cetáceos (Lei n. 7.643, de 18 de dezembro de 1987) e a Lei da Inspeção de Produtos de Origem Animal (Lei n. 7.889, de 23 de novembro de 1989).
A Constituição assegura a defesa e a proteção dos animais, vedando qualquer ato que de alguma forma gere riscos ao meio ambiente, extinção de espécies e atos cruéis. A crueldade e os maus-tratos são conceitos equivalentes, ambos se referem às numerosas práticas cruéis em que os animais são submetidos a elevado sofrimento sem qualquer justificativa e extrema violação às leis da natureza, princípios jurídicos nacionais e internacionais, bons costumes e asseguradores da proteção da incolumidade da vida de todos os seres vivos. (CUSTÓDIO, Helita Barreira, 2005, p. 593.)
Apesar da previsão legal acerca da proteção aos animais, os interesses do homem ainda se colocam frente aos que tutelam os animais, ficando o antropocentrismo mais uma vez como principal interesse do homem. Um exemplo disso são as manifestações culturais que batem de frente com a proteção animal, e que prevalecem à identidade de um povo sobre a vida e o bem-estar animal.
[...] ressalta que, caso um animal esteja ameaçado de extinção, o costume estaria prejudicado, devendo ser vedada a prática, para que seja dada uma mínima qualidade de vida e chance de sobrevivência ao animal, visando a preservação da vida do animal. Assim, em se tratando de um exercício cultural de determinada região e o animal não se encontrando em vias de extinção, não haverá violação constitucional quando praticado atos cruéis contra os animais. Cita também a necessidade de ser realizado o abate de animais pelo método menos doloroso. (FIORILLO, Celso Antonio Pacheco, 2010, p. 67.)
Sendo que de acordo com a lei nº 9.605 de 1998, serão punidos os que praticarem maus tratos contra animais, onde está aplicabilidade dessa lei se os animais continuam sendo torturados e mortos?
Art. 32. Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.
§ 1º Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos.
§ 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal.
A falta de empatia do homem pelo animal tomou conta dos seres humanos, abatedouros, experiência cientifica, aquários, circos, rodeios, vaquejadas, zoológicos, são todos fabricas de crueldade. Não é necessário esse tipo de comportamento, mas isso já se tornou tão natural para o homem que sequer a legislação que protege os animais é eficaz.
Certamente, os animais enquanto tais devem, porque são seres sensíveis e não simples máquinas, nos inspirar uma certa compaixão. Porém o mais grave é que, na crueldade e nos maus tratamentos que inflige a eles, é o homem que degrada a si mesmo e perde sua humanidade. (FERRY, Luc, 2009, p. 73)
Vale ressaltar que a vida do homem está diretamente relacionada à natureza, ao ecossistema de modo geral. Sendo assim a preservação das entidades naturais é essencial para sobrevivência das futuras gerações.
O constituinte tutela o ambiente que resulta em equilíbrio entre o homem e a natureza, importando em uma proteção para as presentes e futuras gerações. O equilíbrio no meio ambiente não importa em imobilismo das relações do homem, mas na busca de harmonia ao meio ambiente. (CARLI, Vilma Maria Inocêncio, 2004, p. 20.)
Nesse sentido, em que o homem tem certo controle Salienta Fiorillo (2006, p. 16) diz que: “o direito ambiental possui uma necessária visão antropocêntrica, porquanto o único animal racional é o homem, cabendo a este a preservação das espécies, incluindo a sua própria”.
Assim, chegará o tempo em que a crueldade e o menosprezo aos direitos dos animais será memória triste de um passado, hoje presente. Mas para tanto é imprescindível que se reformulem determinados conceitos, rompendo grilhões de uma mentalidade tacanha. A etapa mais importante para que se obtenha essa renovação de conceitos, situa-se justamente na redefinição da natureza jurídica dos animais: sujeitos com personalidade jurídica própria à sua condição e não coisas; seres e não números, criaturas da mesma Natureza e não meros elementos econômicos ou materiais, para exploração e diversão do homem. (Ibiden – P. 69)
O primeiro passo para transformar essa crueldade, que hoje faz parte da realidade mundial, é começando justamente com a legislação regulamentando e reconhecendo os direitos dos animais. Existe, uma a Declaração Universal dos Direitos dos Animais proclamada Organização das Nações Unidas para Educação Ciência e Cultura (UNESCO), em 15 de outubro de 1978, que busca igualdade entre animal e homem e a obrigatoriedade de respeito e cuidados deste para com aquele, mostrando que maus tratos aos animais constitui infração, porém sem impor nenhuma penalidade.
No Brasil a penalidades que decorrem de maus-tratos aos animais são insignificantes diante das atrocidades que são cometidas, todas são passiveis de Suspensão Condicional do Processo. Sem leis rigorosas, é improvável que as crueldades praticadas irão cessar. Cada estado disciplina sobre suas próprias normas de proteção ambiental, resultando assim em uma discrepância, e falta de efetividade quando se trata de proteger os animais.
Abre precedente para tratar de forma desigual as várias espécies animais, resguardando umas e deixando outras de lado. Todos os animais sentem dor, medo, sofrimento, tristeza e por que os tratar de forma tão cruel? Todos sentem a mesma dor e sofrimento.
Mesmo que a legislação brasileira ainda tenha muito que evoluir em relação aos direitos dos animais, cada passo é necessário, e mesmo que demore o que se espera é que a cada dia que passe o legislador projete cada vez mais leis que protejam os animais e os reconheçam seus direitos se discriminação.
“Chegará o dia em que todo homem conhecerá o íntimo dos animais. Nesse dia, um crime contra um animal será considerado um crime contra a própria humanidade.” (Leonardo da Vinci)
3. AS EXPLORAÇÕES SOCIALMENTE ACEITAS
A principal atividade que movimenta a economia brasileira é a pecuária, e hoje em dia existem mais bovinos do que seres humanos no país. Fora que além dos bovinos, o Brasil também é um grande produtor de suínos, caprinos e galináceos, sendo responsável por uma serie de abusos aos animais.
Estando diretamente ligados aos interesses econômicos, a produção e criação desses animais ignoram totalmente o que se considera aceitável para o bem estar animal. Um animais que viveria 20 anos, é abatido com 5 anos, usando-se da manipulação genética um galinha por exemplo, que chegaria a viver mais de 10 anos, tem seu vida ceifada dentre 2 ou 3 meses.
Além do tempo de vida consideravelmente reduzido as condições de vida destes animais são de longe aceitáveis, sendo submetidos a castrações sem qualquer tipo de anestesia, tento seus chifres cortados ou ate mesmo queimados. No caso das galinhas, os bicos são cortados, pois acabam cometendo canibalismo devido às situações estressantes que são submetidas.
A indústria leiteira pode ser considera outro show de horror, uma vez que as vacas devem estar constantemente prenhas para produção de leite, sem intervalos para recuperação, e separadas precocemente de seus bezerros o que resulta em um grande sofrimento psicológico para a mãe. Ligadas diretamente a maquinas que ordenham o leite incessantemente, ocasionando infecções, doenças, dores e muitas vezes o óbito.
Tudo que deriva dessas indústrias são “aproveitados”, os bezerros que foram separados são destinados também a produção de leite, quando fêmeas, e os machos para indústria da carne, couro, ou a produção de carne de vitela, os ossos vão para a fabricação de gelatinas e colas. Explora-se o animal até o ultimo sopro de vida.
A situação dos suínos não se difere muito das anteriores, uma vez que são criados em condições super precárias, amontoados, sem higiene, enclausurados sem conseguir se mexer, submetidos a um grande nível de estresse e como os outro, também sofrem mutilações.
No Brasil, a Instrução Normativa SDA - 3, de 17/01/2000, diz o seguinte:
“O SECRETARIO DE DEFESA AGROPECUÁRIA DO MINISTÉRIO DA AGRICULTURA E DO ABASTECIMENTO, no uso da atribuição que lhe confere o art. 83, inciso IV, do Regimento Interno da Secretaria, aprovado pela Portaria Ministerial n.º 574, de 8 de dezembro de 1998, e considerando a necessidade de padronizar os Métodos de Insensibilização para o Abate Humanitário estabelecer os requisitos mínimos para a proteção dos animais de açougue e aves domésticas, bem como os animais silvestres criados em cativeiro, antes e durante o abate, a fim de evitar a dor e o sofrimento...”
Trata-se de um regulamento que prevê um conjunto de técnicas que tornaria o abate menos cruel, evitando sofrimentos desnecessários e garantindo o bem estar do animal, não só na hora do abate em si, mas também na situação pré abate. Ocorre que vemos que a situação em que os animais se encontram está muito longe de ser humanitário, o que resulta mais uma vez na ineficiência jurídica na proteção aos animais, sem a devida divulgação e fiscalização.
Outra grande indústria que investe na exploração animais é a de vestimentas, as peças feitas de couro, normalmente de bois, vacas e jacarés, são consideradas de qualidade, além de esteticamente mais atraentes. Outras roupas que chamam a atenção são as feitas de peles de arminhos, martas, castores, guaxinins, coelhos, raposas e chinchilas.
Por trás de todo o luxo que envolve esses tipos de roupa, está uma grande instruía da tortura, já que para conseguirem as peles, os animais são esfolados vivos, amarrados e seus pelos arrancados, resultando em um dor imensa, grandes machucados por todo o corpo, ou em sua morte.
O carneiro é outro animal que também esta a mercê da exploração, pois além de ser produto da pecuária o seu pelo tem um grande valor comercial. Assim como os outros, o carneiro é geneticamente modificado para uma produção maior de lã, submetido à esfolações, mutilações, castração sem anestesia, entre outros. Explorados repetidamente para a produção de lã durante toda a vida ate que são batidos para consumo.
Os animais também são explorados como forma de entretenimento, como em equitação, corridas de cavalos, corridas de cães, rinhas de galos, rodeios, vaquejadas, circos, aquários e zoológicos. Além de manterem os animais presos, passando sua vida toda em jaulas, estábulos, tanques, acorrentados ou deslocados em meios desconfortáveis.
Esses animais usados para entretenimentos devem ser “domesticados” ou treinados, e a forma que usam para conseguir controlá-los é através de correntes, chicotes, focinheiras, ganchos de metal e bastões elétricos para forçar os animais a se comportarem de determinada maneira. Outros métodos incluem acorrentar os animais e privá-los de comida e água.
Além de gerar prejuízo a saúde física do animal, esse tipo de comportamento também resulta em traumas psicológicos muito severos a eles. Os traumas causados resultam em sérios problemas psicológicos ao animal, a ansiedade e o medo constante os afeta tanto que acabam apresentam comportamentos como mover-se repetidamente para frente e para trás ou de um lado para outro, batem as cabeças, mordem as barras de suas jaulas ou se automutilam.
Zoológicos e aquários privam os animais de sua liberdade, negam-lhe o direito de se movimentarem e socializarem, não tem espaço para se exercitarem. Esses animais estão vivendo em locais desconfortáveis, sofrem de esgotamentos físicos e mentais. Tudo isso em troca de um entretenimento que custa caro para eles, enquanto que para nós trata-se de uma diversão momentânea, reafirmando mais uma vez a crença do homem de que os animais estão à disposição servi-lo.
Um dos animais que mais sofrem com a interferência do homem são os peixes, que dificilmente conquistam a empatia do ser humano. O número de animais aquáticos que são capturados e mortos é difícil de calcular, são toneladas e toneladas pescados todos os dias. Vale ressaltar que muitos estudos mostraram que peixes têm a capacidade de sofrer e sentir prazer, da mesma forma que mamíferos, aves, répteis e outros animais, sentem dor e buscam experiências positivas.
Mesmo sendo animais que sentem como qualquer outro, os peixes são mortos de formas cruéis, asfixiados quando são retirados da água, em decorrência de ferimentos causados pela pesca, cansaço extremo na tentativa de escaparem, esmagados pelo peso de outros peixes, ou mortos pelos próprios pescadores com arpões como é o caso do atum, congelados vivos ou ate mesmo cozidos vivos para manter-los “frescos”.
A pesca tem tomado proporções irrecuperáveis, várias espécies de peixes estão entrando em extinção, um exemplo é a sardinha. Um estudo realizado por uma equipe internacional de cientistas e publicado na revista científica Science, afirmam que os estoques de pesca já caíram em cerca de 33% e a taxa de eliminação da biodiversidade marinha continua aumentando. Essa pesquisa mostra um dado alarmante “não haverá praticamente mais nada para pescar nos oceanos até o ano de 2048.”
Existem ainda, outros setores em que o homem sobrepõe os seus interesses acima do direito dos animais, como a caça, apicultura, usados como meio de transporte e tração, e um dos mais cruéis as experiências em animais.
CONCLUSÃO
No presente estudo, podemos observar como o ser humano e as relações com os animais ao longo da história foram resultando em uma sobreposição de sua situação como individuo dotado de racionalidade, acima das demais espécies animais, inicialmente como uma questão de própria sobrevivência.
Com o passar dos tempos a cultura antropocêntrica tornou-se a verdade, e cada vez mais o homem usava da exploração animal para sua subsistência. Chegando a um ponto em que o desenvolvimento social e tecnologia dispensam essa opressão animal.
Os mecanismos jurídicos que regem a convivência social seria uma fonte para a implantação de novas formas de visualizar os interesses dos animais, uma vez que como seres pensantes e empáticos, desenvolveria métodos para protegê-los e resguardá-los
Apesar de várias previsões legais, quando se trata de direito dos animais, nossa legislação ainda tem muito que discutir e evoluir. Afastando um pouco o interesse econômico, e passando a enxergar os animais como seres sensitivos que são, modificaria o modo como são tratados e de fato tutelar sobre seus direitos, com leis mais eficientes que tratem sobre o assunto.
A sociedade humana em vários momentos históricos sofreu mudanças em entendimentos que anteriormente eram considerados verdade absoluta, por que não modificar a relação do homem com o animal, passando a condenar essa escravidão.
Não se trata de uma sobreposição do direito dos animais sobre o interesse humano, e sim estabelecer uma convivência pacífica e um equilíbrio entre as espécies, dessa forma impossibilitaria a exploração de uma em favor da outra, uma comparação ao mesmo fundamento da abolição da escravatura.
Existindo saídas alternativas para os casos em que há uma exploração animal, como nos casos de alimentação, vestimenta, entretenimento, testes e experiências, falar da libertação animal não seria uma utopia e sim o futuro possível.
REFERÊNCIAS
SINGER, Peter. Libertação Animal. Porto Alegre: Lugano, 2004.
https://www.anda.jor.br/2009/06/exploracao-animal/ Acessado em 03.maio.2018.
http://www.animal-ethics.org/exploracao-animal/animais-usados-alimentacao-introducao/ Acessado em 03.maio.2018.
https://www.anda.jor.br/2013/11/experimentos-animais-nao-sao-necessarios/ Acessado em 05.maio.2018.
http://www.animal-ethics.org/exploracao-animal/animais-usados-entretenimento/circos-outros-espetaculos/ Acessado em 05.maio.2018.
http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,direito-animal-uma-breve-digressao-historica,48729.html Acessado em 05.maio.2018
[1] Possui graduação em Direito pelo Centro Universitário Ritter dos Reis (Canoas – RS – 1996), especialista em Direito e Estado pela Universidade do Vale do Rio Doce (Governador Valadares), é Mestre em Ciências do Ambiente pela Fundação Universidade Federal do Tocantins (Palmas – TO). É Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (Belo Horizonte). Professor de Direito da Faculdade Católica do Tocantins. E-mail: [email protected]
Bacharelanda em Direito pela Faculdade Católica do Tocantins.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: GIOVANNA RODRIGUES BARBOSA DE MENDONçA, . A supremacia antropocentrica frente ao respeito pelo direito dos animais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 29 maio 2018, 04:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/51772/a-supremacia-antropocentrica-frente-ao-respeito-pelo-direito-dos-animais. Acesso em: 04 nov 2024.
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